O beijo mais escuro
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Embora já vivesse há muitos séculos, Anya, a deusa da Anarquia, nunca conhecera o prazer. Até aparecer Lucien, a encarnação da Morte, um guerreiro condenado para toda a eternidade a levar as almas para o além. Ele atraía-a como nenhum outro, e Anya estava disposta a arriscar tudo para o ter. No entanto, quando Lucien recebe dos deuses a ordem de capturar a alma de Anya, a incontrolável atracção transforma-se numa angustiante perseguição. Tinham de vencer as forças que os controlavam antes que a sede que sentiam um pelo outro lhes exigisse um sacrifício de amor inimaginável…
Gena Showalter
Gena Showalter is the New York Times and USA TODAY bestselling author of over seventy books, including the acclaimed Lords of the Underworld series, the Gods of War series, the White Rabbit Chronicles, and the Forest of Good and Evil series. She writes sizzling paranormal romance, heartwarming contemporary romance, and unputdownable young adult novels, and lives in Oklahoma City with her family and menagerie of dogs. Visit her at GenaShowalter.com.
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O beijo mais escuro - Gena Showalter
Um
Anya, deusa da Anarquia, filha da Desordem e portadora do Caos, estava à beira de uma pista de dança cheia de gente. Todas as dançarinas eram mulheres humanas, bonitas e quase nuas, que tinham sido especificamente escolhidas pelos Senhores do Submundo para lhes proporcionarem uma noite de entretenimento. Tanto vertical, como horizontal.
Havia nuvens de fumo que formavam uma névoa à sua volta e o candeeiro girava e criava uma chuva de luzes dentro da discoteca, desenhando círculos lentos. Pelo canto do olho, Anya viu um imortal a possuir uma linda rapariga.
«As festas de que eu gosto», pensou, com um sorriso de atrevimento… embora não a tivessem convidado. «Como se isso me impedisse de vir.»
Os Senhores do Submundo eram guerreiros imortais possuídos pelos demónios que tinham fugido da caixa de Pandora. E naquele momento, com algumas rondas de álcool e de sexo, os guerreiros estavam a despedir-se de Budapeste, a cidade que fora o seu lar durante centenas de anos.
Anya queria entrar em acção com um guerreiro em particular.
– Afastem-se – sussurrou, contendo a sua tendência para gritar «Fogo!» e observar como os humanos corriam em pânico, gritando histericamente. «Deixa-os divertirem-se.»
Um ritmo trepidante de música rock, que seguia o compasso dos batimentos descompassados do seu coração, saiu a todo o volume pelos altifalantes, fazendo com que fosse impossível que alguém a ouvisse. No entanto, todos obedeceram, impelidos por uma obrigação que provavelmente não entendiam.
Abriram-lhe caminho, lentamente… muito lentamente…
Finalmente, o objecto do seu fascínio apareceu à frente dos seus olhos e ela tremeu: Lucien. Cheio de cicatrizes, irresistivelmente estóico e possuído pelo espírito da Morte. Naquele momento, estava sentado numa mesa do fundo, a falar com Reyes, o seu amigo e companheiro na imortalidade.
De que estavam a falar? Se Lucien queria que o guardião da Dor lhe proporcionasse uma daquelas mulheres mortais, a menor das suas preocupações seria um falso alarme de fogo. Cerrando os dentes, Anya inclinou a cabeça concentrou-se neles. Depois de apagar o ruído que os rodeava, ouviu.
– Ela tinha razão. Revi as fotografias no computador de Torin. Os templos estão a elevar-se do mar – disse Reyes. – Um é na Grécia e o outro é em Roma e, se continuarem a elevar-se a essa velocidade, estarão suficientemente adiantados para podermos explorá-los amanhã.
– E porque é que os humanos não sabem nada deles? – perguntou Lucien, esfregando o queixo com dois dedos, um gesto tipicamente dele. – Paris viu as notícias de diferentes cadeias de televisão e não dizem nada, nem sequer há especulações.
«Tolo!», pensou Anya, aliviada por o sexo não ser o assunto da noite. «Vocês sabem porque eu queria que soubessem.»
Ninguém mais os veria. Ela assegurara-se disso, usando o chamado «caos», a sua principal fonte de poder. Escondera os templos com tempestades para manter os humanos afastados e, ao mesmo tempo, proporcionara informação suficiente aos Senhores para que saíssem de Budapeste.
Ela queria que Lucien saísse de Budapeste, que estivesse fora do seu ambiente. Um homem perturbado era mais fácil de controlar.
Reyes suspirou.
– Talvez os responsáveis sejam os novos deuses. Tenho quase a certeza de que nos odeiam e estão desejosos de nos destruir, só porque albergamos os demónios.
A expressão de Lucien continuava perdida.
– Não importa quem é o responsável. Iremos amanhã, tal como tínhamos planeado. Estou desejoso de revistar um desses templos.
– Se tivermos sorte – disse Reyes, – encontraremos a maldita caixa.
Anya passou a língua pelos dentes. A maldita caixa, dimOuniak, a caixa de Pandora. Feita com os ossos da deusa da Opressão. A caixa tinha poder suficiente para confinar no seu interior demónios tão vis que nem sequer o inferno conseguia contê-los. Também era suficientemente poderosa para sugar os demónios novamente para o seu interior, tirando-os dos Senhores, os seus anfitriões. Embora os Senhores não tivessem querido albergar os demónios, com o passar do tempo a sua sobrevivência passara a depender das bestas e era desnecessário dizer que os guerreiros desejavam ter a caixa em seu poder.
Novamente, Lucien assentiu.
– Não penses nisso agora, haverá tempo amanhã.
Agora vai-te embora e desfruta da festa. Não percas nem mais um momento na minha companhia enfadonha.
Enfadonha? Pois! Anya nunca conhecera ninguém que a estimulasse tanto.
Reyes hesitou, mas depois levantou-se e deixou Lucien a sós. Nenhuma mulher humana se aproximou dele. Olhavam para ele, sim. Encolhiam-se ao ver as suas cicatrizes. Nenhuma queria ter nada a ver com ele e isso salvava-lhes a vida.
– Repara na minha presença! – ordenou Anya, suavemente.
Passou um momento e ele não obedeceu.
Vários humanos olharam para ela, mas Lucien continuou a observar fixamente o copo vazio que tinha à sua frente, com uma expressão nostálgica. Para consternação de Anya, os imortais eram indiferentes às suas ordens. Cortesia dos deuses.
– Idiotas… – murmurou ela. – Tudo para incomodar a Anarquia.
Anya não fora favorecida durante os seus dias no Olimpo. As deusas nunca tinham gostado dela porque pensavam que era uma réplica da «sua atrevida mãe» e que seduziria os seus maridos. De igual modo, os deuses não a respeitavam, também por causa da sua mãe. No entanto, eles desejavam-na. Bom, até ter morto o capitão da guarda e terem começado a considerá-la demasiado selvagem. Eram uns idiotas. O capitão merecia o que lhe fizera, por tentar violá-la. Ela não se arrependia de o ter apunhalado no coração. A liberdade de escolha era muito valiosa e qualquer pessoa que tentasse arrebatar a sua sentiria o aço das suas adagas.
Escolha. Essa palavra devolveu-a ao presente. O que raios era preciso fazer para convencer Lucien a escolhê-la?
– Repara em mim, Lucien. Por favor.
Novamente, não lhe fez caso.
Anya bateu com o pé no chão. Durante semanas, escondera-se no seu manto de invisibilidade e seguira Lucien, observara-o e estudara-o. E sim, sentira desejo por ele. Em parte, lamentava tê-lo conhecido, ter permitido que Cronos, o novo rei dos deuses, a intrigasse com histórias sobre aqueles Senhores há alguns meses.
«Talvez seja eu a idiota.»
Cronos acabara de fugir do Tártaro, uma prisão para imortais, e um lugar que ela conhecia muito bem.
Cronos prendera Zeus e outros lá e também os pais de Anya. Quando Anya fora procurá-los, Cronos estava à espera. Pedira-lhe o seu maior tesouro, mas ela recusara-se a dar-lho, portanto, ele tentara assustá-la.
«Dá-me o que quero ou enviarei os Senhores do Submundo atrás de ti. Estão possuídos pelos demónios, como animais sedentos de sangue, e não hesitarão em esfolar-te.» Blá, blá, blá.
Longe de a assustar, estas palavras tinham provocado nela o desejo de procurar os guerreiros. Pensara em derrotá-los e rir-se de Cronos. No entanto, assim que vira Lucien, obcecara-se com ele. Esquecera quais eram os seus motivos para estar ali e até ajudara aqueles guerreiros supostamente malvados.
As contradições cativavam-na e Lucien tinha muitas. Estava cheio de cicatrizes, mas não magoado. Era bom, mas inflexível. Era tranquilo, um imortal que se cingia às regras, não sedento de sangue, tal como Cronos afirmara. Estava possuído por um espírito maligno, mas nunca traíra o seu código pessoal de honra. Lidava com a morte todos os dias, todas as noites, mas mesmo assim, lutava para viver.
Fascinante.
Como se aquilo não fosse suficiente para provocar o seu interesse, Lucien tinha uma fragrância a flores que despertava nela pensamentos decadentes e escandalosos cada vez que se aproximava dele. Porquê? Qualquer outro homem com aquele cheiro tê-la-ia feito rir-se. No entanto, com Lucien só sentia ânsia pelas suas carícias.
Era muito atraente. Tinha os olhos mais estranhos que ela alguma vez vira, um azul e o outro castanho e ambos cheios do espírito de homem e de demónio. E as suas cicatrizes… eram um belo testemunho de toda a dor e sofrimento que superara.
– Eh, linda! Vem dançar comigo – disse um dos guerreiros.
Paris. Anya reconheceu imediatamente a promessa de sensualidade que havia no seu tom de voz.
Devia ter acabado de se divertir com aquela humana contra a parede da discoteca e estava à procura de outra rapariga bonita e tola para se saciar. Ia ter de continuar a procurar.
– Deixa-me em paz.
Sem se deixar afectar pela sua falta de interesse, ele segurou-a pelo pulso.
– Gostarás, prometo-te.
Ela afastou-o com um movimento do pulso. Paris estava possuído pela Promiscuidade e fora abençoado com uma maravilhosa pele clara, uns olhos azuis muito brilhantes e uma cara que, certamente, fazia cantar os anjos, mas não era Lucien e não tinha interesse para ela.
– Afasta as mãos – murmurou Anya, – ou cortar-tas-ei.
Ele riu-se como se aquilo fosse uma brincadeira, sem saber que ela faria isso e mais. Nunca proferia uma ameaça que não estivesse disposta a cumprir. Fazê-lo seria uma fraqueza e Anya prometera-se há muito tempo que nunca mais voltaria a mostrar a mínima fragilidade.
Os seus inimigos adorariam aproveitar-se dela.
Felizmente, Paris não tentou voltar a agarrá-la.
– Em troca de um beijo – disse, num tom rouco, –deixar-te-ia fazer o que quisesses com as minhas mãos.
– Nesse caso, cortar-te-ei também os genitais. O que te parece?
Paris deu uma gargalhada que chamou a atenção de Lucien. Ele levantou o olhar e olhou primeiro para o seu amigo e depois para Anya. Fraquejaram-lhe os joelhos. Oh, meu Deus! Esqueceu-se de Paris e respirou fundo. O fogo que vira a arder nos olhos de Lucien era imaginação dela?
«Agora ou nunca». Humedeceu os lábios e, sem desviar o olhar dele, caminhou sensualmente até à sua mesa. A meio caminho, parou e fez-lhe um gesto com o dedo para que caminhasse até ela. Lucien levantou-se e aproximou-se, como se um fio invisível o puxasse.
Tão perto, era um metro e noventa de músculo e perigo. Pura tentação.
Anya sorriu lentamente.
– Finalmente, encontramo-nos, Flores.
Anya não lhe deu tempo para responder. Esfregou a anca esquerda contra ele e virou-se para lhe oferecer uma visão das suas costas. Tinha um espartilho preso com fitas finas e sabia que a cintura da saia estava tão em baixo nas ancas que deixava a descoberto a elástico da tanga. Oh!
Os homens, mortais ou não, normalmente derretiam-se quando viam uma coisa que não deviam ver.
Lucien assobiou em voz baixa.
Ela sorriu. Oh, rico progresso!
– Porque me chamaste? – perguntou ele, tranquila e disciplinadamente.
– Queria dançar contigo – disse ela, olhando para trás. – É um crime?
Ele não hesitou ao responder.
– Sim.
– Muito bem. Sempre gostei de infringir a lei.
Uma pausa de confusão. Depois:
– Quanto é que Paris te pagou para fazeres isto?
– Vão pagar-me? Oh, que bom! – exclamou Anya e, com um sorriso, aproximou-se dele de costas e esfregou-se contra o seu corpo. – O que tenho de fazer? Dar-te orgasmos?
Nos seus sonhos, ele agarrava-a e penetrava o seu corpo naquele momento. Na realidade, Lucien recuou como se ela fosse uma bomba prestes a explodir e pôs distância entre os dois.
Ela teve uma sensação imediata de perda.
– Nada de contacto – disse ele. Provavelmente, tentara parecer calmo, mas notara-se o seu nervosismo. A sua tensão.
Anya semicerrou os olhos. À sua volta, todos tinham visto a sua interacção e como ele a rejeitara. Ela ordenou-lhes, com um gesto carrancudo: «Isto não é da vossa incumbência! Virem-se!»
Os humanos obedeceram. No entanto, o resto dos Senhores aproximou-se dela, olhando para ela fixamente e com curiosidade. Sem dúvida, queriam saber quem era e o que fazia ali.
Deviam ter cuidado e Anya entendia. Ainda sofriam a perseguição dos Caçadores, um grupo de humanos que achavam, estupidamente, que podiam criar uma utopia de paz e harmonia se libertassem o mundo dos Senhores e dos demónios que albergavam.
«Não faças caso», disse para si. «Estás a ficar sem tempo, rapariga.»
Voltou a concentrar-se em Lucien, para quem olhou sem se virar completamente.
– Onde estávamos? – perguntou e passou um dedo pelo elástico da tanga até atrair o olhar de Lucien para as asas de anjo que havia no meio.
– Eu estava prestes a ir-me embora – balbuciou ele.
– Mas eu não quero que vás – disse Anya, com uma careta.
Lucien deu outro passo para trás.
– O que se passa, querido? – perguntou Anya, aproximando dele sem piedade. – Tens medo de uma mulher?
Ele cerrou os dentes e não respondeu. Embora também não continuasse a afastar-se.
– Tens medo de mim?
– Não sabes o que estás a fazer, mulher.
– Oh, claro que sei – replicou ela e passou o olhar por todo o seu corpo.
– Disse que não queria contacto! – gritou ele.
Anya olhou para ele nos olhos e levantou as mãos, com as palmas para fora.
– Não estou a tocar-te, querido.
«Embora tencione fazê-lo.»
– O teu olhar diz outra coisa – respondeu ele, com tensão.
– Isso é porque…
– Eu dançarei contigo – disse outro guerreiro. Paris novamente.
– Não – respondeu Anya, sem olhar para ele. Ela desejava Lucien e só Lucien. Nenhum outro serviria.
– Pode ser um engodo – disse outro Senhor diferente, provavelmente, olhando para ela com suspeita. Anya reconheceu o tom grave da sua voz: Sabin, o guardião da Dúvida.
Por favor. Engodo? Como se ela tentasse seduzir alguém por uma razão que não fosse completamente egoísta. Os engodos eram raparigas tolas, dedicadas ao sacrifício: a sua missão consistia em distrair os Senhores para que os Caçadores pudessem aproximar deles e matá-los. E, realmente, que tipo de idiota ia querer matar os Senhores, em vez de se divertir um pouco com eles?
– Duvido que os Caçadores tenham conseguido reorganizar-se tão rapidamente depois da praga –disse Reyes.
Ah, sim! A praga. Um dos Senhores estava possuído pelo demónio da Doença. Se tocasse na pele de qualquer humano, infectava-o com uma doença terrível que se espalhava e matava com uma rapidez avassaladora.
Consciente disso, Torin usava sempre luvas e mal saía da fortaleza onde os Senhores viviam, decidido a proteger os humanos da sua maldição. Não fora culpa dele que um grupo de Caçadores tivesse entrado no castelo há algumas semanas e lhe tivesse cortado o pescoço.
Torin sobrevivera, os Caçadores não.
Infelizmente, ainda restavam muitos. Eram como moscas. Se se acabasse com um, apareciam outros dois. Mesmo naquele momento, estavam em algum lugar, à espera de uma boa oportunidade para atacar. Os Senhores deviam ter cuidado.
– Além disso, não há modo de terem encontrado uma forma de atravessar as nossas medidas de segurança – acrescentou Reyes e o seu tom voz áspero afastou Anya dos seus pensamentos.
– Como não havia forma de entrarem no castelo e de decapitarem Torin? – perguntou Sabin.
– Bolas! Paris, fica aqui e vigia-a enquanto eu verifico se não há ninguém perigoso no perímetro – passos, palavrões, murmúrios.
Ena, ena! Se os Senhores encontrassem alguma pista de que havia um Caçador por perto, não conseguiria convencê-los de que ela era inocente. Pelo menos, daquele crime. Lucien nunca confiaria nela, nunca relaxaria na sua companhia. Nunca lhe tocaria, excepto com fúria.
Ela não permitiu que aquela preocupação se reflectisse no seu rosto.
– Vi a multidão e entrei – disse a Paris e ao outro Senhor que estava a observá-la e acrescentou: – E talvez o grandalhão e eu possamos falar durante os próximos minutos sem interrupções. Em privado.
Talvez captassem a indirecta, mas não se foram embora.
Muito bem. Trabalharia à frente deles.
Começou a mexer-se ao ritmo da música e, sem desviar o olhar de Lucien, passou os dedos pela barriga lisa. «Troca as minhas mãos pelas tuas», projectou para a sua mente.
É claro, Lucien não o fez. No entanto, os seus olhos seguiram cada um dos movimentos. Engoliu em seco.
– Dança comigo – disse ela em voz alta, com a esperança de que ele não a ignorasse com tanta facilidade daquela vez. Lambeu os lábios para os humedecer.
– Não – sussurrou ele.
– Por favor. Não me achas desejável, Flores?
– Esse não é o meu nome.
– Muito bem, querido. Não me achas desejável?
– Não importa o que penso de ti.
– Isso não responde à minha pergunta – disse ela, com uma careta.
– Não queria que respondesse.
Que homem tão frustrante. «Tenta outra coisa. Algo mais descarado.»
Como se não tivesse sido completamente descarada.
Muito bem. Virou-se e baixou-se. A saia subiu-lhe pelas coxas, oferecendo uma visão melhor da sua tanga azul e das asas que se estendiam do meio. Quando Anya voltou a levantar-se, imitando os movimentos do sexo, virou-se lentamente e ofereceu-lhe uma visão de todo o corpo.
Ele inspirou bruscamente, com todos os músculos do corpo tensos.
– Cheiras a morangos com natas – disse Lucien e, enquanto falava, parecia um predador prestes a atacar.
«Por favor, por favor, por favor», pensou ela.
– De certeza que também é o meu sabor – disse, pestanejando com sedução, apesar do facto de ele ter mencionado o seu cheiro como se fosse uma afronta terrível.
Lucien emitiu um gemido e deu um passo para ela.
Então, Anya aproveitou a oportunidade e trocou a música rock da discoteca por uma canção suave, lenta.
– Vá lá, dança comigo – pediu a Lucien. – É a única maneira de te livrares de mim.
E para o provocar um pouco, aproximou-se, pôs-se em bicos de pés e mordeu-lhe suavemente o lóbulo da orelha.
Ele voltou a resmungar, mas finalmente, rodeou-a com os seus braços. Ao princípio, Anya pensou que era para a empurrar, mas Lucien colou-a ao seu corpo e fez com que apertasse os seios contra o seu peito e que se sentasse sobre a sua coxa esquerda. Ela sentiu-se muito excitada.
– Se queres dançar, dançaremos.
Lentamente, ele balançou-a de um lado para o outro sem que os seus corpos se afastassem. Anya sentiu centenas de pontadas de prazer.
Pelos deuses do Céu, aquilo era melhor do que imaginara. Fechou os olhos. Lucien era muito grande. Tinha os ombros muito largos e a parte superior do corpo tão musculada que a envolvia. E durante o tempo todo, a sua respiração acariciava-lhe a face como um amante atento. Tremendo, ela deslizou as mãos pelas suas costas e passou-as pelo seu cabelo escuro, sedoso. Sim. Mais.
«Calma, rapariga», disse para si.
Embora Lucien a desejasse tanto como ela o desejava, não podia tê-lo. Não completamente. Naquele sentido, Anya estava tão amaldiçoada como ele. No entanto, de qualquer modo podia desfrutar daquele momento. Finalmente, ele estava a responder-lhe!
Lucien acariciou-lhe a linha do queixo com o nariz.
– Todos os homens te desejam – disse suavemente, embora as suas palavras fossem amargas. –Porquê eu?
– Porque sim – respondeu Anya, inalando o seu perfume a rosas.
– Isso não responde à minha pergunta.
– Não queria responder – replicou ela.
Então, Lucien agarrou-a com força.
– Parece-te divertido gozar com o homem mais feio deste lugar?
– O mais feio? – perguntou Anya. Ele atraía-a mais do que qualquer homem na sua vida. – Mas Paris nem chega aos teus pés, querido.
Lucien franziu o sobrolho e soltou-a. Abanou a cabeça, como se estivesse a tentar esclarecer as ideias.
– Sei o que sou – disse, com certa amargura. – Dizer que sou feio é ser amável.
Ela ficou imóvel, olhando para os seus olhos sedutores. Não sabia como era atraente? Irradiava força e vitalidade. Irradiava uma masculinidade selvagem. Tudo nele a cativava.
– Se sabes o que és, querido, então saberás que és sexy e deliciosamente ameaçador.
E ela precisava mais dele. Sentiu um calafrio que fez vibrar todos os seus membros. «Acaricia-me outra vez.»
– Suponho que as minhas cicatrizes não te incomodam – disse ele, sem mostrar nenhuma emoção.
– Incomodar? – aquelas cicatrizes não o tornavam feio. Tornavam-no irresistível. – Excitam-me.
– Mentirosa!
– Algumas vezes – admitiu ela, «mas não nisto.»
Anya observou a sua cara. O modo como fizera aquelas cicatrizes não devia ter sido agradável. Sofrera. Muito. De repente, essa ideia causou-lhe raiva. Quem o magoara e porquê? Uma amante ciumenta?
Parecia que alguém pegara numa faca e cortara Lucien como um melão e depois tentara juntar as peças sem ordem. Mesmo assim, a maioria dos imortais sarava rapidamente e não ficavam marcas das suas feridas. Assim, mesmo que o tivessem cortado, Lucien devia ter-se curado por completo.
Teria cicatrizes semelhantes no resto do corpo? Ao pensar nisso, sentiu-se muito excitada. Tinha-o espiado durante semanas, mas não conseguira ver o seu corpo. Ele conseguia sempre tomar banho e mudar de roupa depois de ela se ir embora.
Teria sentido a sua presença e decidido escon der-se?
– Se não te conhecesse, pensaria que és um engodo, como os meus amigos – disse ele.
– E porque pensas que me conheces?
Ele arqueou uma sobrancelha.
– És um engodo?
– Queres que seja? – perguntou ela, no tom mais sedutor que pôde. – Porque posso ser o que tu quiseres, amor.
– Pára com isso – resmungou ele. – Eu não gosto deste jogo que estás a jogar.
– Não estou a jogar, Flores. Juro-te.
– O que queres de mim? E não me mintas.
– Aceitarei um beijo – disse ela, olhando para os seus lábios suaves, rosados. – Na verdade, insisto que me dês um beijo.
– Não encontrei nenhum Caçador – disse Reyes, naquele momento. Aparecera, de repente, junto de Lucien.
– Isso não significa nada! – protestou Sabin.
– Não é caçadora e não trabalha para eles – disse Lucien, sem desviar o olhar de Anya enquanto fazia um gesto aos seus amigos para que se retirassem. –Preciso de estar um momento a sós com ela.
Aquela afirmação espantou Anya. E, além disso, queria estar com ela? Sim! Só que os seus amigos não se iam embora. Idiotas.
– Somos dois desconhecidos – disse Lucien, continuando a sua conversa como se não tivessem sido interrompidos.
– E então? Os desconhecidos podem relacionar-se – disse ela. – Beijar-se um pouco não tem nada de mal, pois não?
– E o que vais conseguir com um único beijo?
Tudo. Anya sentiu uma grande impaciência e passou a língua pelos lábios.
– És sempre tão falador?
– Não.
– Beija-a, Lucien, antes de eu