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O proeja no instituto federal de goiás
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O proeja no instituto federal de goiás

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About this ebook

"[...] como a gente vive numa sociedade capitalista, em que a realidade [de fato] a gente não vê, (...) vive na aparência, na irracionalidade, trazer a Educação de Jovens e Adultos para o Instituto é olhar de frente para o nosso país, e não dar as costas [...]". (Professora do PROEJA no Câmpus Goiânia).

"Eu achei muito interessante vocês falarem que os sujeitos da EJA (...) é negro, pobre; estão falando de mim. [...] Esse aluno que vocês estão discutindo é uma pessoa de verdade, é um trabalhador que sofre, sentado em sala de aula". (Aluna do PROEJA do IFG – Câmpus Goiânia 2).

"Recentemente eu aprendi a gostar de Machado de Assis, que eu odiava, porque eu não entendia ele, eu aprendi a gostar de Shakespeare. Pela primeira vez eu aprendi a gostar de Romeu e Julieta, que eu também não gostava. Recentemente eu pude ajudar a minha filha a fazer uma redação. O que é uma redação. E mais recentemente ainda eu ajudei ela a passar no vestibular da Universidade Federal. Agora ela está cursando Farmácia". (Aluna PROEJA do IFG – Câmpus Goiânia 2).

Abordando o processo de implantação e implementação do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), evidencia-se nessa obra os pressupostos estruturais e conjunturais do Estado e da Educação no Brasil, as especificidades sociais dos sujeitos da Educação de Jovens e Adultos e a inserção destes em uma instituição pública de reconhecida qualidade e que até há pouco tempo recebia fundamentalmente estudantes das classes médias. Buscando compreender as múltiplas determinações do processo de implantação e implementação do Proeja, em um estudo de caso, a autora procura ressaltar as contradições, os limites e as perspectivas da Educação Profissional Integrada à Educação de Jovens e Adultos no IFG e nos diversos espaços educativos onde foi/é ofertada.
LanguagePortuguês
Release dateJan 1, 2016
ISBN9788547300913
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    O proeja no instituto federal de goiás - Mad Ana Desiree Ribeiro de Castro

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição – Copyright© 2016 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIEDADE

    Vamos festejar a inveja

    A intolerância e a incompreensão

    Vamos festejar a violência

    E esquecer a nossa gente

    Que trabalhou honestamente a vida inteira

    E agora não tem direito a nada

    Vamos celebrar a aberração

    De toda a nossa falta de bom senso

    Nosso descaso por educação

    Vamos celebrar o horror

    De tudo isso. Com festa, velório e caixão

    Está tudo morto e enterrado agora

    Já que também podemos celebrar

    A estupidez de quem cantou esta canção.

    Venha, meu coração está com pressa

    Quando a esperança está dispersa

    Só a verdade me liberta

    Chega de maldade e ilusão

    Renato Russo

    Ao Fórum Goiano de Educação de Jovens e Adultos, espaço coletivo que tem se constituído como referência e apoio na construção do PROEJA no IFG.

    Aos sujeitos jovens e adultos trabalhadores do PROEJA, cuja trajetória nos impõe revelar a verdade da sociedade brasileira e nos indica que, como diz o poeta, chega de maldade e ilusão.

    Aos meus pais, Antônio e Irene (in memoriam), que sempre estavam com um livro ou um lápis na mão. Ler e escrever... conhecer o mundo, esta é a doce lembrança.

    AGRADECIMENTOS

    É impossível ser feliz sozinho...

    Tom Jobim

    Ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFG, pela seriedade e afetividade com que tem conduzido a formação de muitos.

    À professora Margarida, por ter me ajudado na construção desta pesquisa, por me acalmar em momentos de aflição e por sempre dizer que tudo vai dar certo. Espero que esta parceria continue, afinal, muitas lutas ainda estão por vir. Ela é uma daquelas pessoas imprescindíveis, como disse Brecht.

    Aos professores do PPGE, José Adelson, Anita Rezende, Ângela Mascarenhas e Marília Gouvêa, que muito me ensinaram nesta caminhada.

    Aos funcionários do PPGE, pelo apoio e prontidão.

    Aos colegas da pesquisa PROEJA-Capes/Setec: Sérgio, Luciana, Cínthia, Camila, Lênin, Ariadiny, Geovana, Maria Emília e a todos os que, ainda bem, estão chegando.

    Aos colegas do Fórum Goiano de EJA, pelo acolhimento e carinho com que me receberam. Estou voltando para casa...

    Aos professores Domingos Filho e Luiz Dourado, pelas contribuições nesta pesquisa. Os desafios foram postos... espero não ter desafinado tanto.

    À professora Miriam Fábia e ao professor Gaudêncio Frigotto, por terem aceitado generosamente ler este trabalho. São contribuições valiosas.

    Ao colega e amigo Walmir Barbosa, pelas boas e longas conversas sobre economia política, política econômica e história econômica. Seu apoio, paciência e prontidão me possibilitaram dialogar com uma área do conhecimento que me era pouco familiar.

    À Gilda Guimarães e Jacqueline Vitorette, colegas e amigas, com as quais tenho aprendido muito sobre as coisas da educação profissional e tecnológica e sobre as coisas da vida. Do lado delas, a ação política sempre fica menos árdua.

    À Kênia Bueno e Adolfo Mendes, professores do PROEJA do Câmpus Goiânia, que ajudaram a construir o projeto do curso e que continuam concretizando um sonho que sonhamos juntos, a minha admiração.

    Aos colegas e amigos David Maciel, Paulo Francinete, Karla Emmanuella, Rogério Mauro, Shirley-Mar, Cláudio Maia e Domício Moreira que me ajudaram com materiais importantes para pesquisa e com boas conversas sobre o trabalho.

    À Ana Cláudia Beze, Ana Maria Ferreira e Maria Dulce Machado, educadoras e amigas que compartilharam momentos de tristeza e de felicidade nesta caminhada, e que se constituíram em referência para continuar na estrada.

    À Gladys Vieira e Cicílio Moraes, humanamente profissionais, pelo apoio e ajuda necessários em tempos difíceis, que se tornaram tempos de aprendizagem e conhecimento sobre os meus limites e possibilidades.

    À Cândida Duarte e Vera Correa por cuidar de mim e de meus filhos neste longo período de trabalho.

    À Maria Inês Barbosa, por estar por perto e me acolher.

    Aos meus sobrinhos e sobrinhas, muitos, ainda bem, que me lembram que é possível construir gerações melhores.

    Aos meus irmãos e irmãs, Valderez, Benjamim, Benedito, Antônio Carlos e Maria da Conceição, pelo apoio em todas as horas e de todos os jeitos, com os quais sei que posso contar sempre.

    À minha irmã e madrinha Emerenciana, referência como pessoa e como cidadã, cuja dignidade sempre a fez se indignar com a injustiça social.

    Por fim, àqueles que cotidianamente têm ajudado a dar tom às afinações e desafinações do meu humor nestes longos anos de trabalho: Tião Cláudio, Maria Irene e Cláudio José. A eles, o meu amor incondicional.

    A vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida.

    Vinícius de Moraes

    Apresentação

    O presente texto de Mad`Ana Desirée Ribeiro de Castro aborda a política educacional brasileira para educação de jovens e adultos e investiga especificamente o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), ação desenvolvida, a partir de 2006, pelo Ministério da Educação. Destaca-se a importância do PROEJA em âmbito nacional e especialmente a perspectiva apontada de integração da educação básica, nos níveis fundamentais e médio, com a educação profissional. Nesse contexto, aos Institutos Federais, instituições criadas a partir da transformação dos Centros Federais de Educação Profissional e Tecnológica (CEFETs) ocorrida em 2008, é dada a tarefa da oferta destes níveis e modalidades educacionais, inclusive conforme prescrito pela legislação que regulamenta a criação destas instituições.

    Trata-se, portanto, de um tema de destacada pertinência e relevância na pesquisa e debate educacional brasileiro da atualidade. Observados os deficit educacionais e a exclusão social que caracterizam estruturalmente e historicamente a sociedade brasileira, a educação de jovens e adultos, a elevação de escolaridade geral dos trabalhadores e a educação profissional configuram-se como problemática central do país e as políticas ou programas educacionais que têm por objeto essa temática, como é o caso do PROEJA, ganham maior destaque. A cada dissertação, tese e pesquisa que se conclui, vamos tomando maior conhecimento da complexidade do objeto, dos desafios a enfrentar e dos limites e possibilidades oferecidos pelas políticas e instituições. É conveniente destacar que dado o caráter complexo do estudo das reformas educacionais e dos múltiplos e diferenciados processos que se estabelecem entre a enunciação das reformas, sua regulação em forma de lei, a aplicação da lei em programas governamentais e, finalmente, a sua implementação na situação particular de cada instituição educacional ensejam diferentes processos que podem envolver segundo cada caso específico, singulares mediações, adesões, resistências, negociações entre os diferentes sujeitos sociais/institucionais que atuam no âmbito local, regional e nacional.

    Nesse sentido, o texto ora apresentado traz destacada contribuição, posto que resultante do aprofundamento característico de estudo de caso, permite a identificação de elementos próprios que têm a potencialidade de fazer crescer a reflexão, compreensão teórico-prática e, enfim, a produção do conhecimento sobre o objeto específico e geral em estudo. Ainda mais, neste tema particular da integração da educação básica com a educação profissional na modalidade EJA, cuja definição/redefinição e configuração/reconfiguração de novas institucionalidades segue curso de reiteradas políticas desde o início dos anos 1990, até o momento presente, permeado por outras ações e programas que se inter-relacionam com a temática em foco, como por exemplo, a implementação das recentes diretrizes nacionais para o ensino médio e das diretrizes nacionais para a educação profissional, o Programa Nacional de Acesso à Educação Profissional e ao Emprego e as discussões em curso sobre a reforma do ensino médio e sobre a definição da chamada base curricular nacional comum para a educação básica. Dessa forma, a consideração desses aspectos configura elementos de atualidade e destaque ao texto, evidenciando sua potencialidade de contribuição ao debate de questões educacionais em disputa na sociedade brasileira e ainda indefinidas neste mesmo processo.

    A implementação do PROEJA demarca-se em um contexto social no qual se proclama a intencionalidade do Estado de conduzir políticas educacionais que tragam em seus pressupostos e proposições o compromisso com a reversão de quadros de exclusão social e educacional, como é o caso demandado por políticas de elevação da escolaridade e da formação profissional de jovens e adultos trabalhadores. Nesse sentido, é fundamental o conhecimento aprofundado das condições concretas enfrentadas no processo educacional, o que implica conhecer e considerar, na concepção e execução da política pública, as condições concretas vivenciadas pelas escolas e instituições da educação básica e profissional e pelos sujeitos educadores e educandos que nelas atuam. Entretanto, em que pese considerar tais elementos internos e específicos, uma característica e, a nosso ver, qualidade marcante do texto de Mad’Ana é que a perspectiva que acompanha a investigação conduzida pela autora e o texto aqui apresentado é o rigor analítico de observar simultaneamente que as políticas públicas da EJA e da educação profissional não podem ser consideradas isoladamente das demais políticas sociais, posto que sua natureza e a possível análise e superação de sua problemática não podem se concretizar somente no âmbito interno da educação e das instituições educacionais e tampouco constituem questões meramente conjunturais ou residuais na sociedade brasileira. Ao contrário, é problemática pertinente à configuração estrutural e histórica do modelo societário brasileiro e, portanto, a sua completa – e complexa apreensão – e enfrentamento necessitam localizar-se em um projeto de nação que tenha como referência a perspectiva democrática e popular de justiça e igualdade social. Assim, dirigindo imediatamente seu olhar para a análise do PROEJA no Instituto Federal de Goiás, a autora mediatamente localiza tal movimento em um contexto conjuntural e estrutural mais amplo, caracterizando seu percurso teórico-metodológico investigativo e expositivo pela perspectiva de relacionar a análise microssocial com a análise macrossocial, na consideração da dinâmica processual e indissociável da relação parte e totalidade.

    Outra característica marcante do texto é seu caráter instigante: as reflexões apresentadas por Mad’Ana são marcadas pela razão, mas também pela emoção: estamos frente a um texto que nos inquieta; antes que explicações acabadas, descreve movimentos; antes que conclusões ou respostas definitivas, preocupa-se com a apreensão dos processos e nisso vai descortinando o cenário, suscitando perguntas sobre os seus sujeitos; e tudo isso com o rigor da pesquisadora que exige a observação acurada do objeto, dos movimentos e sujeitos que dão materialidade a pesquisa, da singularidade do cenário investigado e de sua contextualização e relação com o todo. Ao passo que vai fazendo a interlocução com a produção científica da área, a autora insere-se no confronto de posições, problematiza, polemiza e desafia-se na busca de sínteses.

    É um texto que nos inquieta também pela centralidade do conteúdo/objeto/processo que está em discussão: trata-se de verificar as possibilidades e limites do PROEJA, ou seja, inquirir se efetivamente estamos ante uma ação pública (programa ou política) que tem a potencialidade de suprir o direito a educação básica negada historicamente a milhões de brasileiros (segundo Margarida Machado, 101 milhões dos 135 milhões de brasileiros acima de 18 anos não concluíram o ensino médio; apesar de 85% dos jovens de 15 a 17 anos estarem na escola, somente 50% estão no ensino médio); igualmente, trata-se de interrogar se a rede federal de educação profissional e tecnológica pode, e em que condições, constituir-se um lócus privilegiado em que esta potencialidade se realize em plenitude, ou do contrário, seja interditada, e mais especificamente, como a instituição investigada – o IFG, Câmpus Goiânia – vive este processo.

    O texto de Mad’Ana remete à sensibilidade que nos inquieta já desde a epígrafe, quando a autora traz a música de Renato Russo e nos desafia a pensar sobre o compromisso social do Estado brasileiro, dos governos, das instituições educacionais públicas e, enfim, dos seus sujeitos – gestores, professores, técnicos administrativos e estudantes – com estes milhões de brasileiros que não concluíram sua educação básica: é de se perguntar se, como diz a música, vai-se continuar a [...] esquecer a nossa gente que trabalhou honestamente a vida inteira e agora não tem direito a nada? Será que vai continuar o nosso descaso pela educação em relação ao sujeitos de direito? Ou será que, com o PROEJA e outros programas/políticas iniciamos a dizer um chega de maldade e ilusão? Maldades históricas, sucessivas, que não têm sua raiz na individualidade, pontualidade de um governo, um programa, uma instituição, um gestor, mas que são maldades estruturais de um modelo de sociedade que exclui os trabalhadores e que, muitas vezes, em movimentos mais aparentes que reais, promovem a ilusão de incluí-los? Tem razão Renato Russo, citado por Mad`Ana, quando diz chega de maldade e ilusão. Como têm razão os trabalhadores, quando pela canção de Arnaldo Antunes, dizem que a gente não quer só comida, [...] a gente quer inteiro não pela metade. Ou, da mesma forma, têm razão os que pela canção de Gonzaguinha lembram que a gente quer viver pleno direito e por isso a gente quer do bom e do melhor. Isso tudo nos remete ao depoimento, trazido por Mad’Ana, da jovem pobre e humilde, trabalhadora, agora estudante do PROEJA, que relembra de quando passava pela frente da Escola Técnica/CEFET/IFG e sonhava em um dia poder ali entrar. Terá o PROEJA potencialidade/capacidade para aproximar este sonho da realidade, em um passo do chega de maldade, ou será desfigurado em mais uma ilusão, promessa irrealizada de cumprir direitos historicamente interditados e negados?

    O texto nos envolve neste movimento tensionado e entre luzes e sombras, entre promessas e obstáculos emerge a disputa entre sujeitos em busca de superação das sujeições e o movimento contrário das tradições constituídas que buscam mantê-los objetificados. Revelam-se, na análise da implementação do PROEJA, sujeitos em ação nos mostrando as pequenas e valorosas conquistas e as promissoras esperanças, ao mesmo tempo em que nos mostram as muitas interdições, visíveis, palpáveis, sentidas, nos depoimentos dos alunos e professores do PROEJA e dos gestores da instituição. No cenário desses embates a realidade se descortina e se (re)configuram possibilidades de transformação ou de (con)formação nos mostrando, na imbricação que a autora faz do empírico com o teórico, a centralidade do trabalho, da tecnologia e, enfim, da educação profissional e tecnológica, uma centralidade contraditória, pois nela se confrontam interesses de classes distintas, interesses do trabalho e interesses do capital. Enfim, momentos de luta, resistências e conquistas, que nos fazem lembrar o quanto a educação é estratégica e fundamental para a construção de um projeto social contra-hegemônico, efetivamente democrático, civilizador, humano (Gramsci, 1978). Por outro lado, movimentos processuais e contraditórios, cuja análise nos remete à profunda reflexão de Marcuse, em texto escrito em 1951, quando ao discutir as implicações sociais da tecnologia moderna destacava que a tecnologia e os artefatos técnicos como produção social e histórica podem constituir, ao mesmo tempo, obstáculos e potencialidades ao pleno desenvolvimento do ser social: por um lado, sistemas de dominação, por outro, possibilidades de fruição, podendo "promover tanto o autoritarismo quanto a liberdade, tanto a escassez quanto a abundância, tanto o aumento quanto a abolição do trabalho árduo (Marcuse, 1999, p. 74).

    Aos leitores destes instigantes e densos relatos e falas e da rigorosa análise realizada pela autora ficam-nos também a forte impressão de que a entrada nos Institutos Federais desses sujeitos jovens e adultos das classes populares, de trajetórias descontínuas e obstacularizadas da educação e do trabalho desacomoda o status quo ali vivido; enfim, percebe-se que a chegada destes novos sujeitos para dentro dessas escolas de excelência que são os institutos federais, revolve as entranhas dessas instituições e as convulsiona. Pode ser que, em um primeiro momento só potencialmente, mas os jovens e adultos trabalhadores que com o PROEJA entram ou podem entrar, ou do contrário, que seguem sendo barrados (e até quando?) na porta de acesso da instituição, as coloca a si mesmas, estas instituições, frente a um espelho a mirar-se e perguntar-se: quem e como sou eu instituição pública que não vejo o meu público? O que vejo, a quem vejo, a que me dedico? É certo que o PROEJA não inaugura essas indagações e debates sobre a identidade dessa rede de instituições de qualidade social referenciada; é certo que é um debate mais antigo, como também é certo que o PROEJA potencializa este debate em qualidade, quantidade, amplitude e frequência. Ali, no interior das instituições, trava-se uma disputa interna densa, muitas vezes invisível à primeira vista, mas perceptível, quando se mergulha no cotidiano dessas instituições, experiência que nos proporciona o texto de Mad’Ana. A análise da experiência do PROEJA têm a rica capacidade de retirar este debate intramuros e levá-lo a amplos setores da sociedade, e nisso podemos apostar positivamente, pois justo aí reside uma das grandes contribuições a extrair deste texto. Enfim, perguntas, tais como: qual o papel social dos IFs? Qual a sua relação com a educação básica e os desafios a enfrentar pela nação brasileira na perspectiva de universalização desse direito? Quais as metas e prioridades para o curto, médio e longo prazo na ação dessas instituições? Sua gestão é democrática ou autocrática? Como e em que medida? O instituto acolhe e é permeável a quem, a que classes sociais? Aos trabalhadores? Às classes médias? Às elites? Aos movimentos sociais? Ao empresariado? Como se constroem as relações internas e as hierarquias dentro dos institutos e entre os sujeitos estudantes, técnicos-administrativos, professores e gestores? Que valor social/institucional tem cada um de seus cursos? Por exemplo, que valor tem o professor que atua no PROEJA e o que atua na pós-graduação? Como ficam os profissionais que atuam na educação básica (lembrando a cota a cumprir de 50%) das vagas, sabendo-se da escassez de recursos para fazer pesquisas neste nível educacional?

    Pelas questões que o texto desnuda e pelas inquietações que provoca quero dizer que vale muito a pena ganhar horas lendo este livro. A autora, em seu percurso teórico-metodológico rigoroso produz a reconstituição temporal e conceitual do objeto e das múltiplas determinações que envolvem sujeitos e condições materiais do contexto e da trama que medeiam a concepção, implantação e implementação do PROEJA, na educação brasileira e, de modo particular, na rede federal de educação profissional e tecnológica, tomando o caso do IFG como palco das observações e discussões. Dessa forma, a análise criteriosa e estruturada do PROEJA aqui realizada contribui com o avanço teórico-metodológico da produção do conhecimento nas temáticas da educação de jovens e adultos, da educação profissional e das relações que envolvem.

    Identifico, para concluir, no posicionamento crítico da autora, um convite a lutar por uma causa, pois o PROEJA é um Programa tensionador, contraditório e em disputa. Os rumos da sua afirmação (ou não) dependerão da luta política e da força social dos projetos colocados para o Brasil. Que a leitura do texto e o convite formulado por Mad’Ana para o conhecimento dessa complexa problemática sensibilize o leitor para o engajamento na ação transformadora, tanto no plano epistemológico, pela contribuição à identificação dos obstáculos que se apresentam à plena realização do direito da educação básica e formação profissional e tecnológica de jovens e adultos trabalhadores, quanto no plano social e político, pelo incentivo à participação na luta coletiva pela garantia dos direitos à cidadania, à educação e ao trabalho de qualidade socialmente referenciados.

    Curitiba, verão/2016

    Domingos Leite Lima Filho

    Professor do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia e Sociedade

    Universidade Tecnológica Federal do Paraná

    Prefácio

    [...] Se se quiser criar uma nova camada de intelectuais,

    chegando às mais altas especializações, a partir de

    um grupo social que tradicionalmente não desenvolveu

    as aptidões adequadas, será preciso superar enormes dificuldades.

    […] O problema da criação de uma nova camada intelectual,

    portanto, consiste em elaborar criticamente a atividade intelectual

    que cada um possui e determinado grau de desenvolvimento,

    modificando sua relação com o esforço muscular-nervoso

    no sentido de um novo equilíbrio e fazendo com que

    o próprio esforço muscular-nervoso, enquanto elemento

    de uma atividade prática geral, que inova perpetuamente

    o mundo físico e social, torne-se o fundamento

    de uma nova e integral concepção do mundo.

    (Gramsci)

    Iniciar este prefácio com as reflexões de Gramsci sobre que novos intelectuais deve a escola se preocupar em formar tem a intenção de demarcar, inicialmente, que o tema deste livro está em sintonia com uma concepção de escola para trabalhadores que vai muito além da visão de treinamento e conformação, muitas vezes presente em iniciativas de formação profissional. Os ideais de uma escola unitária, que concebe a formação humana na indissociabilidade entre a teoria e a prática, o intelectual e o manual, o pensar e o fazer, estão intrinsecamente relacionados à concepção de educação do PROEJA, ou seja, do Programa Nacional de Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

    O que é este programa? Como ele foi concebido? A quem interessa um programa com essa concepção? Como essa proposta de educação profissional integrada à educação de jovens e adultos chega a instituições centenárias, como as escolas federais de educação profissional do Brasil e como a mesma é recebida? Como sobrevive uma proposta de escola unitária em uma instituição que não tem por cultura dedicar-se a formação dos trabalhadores pobres do país?

    Claro que não vamos esperar que Mad´Ana responda a todas essas questões neste livro. Porém, seu esforço de pesquisa, em quatro anos, a fez debruçar-se sobre a implantação e implementação do PROEJA na instituição: Instituto Federal de Educação Profissional e Tecnológico de Goiás (IFG), onde atua como professora desde 1995; como gestora desde 2001, na coordenação da área de Turismo e Hospitalidade; e, mais recentemente, como Diretora do Câmpus Goiânia Oeste, uma nova unidade do IFG que foi aberta na cidade de Goiânia em 2014.

    Apesar de todas as dificuldades que encontrarão no relato da autora sobre a experiência ocorrida no IFG, com o Curso Técnico em Serviços de Alimentação, que foi o primeiro curso de PROEJA ali implantado, é inegável a mudança provocada nesta instituição, pela chegada dos trabalhadores pobres e excluídos do sistema escolar. O PROEJA segue com oferta de curso técnico integrado noturno, em Goiânia e Jataí/GO, que resiste dentro da instituição até que o novo Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) – 2012/2016 aprove como sua Meta de número 5: ampliação da oferta de cursos do PROEJA, com implementação em todos os departamentos dos Câmpus da Instituição até o primeiro semestre do ano letivo de 2013 (IFG, 2013, p.13). Assim tem-se no Câmpus Goiânia: Cozinha, Informática e Transporte Rodoviário; Câmpus Itumbiara: Agroindústria; Câmpus Uruaçu: Comércio e Manutenção e Suporte em Informática; Câmpus Cidade de Goiás: Conservação e Restauro e Artesanato; Câmpus Jataí; Edificações e Secretariado; Câmpus Inhumas: Panificação e Manutenção e Suporte em Informática; Câmpus Formosa: Manutenção e Suporte em Informática; Câmpus Luziânia: Manutenção e Suporte em Informática; Câmpus Aparecida de Goiânia: Panificação e Técnico em Modelagem do Vestuário; Câmpus Anápolis: Secretaria Escolar e Transporte de Carga; Câmpus Águas Lindas: Enfermagem; Câmpus Goiânia Oeste: Enfermagem; Câmpus Senador Canedo: Refrigeração e Climatização e no Câmpus de Valparaíso: Eletrotécnica.

    Tudo isto é preciso ser dito, não apenas a partir do texto que vão conhecer agora, mas porque, como disse Gramsci: "[…] Se se quiser criar uma nova camada de intelectuais, chegando às mais altas especializações, a partir de um grupo social que tradicionalmente não desenvolveu as aptidões adequadas, será

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