Interjeição: Um Fator de Identidade Cultural do Brasileiro
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Obra sobre o ensino das interjeições do Português do Brasil para estrangeiros.
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Book preview
Interjeição - Adriana Rebello
FINAL
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
1. OI! VEJA, A SEGUIR, O BREVE HISTÓRICO
Nosso interesse em tratar das interjeições e sua relação com a cultura brasileira surgiu da própria prática do ensino do português para estrangeiros e da nossa experiência como falante não nativa de línguas estrangeiras.
No contato com os alunos de outras nacionalidades, percebemos que eles não tinham a noção do uso adequado das interjeições, de forma que, em muitas situações, por não saberem selecionar os elementos interjetivos adequados, comunicavam-se de forma indevida. Em uma ocasião, quando nos dirigíamos a uma determinada sala de uma empresa onde ministrávamos aulas de português, uma empresária inglesa nos pareceu indelicada à primeira vista, alertando: "Ei! Professora! O caminho é por aqui!". Nesse momento, a aluna estrangeira advertia que não era o local onde deveríamos entrar e a interjeição utilizada imprimiu um tom ameaçador ao chamamento.
Por outro lado, através do contato com falantes nativos dessas línguas, notamos que certas interjeições que utilizávamos em português, muitas vezes, não eram compreendidas por nossos interlocutores. O mesmo ocorria quando mantínhamos conversações em espanhol ou em inglês, ou seja, os falantes nativos utilizavam interjeições cujo valor não nos parecia claro (¡Asu!, ¡Chispas!, em Espanhol; Whew!, Yikes!, em Inglês) e não sabíamos se expressavam aprovação ou discordância em relação ao que dizíamos.
Constatamos, então, que as interjeições são elementos importantes para a comunicação e, consequentemente, para o ensino da língua portuguesa para estrangeiros, uma vez que diferem de língua para língua, revelando peculiaridades da cultura dos falantes de uma comunidade.
2. POR QUE ESTUDAR AS INTERJEIÇÕES, ORA BOLAS!?
Entendemos, então, que os elementos interjetivos revelam aspectos da cultura de um indivíduo ou grupo de indivíduos – suas crenças, costumes e ideias. Visto que há uma enorme diversidade de culturas, consequentemente os indivíduos irão se expressar através de distintos sistemas interjetivos: todos os indivíduos possuem emoções, desejos, ideias; a forma de expressá-los, no entanto, não é a mesma. Por exemplo, algumas culturas valorizam a expressão das emoções, outras não; em determinadas localidades, os falantes de uma língua se expressam de forma mais direta, em outras, de maneira mais indireta.
Geralmente, as gramáticas e manuais didáticos não disponibilizam informações sobre como e quando usar esta ou aquela interjeição; logo, memorizar uma lista de elementos interjetivos, simplesmente, não capacita o aprendiz de um idioma a usá-los de forma adequada e competente. Diante das interjeições Cruz credo! e Ué!, o aluno estrangeiro seguramente hesitaria em escolher o melhor elemento para manifestar surpresa ou poderia decidir-se por uma forma inadequada. Sua escolha indevida poderia levá-lo a cometer uma indelicadeza, caso quisesse expressar impaciência através da interjeição Pô!.
Diante desse problema, fazemos o seguinte questionamento: a que meios o aprendiz do português como segunda língua ou como língua estrangeira tem acesso, sem a orientação de um professor e/ou fora de um contexto de imersão prolongada em um ambiente de fala portuguesa, para que saiba em que situações as interjeições são utilizadas de maneira apropriada?
3. UAU! AS DIFERENTES ABORDAGENS DO TEMA POR GRAMÁTICAS E MANUAIS DE ENSINO DO PORTUGUÊS L2
Analisamos obras que se dedicam ao estudo descritivo do português tanto como primeira quanto como segunda língua, a fim de avaliarmos de que forma são abordadas as interjeições.
As gramáticas da Tradição não se dedicam de maneira exaustiva ao seu estudo, visto que se limitam a definir o termo e a apresentar listas de interjeições mais comuns na língua. Consultamos as obras dos autores como Celso Cunha e Lindley Cintra (1985), Celso Cunha (1986), Evanildo Bechara (1999) e Rocha Lima (1987).
Na concepção de Rocha Lima (1987, p. 165), a interjeição é a palavra que exprime emoção
. O autor também afirma que as interjeições são elementos afetivos
, que podem valer por uma frase inteira e que têm seu sentido alterado de acordo com a entoação através da qual são proferidas. A seguir, Rocha Lima apresenta uma lista de interjeições classificadas com base no sentimento que exprimem.
Para Evanildo Bechara (1999, p. 330), a interjeição é a expressão com que traduzimos os nossos estados emotivos
. A definição de locução interjetiva também é mencionada pelo autor: locução interjetiva é um grupo de palavras com valor de interjeição
(Ibidem, p. 332). Ressalta que o tom de voz – seja ascendente ou descendente – com que proferimos as interjeições determina a circunstância do nosso estado emotivo. Acrescenta dados a respeito da pontuação de frases que apresentem interjeições, como também fornece uma listagem dos seus principais tipos, em relação às emoções que expressam.
Celso Cunha define interjeição como uma espécie de grito com que traduzimos de modo vivo nossas emoções
(Cunha, 1986, p. 312). Destaca que tanto uma mesma emoção pode ser expressa por mais de uma interjeição, como uma mesma interjeição pode ser usada para exteriorizar estados emotivos distintos. O autor vincula o valor da interjeição a elementos como o contexto e a entoação. As locuções interjetivas também são mencionadas pelo autor, que as define como um grupo de duas ou mais palavras cuja função é a mesma exercida pela interjeição. Entre os três autores observados, Celso Cunha é o único que comenta o fato de a interjeição não poder ser incluída entre as classes de palavras por equivaler a um vocábulo-frase
(Ibidem, p. 312).
Analisamos também algumas gramáticas da língua portuguesa como segunda língua e constatamos que nenhuma delas apresenta alguma seção em especial dedicada ao estudo das interjeições. Ressaltamos, no entanto, que em Hutchinson e Lloyd (1996), encontra-se uma seção intitulada "Language Functions", na qual as autoras apresentam uma breve explicação e exposição de exemplos em forma de diálogos, sobre formas, em Português, de socialização (cumprimentos, congratulações, apresentações, etc.); de julgamento e avaliação (admiração, desaprovação, surpresa, etc.), entre outras.
Nesta parte de sua obra, as autoras destacam algumas interjeições, como Pst!, Viva!, Cuidado!, Nem pensar!, Meu Deus!, Minha Nossa Senhora!, Oxalá!, Deus nos livre!, Quem dera!; no entanto, com exceção do elemento de chamamento Pst!, não fazem nenhuma observação no que diz respeito aos aspectos culturais relacionados a tais termos. Portanto, de uma maneira geral, o leitor não tem a sua disposição informações sobre a adequação do uso de tais elementos interjetivos, no que se refere à cultura brasileira e suas peculiaridades. Os autores consultados foram Prista (1966), Rodrigues (1992), Thomas (1974), Williams (1976) e Hutchinson e Lloyd (1996).
Os materiais didáticos de Português para estrangeiros, de forma geral, apresentam diálogos elaborados pelos autores e/ou textos literários que contêm interjeições, mas nenhum estudo sobre esses elementos é feito. Os autores analisados foram Laroca, Bara e Pereira (1992), Laroca,