Meios sem fim: Notas sobre a política
By Giorgio Agamben and Davi Pessoa
4/5
()
About this ebook
Read more from Giorgio Agamben
O homem sem conteúdo Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsA aventura Rating: 5 out of 5 stars5/5O tempo que resta: Um comentário à Carta aos Romanos Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsIdeia da prosa Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsA loucura de Hölderlin Rating: 0 out of 5 stars0 ratings
Related to Meios sem fim
Related ebooks
Antropologia do Ciborgue: As vertigens do pós-humano Rating: 5 out of 5 stars5/5Ensaios do assombro Rating: 5 out of 5 stars5/5A sociedade contra o Estado Rating: 5 out of 5 stars5/5Pela supressão dos partidos políticos Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsGiorgio Agamben: a Condição da Vida Humana no Estado de Exceção Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsTrês utopias contemporâneas Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsEspectros da Ditadura: da Comissão da Verdade ao bolsonarismo Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsPara além da biopolítica Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsGovernar os mortos: Necropolíticas, desaparecimento e subjetividade Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsJúbilo ou os tormentos do discurso religioso Rating: 3 out of 5 stars3/5O anjo da história Rating: 5 out of 5 stars5/5Esperando Foucault, ainda Rating: 5 out of 5 stars5/5O império do sentido: A humanização das ciências humanas Rating: 5 out of 5 stars5/5A sociedade ingovernável: Uma genealogia do liberalismo autoritário Rating: 5 out of 5 stars5/5Diante de Gaia: Oito conferências sobre a natureza no Antropoceno Rating: 5 out of 5 stars5/5Conformismo e resistência: Escritos de Marilena Chaui, vol. 4 Rating: 5 out of 5 stars5/5Quando a casa queima Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsO zelo de Deus: Sobre a luta dos três monoteísmos Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsDar corpo ao impossível: O sentido da dialética a partir de Theodor Adorno Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsO circuito dos afetos: Corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo Rating: 4 out of 5 stars4/5Metafísicas canibais: Elementos para uma antropologia pós-estrutural Rating: 5 out of 5 stars5/5Walter Benjamin: os cacos da história Rating: 5 out of 5 stars5/5Walter Benjamin: Experiência histórica e imagens dialéticas Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsVozes do fronte: Considerações sobre o irromper da covid-19 na Itália Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsDeleuze-Guattari e a ressonância mútua entre filosofia e política Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsIntrodução a Giorgio Agamben: Uma arqueologia da potência Rating: 0 out of 5 stars0 ratingsA experiência interior: Seguida de Método de meditação e Postscriptum 1953 Rating: 5 out of 5 stars5/5Linguagem, tradução, literatura: Filosofia, teoria e crítica Rating: 5 out of 5 stars5/5
Philosophy For You
Política: Para não ser idiota Rating: 4 out of 5 stars4/5Tudo Depende de Como Você Vê: É no olhar que tudo começa Rating: 5 out of 5 stars5/5São Cipriano - O Livro Da Capa De Aço Rating: 5 out of 5 stars5/5A história da filosofia para quem tem pressa: Dos pré-socráticos aos tempos modernos em 200 páginas! Rating: 5 out of 5 stars5/5Sobre a brevidade da vida Rating: 4 out of 5 stars4/5Aprendendo a Viver Rating: 4 out of 5 stars4/5O Livro Proibido Dos Bruxos Rating: 3 out of 5 stars3/5Aristóteles: Retórica Rating: 4 out of 5 stars4/5Viver, a que se destina? Rating: 4 out of 5 stars4/5Poder & Manipulação: Como entender o mundo em vinte lições extraídas de "O Príncipe", de Maquiavel Rating: 5 out of 5 stars5/5O Príncipe: Texto Integral Rating: 4 out of 5 stars4/5Minutos de Sabedoria Rating: 5 out of 5 stars5/5Entre a ordem e o caos: compreendendo Jordan Peterson Rating: 5 out of 5 stars5/5A ARTE DE TER RAZÃO: 38 Estratégias para vencer qualquer debate Rating: 5 out of 5 stars5/5Em Busca Da Tranquilidade Interior Rating: 5 out of 5 stars5/5PLATÃO: O Mito da Caverna Rating: 5 out of 5 stars5/5A lógica e a inteligência da vida: Reflexões filosóficas para começar bem o seu dia Rating: 5 out of 5 stars5/5Além do Bem e do Mal Rating: 5 out of 5 stars5/5A voz do silêncio Rating: 5 out of 5 stars5/5Ética e vergonha na cara! Rating: 5 out of 5 stars5/5Tesão de viver: Sobre alegria, esperança & morte Rating: 4 out of 5 stars4/5Shinsetsu: O poder da gentileza Rating: 5 out of 5 stars5/5Schopenhauer, seus provérbios e pensamentos Rating: 5 out of 5 stars5/5Assim Falava Zaratustra Rating: 5 out of 5 stars5/5Você é ansioso? Rating: 4 out of 5 stars4/5Disciplina: Auto Disciplina, Confiança, Autoestima e Desenvolvimento Pessoal Rating: 5 out of 5 stars5/5Platão: A República Rating: 4 out of 5 stars4/5A Arte de Escrever Rating: 4 out of 5 stars4/5
Reviews for Meios sem fim
14 ratings0 reviews
Book preview
Meios sem fim - Giorgio Agamben
Giorgio Agamben
Meios sem fim:
notas sobre a política
Tradução
Davi Pessoa
Revisão da tradução
Cláudio Oliveira
Outros livros da
A teoria dos incorporais no estoicismo antigo
Émile Bréhier
A sabedoria trágica
Sobre o bom uso de Nietzsche
Michel Onfray
A comunidade que vem
Giorgio Agamben
O homem sem conteúdo
Giorgio Agamben
Ideia da prosa
Giorgio Agamben
Introdução a Giorgio Agamben
Uma arqueologia da potência
Edgardo Castro
Nudez
Giorgio Agamben
A potência do pensamento
Ensaios e conferências
Giorgio Agamben
O erotismo
Georges Bataille
A parte maldita
Precedida de A noção de dispêndio
Georges Bataille
O anjo da história
Walter Benjamin
Imagens de pensamento
Sobre o haxixe e outras drogas
Walter Benjamin
Origem do drama trágico alemão
Walter Benjamin
Rua de mão única
Infância berlinense: 1900
Walter Benjamin
Breve tratado de Deus, do homem e do seu bem-estar
Espinosa
A unidade do corpo e da mente
Afetos, ações e paixões em Espinosa
Chantal Jaquet
O belo autônomo
Textos clássicos de estética
Rodrigo Duarte (org.)
O descredenciamento filosófico da arte
Arthur C. Danto
Do sublime ao trágico
Friedrich Schiller
Íon
Platão
O amor impiedoso
(ou: Sobre a crença)
Slavoj Žižek
Estilo e verdade em Jacques Lacan
Gilson Iannini
Introdução a Foucault
Edgardo Castro
Kafka
Por uma literatura menor
Gilles Deleuze
Félix Guattari
Lacan, o escrito, a imagem
Jacques Aubert, François Cheng, Jean-Claude Milner, François Regnault, Gérard Wajcman
O sofrimento de Deus
Inversões do Apocalipse
Slavoj Žižek
Boris Gunjevic
A Razão
Pascal Quignard
Guy Debord, in memoriam
Advertência
Os textos aqui recolhidos tentam, cada um a seu modo, pensar determinados problemas da política. Se a política parece, hoje, atravessar um eclipse permanente, no qual se apresenta em posição subalterna em relação à religião, à economia e até mesmo ao direito, isso é porque, na medida em que perdia consciência de seu estatuto ontológico, ela deixou de se confrontar com as transformações que progressivamente esvaziaram de dentro suas categorias e conceitos. Assim, acontece que, nas páginas que se seguem, paradigmas genuinamente políticos são procurados em experiências e fenômenos que habitualmente não são considerados políticos (ou o são de modo unicamente marginal): a vida natural dos homens (a zoé, por muito tempo excluída do âmbito propriamente político) restituída, segundo o diagnóstico da biopolítica foucaultiana, ao centro da polis; o estado de exceção (suspensão temporária do ordenamento, que revela, ao contrário, constituir a sua estrutura fundamental em todos os sentidos); o campo de concentração (zona de indiferença entre público e privado e, ao mesmo tempo, matriz escondida do espaço político em que vivemos); o refugiado, que, rompendo o nexo entre homem e cidadão, deixa de ser uma figura marginal para se tornar um fator decisivo da crise do Estado-nação moderno; a linguagem, objeto de uma hipertrofia e, juntamente, de uma expropriação, que definem a política das sociedades democrático-espetaculares nas quais vivemos; a esfera dos meios puros ou dos gestos (isto é, dos meios que, mesmo que permaneçam como meios, emancipam-se de sua relação com um fim) como esfera especial da política.
Os textos aqui reunidos se referem todos, de vários modos e segundo as ocasiões das quais nascem, a um espaço de trabalho ainda aberto (cujo primeiro fruto é o volume einaudiano Homo sacer,¹ Turim, 1995), do qual antecipam, às vezes, os núcleos originais e, outras vezes, apresentam estilhaços e fragmentos. Como tais, eles são destinados a encontrar seu verdadeiro sentido apenas na perspectiva do trabalho concluído, que é o de repensar todas as categorias da nossa tradição política à luz da relação entre poder soberano e vida nua.
1 Referência à editora Einaudi, que publicou na Itália o primeiro volume de Homo Sacer, O poder soberano e a vida nua. (N.T.)
Forma-de-vida
1. Os gregos não tinham um termo único para exprimir o que entendemos pela palavra vida. Serviam-se de dois termos semântica e morfologicamente distintos: zoé, que manifestava o simples fato de viver, comum a todos os viventes (animais, homens ou deuses), e bios, que significava a forma ou maneira de viver própria de um indivíduo ou de um grupo. Nas línguas modernas, em que essa oposição desaparece gradualmente do léxico (onde é conservada, como em biologia e zoologia, ela não indica mais nenhuma diferença substancial), um único termo – cuja opacidade cresce proporcionalmente à sacralização de seu referente – designa o nu pressuposto comum que é sempre possível isolar em cada uma das inumeráveis formas de vida.
Com o termo forma-de-vida entendemos, ao contrário, uma vida que jamais pode ser separada da sua forma, uma vida na qual jamais é possível isolar alguma coisa como uma vida nua.
2. Uma vida, que não pode ser separada da sua forma, é uma vida para a qual, no seu modo de viver, está em jogo o próprio viver e, no seu viver, está em jogo antes de tudo o seu modo de viver. O que significa essa expressão? Define uma vida – a vida humana – em que os modos singulares, atos e processos do viver nunca são simplesmente fatos, mas sempre e primeiramente possibilidade de vida, sempre e primeiramente potência. Comportamentos e formas do viver humano nunca são prescritos por uma vocação biológica específica nem atribuídos por uma necessidade qualquer, mas, por mais ordinários, repetidos e socialmente obrigatórios, conservam sempre o caráter de uma possibilidade, isto é, colocam sempre em jogo o próprio viver. Por isso – isto é, enquanto é um ser de potência, que pode fazer e não fazer, conseguir ou falhar, perder-se ou encontrar-se –, o homem é o único ser em cujo viver está sempre em jogo a felicidade, cuja vida é irremediável e dolorosamente destinada à felicidade. Porém isso constitui imediatamente a forma-de-vida como vida política. ("Civitatem... communitatem esse institutam propter vivere et bene vivere hominum in ea" [A cidade se constitui em comunidade para que os homens vivam nela juntos e bem]: Marsílio de Pádua, Defensor pacis, V, II).²
3. O poder político que conhecemos sempre se funda, ao contrário, em última instância, na separação de uma esfera da vida nua do contexto das formas de vida. No direito romano, vida não é um conceito jurídico, mas indica o simples fato de viver ou um modo particular de vida. Há um único caso no qual o termo vida adquire um significado jurídico que o transforma em um verdadeiro e peculiar terminus technicus: é na expressão vitae necisque potestas, a qual designa o poder de vida e de morte do pater sobre o filho homem. Yan Thomas³ mostrou que, nessa fórmula, que não tem valor disjuntivo, vida não é senão um corolário de nex, do poder de matar.
A vida aparece, assim, originariamente no direito, somente como parte contrária de um poder que ameaça de morte. Mas o que vale para o direito de vida e de morte do pater vale com maior razão para o poder soberano (imperium), do qual o primeiro constitui a célula originária. Assim, na fundação hobbesiana da soberania, a vida no estado de natureza só é definida pelo seu ser incondicionadamente exposta a uma ameaça de morte (o direito ilimitado de todos sobre tudo), e a vida política, isto é, aquela que se desenvolve sob a proteção do Leviatã, não é senão essa mesma vida, exposta a uma ameaça que repousa, agora, apenas nas mãos do soberano. A puissance absolue et perpetuelle,⁴ que define o poder estatal, não se funda, em última instância, em uma vontade política, mas na vida nua, que é conservada e protegida somente na medida em que se submete ao direito de vida e de morte do soberano (ou da lei). (Este, e não outro, é o significado originário do adjetivo sacer referido à vida humana.) O estado de exceção, sobre o qual o soberano decide todas as vezes, é precisamente aquele no qual a vida nua, que, na situação normal, aparece reunida às múltiplas formas de vida social, é colocada explicitamente em questão como fundamento último do poder político. O sujeito último, que se trata de excetuar e, ao mesmo tempo, de incluir na cidade, é sempre a vida nua.
4. A tradição dos oprimidos nos ensina que o ‘estado de exceção’ no qual vivemos é a regra. Precisamos chegar a um conceito de história que corresponda a esse fato.
Esse diagnóstico de Benjamin, que já tem mais de cinquenta anos,⁵ não perdeu nada de sua atualidade. E isso não tanto ou não apenas porque o poder não tem, hoje, outra forma de legitimação que não seja a emergência, e por todos os lugares e continuamente faz apelo a ela e, ao mesmo tempo, trabalha secretamente para produzi-la (como não pensar que um sistema que pode agora funcionar apenas na base de uma emergência não esteja do mesmo modo interessado em mantê-la a qualquer preço?), mas também e, sobretudo, porque, nesse ínterim, a vida nua, que era o fundamento oculto da soberania, tornou-se por toda parte a forma de vida dominante. A vida, no estado de exceção tornado normal, é a vida nua que separa em todos os âmbitos as formas de vida de sua coesão em uma forma-de-vida. À cisão