O Selo do Imperador: Tempos Tocantes
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O Selo do Imperador – o símbolo divino do Imperador na terra – está perdido. A Imperatriz fará o que for preciso para recuperá-lo.
Jiayi tem um dom: ela pode viajar no tempo somente tocando artefatos históricos. Mais do que qualquer coisa, ela deseja escapar das garras da Imperatriz e fugir para uma terra estrangeira. Encontrar o Selo do Imperador pode ser sua única chance de liberdade, mas estaria disposta a arriscar despertar a ira da Imperatriz?
O historiador e aspirante a arqueólogo Zhihao não tem nenhum amor pela Imperatriz ou pela dinastia Qing, mas quando ela lhe ordena que encontre o Selo do Imperador em troca de arcar com os custos do primeiro museu de história da China, ele não pode recusar. É somente após aceitar a tarefa, que ele se dá conta de que a chave para encontrar o Selo está nas mãos de uma escrava do palácio.
A inquietação civil e as forças estrangeiras invasoras ameaçam a missão e as vidas de Jiayi e Zhihao enquanto eles caçam o Selo do Imperador.
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O Selo do Imperador - Amanda Roberts
O Selo do Imperador
Um Romance de Tempos Tocantes
Livro Um
Por
Amanda Roberts
Traduzido por João Paulo M. Rocha
Revisado por Vera Moraes
Capítulo Um
— Faça-o — a imperatriz ordenou.
Cuidadosamente, como se aquilo contivesse uma cobra que pudesse picá-la, Jiayi enrolou as longas mangas de seu robe, e pegou a caixa nas mãos. Inspirou fundo e devagar, fechando os olhos. Não sabia o que podia esperar, então tinha que estar preparada para qualquer coisa.
Quando abriu os olhos, estava cercada por cavalos em disparada. Pessoas gritavam enquanto corriam para se proteger. Os homens sobre os cavalos brandiam armas, golpeavam e cortavam pessoas à sua volta. Jiayi se virou para a esquerda e para a direita, procurando por uma saída antes que também fosse pisoteada. Ela nunca morrera durante uma de suas visões antes, mas não sabia o que aconteceria com ela na vida real se isso ocorresse. E não queria arriscar. Um dos cavaleiros parou para espetar um homem, não muito longe dela. O homem gritou, enquanto o sangue jorrava de seu corpo como um chafariz. Jiayi ficou apavorada, mas não havia nada que pudesse fazer por ele. Tinha de cuidar de si mesma. O cavalo parado fez uma pausa no mar de bestas galopantes. Jiayi precisava correr enquanto tinha a chance. Não fazia ideia de para onde estava indo, ou porque a caixa que lhe fora entregue pela imperatriz havia lhe enviado para este lugar, este tempo, mas tinha de encontrá-lo: o selo do imperador. De alguma forma, esta mulher, este corpo em que ela estava habitando, tinha alguma ligação com ele. Precisava confiar que ela a levaria para a resposta.
Ela correu para longe da batalha, o máximo que pôde. Sobre uma colina, viu uma grande tenda e muitos homens montados em cavalos assistindo ao combate abaixo. Por que eles estavam apenas assistindo, ela não sabia. Olhou para baixo para checar suas roupas, e viu que estava vestindo trajes femininos da nobreza Manchu. Os homens assistindo também tinham trajes Manchu. Ao menos não estava correndo em direção ao inimigo. Ela subiu correndo a colina, o mais rápido que podia.
— Por favor! Me ajudem! — gritou quando estava perto o suficiente para que fosse ouvida.
Os homens a olharam completamente atônitos, como se a tivessem visto apenas naquele momento. Era possível. Jiayi não tinha ideia de como as suas manifestações nas visões se pareciam para outras pessoas.
— Lady Caigiya! — um dos homens vestido como um general chamou. Ele apontou para ela, e dois de seus homens correram para seu lado e a ajudaram a subir. — O que aconteceu? Como a dama foi parar lá embaixo? — O general perguntou quando ela, enfim, chegou até ele.
— Eu... eu não sei — balbuciou. — Devo ter me perdido...
A resposta pareceu satisfazer o general. Ele acenou com a cabeça mais uma vez para os seus homens. — Levem-na para o imperador. Ele deve estar preocupado.
Jiayi tinha sérias dúvidas sobre isso. Nunca ouvira falar de um imperador que se preocupasse com uma mulher, mas permitiu que fosse conduzida. Foi levada para uma tenda enorme, grande e imponente o suficiente para ser uma residência imperial na Cidade Proibida. Quando as pesadas cortinas foram puxadas, estava tão escuro lá dentro que não podia ver nada. Ela foi rudemente empurrada para dentro e as cortinas se fecharam às suas costas. O recinto estava espantosamente quieto. Podia ouvir homens conversando em voz baixa, mas mal conseguia ouvir os sons da batalha travada logo abaixo, tão grossas eram as paredes da tenda. Depois de um tempo, seus olhos começaram a se acostumar à luz tênue dos braseiros espalhados pelo ambiente.
No fundo da tenda havia uma grande mesa, e vários homens estavam em pé à sua volta, em uma acalorada discussão. Ao redor da tenda, junto às paredes, haviam damas vestidas elegantemente e muitas crianças. Se o imperador estava ali, estas deviam ser as suas damas – esposas e concubinas – e seus filhos, os príncipes e as princesas. Por que eles estavam ali, em meio a uma perigosa batalha? Esta não foi a primeira vez que Jiayi desejou que soubesse alguma coisa sobre história. Até nomes e datas a ajudariam a entender melhor as suas visões.
Ela deu alguns passos em direção aos homens que estavam no meio da tenda. O general havia dito que ela seria levada ao imperador, mas será que quisera dizer apenas ali, naquele lugar, ou para o lado dele?
Um dos homens ergueu os olhos para ela, e seu rosto se iluminou. — Cai! — Chamou, correndo em sua direção. — Minha amada — sussurrou ao segurar sua mão. — O que aconteceu com você? — Perguntou.
Cai! É claro! Caigiya era seu nome completo, mas ela era mais comumente conhecida como Lady Cai, a mais amada – e a mais escandalosa – das mulheres do imperador Daoguang. Ela já não precisava de uma aula formal de história para saber quem era. Qualquer mulher que vivia no palácio conheceria a infame Lady Cai, aquela que roubou o coração de um imperador.
Mas não havia tempo para que ela declamasse a lenda sobre o amor deles. Ela tinha que achar o selo. Se falhasse de novo, a imperatriz ficaria extremamente irritada... e ninguém queria cair em desgraça perante a imperatriz.
— Eu... Eu estava perdida. Havia cavalos correndo e homens estavam gritando... — disse.
— Lamento que tenha sido pega em meio a isso. Os rebeldes vieram sobre nós tão rápido! Eu fui um tolo por tentar trazer minha família a Jehol durante tempos como esse... — o imperador lamentou.
Jiayi estava ligando alguns pontos. O imperador e sua família deviam estar viajando de Pequim para a Residência de Montanha, mais ao norte, em Jehol, quando foram atacados por um exército rebelde. Quais rebeldes, ela não tinha ideia, mas parecia não importar no momento.
— Estou bem — Jiayi disse, tentando sorrir. — Estou aqui com você agora.
O imperador devolveu o sorriso e a beijou ternamente. Ela quase recuou. Esses momentos sempre a chocavam. Ela nunca havia sido beijada na vida real. Era uma donzela ingênua que tinha passado a maior parte da vida enclausurada no palácio da imperatriz. Mas esta não era a primeira vez que um homem em suas visões a beijava. Alguns haviam feito mais... Ela tinha aprendido a reprimir os sentimentos e a deixar que o corpo de sua hospedeira assumisse o controle. Necessitava ficar calma e fingir que tudo estava normal. Precisava que o imperador a levasse até o selo. Ele tinha que estar ali!
O imperador se afastou e sorriu para ela. — Tem certeza que está tudo bem? — Perguntou.
Ela assentiu. — É claro! Apenas estava preocupada com você. Posso ajudá-lo de alguma forma? — Perguntou.
Ele levantou a mão e a tocou no nariz divertidamente. — É como se pudesse ler meus pensamentos — disse. — Siga-me.
Ela fez como ele lhe ordenara. O imperador a tomou pela mão e a conduziu à mesa que estava cercada pelos outros homens. Eles não pareceram nada felizes por tê-la em sua presença, fechando os semblantes e cruzando os braços. Não estavam acostumados a discutir assuntos importantes perante uma mulher. Jiayi não pôde evitar de sorrir para si mesma com aquilo. Em seu tempo, apenas algumas décadas à frente, a China era governada por uma mulher.
— Vossa Majestade — um dos homens disse. — Certamente há outra maneira...
— Devemos proteger o selo — o imperador disse firmemente. — O selo representa o imperador – a mim mesmo e a todos os que vieram antes e que hão de vir até o fim dos tempos – e o Mandato do Céu. Estamos sendo atacados aqui! Se os bárbaros se apoderarem dele, podem-no utilizar para derrubar a dinastia Qing! Se eu morrer hoje, poderiam encontrar o selo e usá-lo para reivindicar o império para eles. Ele deve permanecer escondido, ao menos por enquanto.
— Mas confiar em uma mulher? — Outro dos ministros falou.
O imperador riu. — As mulheres são as melhores em esconder as coisas! Elas furtam um pouco de dinheiro, ou uma joia, ou até mesmo uma peça de trajes caros a cada chance que têm, e você nunca mais os encontra. Por que você acha que sempre precisa comprar coisas novas para elas?
Os outros homens riram também, mas Jiayi corou. Era verdade, em parte. A maioria das mulheres não podia ganhar o próprio dinheiro, então frequentemente tinham que esconder pequenas quantias para uma emergência. Uma mulher nunca sabia quando podia perder as graças do marido, ou da sogra, ou de outro benfeitor, e não ter lugar nenhum para ir ou comida para comer. Mesmo a serviço da imperatriz, Jiayi temia o dia em que já não lhe fosse útil, e que se encontrasse de volta na rua.
O imperador estalou os dedos. Um eunuco veio correndo e colocou uma grande caixa sobre a mesa. Era a mesma caixa que Jiayi estava segurando em suas mãos reais – a caixa que continha o selo. Era de laca vermelha com dragões dourados pintados nela. Muito maior do que seria necessário, mas o interior tinha muitas camadas de seda vermelha protetora para amortecê-lo.
O imperador abriu a caixa e levantou o selo, com um ar solene. Ele havia sido forjado há séculos, em ouro puro. Sua base era quadrada, mas em cima, havia um dragão entalhado – o símbolo do imperador. Seus olhos eram incrustados de rubis que reluziam com o fogo dos braseiros. Cada um dos quatro lados do selo tinha imagens esmaltadas, que eram azuis no fundo, com dois dragões – oito, no total – alcançando uma pérola em chamas. Ela simbolizava sabedoria, prosperidade, poder e imortalidade – todas, qualidades que o imperador possuía.
A beleza do selo e o peso de seu significado fizeram Jiayi perder o fôlego. Ela estava tão perto. Suas mãos começaram a tremer, e suor começou a brotar de sua testa. Todo o recinto começou a embaçar. Quando o imperador se virou para ela, foi como se o mundo estivesse em câmera lenta. Jiayi percebeu o que estava acontecendo – estava acordando! Estava perdendo o controle sobre a visão, e logo estaria de volta à presença da imperatriz. Precisava descobrir o que acontecera com o selo, antes que fosse tarde demais.
O imperador começou a se aproximar, tão lentamente que parecia estar se movendo em lama grossa. Jiayi tentou dar um passo na direção dele, mas estava quase congelada em seu lugar. — Meu amor — chamou, com a intenção de que ele se apressasse, mas sem levantar suspeitas.
— Minha querida Lady Cai — ele disse, lhe estendendo o selo. — Preciso que esconda isto para mim. Promete mantê-lo em segurança, e não revelar sua localização a ninguém além de mim, quando for seguro fazê-lo novamente? — As palavras soavam como se ele estivesse debaixo d’água.
— Sim, sim, meu amor. É claro! — disse. O mundo se embaçou mais. Já não podia ver a mesa, os braseiros, ou as caras irritadas dos outros homens.
— Em suas mãos eu confio toda a China.
Ela tentou estender as mãos, mas não conseguiu se mover rápido o suficiente. O imperador soltou o selo e ele escorregou por entre seus dedos, caindo no chão.
— Jiayi... — imaginou ter ouvido o imperador dizer, mas sua voz soou distante, ainda que ele estivesse ali, bem na frente dela.
— O quê? — Perguntou.
— Jiayi... — a voz dele era pouco mais que um sussurro, enquanto o mundo escurecia.
Quando ela acordou, ouviu seu nome ser chamado cada vez mais alto.
— Jiayi! Jiayi, me responda! Encontrou? Sabe onde o selo está?
Jiayi abriu os olhos, e a imperatriz estava bem na frente dela. Sentiu um arrepio ao receber aquele olhar severo diretamente dentro de seus olhos.
— Jiayi! Me responda! O que você viu?
— Lady Cai... — Jiayi disse, enquanto tentava se lembrar dos detalhes da visão. — O imperador entregou o selo a Lady Cai.
Ela ouviu outras mulheres na sala se sobressaltarem. Olhou ao redor e viu as outras damas da imperatriz, suas servas e criadas, todas olhando para ela. Embora a imperatriz mantivesse os poderes de Jiayi em segredo para seus ministros e conselheiros homens, não se preocupava em escondê-los de suas amigas e damas - suas verdadeiras conselheiras.
— Quer dizer A Lady Cai? Aquela por quem o imperador quase abriu mão do trono? — Uma das damas perguntou. — Ele realmente confiava nela tanto assim?
Jiayi assentiu. — Ele a amava — afirmou.
— Mas e o selo? — Estourou a imperatriz, agarrando Jiayi pelos braços e sacudindo-a.
Sabia que a imperatriz iria se enfurecer quando descobrisse que Jiayi não sabia onde ele estava. Mas talvez pudesse lhe dar informações suficientes para aplacar a sua ira.
— Houve uma batalha, na estrada para Jehol. Alguns bárbaros. Não sei quem... — explicou. — O imperador temia que o matassem e roubassem o selo. Ele queria que Lady Cai o escondesse, para protegê-lo.
— E? — A imperatriz estava tremendo. Tinha as mãos estendidas como se Jiayi tivesse o selo consigo e o pudesse simplesmente lhe entregar.
— E... Eu... Eu o deixei cair — Jiayi disse, com lágrimas brotando dos olhos. — Sinto muito, mas a visão acabou antes que ele pudesse me entregá-lo. Não sei onde ele está. Mas o imperador certamente o entregou a Lady Cai! Se soubermos qual foi o local da batalha, ela deve ter escondido em algum lugar próximo e...
A imperatriz a estapeou tão forte no rosto que ela achou que o pescoço havia trincado. Segurou o fôlego, temendo fazer qualquer som, ainda que mínimo, e correr o risco de despertar ainda mais a ira da imperatriz. A sala ficou em silêncio absoluto. Nenhuma das outras mulheres ousou correr em auxílio a Jiayi. Depois de um momento que pareceu uma eternidade, a imperatriz cambaleou para trás. Jiayi finalmente voltou a aspirar, enquanto todas na sala exalaram audivelmente. Lentamente endireitou o pescoço, mas manteve os olhos úmidos voltados para baixo.
— Tão perto... tão perto... — a imperatriz balbuciou.
— Podemos tentar de novo — uma das outras mulheres sugeriu. Ela pegou a caixa e a enfiou nas mãos de Jiayi, mas nada aconteceu.
— Você sabe que não é assim que funciona — outra das mulheres sussurrou irritada, afastando suas mãos com tapas.
— Mas Jiayi tem razão — disse a princesa Der Ling. — Se Lady Cai estava com a caixa no caminho para Jehol, nosso campo de busca ficou consideravelmente mais estreito.
A imperatriz se sentou em sua cadeira, parecendo tão esgotada e exausta quanto Jiayi se sentia. Ficou assim por um momento, como se estivesse ponderando suas opções. Enfim, acenou a cabeça.
— Sim, chegou a hora. Tragam-no para mim...
Capítulo Dois
Convocado pela imperatriz! Zhihao mal podia acreditar que estava prestes a ser apresentado para a imperatriz em carne e osso. Tudo bem, a imperatriz-viúva, mas ninguém a chamava assim. Todos sabiam que o imperador não era nada mais que uma figura cerimonial, na melhor das hipóteses. A imperatriz era o verdadeiro poder por trás do trono.
Esta não seria a primeira vez que veria