O fim do ciúme e outros contos
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About this ebook
Marcel Proust
Marcel Proust (1871-1922) was a French novelist. Born in Auteuil, France at the beginning of the Third Republic, he was raised by Adrien Proust, a successful epidemiologist, and Jeanne Clémence, an educated woman from a wealthy Jewish Alsatian family. At nine, Proust suffered his first asthma attack and was sent to the village of Illiers, where much of his work is based. He experienced poor health throughout his time as a pupil at the Lycée Condorcet and then as a member of the French army in Orléans. Living in Paris, Proust managed to make connections with prominent social and literary circles that would enrich his writing as well as help him find publication later in life. In 1896, with the help of acclaimed poet and novelist Anatole France, Proust published his debut book Les plaisirs et les jours, a collection of prose poems and novellas. As his health deteriorated, Proust confined himself to his bedroom at his parents’ apartment, where he slept during the day and worked all night on his magnum opus In Search of Lost Time, a seven-part novel published between 1913 and 1927. Beginning with Swann’s Way (1913) and ending with Time Regained (1927), In Search of Lost Time is a semi-autobiographical work of fiction in which Proust explores the nature of memory, the decline of the French aristocracy, and aspects of his personal identity, including his homosexuality. Considered a masterpiece of Modernist literature, Proust’s novel has inspired and mystified generations of readers, including Virginia Woolf, Vladimir Nabokov, Graham Greene, and Somerset Maugham.
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Book preview
O fim do ciúme e outros contos - Marcel Proust
Violante ou a mundanidade
Com jovens e pessoas mundanas conversai pouco... Não busqueis aparecer na presença dos poderosos.
A imitação de Cristo
Livro I, Capítulo 8
I. Infância meditativa de Violante
A viscondessa da Estíria era generosa e terna, toda imbuída de uma graça que encantava. O espírito do visconde, seu marido, era extremamente alerta, e os traços de seu rosto tinham uma regularidade admirável. Mas qualquer granadeiro seria mais sensível e menos vulgar. Longe do mundo, na rústica propriedade da Estíria, criaram a filha Violante, que, bela e alerta como o pai, caridosa e misteriosamente sedutora como a mãe, parecia unir as qualidades dos dois numa proporção perfeitamente harmoniosa. No entanto, as cambiantes aspirações de seu coração e de sua mente não encontravam nela uma vontade que, sem limitá-las, as direcionasse e a impedisse de se tornar seu encantador e frágil joguete. Essa falta de vontade infundia na mãe de Violante temores que poderiam se tornar, com o tempo, fecundos, se a viscondessa não tivesse morrido violentamente com o marido num acidente de caça, deixando Violante órfã aos quinze anos. Vivendo quase sozinha, sob a guarda vigilante mas desajeitada do velho Augustin, seu preceptor e intendente do castelo da Estíria, Violante, por falta de amigos, fez de seus sonhos companheiros agradáveis aos quais então prometia manter-se fiel por toda a vida. Passeava com eles pelas alamedas do parque, pelo campo, debruçava-se com eles ao terraço que, fechando a propriedade da Estíria, dava para o mar. Elevada por eles como que acima de si mesma, iniciada por eles, Violante sentia todo o visível e pressentia um pouco do invisível. Sua alegria era infinita, entremeada de tristezas que, em doçura, ainda superavam a alegria.
II. Sensualidade
Não vos apoieis no junco que o vento agita e não coloqueis vossa confiança sobre ele, pois toda carne é como a relva e sua glória passa como a flor do campo.
A imitação de Cristo
Com exceção de Augustin e algumas crianças da região, Violante não via ninguém. Somente uma irmã mais nova de sua mãe, que morava em Julianges, castelo a algumas horas de distância, às vezes visitava Violante. Certo dia em que ia visitar a sobrinha, um de seus amigos a acompanhou. Chamava-se Honoré e tinha dezesseis anos. Não agradou a Violante, mas voltou. Passeando numa alameda do parque, ensinou-lhe coisas muito inconvenientes de que ela nem desconfiava. Ela experimentou um prazer muito suave, do qual, porém, logo sentiu vergonha. Depois, como o sol se pusera e tinham caminhado muito, sentaram-se num banco, por certo para contemplar os reflexos com que o céu róseo suavizava o mar. Honoré aproximou-se de Violante para que ela não sentisse frio, fechou-lhe o casaco de pele ao peito com engenhosa lentidão e propôs-lhe tentar colocar em prática, com sua ajuda, as teorias que acabara de ensinar-lhe no parque. Quis falar-lhe baixinho, aproximou os lábios do ouvido de Violante, que não o afastou; mas ouviram um barulho nas folhagens. Não é nada
, disse Honoré ternamente. É minha tia
, disse Violante. Era o vento. Violante, porém, que se levantara, refrescada na hora certa por aquele vento, não quis voltar a sentar-se e despediu-se de Honoré, apesar de suas súplicas. Teve remorsos, uma crise de nervos e por dois dias seguidos custou muito a pegar no sono. Sua memória era um travesseiro abrasador que ela revirava sem parar. Dois dias depois, Honoré pediu para vê-la. Ela mandou dizer que saíra para passear. Honoré não acreditou e não ousou retornar. No verão seguinte, ela voltou a pensar em Honoré com ternura, com mágoa também, pois sabia que ele havia partido num navio como marujo. Depois que o sol se punha no mar, sentada no banco ao qual, havia um ano, ele a conduzira, esforçava-se para lembrar dos lábios contraídos de Honoré, de seus olhos verdes semicerrados, de seus olhares exploradores como raios que pousavam sobre ela um pouco de viva luz cálida. E nas noites doces, nas noites vastas e secretas, quando a certeza de que ninguém podia vê-la exaltava seu desejo, ela ouvia a voz de Honoré dizendo-lhe ao ouvido coisas proibidas. Ela o evocava por inteiro, obcecante e oferecido como uma tentação. Certa noite, ao jantar, olhou suspirando para o intendente que estava sentado a sua frente.
– Estou muito triste, meu Augustin – disse Violante. – Ninguém me ama – continuou.
– No entanto – replicou Augustin –, quando há oito dias estive em Julianges para arrumar a biblioteca, ouvi dizerem da senhorita: Como é bela!
.
– Por quem? – perguntou Violante tristemente.
Um tênue sorriso erguia, pouco e timidamente, um canto de sua boca, como quando se tenta abrir uma cortina para deixar entrar a alegria do dia.
– Pelo jovem do ano passado, o sr. Honoré...
– Acreditava-o no mar – disse Violante.
– Ele voltou – disse