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Panorama histórico da cultura jurídica europeia

(guião)

António Manuel Hespanha

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21-02-09
Objectivos gerais do curso

 Neste curso, a história do direito é assumida como


uma disciplina formativa de futuros juristas, embora
de uma forma diferente daquela em que o são as
disciplinas dogmáticas.
 Com ela, pretende formar-se um espírito jurídico
mais aberto:
• para outros valores sociais;
• para outros modelos de justiça e de direito;
• para outras formas de pensar e raciocinar sobre direito
(outros discursos jurídicos).

 Um discurso mais liberto do direito vigente e mais


capaz de se adaptar à pluralidade e à mudança,
típicas do mundo contemporâneo.

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Panorama genérico

Objectivos
formativos

Criar uma
Um direito percepção Um direito
alternativo – multi- “igual” –
o ius dimensional
direito liberal
commune do direito

As
Outra lógica,
ilusões
outras
da
normas,
“familia
outros
ridade”
conceitos
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Métodos de trabalho
 Aulas
• Constrangimentos
• Atitudes
 Textos de apoio
• A. M. Hespanha, Panorama histórico da cultura jurídica
europeia, Lisboa, Europa-América, 1997
• Textos na página web: http://members.nbci.com/
am_hespanha
• Bibliografia suplementar
• Esquemas e guiões
 Trabalho pessoal
• Pré-leitura dos textos
• Reflexão sobre a bibliografia
• Revisão de conhecimentos prévios
 Avaliação
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Calendário

 Horário
• 2as. Feiras: 14.00 – 17.00
• 4as. Feiras: 11.00 – 12.30
 Horas de atendimento:
• 2as. Feiras: 17.00 – 18.30
• 4as. Feiras: 9.30 – 10.30; 12.30 – 14.00
• e por marcação
 Calendário anual: ver folha distribuída
 Docentes:
• António Manuel Hespanha (aulas) (amh@netcabo.pt)
• Ana Cristina Nogueira da Silva (acompanhamento)
(ancs@fd.unl.pt)
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Dia Tema
12.02 I. Apresentação.
14.02 Introdução metodológica. Linhas de força de
uma nova história do direito (i)
19.02 Introdução metodológica. Linhas de força de
uma nova história do direito (ii)
21.02 Síntese do curso (i);
26.02 Síntese do curso (ii);
28.02 Síntese do curso (iii);
05.03 A ordem jurídica do direito comum (sécs. XII-
XVIII).
Elementos constitutivos:
 O direito romano e tradição romanística.
07.03  O direito canónico
12.03  Os direitos próprios (germânico, feudal e
reinícola).
14.03  Uma ordem jurídica pluralista.
19.03  Um discurso jurídico “sem Verdade”.
21.03  O imaginário corporativo da sociedade e
do poder.
36.03 Ilustrações institucionais:
 a ordem jurídica familiar;
28.03  a ordem jurídica “colonial”.
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29.03 A ordem jurídica jusracionalista e
individualista (sécs. XVIII-XX).
02.04  Um paradigma individualista.
04.04  Jusracionalismo individualista e
contratualista (séc. XVIII).
23.04 Liberalismo, constitucionalismo e direito (i)
25.04 Liberalismo, constitucionalismo e direito (ii)
30.04 Romantismo jurídico: a Escola histórica alemã
02.05 Pandectística (séc. XIX).Teoria pura do direito
(séc. XX)).
07.05 Ilustrações institucionais: a nova constituição
colonial
09.05 As escolas jurídicas anti-conceitualistas e
trans-individualistas
 Naturalismo e organicismo
 Positivismo sociológico e o
institucionalismo
14.05  A jurisprudência teleológica
 A jurisprudência dos interesses
16.05 A reacção anti-naturalista. Idealismo e
dogmatismo
21.05 As escolas críticas:
 sociologismo marxista clássico no
domínio do direito
 marxismo ocidental dos anos sessenta.
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23.05  a "crítica do direito”.o "uso alternativo do
direito”.
28.05 As escolas anti-legalistas:
 Sentidos gerais do anti-legalismo
contemporâneo
 Em busca de uma "justiça material”.
 Os jusnaturalismos cristãos.
30.05  O pós-modernismo jurídico

Bibliografia básica:
Hespanha (1977), António Manuel, Panorama histórico da cultura
jurídica europeia, Lisboa, Europa-América, 1997. (actualização na
ed. italiana, introduzione alla storia del diritto europeo, Bolgna, Il
Mulino, 1998 ou em http://members.xoom.com/am_hespanha/)

Hespanha (1993), António Manuel, "«Carne de uma só carne».


Para uma compreensão dos fundamentos histórico-
antropológicos da família na época moderna”, Análise social,
123/124.I(1993), 951-974.

Hespanha (1993a), António Manuel, O Antigo Regime, em Mattoso


(1993) José (dir.), História de Portugal, vol. IV, Círculo dos
Leitores, Estampa, 1993.

Hespanha (1994), António Manuel, “O estatuto jurídico da mulher


na época da expansão”, em O rosto feminino da expansão
portuguesa. Congresso internacional, Lisboa, 1994, 54-64.

Silva, Ana Cristina Nogueira da, "Constitutionalizing Africa.


African Natives in the Portuguese Early Colonialism” (inédito). 8
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Conceitos a reter, conhecimentos pressupostos,
sugestões de estudo

 Cada módulo inclui uma referência:


• aos conceitos a reter - deve tentar construir
definições de cada um deles;
• aos conhecimentos pressupostos – deve
procurar obtê-los em obras de referência (v.g.,
enciclopédias);
• A sugestões de estudo – indicando outros
lugares do manual onde as questões são
abordadas, recomendando exercícios ou leituras
suplementares, chamando a atenção para
nuances.

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1. História do direito na formação dos juristas.
 Explica-se porque é que a história do direito é uma
disciplina formativa para futuros juristas.
 Distingue-se disciplinas dogmáticas de disciplinas
críticas. As primeiras descrevem tal como são o
direito e os seus conteúdos (as suas normas, os
seus conceitos, a sua lógica argumentativa). As
segundas descrevem o direito e os seus conteúdos
em função dos seus contextos (social, cultural,
económico, filosófico), procurando explicar por que
é que eles são como são.

 Conceitos a adquirir:
• Disciplinas dogmáticas.
• Disciplinas críticas.
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O interesse formativo da história do direito nos
cursos jurídicos

A história do direito tem um valor


formativo, não sendo uma matéria de
mera “cultura geral”.

O seu valor formativo prende-se com o


facto de ela possibilitar uma visão
“exterior” (não técnica, não dogmática) do
direito.

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O que é uma visão “exterior” do direito ?

 Disciplinas dogmáticas  Disciplinas críticas ou


ou técnico-jurídicas: meta-jurídicas:

 não discutem ou  não aderem aos


problematizam os pressupostos implícitos
pressupostos do discurso jurídico;
implícitos;
 Aceitam a lógica  observam o discurso
interna de um certo jurídico de um ponto de
discurso jurídico. vista externo (superior).

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Ver o direito “a partir de fora” é …
(... nos quadros de um meta-discurso)

 dar-se conta do seu carácter:


 artificial ( dado);
 cultural ou local (  natural, universal);

 perceber que ideia cria o direito de si mesmo (auto-


representação jurídica);

 perceber o modo como o direito cria a realidade jurídica


(momento poiético).

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O carácter local ou cultural do direito …

 diferentes normas (v.g., formalidades do casamento,


prazos de prescrição);

 diferentes instituições (v.g., a instituição “família”,


“aquisição de direitos”);

 diferentes paradigmas ou categorias (v.g., o imaginário


sobre o género, sobre os laços familiares, sobre a eficácia
do tempo).

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A imagem que o direito cria de si (três exemplos)
...

 A centralidade do  [No entanto] ... a ausência


direito (como auto- ou marginalidade do direito
representação). na regulação da vida e na
composição de conflitos.

 Exs.:
 a família;
 o quotidiano.

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A imagem que o direito cria de si (três exemplos)
...
 Majestade:  Cientificidade,
 primado do direito; tecnicismo, des-
responsabilização
 princípio da legalidade.

 As ausências:
 O papel da retórica na
 administração pública; aquisição dos
 ambiente escolar; consensos jurídicos.
 esquadras de polícia

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A construção da realidade pelo direito ...

 Contra a ilusão  O direito cria a


naturalista (o direito realidade:
descreveria a realidade).  Pela “descrição”:
 “caso jurídico” e
“caso da vida”.
 Pela “classificação”:
 a morte e a vida;
 a raça e o o género;
 pessoas e coisas.

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A construção da realidade pelo direito ...

 Pela construção de “objectos”;


 pessoas jurídicas;
 presunções (de morte, de prioridade na morte,
de filiação).

 Pela irrelevância da realidade não juridicamente


comprovada:
 quod non est in actis non est in mundo [o que
não vem no processo não existe no mundo].

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1.1 A história como discurso legitimador (i).
 Distingue-se, depois, uma história jurídica
legitimadora e uma história jurídica crítica. A
primeira procura legitimar o direito vigente, como
natural (“imune ao tempo”, expressão de um
espírito trans-temporal) ou “ponto de chegada” (de
um progresso histórico de um só sentido).
 Debate-se a dificuldade da questão da existência
de valores intemporais ou de um progresso
histórico, salientando as suas dificuldades,
salientando-se a função do discurso histórico na
construção do passado à medida das
necessidades, anseios, pré-conceitos do presente.

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1.1 A história como discurso legitimador (ii).
 Conceitos a adquirir:
• Carácter construído da história.
• Leitura naturalista da história.
• Leitura finalista da história.
• Leitura progressista da história
• Retro-projecção das categorias do presente
sobre o passado.
• Autonomia do passado.
• Eufemização das decisões jurídicas.

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O uso legitimador e o uso desconstrutor da
história do direito.

Feita de uma forma, a história pode servir


para tornar o direito vigente mais
consensual e a-problemático.

Feita de outra forma, a história revela o


carácter apenas “local” do direito de
qualquer época, incluída a presente.

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Algumas manifestações de uso legitimador da
história do direito (i).

 Tradicionalismo-naturalismo:

 A tradição como prova da “natureza”;


 A tradição como manifestação do “espírito do povo”;
 A tradição como prova de consenso tácito (iura
radicata, firmata).
 As ilusões da continuidade: a reinvenção da
tradição.

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Algumas manifestações de uso legitimador da
história do direito (ii).

 A história como documentário do progresso jurídico.

 A crítica do progressismo:
 não linearidade do progresso;
 as “vias falhadas”.

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1.2. A história crítica do direito.
 A história do direito pode incluir-se no grupo das
disciplinas críticas do direito. Desde que seja feita
de certa maneira.
 Desde que (i) assuma o carácter construído da sua
própria narrativa; e desde que (ii) assuma o
carácter também construído (não intemporal, não
“Racional”, não universal) do direito e dos seus
conteúdos.
 Esta linha de orientação desdobra-se em várias
consequências metodológicas enumeradas nos
sub-números do capítulo.

 Conceitos a adquirir.
 Carácter poiético do discurso histórico.
 Contextualização histórica do direito.
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Questões metodológicas acerca da
continuidade ou do progresso (i)

 A nova consciência da importância das rupturas


históricas (École des Annales, c. 1960).

 As ilusões da continuidade, (da genealogia e da


influência):
 o carácter “local” do sentido (Cl. Geertz);
 a “leitura” como “criação” (U. Eco);
 as épocas como “sistemas fechados” (N. Luhman).

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Questões metodológicas acerca da
continuidade ou do progresso (ii)

 “História retrospectiva” e duplex interpretatio


[interpretação dupla]:

 a retro-projecção do modelo estatalista;


 as fontes da teoria política e jurídica de
Antigo Regime (oeconomia, iurisdictio e
politica);
 a “continuidade e o “valor actual” do direito
romano;

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Tópicos para uma história desconstrutiva do
direito

Uma história desconstrutiva do direito


deve incidir a sua análise crítica nos
temas em torno dos quais gira o senso
comum jurídico dos nossos dias.

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1.2.1. Anti-estatalismo e auto-organização.

 Atenção a formas de organização e de normação


diferentes das actuais. Este tema volta a ser
tratado, de forma mais completa, em 3.1..

 Conceitos a adquirir
• Estadualismo.
• Pluralismo.
• Disciplina “doce”.
• Carácter molecular do poder.
• Pan-politização

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Leitmotiven de uma história desconstrutiva do
direito

 Modelos não estatalistas (pluralistas) de


organização:

 o modelo corporativo medieval;

 a disciplina “doce” (graça, amor ...).

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1.2.2. O direito como produto social.
 Propõe-se um modelo de inter-acção entre o direito
e o seu contexto capaz de salvaguardar uma certa
autonomia explicativa do direito, embora
reconhecendo inter-influências recíprocas entre
direito e contexto.

 Conceitos a adquirir
• Autonomia do direito.
• Processo de produção do direito.
• Recepção.
• Habitus (cf. 3.2.2.).

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Leitmotiven de uma história desconstrutiva do
direito

 O direito como produto:

 crítica do “purismo” (Trennungsdenken);

 a críticas (a “arqueologia”) dos dogmas:


legalismo, voluntarismo, sistemismo …

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1.2.3. Contra a teleologia.
 Propõe-se um modelo de leitura da história que não
a aprisione numa lógica de “preparadora” ou
“precursora” do presente.

 Conceitos a adquirir
• Teleologia.
• Ruptura histórica.
• Função poiética da tradição.

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2. A história institucional como discurso histórico.

 Num capítulo destinado sobretudo a historiadores,


insiste-se no carácter não apenas reflexo,
dependente, do direito; mas na eficácia
condicionante, criadora deste, desde logo como
máquina de produção de representações (imagens)
da sociedade.

 Nota.
• O tema volta a ser tratado em 3.2.4.

 Conceitos a adquirir
• Sociedade de Antigo Regime.
• Unidade entre direito, religião e moral na sociedade de
Antigo Regime.
• Relação entre direito e senso comum. 33
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3. Linhas de força de uma nova história política e
institucional.

 Neste capítulo, define-se o objecto da história do


direito (ou, no conceito aqui acolhido, da história
institucional).

 Isto é, define-se o sentido de poder, nos seus


aspectos organizativos (instituições) ou normativos-
disciplinares (direito). No seu desenvolvimento,
retomam-se e aprofundam-se temas tratados no
título anterior.

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3. 1. O objecto da história político-institucional. A
pré-compreensão do político.
3.1.1 A crise política do estadualismo.
 Descreve-se o imaginário “estadualista”, instituído
pela cultura política iluminista e, principalmente,
liberal, constatando-se um processo de
decomposição deste, que torna mais visíveis
elementos de organização e disciplina inferiores ao
Estado e omni-presentes na sociedade.

 Conceitos a reter:
• Estado e “estadualismo”
• Sociedade política e sociedade civil
• Lei

 Conhecimentos pressupostos
• Iluminismo (v. adiante, 7. 8.1-8.2).
35
• Liberalismo 21-02-09
3.1.2. A pré-compreensão pós-moderna do
poder. A crise política do estadualismo.

 Chama a atenção para o paralelismo entre a crise descrita no


número anterior e várias sensibilidades (pré-compreensões)
culturais e filosóficas contemporâneas, nomeadamente a
sensibilidade pós-moderna (i.e., a sensibilidade cultural dos
nossos dias que critica o modelo social e ideológico da
Modernidade, implantado pelo liberalismo.

 Conceitos a reter:
• Pré-compreensão
• Modernismo vs. pós-modernismo (v., adiante, 8.6.4.).

 Conhecimentos básicos pressupostos


• Karl Marx (identificação elementar)
• Michel Foucault (identificação elementar)
• V. I. Lenin (identificação elementar)
• A. Toffler (identificação elementar)
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3.1.3. Contra uma história político-institucional
actualizante (i).

 Para descrever com rigor e sem distorções


modelos (históricos) de organização diferentes
(alternativos) é necessário evitar lê-los com recurso
aos esquemas mentais com que apreendemos o
modelo político actual. Critica-se, por tanto, a ideia
de que existe uma “continuidade” (ou
“naturalidade”) nos conceitos e esquemas mentais
que utilizamos para falar de política, destacando-se
o seu sentido ideológico de legitimação do
presente.
 Critica-se, por isso (em 3.1.3.2.), a ideia de que os
conceitos (jurídicos) são a-temporais, descrevendo-
se a carga ideológica desta ideia na historiografia
jurídica, bem como as tensões a que a sua
superação tem dado lugar.
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3.1.3. Contra uma história político-institucional
actualizante (ii).

 Superada a ideia de a-temporalidade do direito, descobre-


se que os valores (jurídicos) do passado são “locais” (por
oposição a universais, intemporais) e que a historiografia
os deve tratar como tais, respeitando as lógicas (de
organizar, de disciplinar) alternativas do passado, sem
tentar reduzi-las a antecipações das do presente.
 Chama-se a atenção para as dificuldades epistemológicas
que esta ideia de ruptura histórica põe para o próprio
conhecimento histórico.
 Como exemplo de trabalhos modelares neste sentido,
apontam-se contribuições de Paolo Grossi, sobre os
modelos (alternativos) de conceber a propriedade na
Idade Média, e de Pietro Costa, sobre o saber político
medieval.

 Nota.
• Este tema já foi abordado em 1.1. E volta a sê-lo em 3.2.

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3.1.3. Contra uma história político-institucional
actualizante (iii).
 Conceitos a reter:
• Ideia de continuidade (e sua função ideológica).
• História dops dogmas (Dogmengeschichte)
• Ideia “de separação”.
• Carácter “local” (ou alteridade) dos sistemas culturais.
• Leitura participante (cf. Observação participante).
• Jurisdição.

 Conhecimentos básicos pressupostos


• Regra do precedente
• Interpretação histórica

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3.1.4. A descoberta do pluralismo político (i).
 A superação do modelo mental estadualista permite ver o
modelo pluralista que caracterizava a organização política e
jurídica do Antigo Regime, em que:
• coexistiam vários centros autónomos de poder;
• se sobrepunham vários níveis de normação;
• mas, sobretudo, existia uma consciência (um imaginário) disto.
 Neste capítulo referem-se estudos recentes que enfatizaram
este carácter pluralista da constituição política e jurídica de
Antigo Regime.

 Nota:
 Este imaginário “pluralista” ou “corporativo” (descrito,
adiante, em 4):
• é típico da política e do direito de Antigo Regime;
• mas sobrevive em momentos muito mais recentes da cultura
jurídica europeia (cf. 8.3.2. e 8.4.3.);
• enquanto que um pluralismo inconsciente continua a existir nos
dias de hoje.
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3.1.4. A descoberta do pluralismo político (ii).

 Conceitos a reter:
• Pluralismo político e pluralismo normativo.
• Ordem jurídica natural-tradicional.
• Jurisdição.
• Corporativismo.
• Modelos disciplinares não estaduais (enumeração).
• Liberalidade, graça e moral beneficial.
• Disciplina doméstica.
• Direito dos rústicos.
 Conhecimentos básicos pressupostos
• Max Weber.
• Culpa.
• Dolo.
• Conhecimentos básicos pressupostos
• Regra do precedente
• Interpretação histórica
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21-02-09
3.2. Uma leitura densa das fontes.
3.2.1. Respeitar a lógica das fontes. A descoberta
do pluralismo político (i).

 Neste número, enumeram-se as condições metodológicas


para que se possa respeitar a lógica das fontes históricas,
não as reduzindo à lógica do presente e recuperando o
sentido local original dos textos.
• Dão-se exemplos negativos e positivos de tratamento das
fontes, sendo os primeiros os que as reinterpretam
segundo perspectivas actuais (anacrónicas) e os
segundos os que tentam captar o sentido histórico mais
puro (e distante do presente).
 A fonte histórica é, por natureza, uma interpelação chocante
dos pontos de vista do presente;
 A sua interpretação tem que afastar os sentidos óbvios e
procurar sentidos escondidos e “estranhos”, por meio de
uma hermenêutica profunda, de uma leitura densa.

42
21-02-09
3.2. Uma leitura densa das fontes.
3.2.1. Respeitar a lógica das fontes. A descoberta
do pluralismo político (ii).

 Conceitos a reter:
• Leitura (ou interpretação, hermenêutica) densa
(thick) ou profunda (deep).
• Limites da interpretação.
• Conhecimentos básicos pressupostos
• Banalizar ou eufemizar

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Leitmotiven de uma história desconstrutiva do
direito

 Uma “interpretação densa” das fontes:


 os contextos culturais implícitos (o direito é
culture embedded);
 os constrangimentos das gramáticas dos
discursos;
 as insinuações da forma: da “razão gráfica” de
Jack Goody à “bibliografia material” de D. F.
McKenzie.

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21-02-09
3.2.2. A literatura ético-jurídica (i).

 Dadas (i) a estrutura pluralista da ordem jurídica de


Antigo Regime e (ii) a alteridade da lógica de
organização dos discursos normativos do passado,
sublinha-se a importância de fontes literárias, que
hoje se encontram fora do campo do saber jurídico,
como a literatura teológica e moral.

 Explica-se também como é que estes textos


continham e reproduziam uma visão do mundo,
tendendo a torná-la consensual na sociedade.

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3.2.2. A literatura ético-jurídica (ii).

 Conceitos a reter:
• Papel conformador (constitutivo, poiético, reprodutor) dos
imaginários sobre o homem e a sociedade.
• Habitus.
• Consensos jurídico-culturais e mecanismos da sua
reprodução no direito do Antigo Regime.
• Consensos jurídico-culturais e formas de integrar o conflito.

 Nota:
• Os conceitos de quaestio e tópica são descritos com detalhe
em 5.4..

 Conhecimentos básicos pressupostos


• Teologia
• Ética
• Pragmática
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3.2.3. Cálculos pragmáticos conflituais e
apropriações sociais dos discursos.

 Neste número explica-se como é que, apesar de todos os


mecanismos do discurso do direito para construir
consensos, se manifestava a discordância e o conflito,
frequentemente invocando os mesmos textos de
autoridade.
 Também se refere que, ao lado do modelo de compreensão
da sociedade proposto pelo direito, existiam outros
modelos (minoritários, marginais).

 Conceitos a reter:
• Apropriação (ou leitura) de um discurso.
• Contextualização cultural.

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3.2.4. Texto e contexto.
 Este número insiste na ideia de que o direito mantém
transacções reciprocamente condicionantes com o seu
contexto. E que, portanto, pode ser determinado por este.
 Mas alerta para o perigo de reduzir estas determinação à
esfera do económico, insistindo no papel determinante dos
contextos culturais (das “representações”).

 Conceitos a reter:
• Determinismo economicista.
• Embebimento cultural.
• Os esquemas mentais como grelhas de leitura (construção)
da realidade.
• O texto como “universo de sentido”.
• A “realidade” como texto.

 Nota.
• O tema já foi abordado em 2.
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3.2.5. Interpretação densa dos discursos, história
dos dogmas e história das ideias.

 Este número procura explicar porque é que uma


história do direito voltada para os mundos
culturais em que este se baseia (e que reproduz)
é diferente da antiga história dos dogmas, já
rejeitada.

 Conceitos a reter:
• Distanciamento.
• Formalismo.
• Dogmatismo.

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3.3. Uma nota sobre “relativismo metodológico” e
“relativismo moral” (ver texto actualizado).

 O último capítulo da introdução discute as implicações


metodológicas e éticas de um tema que foi constante ao
longo de toda a introdução – o carácter local dos valores
e, também, dos valores jurídicos.
 Explica-se aqui que a impossibilidade de fundamentar
valores universais e intemporais não prejudica
• (i) nem a existência de regras (locais) de validação de um
saber (leges artis),
• (ii) nem a adesão a convicções e padrões morais, às quais
cada época ou cultura pode atribuir um valor decisivo.

 Conceitos a reter:
• Relativismo metodológico e relativismo moral.
• Verdade e coerência.
• Valores verdadeiros e valores consensuais.
• Liberalismo totalitário.
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21-02-09
Uma nota final sobre relativismo metodológico
e relativismo moral (i).

 O relativismo metodológico exprime a


impossibilidade de fundamentar os valores jurídicos
na natureza ou na ciência.

 É uma atitude muito antiga na tradição cultural


europeia, mas hoje largamente aceite pela teoria
das ciências sociais.

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Uma nota final sobre relativismo metodológico
e relativismo moral (ii)

 As próprias ciências físico-naturais abandonaram a


ideia de verdade (como correspondência com uma
realidade exterior fixa, adequatio intelelectus rei)
pelas ideias de “coerência”, “paradigma”, “universo
de crenças”, “eficácia ou elegância explicativas”.

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Uma nota final sobre relativismo metodológico
e relativismo moral (iii).

 O relativismo metodológico não impede a adesão


pessoal (“política”) a valores, nem enfraquece a força
desta adesão.

 Como também não impede a aceitação pragmática de


valores consensuais.

 Apenas impede que cada um faça passar os seus


valores (ou os valores localmente consensuais) como
universais ou naturais, desqualificando os dos outros
como “errados” ou “anormais”.

53
21-02-09
Uma nota final sobre relativismo metodológico
e relativismo moral (iv).

 Do ponto de vista ético, o relativismo promove a


coragem e a auto-responsabilização na afirmação dos
valores de cada um.

 E, ao mesmo tempo, a humildade e a tolerância no


confronto de ideias, interditando qualquer tipo de
dogmatismo.

54
21-02-09
4. O imaginário da sociedade e do poder.
4.1. Imaginários políticos.

 Assente que o direito se fundamenta em


imaginários sociais profundos (cf. 3.2.4.),
descrevem-se, agora, os dois imaginários da
sociedade e do poder que acompanharam a
história da cultura jurídica europeia.

 Conceitos a reter:
• Imaginação social e regulação social.

55
21-02-09
4.2. A concepção corporativa da sociedade.
4.2.1. Ordem e criação.
 Descreve-se um modelo de representação da sociedade e do
poder que, sendo comum a outras culturas, dominou a cultura
europeia até ao sec, XVII, embora tenha voltado a influenciar, de
forma mais localizada, algumas escolas do pensamento jurídico
contemporâneas.
 O primeiro elemento é a ideia de ordem criada por Deus, natural
e indisponível, que ordenava as coisas umas para as outras,
atribuindo-lhes um “lugar”, uma “função”, com os respectivos
direitos e deveres.

 Conceitos a reter.
• Organização funcional (ou finalista) das criaturas.
• Direito natural.
• Justiça como restabelcimento da ordem (suum cuique tribuere)

56
21-02-09
4.2.2. Ordem oculta, ordem aparente.

 O segundo elemento é a ideia de que a ordem oculta e


inatingível se manifesta parcialmente nas coisas visíveis,
bem como nas tendências naturais.
 Revelar a ordem é obedecer aos instintos naturais de
bondade, de verdade e de honestidade, bem como
observar e interpretar as coisas e a sua história (tradição).

 Conceitos a reter.
• Honestidade.
• Verdade.
• Bondade.
• Dissimulação.
• Tradição.

57
21-02-09
4.2.3. Ordem e vontade.

 O terceiro elemento é a ideia de que a ordem é


indisponível: ou seja, de que apenas minimamente pode
ser alterada pela vontade.
 Daqui decorre a ideia de que o direito é sobretudo produto
de um equilíbrio natural, e não da vontade (do povo ou do
soberano). Sendo assim, a verdadeira constituição da
sociedade não é constituída por um pacto entre os
cidadãos, mas pelo direito inscrito na natureza da
sociedade.

 Conceitos a reter.
• Constituição natural ou tradicional.
• Direito civil e direito natural.
• Finalidade do governo legítimo (“fazer justiça”).

58
21-02-09
4.2.4. Ordem e desigualdade.

 O quarto elemento é a ideia de que a ordem implica


diversidade de funções de cada parte do todo e, por isso,
desigualdade de estatutos.
 Relaciona-se esta ideia com a natureza inegualitária do
direito do Antigo Regime, marcado pelo princípio da
desigualdade de estatutos jurídicos.

 Conceitos a reter.
• Direito desigual, direito igual e direito arbitrário.

59
21-02-09
4.2.5. Ordem e “estados”.

 O quinto elemento é a ideia de que, em virtude da


desigualdade de funções entre as várias categorias de
pessoas, mais importante do que uma pessoa
determinada, era a categoria a quela pertencia, pois era
essa categoria, e não cada indivíduo, que desempenhava
uma função na ordem do todo e, assim, que gozava de um
estatuto jurídico definido.
 Isto dá origem à noção de “estado”, sobre a qual se funda
a ordem jurídica de Antigo Regime.

 Conceitos a reter.
• Pluralidade de pessoas em cada estado.
• Pluralidade de estados de cada pessoa.
• Pessoa como “papel social” e não como substrato físico.

60
21-02-09
4.2.6. Ordem e pluralismo político.

 O sexto elemento é a ideia de que o poder estava, por natureza,


repartido; pelo que, numa sociedade bem governada, esta
partilha natural deveria traduzir-se na autonomia político-jurídica
(iurisdictio) dos corpos sociais.
 Mas também a ideia de que o carácter natural da ordem fazia com
que ela se manifestasse de muitas formas – pelas tendências
naturais (amores), com o tempo concretizadas em costumes
(consuetudines vel mores, practicae, styli), pelas virtudes morais
(amicitia, liberalitas), pela revelação e também pelo direito
formalizado pelos juristas, como peritos na observação e
memória das coisas sociais, ou mesmo pela vontade do rei,
como portador de um poder normativo de origem divina

 Conceitos a reter.
• Pluralidade político.
• Pluralismo normativo.

61
21-02-09
4.3. O paradigma individualista.
 Descreve-se o modelo de representação da sociedade que
subjaz à generalidade das escolas do pensamento jurídico
contemporâneo (sec. XVIII-XX).

 Nota.
• Estes temas são desenvolvidos em 7.

 Conceitos a reter:
• Contrato social.
• Vontade e ordem social.
• Sociedade natural e sociedade política.
• Absolutismo legalista ou positivismo jurídico.
• Individualismo, voluntarismo e contratualismo.
• Direito natural jus-racionalista.

 Conhecimentos pressupostos.
• Estoicismo.
• Santo Agostinho.
• S. Tomás (Tomismo).
• 62
Questão dos universais. 21-02-09
5. A formação do direito comum.
5.1 Factores de unificação do direito europeu (i).

 O curso apenas pretende abranger a história da


cultura jurídica europeia, desde que a Europa
começa a ser um conceito de referência, o que
acontece no período medieval. Um dos factores
de unidade dessa Europa é precisamente o
direito, um “direito comum”, cuja história se
começa agora a contar.
 Este direito é “comum” não apenas por se
aplicar comummente na Europa ocidental, mas
ainda por englobar uma série de ordenamentos
autónomos, que serão tratados nos números
seguintes.

63
21-02-09
5. A formação do direito comum.
5.1 Factores de unificação do direito europeu (ii).

 Conceitos a reter:
• Direito comum (ius commune).
• Juristas letrados.

 Conhecimentos pressupostos.
• Império Romano (do Ocidente, do Oriente)
• Carlos Magno.
• Sacro Império Romano-Germânico.
• Universidades (história das).
• Mapa político da Europa medieval.

64
21-02-09
5.1.1 A tradição romanística (i).

 Descreve-se, neste número, o primeiro elemento (ordem


normativa) do direito comum. A título de introdução,
descrevem-se brevemente as características essenciais do
direito romano e da sua evolução histórica, no período da
sua vigência propriamente dita (sec. VII a.C a sec. VI d.C.)
(cf. 5.1.1.1.). Como, de acordo com os pressupostos
teóricos deste curso, o direito romano é tratado apenas
como mais um direito histórico, e não como um modelo
jurídico-intelectual, discute-se (no ponto 5.1.1.1.1.) o
sentido do estudo do direito romano na actualidade.

65
21-02-09
5.1.1 A tradição romanística (ii)

 Conceitos a reter:
• Épocas históricas do direito romano e suas
características.
• Formalismo jurídico.
• Casuismo vs. normativismo.
• Autonomia da Iurisprudentia vs. legalismo
(“totalitarismo da lei”).
• Vulgarização.
• Corpus iuris civilis e suas partes componentes.

 Conhecimentos pressupostos.
• Império Romano (do Ocidente, do Oriente)
• Justiniano.
• Queda do Império romano do Ocidente e
invasões germânicas. 66
21-02-09
A tradição romanística

 A tradição romanística - ao lado da canonística


e a germano-feudal - constitui um dos
elementos mais importantes do direito histórico
europeu.

 Como se constituiu essa tradição ?

 Que significa ela hoje, para nós ?

67
21-02-09
A Europa e o direito romano (i).

 Roma como “mito fundador” da cultura jurídica europeia:


 uma visão retrospectiva …
 criada pelo próprio triunfo do romanismo:
 visões alternativas (germanismo, celtismo …).

 O legado do direito romano, hoje:


 como direito positivo;
 como contributo doutrinal.

68
21-02-09
A Europa e o direito romano (ii).

 O direito romano como direito “de contraste”:

 naturalismo;

 casuísmo;

 primado da doutrina e da jurisprudência;

 carácter prudencial.

69
21-02-09
Épocas históricas do direito romano (critério
jurídico)

 Época arcaica (753 a.C. - 130 a.C);

 Época clássica (130 a.C - 230 d.C);

 Época pós-clássica (230-530);

 Época justinianeia (530-565).

70
21-02-09
Época arcaica (753 a.C. - 130 a.C)

 Indistinção ius-fas-mos.
 O primado do costume. A Lei das XII Tábuas, c.
450 a.C..
 O carácter sacral do direito:
 Rituais jurídicos - a emptio venditio fundi.
 Fórmulas mágicas - a stipulatio.
 Inderrogabilidade e formalismo dos
instrumentos jurídicos - as legis actiones.

71
21-02-09
Época arcaica (cont.)

 O saber jurídico prudencial:


 A natureza oracular do discurso jurídico -
pontífices (pontem facere) e juristas;
 A aprendizagem do direito pela prática junto dos
peritos.

72
21-02-09
O Império romano (sécs. II/III d.C.)

73
21-02-09
Época clássica (130 a.C - 230 d.C)

 Ascensão e auge do direito pretório:

 ius praetorium est quod praetores introduxerunt


adiuvandi vel corrigendi vel supplendi iuris civilis
gratia propter utilitatem publicam, Papinianus,
D.,1,1,7,1.

74
21-02-09
Época clássica (cont.)

 Expedientes do pretor baseados no imperium:

 a stipulatio praetoria,

 as restitutiones in integrum (ob metum, ob


dolum, ob errorem, ob aetatem),

 os interdicta possessoria (uti possidetis, unde


vi);
75
21-02-09
Época clássica (cont.)
 Expedientes baseados na iurisdictio (depois da Lex
Aebutia de formulis, c. 130 a.C.):

 actiones praetoriae (in factum conceptae, utiles);


 a fórmula (Titius iudex esto. Si paret Numerium
Negidium Aulo Agerio centum dare oportere,
condemnato. Si non paret, absolvito)

 exceptiones.

76
21-02-09
Época clássica (cont.)

 Decadência do direito pretório:

 a ossificação do direito pretório - o Edictum


perpetuum (130 d.C.);

 a generalização da cidadania romana (com


Antonino Pio Caracala, 212 d.C).

77
21-02-09
Época clássica (cont.)

 A inventiva doutrinal:
 o casuísmo e autonomia

 (iurisprudentia): non ex regula ius sumatur,


sed ex iure quod est regula fiat

78
21-02-09
O império romano na época pós-clássica.

79
21-02-09
Época pós-clássica (230-530)

 Vulgarização - helenização;

 Cristianização;

 Oficialização (lei e critérios oficiais de valorização da


doutrina);

 Codificação (Codex Theodosianus, 438 d.C.);

80
21-02-09
Época pós-clássica (cont.)

 A ratificação imperial (i.e., pelo imperium) da


autoridade (auctoritas) dos juristas:

 o ius respondendi ex auctoritate principis


(Augusto, c. 25 a.C.)); a equiparação da
doutrina à lei (Adriano, c. 120 d.C.);

 a Lei das Citações (426 d.C.).

81
21-02-09
Época justinianeia (530-565)

 Neo-classicismo;

 Elaboração do Corpus Iuris


Civilis:

 Codex Iustitniani (529 d.C);


 Institutiones (530 d.C.);
 Digesta seu Pandektae
(533 d.C.);
 Novellae (530-565 d.C.).
82
21-02-09
Digesta seu Πανδεκται (533 d.C.). Estrutura.

83
21-02-09
5.1.1.2. A recepção do direito romano.

 Explica-se como, sobre a ficção da translatio Imperii, o direito


romano passa a vigorar na Europa Ocidental.
 Alinham-se os argumentos dogmáticos que justificam esta
vigência e
 discutem-se as causas desta Recepção.

 Nota.
• O tema voltará a ser tratado em 5.2., 5.3. E 5.4.

 Conceitos a reter:
• Recepção do direito romano.
• Translatio Imperii (transmissão do Império).
• Direito comum e direitos próprios.
• Direito principal e direito subsidiário.

 Conhecimentos pressupostos.
• Renascimento do comércio na baixa Idade Média.
84
21-02-09
5.1.1.3. A influência do direito romano no direito
local (i).

 O segundo elemento do direito comum é o direito local,


constituído pelas normas próprias das distintas
comunidades e reinos da Europa central e ocidental:
 Costumes locais de terras e reinos;
• Legislação dos reis;
• Direito dos senhores (direito feudal);
• Praxes de julgar dos tribunais;
• Colecções de fórmulas notariais.

 Nota.
• Este tema deve ser estudado por J. Gilissen, Uma introdução à
história do direito, Lisboa, Gulbenkian, 1997, 162-187.

85
21-02-09
5.1.1.3. O direito local e a sua progressiva
romanização (ii).

 Conceitos a reter:
• Leges barbarorum e leges romanae barbarorum
(conceito).
• Personalidade e territorialidade do direito.
• Romanização dos direitos germânicos.

 Conhecimentos pressupostos.
• Invasões germânicas e geografia dos reinos neo-
ghóticos daí derivados.

86
21-02-09
5.1.2. O direito canónico.
5.1.2.1. A tradição canonística. .

 Descreve-se, agora, o terceiro elemento do direito


comum – o direito da Igreja cristã.
 Enumeram-se as suas fontes e o movimento da sua
codificação.

 Conceitos a reter:
• Sagrada Escritura.
• Cânones conciliares.
• Bulas, breves, decretais, decretos e encíclicas papais.
• Elementos do Corpus iuris canonici.

 Conhecimentos pressupostos.
• Organização básica da Igreja no Ocidente medieval.

87
21-02-09
5.1.2.2. O lugar do direito canónico no seio do
direito comum.

 Sublinham-se as áreas e temáticas do direito


em que a influência canonística foi mais forte.

 Conceitos a trabalhar:
• Vontade e forma.
• Posse e propriedade.
• Herança e testamento.
• Equidade e rigor do direito.
• Arbitragem e adjudicação.
• Processo acusatório e processo inquisitório.

88
21-02-09
5.1.2.3. O direito canónico como limite de
validade dos direitos temporais .

 Descreve-se o modo como direito canónico e direitos


temporais (nomeadamente, direito romano) distinguiam
os seus domínios de vigência, bem como a evolução de
uma concepção integrista da validade do direito
canónico, para uma concepção mais secularista, em que
este constituía reconhecia um âmbito próprio aos
direitos temporais.
 Distingue-se domínio de vigência do direito romano de
competência jurisdicional dos tribunais eclesiásticos.

 Conceitos a reter:
• Primado temporal do Papa.
• Autonomia da Igreja.
• Foro eclesiástico.
• Critério do pecado.

89
21-02-09
O direito canónico.

O direito da Igreja é uma das outras


componentes fundamentais da
tradição jurídica europeia, pelo
menos até aos finais do séc. XVIII.
O seu contributo fez-se sentir,
sobretudo, no direito da família e na
valorização dos aspectos internos
dos actos jurídicos.

90
21-02-09
Evolução do direito canónico (i).

 Época primitiva (até a 313 d.C., Edito de Milão):


 a regulação pelo Evangelho, pelo amor e pela
fraterna correctio.
 Época constantiniana (313 - s. XII):
 o aparecimento de fontes jurídicas: cânones
conciliares, decretais pontifícias (encíclicas,
bulas e breves).

91
21-02-09
Evolução do direito canónico (ii).

 Época do cesaropapismo (s. XI-XV):


 pretensões de governo universal:
 Gregório VII, Dictatus Papae, 1075.
 codificação:
 Decreto, de Graciano (c. 1140);
 Decretais, de Gregório IX (1234);
 Sexto, de Bonifácio VIII (1298);
 Clementinas, de Clemente V (1414);
 Extravagantes, de João XXII (1324);
 Extravagantes comuns (séc. XV).

92
21-02-09
Evolução do direito canónico (iii).

 Época da Reforma e Contra-Reforma (Trento,1545-


1563 - séc. XVIII):
 perda da unidade religiosa da Europa;
 reforço do controlo religioso e ético nos países
católicos;
 fundamental continuidade normativa.
 Época contemporânea (a partir do séc. XVIII):
 perda de poder normativo secular.

93
21-02-09
Fontes do direito canónico

Decretais de Gregório IX -
I,2,1, De Quodvult Deo
(manuscrito do séc. XIV).

(M. Albuquerque (coord.), A Torre


do Tombo e os seus tesouros,
Lisboa, Inapa, 1990, 100)

94
21-02-09
Influência do direito canónico (i).

 A valorização dos aspectos internos dos actos


jurídicos:

 a valorização do simples vontade:


 nuda pacta e pacta vestita;
 os limites morais do consenso:
 o “justo preço” e proibição da usura;
 a valorização dos contextos morais subjectivos (a
“boa fé”):
 a proibição da usucapião de má fé.

95
21-02-09
Influência do direito canónico (ii).

 A oposição entre equidade e rigor do direito:


 a “equidade bartolina” na renovação da enfiteuse;
 a regra da equidade na determinação do conteúdo
dos contratos.

 A influência sobre o direito penal:


 a “criminalização do pecado”;
 a “lesa majestade divina”.

96
21-02-09
Influência do direito canónico (ii).
 A instituição do processo inquisitório:

 a primazia da verdade material sobre a verdade


processual formal.

 A nova hierarquia das fontes de direito:

 a teoria integrista (Dictatus Papae, 1075);


 a teoria dos “dois gládios” (Gelásio I, s. V):
 nec papa in temporalibus, nec imperator in spiritualibus se
debeant inmiscere (Acúrsio, s. XIII);
 o critério do pecado (Bártolo, s. XIV).
 aplicações: usura, prescrição aquisitiva de má fé;
97
21-02-09
Âmbito do direito
canónico.

S. Pedro entregando a
estola ao Papa Leão III
e a lança ao Imperador
Carlos Magno (Roma,
S. João de Latrão, séc.
VIII)

(José Pijoan, História do


Mundo, Lisboa, Alfa, V, 262).

98
21-02-09
Âmbito de aplicação da jurisdição eclesiástica.

 Jurisdição eclesiástica: jurisdição dos tribunais da


Igreja, aplicando ou não direito canónico.

 Competência em razão da matéria:


 disciplina interna da Igreja;
 matérias de natureza espiritual (sacramentos, pactos
ajuramentados, lesa majestade divina).

 Competência em razão das pessoas:


 eclesiásticos (seculares, regulares, cavaleiros das ordens
militares, estudantes).

 Jurisdição voluntária:
 Casos de foro misto (jogo, usura, adultério, crimes sexuais,
etc., Ord. Fil., II,9)). 99
21-02-09
5.1.3. Direito recebido e direito tradicional.

 Identificam-se áreas em que os direitos locais (v. antes)


possuíam traços característicos muito diferentes dos
direitos letrados agora recebidos:
• Estatuto pessoal de tipo corporativo ou estamentário;
• Constituição fundiária comentarista.
• Confusão entre poder e propriedade.

 Nota.
• Capítulo novo.

 Conceitos a reter.
• Sociedade de estados.
• Propriedade comentarista.
• Propriedade vinculada.
• Patrimonialização dos direitos políticos.

 Conhecimentos pressupostos.
• Feudalismo.
100
21-02-09
Direito costumeiro e direito feudal

O direito costumeiro e o direito feudal


constituem o elemento mais
expontâneo e tradicional do direito
medieval ...

… sobre o qual se vai exercer a


influência doutrinal do direito culto
(romano-canónico).

101
21-02-09
Fontes do direito costumeiro e direito feudal

 Costumes gerais (< leges barbarorum);

 Costumes locais (coutumiers, Rechtsbücher


[Sachsenspiegel, c. 1230], fueros, foros,
forais);

 Direito feudal (Libri feudorum, c. 1130).

102
21-02-09
Características do direito costumeiro e direito
feudal
 Direito tradicional:  Direito culto:

 Desigualdade de  Razoável igualitarismo;


“estados” (Stände);
 Vinculação familiar e  Individualismo (liberdade de
sucessória da terra; disposição em vida e por
 Patrimonialização do morte);
poder.  Distinção entre público e
privado.

103
21-02-09
Fontes do direito feudal

Libri feudorum Certianiae


(direito feudal da
Sardenha, séc. XII)

(José Pijoan, História do


Mundo, Lisboa, Alfa, V, 313).
104
21-02-09
Fontes do direito feudal

Foral velho de Guimarães


(1111)

(M. Albuquerque (coord.), A Torre


do Tombo e os seus tesouros,
Lisboa, Inapa, 1990, 139)
105
21-02-09
5.2. Resultado: uma ordem jurídica pluralista.
5.2.1. Uma constelação de ordens normativas (i).
 Este capítulo descreve como é que se articulavam
os vários ordenamentos que compunham a ordem
jurídica pluralista.
 Começa por destacar que a pluralidade de ordens
decorre do facto de a harmonia da Criação se
manifestar de muitas formas, desde os
sentimentos até às ordens coactivas.
 Depois, explica como a hierarquia entre as várias
ordens normativas dependia da natureza do caso.
 Teminando pr exemplificar os conceitos através
dos quais cada ordem recebia (importava)
conceitos de outras.

 Nota.
• Capítulo novo.
106
21-02-09
5.2. Resultado: uma ordem jurídica pluralista.
5.2.1. Uma constelação de ordens normativas (ii).

 Conceitos a reter.
• Manifestação plural da ordem da Criação.
• Natureza das coisas.
• Natureza dos contratos.
• Geometria variável do sistema de fontes do ius
commune.
• Carácter tópico (heurístico) de cada
ordenamento.

107
21-02-09
5.2.2. Direito canónico e direito civil.

 Neste capítulo apenas se recordam tópicos já


tratados (em 5.1.2.2.), acerca do modelo de
relacionação entre o direito canónico e os direitos
temporais.

108
21-02-09
5.2.3. Direito comum e direitos dos reinos.

 Neste capítulo especificam-se as relações entre


direito comum e direitos próprios, salientando-se
que, embora existissem alguns princípios que
promoviam a vigência do direito como (como
direito subsidiário, como ratio iuris), o princípio
dominante era o do particularismo jurídico: na sua
esfera própria, o direito particular impunha-se ao
direito comum.

 Conceitos a reter.
• Direito comum e direito próprio.
• Direito geral e direito especial.
• Direito subsidiário e direito principal.

109
21-02-09
5.2.4. Direito dos reinos e direito dos corpos
inferiores.

 Descreve-se o modelo de relacionamento entre o


direito comum e o direito dos reinos, bem como o
modo como estes se articulavam com os direitos
particulares dentro de cada reino.

 Conceitos a reter.
• Fundamento de validade do direito dos reinos.
• Relações entre direito do reino e direitos
particulares inferiores.
• “Boa razão”

110
21-02-09
5.2.5. Direito comum e privilégios.

 Descreve-se o modelo de relacionamento entre o


direito comum, estabelecido em geral e o direito
para certos grupos ou pessoas em particular.

 Conceitos a reter.
• Costumes particulares e direito comum.
• Privilégio.

111
21-02-09
5.2.6. Direito anterior e direito posterior.

 Descreve-se o modelo de relacionamento entre o


direito mais recente e direito mais antigo,
explicando-se porque é que o princípio de que a lei
posterior revoga a lei anterior tem um valor
limitado.

112
21-02-09
5.2.7. Normas de conflito de "geometria variável".

 Conclui-se, expondo o princípio de que o direito


comum não tem uma arquitectura fixa, dominada
por princípios hierarquizados e gerais.
 Mas, antes, de que constitui uma constelação de
ordenamentos jurídicos que dialogam entre si,
sendo a sua preferência recíproca determinável
apenas em face dos casos concretos.
 Assim se explicando a importância do arbítrio do
julgador na determinação do direito aplicável.

 Conceitos a reter.
• Estrutura tópica ou argumentativa do direito.
• Prudente arbítrio do julgador..

113
21-02-09
Uma ordem jurídica pluralista (i)
 Sistema jurídico contemporâneo - monista e fechado - e
ordem jurídica medieval - pluralista e aberta.

 Direito canónico e direito civil.

 Direito comum e direitos próprios:


• a prevalência do direito próprio sobre o comum (a lei
Omnes populi);
• a ratio iuris como inerente ao direito comum - a
prevalência doutrinal.

114
21-02-09
Uma ordem jurídica pluralista (ii)

 O direito régio como direito comum no reino:


 isenção em relação ao direito imperial (exemptio
imperii):
 rex in suo regno imperator est;
 ratio iuris própria;
 predomínio político-jurisdicional (imperial) sobre
os direitos inferiores.

115
21-02-09
Uma ordem jurídica pluralista (iii)

 Direito comum e privilégio:


 a garantia jurídica do direito particular.

 Direito anterior e direito posterior:


 não derrogação do antigo pelo novo.

 Normas de conflito “não monótonas”:


 “harmonia” v. “unidade”;
 as várias normas sucessivas como “tópicos”
coexistentes;
 hierarquização casuísta.
116
21-02-09
5.3. Uma ordem jurídica flexível.
5.3.1. Flexibilidade por meio da graça.
 Explica-se, neste capítulo, como se constrói,
dogmaticamente, a flexibilidade da ordem jurídica.
Salientam-se dois planos de flexibilidade – a flexibilidade
no estabelecimento das normas e a flexibilidade na
aplicação das normas.

 No plano do estabelecimento da norma de decisão, a


flexibilidade decorria da existência de uma pluralidade de
fontes de manifestação da ordem (cf. antes de normas
4.2.1 e 5.2.1.), de entre as quais o intérprete devia, acaso a
caso, identificar a preferente.

 Capítulo novo.

 Conceitos a reter.
• Natureza, graça e justiça.
• Poder extraordinário dos reis: manifestações e limites.
117
21-02-09
5.3.2. Flexibilidade por meio da equidade

 No plano da aplicação da norma de decisão, a


flexibilidade decorria da possibilidade de temperar a
rigidez do direito (rigor iuris) com a consideração de
normas adequadas ao particularismo de cada caso. A
este direito especial, particular, de superior perfeição,
chamava-se equidade.

 Capítulo novo.

 Conceitos a reter.
• Equidade.como justiça especial.
• Equidade como justiça superior.

118
21-02-09
5.4. Direito do reino em Portugal. Épocas
medieval e moderna.
 Novo.

119
21-02-09
5.5. A unificação pela "cientificização". As
escolas da tradição jurídica medieval (i).
5.5.1. A Escola dos Glosadores.

 Neste número caracterizam-se as duas etapas mais


importantes do saber jurídico baixo-medieval,
correspondentes às duas “escolas em epígrafe”.

 Conceitos a reter (Glosadores).


• Glosa e outros estilos literários da Escola dos
Glosadores.
• Acúrsio.
• Magna Glosa.

120
21-02-09
Recepção do direito romano

 Por recepção do direito romano entende-se:


 a redescoberta dos textos de direito
justinianeu, em Bolonha, durante o séc. XII;

 a sua adopção no ensino universitário do


direito;

 e a sua transformação na base doutrinal do


direito culto ou letrado da Europa Ocidental.

121
21-02-09
Causas da recepção do direito romano (i)

 Causas políticas da recepção do direito romano (o


direito romano como “direito do Império”):

 a ideia de renascimento do Império (Carlos Magno,


800; Otão I, 962);

 a ideia de que “os reis, no seu reino, são


imperadores”:
 rex superiorem non recognoscens in regno suo
imperator est.

122
21-02-09
Causas da recepção do direito romano (ii)

 Causas religiosas e filosóficas:

 a ideia de que à perfeição (da Criação) deve


corresponder a unidade (da Ordem);

 a ideia de que à unidade da Igreja deveria


corresponder uma unidade política temporal do
Império.

123
21-02-09
Causas da recepção do direito romano (iii)

 Causas económico-sociais:

 um espaço económico integrado (pelo


renascimento do comércio, séc. XIII) exigiria um
direito único; crítica;

 a “previsibilidade” (generalidade, abstracção) e o


“individualismo” do direito romano favoreceria o
dinamismo comercial nascente; crítica.

124
21-02-09
Causas da recepção do direito romano (iv)

 Causas intelectuais:

 a sofisticação da doutrina jurídica romana: rigor


conceitual, maleabilidade (aequitas) e capacidade
de construção;

 o direito romano como “razão jurídica” (ratio


iuris) e como direito comum (ius commune):
 ius romanum ubi non viget ratione imperii,
viget imperio rationis.

 A recriação do direito romano pela tradição


romanística.
125
21-02-09
Causas da recepção do direito romano (v)

 Os juristas como mediadores políticos na sociedade


de Antigo Regime.

 O direito como forma da política;

 Os juristas como criadores do direito;

 Os juristas como conselheiros políticos;

 Os juristas como avaliadores da correcção política e


limites do poder.

126
21-02-09
Escolas da tradição romanística medieval

 Escola dos Glosadores (sécs. XII e XIII).

 Fidelidade aos textos justinianeus;


 Carácter analítico e pouco sistemático;
 A recriação de uma linguagem técnica;
 Carácter académico e dogmático;
 A “glosa” como método.

127
21-02-09
Escola dos Glosadores

Irnério (séc. XII);


Acúrsio (c. 1180-c.1260)
Magna Glosa ou Glosa
Ordinaria (c. 1240)

Página de edição
impressa (séc. XVI) do
Corpus iuris civilis, com
a Glosa Ordinaria.

128
21-02-09
Escola dos Glosadores

Aula de direito
no Estudo de
Bolonha

(Pormenor de
túmulo de um
jurista, em
Bolonha)

129
21-02-09
Escola dos Glosadores

Bolonha,
túmulos de
Acúrsio,
Odofredo e
Rolandino
(séc. XIII)
130
21-02-09
Escola dos Glosadores

Bolonha, túmulo de um
jurista, (séc. XIII)

131
21-02-09
5.5. A unificação pela "cientificização". As
escolas da tradição jurídica medieval (ii).
5.5.1. [...]
5.5.2. A Escola dos Comentadores.

 Conceitos a reter (Comentadores).


• Comentário e outros géneros literários dos
comentadores.
• Bártolo de Sassoferrato.
• Textualismo, integrismo e racionalismo.

 Conhecimentos pressupostos.
• Escolástica.
132
21-02-09
5.5.2. A Escola dos Comentadores. Novidades
dogmáticas (i).

 Neste número, dão-se três exemplos de inovações


dogmáticas introduzidas pelos Comentadores, graças
à utilização de novos processos intelectuais e da
recepção de conceitos filosóficos da Escolástica:

• Teoria da pluralidade das situações reais.


• Aplicação espacial dos ordenamentos jurídicos;
• Teoria da naturalidade do poder político
(iurisdictio)

133
21-02-09
5.5.2. A Escola dos Comentadores. Novidades
dogmáticas (ii).

 Conceitos a reter.
• Propriedade e domínio.
• Propriedade dividida.
• Domínio directo e domínio útil.
• Lex fori.
• Lex actus.
• Lex rei sitae.
• Iurisdictio e suas sub-divisões (imperium merum et
mixtum, iurisdictio stricte sumpta).

134
21-02-09
Escola dos Comentadores (i)

 A emergência dos direitos próprios e a


necessidade de os integrar, bem como ao
direito canónico, na construção jurídica (o novo
direito comum);

 A influência da escolástica como método


intelectual - realismo e racionalismo.

135
21-02-09
Escola dos Comentadores (ii)

 Principais representantes:

 Cino de Pistóia (1270-1336);

 Bártolo de Sassoferrato (1314-1357):


 nemo iurista nisi bartolista

 Baldo de Ubaldis (1327-1400).

136
21-02-09
Escola dos Comentadores (iii)

Bolonha, túmulo
de Bartolomeu de
Saliceto (séc. XIV)
137
21-02-09
Escola dos Comentadores (iv)

Aula de
direito.

Gravura de
uma edição
quinhentista
dos
comentários
de Baldo
sobre o
Digesto
Velho
138
21-02-09
Escola dos Comentadores (v)

 Principais inovações dogmáticas:


 A teoria do dominium (propriedade): a
pluralidade de domínios sobre a mesma
coisa;

 A teoria estatutária na aplicação das leis no


espaço (ultrapassando a oposição
“personalidade” vs, “territorialidade”);

139
21-02-09
Escola dos Comentadores (vi)
 A origem natural do poder (iurisdictio) e a construção de
uma constituição política e jurídica pluralista:

 “os povos existem por direito das gentes e o seu


governo tem origem no direito das gentes; como o
governo não pode existir sem leis e estatutos, o
próprio facto de um povo existir tem como
consequência que existe um governo nele mesmo, tal
como o animal se rege pelo seu próprio espírito e
alma” (Baldo, Comentário à lei Omnes populi, D.,
1,1,9).

140
21-02-09
5.6. Génese do modelo discursivo do direito
comum europeu

 Neste capítulo e no seguinte, aprofunda-se um


conceito que sublinhado desde o início do curso: o
de que o direito – neste caso, mesmo a forma de o
penar e discorrer sobre ele – tem lógicas que
variam com os contextos histórico-culturais.

 Mostra-se como o discurso jurídico medieval tem


uma estrutura diferente da do actual, também ela
marcada pelo pluralismo (das verdades, neste
caso), e como esta estrutura dependeu de um
especial contexto filosófico, cultural e institucional.

141
21-02-09
5.6.1. Factores filosóficos, normativos e
institucionais do modelo discursivo do direito
comum europeu (i)
 Dos factores filosóficos, destaca-se um diferente
conceito de verdade – a verdade como objectivo
final e inatingível da interpretação variável,
provisória e problemática da natureza das coisas
(divinas e humanas).

 Conceitos a reter:
 Augustinianismo jurídico.
 Voluntarismo.
 Positivismo.
 Racionalismo.
 Naturalismo.
 Verdade como opinião.
 Pensamento problemático vs. Pensamento sistemático.
142
 Invenção jurídica 21-02-09
5.6.1. Factores filosóficos, normativos e
institucionais do modelo discursivo do direito
comum europeu (iii)

 Dos factores normativos, destaca-se a


necessidade de mobilizar meios lógicos e
argumentativos para modificar o sentido dos textos
de autoridade (Corpus iuris civilis,
nomeadamente).

 Dos factores institucionais, salienta-se o espírito


de controvérsia das universidades medievais.

 Conceitos a reter:
 Exegese e inovação.

143
21-02-09
5.6.2. A estrutura discursiva (i)

 Neste número, vai ser descrita a estrutura do


discurso jurídico medieval (ou, mais geralmente,
de Antigo Regime), insistindo-se em duas
características:
 Interpretação criadora dos textos, mediante (i) a
oposição do “espírito” à “letra” da lei e (2) oposição
da lógico global ao sentido de um texto particular.
 Adequação dos textos à realidade mutável da vida,
mediante (i) o confronto de perspectivas de
interpretação (utilização da tópica) e a (ii) adopção
de um modelo literário favorável à discussão
(quaestio).

144
21-02-09
5.6.2. A estrutura discursiva (ii)

 Conceitos a reter:
 Espírito da lei vs. texto da lei.
 Ratio legis.
 Discurso dialético e discurso apodítico.
 Tópica ou ars inveniendi.
 Regra axiomática e regra heurísitca.
 Lugares (topoi) – noção e exemplos.
 Argumento de autoridade e opinião comum dos doutores.

 Conhecimentos pressupostos:
 Escolástica.
 Silogismo.

145
21-02-09
O modelo do discurso jurídico medieval.

O discurso jurídico medieval interessa-nos


como um modelo alternativo, em relação ao
de hoje, de discorrer (argumentar,
fundamentar a decisão) em direito.

146
21-02-09
O modelo do discurso jurídico medieval.

 Esse carácter alternativo decorre:

 de o discurso não pretender a verdade, mas


apenas a probabilidade;

 de se organizar em torno de questões de solução


problemática e não em torno da aplicação de
regras

147
21-02-09
O carácter alternativo do discurso jurídico
medieval decorre ...

 de o discurso não  … mas apenas a


pretender a verdade probabilidade.

 de partir de  … e não de aplicação
questões de automática de regras
solução incerta … pretensamente certas.
 de se assumir como  … e não como uma ciência
saber rigorosa e neutra.
argumentativo

148
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (i)

 A autonomização da razão natural em relação à fé,


mas …

 … a impossibilidade de a razão atingir uma plena e


definitiva compreensão das coisas humanas;

149
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (ii)

 A actividade intelectual como permanente


interpretação de camadas sucessivamente mais
profundas do sentido.

 O direito como a emanação de uma ordem íntima


das coisas, cuja revelação decorria de um uso
correcto da razão (recta ratio).

150
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (iii)

 O discurso jurídico como uma técnica regulada (ars) de


encontrar (ars inveniendi) perspectivas da justiça e de
as avaliar (ars iudicandi).

 O contributo da “escolástica”, como técnica de


discussão académica - as “questões quodlibéticas”.

151
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (iv)
 Compatibilizar a autoridade dos textos com o
dinamismo da vida.
 “espírito” e “letra”:
 scire leges non hoc est verba earum tenere, sed vim ac
potestatem (Celsus, D,1,3,17)
 a interpretação lógica (ratio legis):
 Incivilis est nisi tota lege perspecta aliqua particula eius
proposita iudicare vel respondere (Celsus, D,1,3,24)

 scientia legum consistit in medula rationis non in cortice


scripturarum (Baldo, séc. XIV).

152
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (vi)
 A dialéctica (ou arte de discutir a partir de argumentos
apenas prováveis) (  demonstração, oração).

 a vertente casuística:
 a arte de encontrar os argumentos (tópica < τοπ
οι, loci, lugares);

 a arte de avaliar a força dos argumentos (ars


iudicandi) - a referência ao auditório;

153
21-02-09
A hierarquia das fontes num ordenamento
pluralista

1. Casamento (Dcan)
2. Compra e venda
(Dciv)
3. Imposto sobre a
compra e venda (DR)
4. Formalidades do
contrato (C)
154
21-02-09
Fundamentos epistemológicos do discurso
jurídico medieval (vii)

 A vertente “generalizante”:
 a formulação de regras:
 Regula est, quae rem, quae est, breviter enarrat.
Non ex regula ius sumatur, sed ex iure quod est
regula fiat (Paulus, D.,50,17,1,pr.);
 o argumento da autoridade:
 doctor est peritus;
 a opinião comum (opinio communis doctorum):
 critério quantitativo (maior pars);
 critério qualitativo (melior et sanior pars):
 a prática (praxis) como interpretação autêntica:
 ius receptum, practica intellectrix legum.
155
21-02-09
Aplicação do modelo discursivo: a quaestio (i)

 Exposição do caso ou do  Primo ponendo casum vel


sentido literal do texto; dicendum sensum litterae;

 Explicando a letra;  Secundo dicendum litteram


et exponendo et etiam
construendo si difficlis
appareat;
 Induzindo casos  Tertio inducendo similia;
semelhantes;
 Induzindo casos  Quarto inducendo contraria
contrários, resolvendo e et solvendo et distinguendo;
distinguindo;

156
21-02-09
Aplicação do modelo discursivo: a quaestio (ii)

 Elaborando questões  Quinto, quaestiones


(dúvidas) e resolvendo-as; faciendo et determinando;

 Expondo coisas dignas de  Sexto, dicendo notabilia ad


nota e explicando de que quae et qualiter inducit
modo se induzem da debeat decretalis.
decretal e com que
consequências.

(Henrique de Susa, Cardeal


Hostiense, séc. XIII)

157
21-02-09
8. O direito na Época Contemporânea.
8.1. O contexto político.
 Este capítulo introduz as linhas básicas da evolução da
cultura jurídica oitocentista.
 Recapitulam-se os traços fundamentais do liberalismo como
modelo social (antes de todos, liberdade pessoal, propriedade
privada e livre empresa),

 apontando-se as consequências de cada um deles no plano do


direito,
 mas também as limitações com que os princípios foram
institucionalizados.

 Realçando o modo como a estabilidade da lei (expressa nas


tendências codificadoras) foi considerada como a principal garantia
da liberdade (contra o arbítrio e confusão da legislação dispersa).

158
21-02-09
8.2.1. Democracia representativa e legalismo.

 O capítulo explica em que se traduz o princípio democrático e identifica


a sua principal consequência no plano jurídico – o legalismo.
 Mostra como tal princípio deslegitimou tods as anteriores fontes de
direito (desde o costume até ao direito jurisprudencial: jurisprudência e
doutrina).
 Mas chama-se também a atenção para o facto de este filão
democrático ter sido confrontado, durante todo o liberalismo, com
orientações que desvalorizavam a lei como fonte de direito, com
argumentos que serão inventariados nos números seguintes.

 Conceitos a reter:
 Legalismo

 Conhecimentos pressupostos:
 Revolução francesa e revoluções liberais (traços gerais)

159
21-02-09
8.2.1.1. “Razão jurídica” vs. “razão popular”.
 Contrastando com o que se descreveu imediatamente
antes, este capítulo descreve a constante reacção contra o
domínio do exclusivo da criação do direito pela vontade
popular. Mostra como se trata de salvaguardar para uma
elite cultural (grosso modo, os intelectuais, os políticos, os
juristas) aquele poder constituinte que a filosofia política
ameaçava, desde o séc. XVII, entregando nas mãos do
povo.
 A primeira linha de argumentação, distingue a “vontade
esclarecida” da “vontade apaixonada”
 Conceitos a reter:
 Vontade racional e paixão.
 Liberdde dos antigos e dos modernos.

160
21-02-09
8.2.1.2. “Tradição”

 A segunda linha de argumentação, Um desses filões


considera a constituição e do direito como legados da
tradição, apenas modificáveis ou actualizáveis pelos
processos de evolução “natural”das sociedades, já que a
geração presente não pode dispôr de algo que é de muitas
gerações.

 Conceitos a reter:
 Romantismo jurídico.
 Volksrecht e Professorenrecht.

 Conhecimentos pressupostos:
 Romantismo;
 Império alemão no séc. XIX (traços gerais).
161
21-02-09
8.2.1.3. Direitos individuais.
 Para outras correntes, descritas neste número, o que resistia à
modelação livre do direito pela vontade soberana era, desde logo, os
direitos naturais dos indivíduos, anteriores à lei positiva.
 Este capítulo descreve as duas vertentes principais (a americana e a
europeia) desta ideia de que o direito (do Estado) está subordinado
aos direitos (pré-estatais), salientando os seus pressupostos
antropológicos.
 Conceitos a reter:
 republicanismo;
 controle judicial das leis;
 governo de assembleia;
 direitos de resistência e direitos sociais ou “mediados pelo
Estado”;
 pré-condições do liberalismo; sua criação pelo Estado

 Conhecimentos pressupostos
 Revolução americana (traços gerais);

162
21-02-09
8.2.1.4. Elitismo social

 Este número explica o fundo elitista do liberalismo, que


subjaz, tanto aos receios, antes descritos, perante os
modelos democráticos, como às linhas de argumentação
anti-democrática dos anteriores números.

 Conceitos a reter:
 exclusões eleitorais elitistas

163
21-02-09
8.2.1.4. Estadualismo e “direito igual”

 Este número explica o fundo elitista do liberalismo, que


subjaz, tanto aos receios, antes descritos, perante os
modelos democráticos, como às linhas de argumentação
anti-democrática dos anteriores números.

164
21-02-09
8.2.1.6. O “método jurídico”

 Este número explica de que modo a concepção


(nomeadamente hegeliana) de que o Estado é, antes de
mais, uma ideia leva à conclusão de que o direito é, antes
de tudo, uma teoria (um “método” de pensar), cuja validade
não depende da vontade democrática, mas da correcção
metodológica. O que autonomiza os juristas dos políticos e
os coloca, de novo, no primeiro plano da criação do direito.

 Conceitos a reter:
 O Estado como ideia (“Estado ético”);
 Papel ordenador (racionalizador) do Estado.

 Conhecimentos pressupostos:
 Filosofia política de G. F. Hegel (traços gerais).
165
21-02-09
8.2.1.7. Positivismo conceitual e Estado
constitucional

 Este número ...

 Conceitos a reter:

 Conhecimentos pressupostos:

166
21-02-09
8.3. Positivismo e cientismo.

 Este número ...

 Conceitos a reter:

 Conhecimentos pressupostos:

167
21-02-09
8.3. Positivismo e cientismo (i).

 A ciência como modelo epistemológico.

 O novo ideal de ciência como conhecimento da realidade


empírica (“posta”, “positiva”):

• contra o argumento da autoridade;


• Contra o argumento da tradição como prova de verdade;
• contra o saber subjectivo e opinativo;
• contra o saber especulativo.

168
21-02-09
8.3. Positivismo e cientismo (ii).

• O direito como ciência ou a necessidade de “coisas


positivas” no direito.

• a lei → positivismo legalista;


• as instituições vividas → positivismo histórico e
sociológico;
• os conceitos (como “saber formal, geral e abstracto”) →
positivismo conceitual.

• A exportabilidade das soluções jurídicas e o imperialismo


jurídico europeu.

169
21-02-09
8.3. As escolas clássicas do século XIX.
8.3.1. A Escola da Exegese. A origem do legalismo.

• A emergência do legalismo moderno:


• o racionalismo e a sua consumação no legalismo;
• reformismo político e legalismo;
• as codificações do despotismo esclarecido (Novo
Código, 1778; ALR, 1794; ABGB, 1811).

• O advento do modelo democrático representativo em


França e o legalismo revolucionário:
• o Code civil, 1804; restantes códigos.

• O novo papel dos juristas como meros intérpretes da lei.


170
21-02-09
8.3. As escolas clássicas do século XIX.
8.3.1. A Escola da Exegese. Balanço do legalismo.

• Legalismo e democracia:
• igualdade e garantia do direito;
• popularização do direito.

• Os requisitos do modelo e a sua subversão:


• a “mediação” da relação representativa;
• a progressiva tecnificação do discurso legislativo;
• a ossificação / efemerização do sistema jurídico:
substituição da dinâmica doutrinal pela dinâmica
legislativa (Gesetzflut).

171
21-02-09
8.3.2. A Escola Histórica Alemã. A vertente
organicista e tradicionalista.
• O nacionalismo romântico:
• em busca da alma nacional (Volksgeist);
• em busca de um direito próprio da Nação e anterior ao
Estado.

• O organicismo social.

• Consequências:
• Anti-legalismo;
• Valorização do costume (Gewohnheitsrecht);
• Valorização da doutrina (Rechtswissenschaft,
Professorenrecht);
• Revalorização da história do direito. 172
21-02-09
8.3.2.1. A cultura jurídica portuguesa da primeira
metade do séc. XIX

• O quadro das fontes de direito no pós-iluminismo.

• Reformismo social e politico.

• Importação de direito estrangeiro:


• A recepção do Code civil

• Positivismo e jusracionalismo tardio (ecletismo)

173
21-02-09
8.3.3. A Escola Histórica Alemã. A vertente
conceitualista (Begriffsjurisprudenz) (i)

• Volksgeist e coerência sistemática.

• A coerência intra-sistemática como novo critério de


verdade. A desvalorização dos referentes extra-
sistemáticos (lei, contexto social).

• A “construção” e o poder genético dos conceitos.

• O “formalismo”: o carácter “depurado” dos conceitos.

174
21-02-09
8.3.3. A Escola Histórica Alemã. A vertente
conceitualista (Begriffsjurisprudenz) (ii)

• Significado sociológico:
• formalismo e liberalismo;
• neutralidade política;
• individualismo;
• legitimação da hegemonia política dos juristas.

• Os dogmas do conceitualismo:
• A teoria da subsunção;
• O dogma da plenitude lógica do ordenamento jurídico;
• A interpretação objectiva.
175
21-02-09
8.3.3. A Escola Histórica Alemã (conceitualismo)
(iii)

• Sentido político do formalismo:


• Um factor de eufemização dos conflitos políticos e de
encontro de um plano ideologicamente neutral de
diálogo político;
• Um factor de legitimação do Estado, da Administração
e da Justiça como entidades neutras;
• O formalismo como cobertura ideológica do liberalismo
económico-social;
• O neutralismo cientista como ideologia expontânea dos
juristas.

176
21-02-09
Conceitualismo. O direito como um corpo vivo
“Devemos, portanto, medir as características e a força do
corpo jurídico [i.e., de um instituto jurídico], mostrar o modo
em que nasce e morre, as condições e situações em que
ele pode influir, as influências que, em contrapartida, sofre,
as metamorofoses de que é capaz; devemos indicar a sua
relação com outros corpos jurídicos e as ligações que tece
com eles ou os conflitos em que com eles cai; assim,
devemos compreender num conceito, como num ponto focal
lógico, obtido com base de todas as anteriores
investigações, a natureza do mesmo, a sua individualidade
jurídica e, enfim, devemos ordenar, do mesmo modo que o
cientista classifica os objectos histórico-naturais, todos os
corpos jurídicos em e para um sistema" (Rudolf v. Jhering,
Unsere Aufgabe, 1857 [em Rudolf von Jhering, La lotta per il
diritto e altri saggi, Milano, Giuffrè, 1989, 9]).

177
21-02-09
Conceitualismo. O direito como um corpo vivo

“O conteúdo do sistema é a legislação, logo, as normas


jurídicas. Para as conhecermos, em parte
individualmente, em parte no seu conjunto,
necessitamos de um meio lógico, a forma, i.e., o
tratamento lógico do conhecimento de todo o
conteúdo da legislação. Todo este tratamento formal
ou deve desenvolver a definição das normas
jurídicas isoladas - chama-se por vezes a isto
definições e distinções - ou organizar a relacionação,
quer de várias normas, quer do seu conjunto. É a
isto que se chama sistema em sentido próprio" (F. C.
v. Methodenlehre, 37) .

178
21-02-09
Balanço do conceitualismo

Sociologia do conceitualismo pandectista:

• O formalismo como mistificação: modelos jurídicos


formais e modelos políticos materiais;

• O formalismo como dissimulação: a função


socialmente conservadora da neutralidade científica;

• O formalismo como inculcação: o poder disciplinador


do imaginário formalsta das relações sociais.

179
21-02-09
O apogeu do formalismo.
A Teoria Pura do Direito (i)
• O direito como fenómeno social cultural.

• As condições específicas de validade de uma ciência


dos valores:
• Ciências da natureza e ciências da cultura;
• Ciências descritivas e ciências valorativas;
• Ciências referidas a leis e ciências referidas a
sentidos.

• A purificação do objecto.

• Um diferente modelo científico: raciocínio, causalidade,


lógica, interpretação.
180
21-02-09
O apogeu do formalismo.
A Teoria Pura do Direito (ii)

• Um sistema auto-sustentado (Grundnorm, Stufen-


theorie).
• "Toda a norma jurídica legítima (i.e., estabelecida de acordo
com o direito) deve ser observada".
• Um sistema auto-referencial (auto-poiético);
• Um sistema “purificado” em relação:
• à moral;
• à política;
• às ciências sociais.
• Estatalismo ou anti-estatalismo ?

181
21-02-09
O apogeu do formalismo.
A Teoria Pura do Direito (ii)

• Um sistema auto-sustentado (Grundnorm, Stufen-


theorie).
• "Toda a norma jurídica legítima (i.e., estabelecida de acordo
com o direito) deve ser observada".
• Um sistema auto-referencial (auto-poiético);
• Um sistema “purificado” em relação:
• à moral;
• à política;
• às ciências sociais.
• Estatalismo ou anti-estatalismo ?

182
21-02-09
O naturalismo jurídico

 Factores epistemológicos: observação empírica,


experimentação e explicação finalista (< darwinismo);

 Factores político-sociais: “questão social” - a


sociedade percorrida por conflitos de interesses e de
grupos.

 O naturalismo jurídico - o direito como um facto


social,
 explicável mecanicistica ou finalisticamente,
 desvalorizando as intenções normativas.

183
21-02-09
O naturalismo jurídico. Desenvolvimentos

 A jurisprudência teleológica - a lógica das finalidades


imanentes das instituições;

 A Escola Livre do Direito - a lógica da “vida”;

 A Jurisprudência dos Interesses - a lógica dos


interesses legalmente reconhecidos;

 O Institucionalismo jurídico - a organização


espontânea da vida.

184
21-02-09
A jurisprudência dos interesses (Rudolf v. Jhering
[1818-1892])

• A uma lógica voluntarista e contratualista substitui-se


uma outra utilitarista e transindividual.
• Do poder de vontade (momento genético) ao interesse
protegido (momento finalista).
• Interesses individuais ou interesses sociais objectivos que,
frequentemente, não fazem parte das volições individuais (boa
fé contratual, dimensão social da propriedade, finalidades da
instituição familiar)
• De uma ética formal, baseada em imperativos
categóricos (e abstractos) a uma ética material,
baseada em constelações objectivas de interesses.
• De uma interpretação lógica (sistemática) a uma
interpretação teleológica.
185
21-02-09
A jurisprudência dos interesses:
(Ph. Heck [1858-1943])

• Um objectivo limitado - a interpretação da lei (e não o


achamento livre do direito).

• Interpretação lógico conceitual vs. interpretação


pragmática ou finalista (de acordo com os interesses
em presença).

• A avaliação dos interesses é feita de acordo com os


critérios do legislador (um “legalismo inteligente”).

186
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O positivismo sociológico: Auguste Comte (1798-
1857) (i)

• O positivismo - uma ciência do geral (↔ “particular” e


↔ “individual”) → anti-individualismo.

• A sociologia como "fisiologia social", a-valorativa,


depurada de intenções normativas (religiosas, éticas);

• A ordem social não se funda no acordo de vontades,


mas em exigências objectivas da vida social,
concretizadas em instituições (transindividuais e
indisponíveis).

187
21-02-09
O positivismo sociológico: Auguste Comte (1798-
1857) (ii)

• As normas jurídicas, como "coisas objec-tivas",


indisponíveis e trans-individuais.

• O direito como produto de solidariedades sociais


objectivas geradas pela especialização e pela divisão
das funções sociais;

• O Estado como cume (provisório) da organização


social e agente de racionalização social (vicariando e
agilizando os impulsos naturais da solidariedade);

188
21-02-09
O realismo jurídico: Léon Duguit (1859-1928)

• Crítica da ideia de direito subjectivo como entidade


originária e fundadora;
• Crítica da ideia de soberania como poder político único,
exclusivo e residindo no Estado e como o produto da
delegação das vontades individuais.
• Particularismo jurídico;
• Recusa do dogma da igualdade jurídica dos homens;
• Crítica à limitação do Estado pelos direitos individuais e
recusa do primado dos direitos subjectivos sobre o
direito objectivo.

189
21-02-09
O institucionalismo:
Maurice Hauriou (1856-1929)

• A instituição como “coisa” ou “ideia”;

• As instituições são indisponíveis, não resultando das


vontades individuais ou da vontade do Estado → anti-
individualismo, anti-estadualismo;

• O direito vivo, espontâneo ou praticado (lebendiges


Recht, law in action) → anti-legalismo;

• Saberes jurídicos não normativos → anti-formalismo;

190
21-02-09
O sociologismo jurídico.
Traços comuns (i)

• Aplicações:
• Crítica ao formalismo conceitualista, em nome do direito
vivo (lebendiges, Law in action);
• Crítica (mitigada) do legalismo e do estadualismo;
• Crítica da forma individualista, democrática e liberal de
Estado (corporativismo, totalitarismo).
• Crítica das ideias "metafísicas" da teoria penal (como
"responsabilidade", "culpa”; "expiação", "retribuição");
• Crítica do individualismo no direito privado (propriedade,
limitações sociais ao poder de vontade).

191
21-02-09
O sociologismo jurídico.
Traços comuns (ii)
• Reflexos políticos:
• Vertente “progressista”:
• Laicização do Estado, expansão do ensino oficial
não confessional, crítica aos excessos do liberalismo
económico, certo comprometimento com os
movimentos socialistas;
• Vertente “conservadora” ou “reaccionária”:
• Anti-parlamentarismo e autoritarismo;
• Racismo e machismo;
• Estatização dos sindicatos;
• Coisificação e instrumentalização do homem.

192
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A reacção anti-naturalista

• A dualidade entre o mundo dos objectos e o mundo dos


valores (ou sentidos);
• A dualidade dos processos científicos (i.e., não metafísicos)
de conhecimento:
• Ciências da natureza (Naturwissenschaften);
• Ciências do espírito ou da cultura (Kulturwissen-
schaften).
• A irredutibilidade do dever ser ao ser; a irredutibilidade dos
“momentos jurídicos” (aos momentos sociológicos, políticos,
éticos) → jusnaturalismo, conceitualismo, estatalismo e
legalismo (temperados).

193
21-02-09
As escolas críticas. Karl Marx (1818-1883) e o
marxismo clássico (i)

• Uma ciência positiva global da sociedade:

• Uma ciência materialista (i.e., que explica os


produtos pelo processo histórico-material de
produção)  anti-idealismo, anti-estadualismo.

• ( o direito como “infra-estrutura”);


• ( o direito como “reflexo”);

• Um projecto revolucionário (não apenas “descrever”,


mas, sobretudo, “transformar”).
• ( o direito como “alavanca”). 194
21-02-09
As escolas críticas. Karl Marx (1818-1883) e o
marxismo clássico (ii)

• O direito como um produto “de classe”:


• nos seus conteúdos normativos (o exemplo do “roubo
de lenha”; a “ditadura do proletariado”);

• no seu funcionamento ideológico:


• a função mistificadora da generalidade e
abstracção: [“a majestosa igualdade das leis que
tanto proíbe ao rico como ao pobre dormir debaixo
das pontes, mendigar nas ruas e roubar pão”
(Anatole France)];
• o formalismo da liberdade contratual.
195
21-02-09
As escolas críticas. Karl Marx (1818-1883) e o
marxismo clássico (iii)

• O novo direito:

• Um direito ao serviço das classes revolucionárias (a


“ditadura do proletariado”, A. Vychinski e o conceito
terrorista do Estado);

• Um direito instrumental (liberto do “fetiche legalista”,


oportunista, casuista); a dissolução do direito na
política;

196
21-02-09
As escolas críticas. O marxismo ocidental dos anos
sessenta
• Contra o mono-causalismo:
• A rejeição do determinismo económico e o
reconhecimento da autonomia relativa dos vários níveis
de acção (L. Althusser);

• A rejeição do determinismo político: a distinção entre


“domínio” (político) e “hegemonia” (ideológica)(A.
Gramsci).

• Uma explicação autónoma do direito (“sobredeterminação”


jurídica, “modo de produção” do direito).
197
21-02-09
As escolas críticas. Critical legal studies e uso
alternativo do direito
• A “crítica do direito” (critical legal studies).
• os pressupostos ideológicos do direito (crítica à “ideia
de neutralidade”);
• o direito como construtor de ideologia (a construção
do género, da raça, da loucura, da liberdade
individual; o ocultamento da violência institucional,
“dura” ou “doce”).
• O “uso alternativo do direito”.
• o uso do direito contra o sistema;
• formar juristas mais esclarecidos e mais livres;
• a promoção da jurisprudência e dos juízes.
198
21-02-09
As escolas críticas. Portugal – 1974 (i)

• Componentes político-culturais do direito do Estado Novo:

• Positivismo legalista;

• Autoritarismo (sobre o direito judicial e sobre o direito


doutrinal)

• Conservadorismo de cobertura jus-racionalista.

199
21-02-09
As escolas críticas. Portugal – 1974 (ii)

• Componentes político-culturais:
• Deslegitimação do direito anterior à revolução + crítica
de democracia representativa  ideia de legalidade
revolucionária + reforma do sistema jurídico;
• Basismo político + dinâmica revolucionária  anti-
legalismo;
• Desconfiança nos juízes (compromisso político,
corporativismo)  justiça revolucionária;
• Compromisso político da Universidade + anti-
tecnicismo  reforma radical do ensino jurídico (FD-
UL);
• Anti-legalismo (de esquerda e de direita)  defesa da
criatividade da jurisprudência e neo-jusnaturalismo;
200
21-02-09
As escolas críticas. Portugal – 1974 (iii)

• Componentes legislativos:

• Constituição de 1976,
• reforma do direito de família,
• Reforma do direito do trabalho,
• abertura da magistratura a mulheres, etc..

201
21-02-09

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