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As Traduções de Yoram
#1 As escolhas são más
#2 As escolhas são mesmo más
#3 As pessoas são estúpidas
#4 As pessoas não são assim tão estúpidas
#5 O comércio pode ser prejudicial para todos
#6 Os governos são estúpidos
#7 Os governos não são assim tão estúpidos
#8 Blá, blá, blá
#9 Blá, blá, blá
#10 Blá, blá, blá
Explicações e Detalhes
À primeira vista, o leitor não pode deixar de ficar impressionado pela simplicidade e
clareza da tradução. Mas não se confunda aqui acessibilidade com superficialidade: uma
análise continuada revelará profundezas e subtilezas escondidas que premiarão
ricamente o estudante atento. Alguma reflexão permite-nos identificar um grande
número de mistérios e enigmas. Primordial entre todos eles, será provavelmente este:
Porque é que os princípios #8, #9 e #10 têm traduções idênticas?
A explicação óbvia e mais imediata é que aqueles são princípios macroeconómicos e
que eu, como microeconomista, não estou equipado para compreendê-los, muito menos
para traduzi-los.[2] Como acontece frequentemente neste mundo complexo em que
vivemos, esta explicação óbvia e mais imediata também é incorrecta. A verdadeira
razão porque atribuí as traduções idênticas «Blá, blá, blá» aos Princípios #8, #9 e #10, é
que estes princípios dizem precisamente o mesmo, nomeadamente «Blá, blá, blá». Um
dia em que tenha umas horitas para matar, vá perguntar a um economista — de
preferência, um macroeconomista — o que é que ele quer realmente dizer com os
termos «padrões de vida» ou «bens e serviços» ou «inflação» ou «desemprego» ou
«curto prazo» ou até «demasiado». Rapidamente percebe que há uma enorme diferença
entre, digamos, aquilo que o Princípio #10 diz — «A sociedade defronta-se com um
compromisso de curto prazo entre a inflação e o desemprego» — e aquilo que o
Princípio #10 significa — «A sociedade defronta-se com um blá de blá entre a blá e o
blá». As minhas traduções são simplesmente representações concisas destes significados
subjacentes.
Tendo clarificado este ponto, voltemos ao
Princípio #1: As pessoas defrontam-se com compromissos
Tradução: As escolhas são más
O raciocínio subjacente à tradução é óbvio. Imagine, por exemplo, que alguém o aborda
e lhe dá a escolher entre uma barra de chocolate Snickers e alguns M&Ms. Tem aqui
um compromisso, o que quer dizer que tem de escolher entre um e outro. E ter de
escolher entre uma coisa e outra é mau. Diz-se que o Presidente Truman pediu um
conselheiro económico com um só lado, porque os seus conselheiros económicos com
dois passavam a vida a dizer, «Por um lado... mas por outro lado...».
Aqueles que não receberam educação em economia podem ser tentados a considerar as
escolhas boas. Não o são. A ideia (errada) de que as escolhas são boas deve resultar da
ideia (igualmente errada) de que a falta de escolhas é má. Isto é simplesmente falso,
como revela Mancur Olson no livro A Lógica da Acção Colectiva, (The Logic of
Collective Action): «Dizer-se que uma situação está 'perdida' ou que não há esperança, é
de certa forma equivalente a dizer-se que é perfeita, pois em ambos os casos qualquer
esforço para melhorá-la não se traduz em resultados positivos».
Resulta daqui a minha tradução do primeiro princípio de Mankiw: As escolhas são más.
Este conceito pode ser de difícil alcance — nunca ninguém disse que a economia era
fácil — mas o leitor em dificuldades poderá ficar mais esclarecido com o
Princípio #2: O custo de uma coisa é aquilo de que abdicamos para obtê-la
Tradução: As escolhas são mesmo más
Para além de transformar a armadilha semântica de Mankiw na simplicidade em si
mesma, esta tradução tem a vantagem de estabelecer uma ligação entre o Princípio #1
(As escolhas são más) e o Princípio #2 (As escolas são mesmo más).
Continuando a aprofundar o entendimento do leitor sobre o facto das escolhas serem
más — mesmo más — voltemos ao exemplo anterior, onde lhe dão a escolher entre uma
barra de chocolate Snickers e alguns M&Ms. Suponhamos, à laia de argumentação, que
escolhe os M&Ms. Segundo Mankiw, o custo dos M&Ms é o chocolate Snickers de que
abdicou para ter os M&Ms. O seu ganho nesta situação — aquilo a que os economistas
chamam o «lucro económico» — é, portanto, a diferença entre o valor que ganha ao
receber os M&Ms (digamos, €.75) e o valor que perde ao abdicar do chocolate Snickers
(digamos, €.40). Por outras palavras, o seu lucro económico é de apenas €.35. Embora
avalie os M&Ms a €.75, ao ter a possibilidade de escolher o chocolate Snickers reduz o
seu ganho em €.40. Em consequência, temos o Princípio #2: As escolhas
são mesmo más.
De facto, quanto mais escolhas tiver, pior estará. A pior situação de todas seria que
alguém o abordasse e lhe desse a escolher entre dois pacotes idênticos de M&Ms.
Porque escolher um pacote (que avalia em €.75) significa abdicar do outro (que também
avalia em €.75), o seu lucro económico é precisamente zero! Portanto, ser-lhe dada a
possibilidade de escolha entre dois pacotes idênticos de M&Ms, é na verdade
equivalente a não lhe ser dado nada.
Ora, pode-se desculpar um leigo por julgar que ser-lhe dada a possibilidade de escolha
entre dois pacotes idênticos de M&Ms é, na verdade, equivalente a ser-lhe oferecido um
único pacote de M&Ms. Mas os economistas não acreditam nisso. Ser-nos oferecido um
único pacote de M&Ms significa, efectivamente, escolher entre um pacote de M&Ms
(que avaliamos em €.75) e nada (que avaliamos em €0). Escolher os M&Ms resulta num
lucro económico de €.75, o que é €.75 mais do que quando nos é dada a escolha entre
dois pacotes idênticos de M&Ms.
Chegados a este ponto vale a pena reconhecer que (1) há leitores que não
compreenderam na totalidade as subtilezas supra, e (2) esses leitores poderão muito bem
ter começado a pensar se não serão, numa palavra, estúpidos. Quaisquer dúvidas que
subsistam deverão ser eliminadas pelo
Princípio #3: As pessoas racionais pensam marginalmente
Tradução: As pessoas são estúpidas
Um ponto que é imediatamente óbvio, mesmo para o observador mais casual de
inteligência mediana, é que a maioria das pessoas não pensa marginalmente. Por
exemplo, a maioria das pessoas que compram laranjas na mercearia pensa assim: «Hum,
laranjas a €.25 cada. Acho que vou comprar meia dúzia.» Não pensa assim: «Hum,
laranjas a €.25 cada. Vou comprar uma porque o meu valor marginal excede o preço de
mercado. Agora vou comprar uma segunda, porque o meu valor marginal ainda excede
o preço de mercado...» Nós sabemos que a maioria das pessoas não pensa assim, porque
a maioria das pessoas não enche o cesto das compras laranja a laranja!
Mas agora somos inexoravelmente conduzidos a uma conclusão deveras infeliz. Se —
como afirma Mankiw — as pessoas racionais pensam marginalmente e se — como
todos sabemos — a maioria das pessoas não pensa marginalmente, então a maioria das
pessoas não é racional. A maioria das pessoas, por outras palavras, é estúpida. Em
consequência, temos a minha tradução do terceiro princípio da economia: As pessoas
são estúpidas.
Antes de cair no desespero pelo destino da raça humana, no entanto, sensato seria que o
leitor considerasse o
Princípio #4: As pessoas respondem aos incentivos
Tradução: As pessoas não são assim tão estúpidas
O dicionário diz que um incentivo, s.m., é 1. aquilo que leva à acção; estímulo;
encorajamento. SIN. ver motivo.
Então aquilo que Mankiw aqui diz é que as pessoas são motivadas pelos motivos, ou
que as pessoas são levadas à acção por coisas que levam à acção. Ora, isto pode parecer
um pouco como dizer-se que as tautologias são tautológicas — o leitor poderá estar a
pensar que as pessoas teriam de ser bastante estúpidas para serem desmotivadas pelos
motivos, ou ficarem inactivas em resposta a algo que as leve à acção. Mas lembre-se do
Princípio #3: As pessoas são estúpidas. Em consequência, temos a necessidade do
Princípio #4, para clarificar que as pessoas não são assim tão estúpidas.
Só as pessoas verdadeiramente estúpidas poderiam não compreender a minha tradução
do
Princípio #5: O comércio pode ser benéfico para todos
Tradução: O comércio pode ser prejudicial para todos
Mas, poderá estar o leitor a perguntar-se, a tradução do quinto princípio não é o exacto
oposto do próprio princípio? Claro que não.
Para ver porquê, note primeiro que «o comércio pode ser benéfico para todos» é
patentemente e obviamente isto: se eu tenho um chocolate Snickers e quero M&Ms e tu
tens M&Ms e queres um chocolate Snickers, podemos trocá-los e saímos ambos
beneficiados. Mankiw refere-se com certeza a algo mais profundo do que isto? De facto,
eu acredito que sim. Para ver a quê, compare as seguintes frases:
A: O comércio pode ser benéfico para todos
B: O comércio vai ser benéfico para todos
Aqui, a Afirmação B é claramente superior à Afirmação A. Por que, então, é que
Mankiw usa a Afirmação A? Só pode ser porque a Afirmação B é falsa. Ao afirmar que
o comércio pode ser benéfico para todos, Mankiw tenta transmitir uma das subtilezas da
economia: o comércio também pode não ser benéfico para todos. Um pequeno passo
leva-nos daqui até à minha tradução, «O comércio pode ser prejudicial para todos»
(encontra uma demonstração matemática nesta nota de rodapé[3]).
A subtileza evidenciada pelo Princípio #5 pode ver-se mais claramente ainda nos dois
princípios seguintes.
Princípio #6: Os mercados são normalmente uma boa forma de organizar a
actividade económica
Tradução: Os governos são estúpidos
Princípio #7: Os governos podem por vezes melhorar os resultados dos mercados
Tradução: Os governos não são assim tão estúpidos
Para ver o papel fulcral que o Princípio #5 tem nestas duas afirmações, note que a
formulação original do Princípio #5 («O comércio pode ser benéfico para todos») nos
conduz ao Princípio #6 («Os governos são estúpidos»). Afinal de contas, se o comércio
pode ser benéfico para todos, para que é que precisamos do governo? Mas a tradução do
Princípio #5 («O comércio pode ser prejudicial para todos») conduz-nos ao Princípio #7
(«Os governos não são assim tão estúpidos»). Porque, afinal, se o comércio pode ser
prejudicial a todos, é melhor termos ali um governo que impeça as pessoas de
comerciarem!
Tal como os primeiros cinco princípios, os Princípios #6 e #7 demonstram as finas
distinções inerentes ao modo económico do pensamento. As pessoas são estúpidas, mas
não assim tão estúpidas; o comércio pode ser benéfico para todos, mas também pode ser
prejudicial a todos; os governos são estúpidos, mas não assim tão estúpidos. Explorar,
definir e delinear estas distinções é o tema das aulas avançadas de economia, das
dissertações doutorais em economia e da vasta maioria dos papersna American
Economic Review e noutros jornais académicos. Se o leitor decidir seguir este percurso,
os princípios fundamentais descritos na primeira página deste artigo serão um guia
imprescindível.
Notas