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NOTA & DE EPrirerRra A concretizagaéo do Senhor a proposito da leitura d’O Evangelho de Judas Neste sentido, 0 texto que agi nos tn, rio & um. Evangelho em: sentido pleno ¢ tradicional Nao, ndo se trata de un livro sobre Jesus, ras sins sore Judas Nunn deveria ser tum «Etxangetho segundo Judas», mas sim tun eeoangelho de Judase, 0 seu ecto» Isto é este livre nito é 0 Evangeiho [de jesus) segundo Judas, mas sim (0 Euangetho de judas segundo jesus] Paulo Mendes Pinto Centro de Estudos em Ciéncn das Religies, Bolsero da Facto paraa Ciencia e Tecnologia Reiss Lesdrona og CINE Das RELctons~ Ano V, 2006 1.°9/10 31 Eaitado recentemente, segundo tradugao directa do original com cerca de 1700 anos, no site da National Geographic Society , O Eomigeliia de Judas levantou um large conjunto de reflexdes por todo o universo acadé- ico e religioso* £ com base neste texto apdcrifo, j4 referido por Ireneu de Leao no século II, aquando do inicio do Processo de criagéo do corpus que integra 0 chamado Novo Testamento, que faremos um conjunto de refle- xBes que nao pretendem ser mais que pequenos e sim- ples contributes para um caminho prOprio de cada Ieitor. Deseu nome Jucias Iscariotes, este personagem foi dos mais odiados dla Historia da Humaniclade. Seguindo 0 Novo Testamento, Judas era um dos discipulos de Jesus, @ nos clerradeiros dias deste, em Jerusalém, traiu-o pelas, célebres 30 moedas, entregancio-o aos ramanos, A ideia geralmente difundida diz-nos que esta sua acco teve como motor a sua ganancia ou, noutra leitura complementar, a influéncia clo deménio. Di- zem-nos os textos sobre a vida de Jesus e dos primei- 10s cfistdos que, com a marca de um remorso acima da sua capacidade humana, se teria suicidado, en- forcando-se. Noutras versdes, seguindo o Alcorio, itlps// wrew.nattonalgeographic.com/ lostgospel/_pdf/Gospelof Judas pa *Actuslmente js exstom duas edigdes portuguesas. A primeica, por ‘nds apresentada no dis 4 de Julho, da responsabilidade ds @squilo, com tuadugia do original por Antonia Pineso Sofia Torallas-Towat. 26 315 Esrawre ~ Nora ve Lerrura = Pauto MEnDes Pivro por exemplo, Judas foi crucificado como punicao pela traicao. Noutras ainda, segundo Papias, por volta do ano 100, Judas teria inchado enormemente, apo- drecendo vivo. Encerrado desde muito cedo nas paredes de um mito intransponivel, Judas pas- souaser, durante dois milénios, a imagem plena, terminada, do deicidio dos Judeus. Pela metéfora que é Judas, a sua vida ea sua venda do Mestre, muita gente tera moz- rido, identificada com essa falha quase-original de um judeu que, aliés, tinha um no- me que facilmente parecia ser, afinal, todos os nomes dos judeus («Judas» como ima- gens dos «judeus»), Sempre relacionados, anfvel de imagem, coma usura, a cobranca de impostos, o lucto, Judas e as suas 30 moedas eram a imagem perfeita de quem tudo vendia, até Deus. 56 relativamente préximo de nésa Igreja Catélica apagou totalmente, em proceso que ja vinha do Coneilio de Trento, a imagem totalmente negativa de Judas. O nosso adagirio, e mesmo a forma como definimos as palavras s4o imagem do que sobre Judas se pensou, e pensa, no Ocidente cristao. Consultando 0 Diciondvio Houaiss da Lingua Portuguesa, temos um vislambre de como © simbolo, a imagem, ultrapassou o sentido estrito do nome. De facto, 0 pri meiro sentido indicado nesse moderno dicionario € metaforico, dizendo-nos que ‘a metéfora passou para primeiro lugar no campo dos significados. E diz, 0 sen- tido metaférico: “individuo que trai a confianga de alguém; traidor.” $6 depois, em altimo luger no elenco dos senticios, vem o literal, 0 que nos diz a origem do nome’. Num oficio ortodoxo da Semana Santa ainda se diz, com toda uma carga ver- dadeiramente arrasadora sobre Judas (4.° Stikeron): Judas, 0 traidor, ern sua perfidia, ‘eittregou cont unt beija inéquo 0 Senhor, nosso Salvador. Ele vender: nos Jucteus, conto a went escravo, 0 Sertlor de todas as coisas. Como um cordeivo conduzido ao matadouro, assim o seguia 0 Conieiro de Deus, 0 Filho do Pai, 0 Unico infinitamente nisericordioso’. Mas o centro da nossa questao, desta reflexio, nao se encontra na perseguicdo de que os juceus foram alvo por parte dos cristaos até a actualidade, Nao que a questo nao seja significativa e no nos merega o maior dos respeitos. A nossa abordagem vai num outro sentido: de que forma pode ter nascido o Cristianismo se, logo & nascenga, com 0 episédio de Judas, parece ter esquecido a sua definicao teologica mais profunda? ‘Com ou sem Judas, Jesus 56 seria o Cristo, se morto. Numa matematica talvez um pouco simplista, dirao muitos, o Cristianismo apenas existe porque Jesus foi morto, podendo, assim, ressuscitar. Se nao ressuscitasse, Jesus nunca seria 0 Messias, 0 Cristo. Ora, para regressar do mundo da morte, Ble teria de lA ir; e sé la poderia ir, semorresse. E esta a base desta nova religifo, base esta que apenas pode ter tido lugar se, de uma forma qualquer, o seu personagem central morrer. >Vaj-te o Toro IV, p. 2189, “Veja-se (consultade por nés em Julho de 2006), 316 Revista Luscrowa oe Citwcia Das Reucioes ‘A ProrOsiro 04 Lertura 0'O EVANCELHO bE JUDAS Mais, ¢ esta linha, defendida por toda a tradigéo do Antigo Testamento, que 0 proprio Jesus cita tanta vez; é esta a tradicdo religiosa que no Médio Oriente Antigo vemos ser cimentada ao longo de trés milhares de anos até ao momento em que Jesus, para ser um Cristo, teria de morrer, Judas € a imagem dessa necessidade de Jesus morrer, uma necessidade da qual, afinal, todos os discipulos estariam cientes, quer pela boca do seu Mestre, quer pelas leituras dos profetas do Antigo Testamento. O importante é que, apesar deste ver- dadeiro e inegavel conhecimento generalizado entre os discfpulos de que Jesus mor- reria, parece que nenhum deles encarou coma devida "normalidade” a situacdo es- perada e, convenhamos, desejada. —ti= De facto, 0 centro da nossa reflexdo sobre a personagem Judas encontra-se na aparente tensdo entre o que seria suposto os cliscfpulos saberem e 0 que nos é mos- trado que sabem, No limite, uma acgao de ensino-aprendizagem que durou cerca de trés anos (a fase de pregacao publica de Jesus), o mesmo que actualmente um Curso Superior, deveria ter desembocado em algo mais que, por exemplo, um Pedro que recusa a ideia de Jesus morrer, ¢ isto ja no final do terceiro ano... Seria a ideia de ressurreicao estranha ao tempo e a area em que 0s discipulos se movimentavam? Nada o leva a considerar. A ideia de ressurreigao estava tao en- raizada que até Herodes, ao saber dos milagres de Jesus, teré dito: Esse homvemt é Joo Baptista! Ressuscitou dos mortos e, por isso, se manifestam nele tais poderes miraculosos*, Sobre a anterioridade desta ideia, que mitologicamente podamos remeter para mais de dois milénios antes, nos debrucaremos mais & frente. Fiquemos agora pelo discurso de Jesus. Muitas foram as ocasides, por comparagdes, ou de forma directa, quie Jesus levou aos seus discipulos a ideia de que iria morrer, como estava profetizado, Uma das tages, talvez imageticamente uma das mais interessantes, tem como paralelo a historia de Jonas: fexto teolégico para a morte de Jesus Mateus (12,39-40): Ele respondents: «Geragio mi e adiiltera! Reclama um sinnl, mas nfo the sera dado outro sinal, a nifo sero da profeta Jonas, Assim como Jonas esteve no ventre do monstro marinho, trés dias e tres noites, assim o Filho do omen estard no seio da terva, trés dias ¢ trés woites.* De resto, e de forma explicita, clara, sem sombra para clividas, verdadeiramente oficial, acabando com a interpretagao de que Jesus ou o Filho do Homem era Joao Bap- tista, desde Mateus (16,13-20) que todos os discipulos sabiam que Ele era o Messias: Ao chegar 8 regio de Cesarvia de Filipe, Jesus fez a seguinte pergunia aos seus ddiscipulos: «Quem dizen os homens que é 0 Filho do Homent?» Eles responderam: «Uns dizein que é Josio Baptista; outros que & Elias; e outros que é Jeresmias ou "Mateus (14.2), muito semelhante a Marcos (614-16) ea Lucas (97-5), este, menos convicto nas palaveas air bbuidas a Herodes, mas sists outins pessoas, “Vejase jonas 2 "Discurso repotido, deforma quase acults, em Mateus (161-4 Rewora Lusorowa OF Ciencia DAs REUGIOES 317 Estanre ~ Nora DE Lemna ~ Pauto Mewoes Piura alguin dos profetas», Perguntou-thes de novo: «E vds, quem dizeis que Eu sou?» To- ‘mando a palavre, Siméo Pedro respondeu: «Tu és 0 Messias, 0 Fillio do Deus vivo.>* Logo depois (em Mateus, logo em 16,21, em Marcos 8,31, e Lucas 9,21") dé-se 0 chamaclo ancincio da Paixao, A partir deste momento, todos os discipulos sabem que a concretizacao do sentido cle Messias implica a sua morte como estava profetizado: Mateus (16,21): A partir desse momento, Jesus Cristo comegou a fazer ver aos seus discfpulos que tinha de ir a Jerusalém e sofrer muito, da parte dos ancitis, dos sumos sacerdotes ¢ dos doutores da Lei, ser morto e, ao terceiro di, ressuscitar. Ora, no seguimento desta descricéio, nos versiculos seguintes, da-se o maximo da incongruéncia na visio messianica dos discipulos. Poucos versiculos antes, Pedro fora colocado a declarar Jesus como Messias, seguindo 0 jé entéo declarado Cristo para a famosa tirada em que diz que sobre Pedro edificaria a sua Igreja (Mateus 16,18), agora, perante a informagao do que isso implicava, o mesmo Pedio diria: Mateus (16,22): Tomando-o de parte, Pedro comecou a repreendé-lo, dizendo: «Deus te livre, Senhor! Isso nunca te iné-de acontecer!» Pedro nao percebia, logicamente, nada cie nada. Mas mais, e reforgando as leituras que dao como espuirias as interpretacdes catélicas dos versiculos anteriores: Jesus, inritado, longe de reafirmar que Pedro é 0 seu paladino, sobre o qual edificaria a sua igreja, afirma: Mateus (16,23): Afasta-te, Sntanis! Tu és parn mim um estorvo, porque os teus peusanierttos no sito os de Deus, nis 0s dos homens! Confirmando a sua catequese, pouco depois, no versiculo imediatamente sequente (Mateus 16,24.25), Jesus afirmara sobre a dimensdo Libertadora e desejada que ¢ a morte: Se alguén: quiser vir comigo, renuincie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-mte, Quem quiser salvar a sua vida, vai perdé-la. Mas estes seus ensinamentos, em pleno enquadramento cultural, justificados e necessdrios pelos ensinamentos cos profetas, pareciam ter pouco eco em alguns dos disctpulos. De facto, perante esta situacdo, nao € de estranhar a forma como Pedro reage, posteriormente, & prisao no Monte as Oliveiras, Pedro continuava a nao perce- ber que ser 0 Messias implicava ressuscitar dos mortos e, por ineréncia material desse facto, morrer antes. E complexo olhar para 0 “processo de aprendizagem” dos discipulos de Jesus" = muitos podem afirmar que tal no era necessario, a inspiragdo tudo faria. Temos poucos dados e, em especial, dispersos por variados quadros. Contudo, nao deixam de surgir com peso algumas situagdes de franca incapacidade teolégica. Pedro cone cretiza a maior parte delas. Mas Jesus tem consciéncia desse facto: ainda neste rico capitulo 16, logo a seguir (28), Jesus diz. que a salvagao nao sera para todos os pre- sentes, mas s6 para alguns dos discipulos. {ste epinddo surge nos restates Evangethoscandnicos: Marcos (829-30), Lucas (18-21) e Jos (657-7), ‘Joao ni da este encadeamento narrative, "Virias outras vezes, nomendamente & medida que a data da sua morte se aproximavs, Jesus tornou a afte ‘mar a nacessidade da sun Pai. Em Mateus 26,2, Ele ¢, mais uma vex, elaro: Como sabes Pésan@ dag dats dias, Fillo so Hoosen sera entregue a ser erufcu. 318 Revista Lusorona De CiENcia 0A Re ‘A Prordstro 0A LerTuaa D'O EVANGELHO De JUDAS ‘Também quase todaa historia do Cristianismo, pelos dois milénios seguintes, no percebeu que Judas apenas concretizou 0 que éra essencial a esse simples facto: Jesus tinha de morrer. Numa forma muito usada no Antigo Testamento, judas pode ser entendido como um braco de Deus, um instrumento dos seus designios Apesar de muito enraizada, essa visio em toda um Histéria Mitolégica vem desde, pelo menos, a Suméria, com mitos de descida aos infernos como os de Innana, perante as dificuldades cle Pedro, a verdade é que parece que toda uma cultura es- queceu, de repente, essas enormes herancas. Talvez este processo, a fuga a uma morte necessétia e desejada do Messias, para encarnar a ideia messianica, tenha ocorrido por necessidade de identidade, fuga a tantas outras religiGes que desse dado compartilhavam. Ou, noutro ponto de vista, por fendmenos conjunturais, também eles de identidade e de afastamento ao mundo judaico, apés destruicao de Jerusalém em 70. Terd sicio desde sempre Jucias declarado um traidor que agiu apenas por sua res- ponsabilidade, movido unicamente pela ganancia ou pelo “maligno”? Num confronto entre aqueles que passaram para a Histéria como totalmente opostos, Pedro, o discipulo sobre o qual Jesus formou o seu grupo, Judas, o que o traiu, parece inequivoco o julgamento comum: um personifica 6 Bem ¢ 0 outro 0 Mal. Mas nao poderao estar os papéis um pouco distorcides? Ou melhor, extremados entre cores opostas, esquecendo o ilimitado manancial da paleta das tonelidades? No chamado «segundo antincio da Paixao» (Mateus 17,22-23; Marcos 9,30-32 ¢ Lucas 9,43-45), Jesus especifica de forma muito precisa o processo em que Judas es- tard implicado. O centro encontra-se no verbo «entregue»: O Fillio do Homem tem de ser entregue nas mifos dos homens, que o muatardo; nas, ao terceiro dia, resswscitard. A for- ma como a accao ¢ apontada implica um agente; esse agente seria Judas. Mais que morrer, a morte tem de vir num processo em que ha um agente. Como que dando “razio” ao Judas que nos é oferecido no evangelho como seu nome, Marcos (9,32) acrescenta uma preciosa frase que Mateus esqueceu: Mas eles [os discfptlos] nao entendiam esta linguagem - Lucas segue, em certa medida, Marcos, mas dando a entender que nao compreendiam porque era um conhecimento que Ihes es- tava vedado ou inacessivel (Lucas 9,45). Fintas da Historia, Pedro dificilmente parece ter percebido a ideia de messianismo do seu Mestre; contudo, foi ele 0 “construtor” da sua Igreja. Judas} vendeu o seu Se- nhor pelas eélebrestrinta moedas, mas foi ele que possioilitou gle Jesus se wane, formasse no Cristo A iimagem de fades através dos trechos dos Evangethos candnicos Vejamos agora um breve resumo dos trechos onde, nos quatro Evangelhos canéni- cos, surge Judas. Na medida do possivel, iremos comparar algumas das formas de apresentar este personagem e as suas acgoes, Elei¢ao dos doze Mateus (10,1-4): Sao estes os nomes dos doze Apéstolos [..] e Judas Is- cariotes, que o traiu, Revista Lusorowa De Ciéncra pas RELCIOES 319 Estawre ~ Nora pt Lertura ~ Pauso Menpes Pivto Marcos (3,14-19): ’stabeleceu estes doze: [..] e Judas Iscariotes, que oen- tregou. Lucas (612-16): [..] aos quais deu o nome de Apéstolos:[...] e Judas Is- cariotes, que veio a ser o traidor. estes breves trechos, parece claro que é Lucas que vai mais longe na caracteri- zacdio negativa de Judas. Nenhum “esquece" deo epitetar de forma clara; mas Mar- cos apenas afirma que 0 “entregou"; Mateus vai um pouco mais, usando o verbo trair; mas é Lucas que mais desenvolve a ideia. Joao, que nao descreve esta cena, acrescenta ao corpus uma outra que, sem interes- se demasiado na narrativa total dos Evangelhos, muito de contetido sobre a visto de Judas nos apresenta: Maria de Betdnia unge o Senhor Joao (12,4-8): Nessa altura, disse um dos discipulos, Judas Iscariotes, aque- le que havia de o entregar: «Porque é que nao se vendeu este perfume por trezentos dendrios, para os dar aos pobres?» Ele, porém, disse isto, nao por- que se preacupasse com os pobres, mas porque era ladrao e, como tinha a bolsa do dinheiro, tirava o que nela se deitava, Entao, Jesus disse: «Deixa que ela o tenha guardado para o dia da minha sepultura! De facto, os pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nao me tendes sempre», Joao é, aqui, bastante rico na caracterizagao de Judas. Escrito, logicamente, apés 0s acontecimentos da paixao, este trecho serve claramente para preparar uma Visio ligada ao monetario, um espirito em tudo tolhido pelo material, pelo lucro. E interessante, até, verificar a possivel comparacao com a verba que Judas obteve pela venda de Jesus: 30 moedas, contra 0s 300 dendrios aqui mencionados. Amiincio(s) da traicao Mateus (26, 14-16): Entao um dos Doze, chamado Judas Iscariotes, foi ter comos sums sacerdotes e disse-Ihes: «Quanto me dareis, se eu vo-lo entre- gar?» Eles garantiram-Ihe trinta moedas de prata. E a partir de entao, Judas procurava uma oportunidade para entregar Jesus Marcos (14, 10-11): Entao, Jucias Iscariotes, um dos Doze, foi ter com os sums sacerdotes para lhes entregar Jesus. Eles ouviram-no com satisfacéo ¢ prometeram dar-lhe dinheiro. E Judas espreitava ocasio favoravel para entregar. Lucas (22, 3-6): Satands entrou em Judas, chamado Iscariotes, que era do ntimero dos Doze. judas foi falar com os sumos sacerdotes e os oficiais do templo sobre o modo de Ihes entregar Jesus. Eles regozijaram-se e com- binaram dar-lhe dinheiro. Judas concordou e procurava ocasio de o entre- gat, sem a multidao saber. 320 Revista Lusorows 0F CeNetA bas Revises A Prordsiro 04 LetTua 0’O EVANGELHO De JuDas Joao (6,70-71): Disse-lhes Jesus: «Nao vos escolhi Eu a v6s, 0s Doze? Contudo, um de vés é um diabo.» Referia-se a Judas, filho de Simao Iscario- tes, pois esse é que viria a entregé-lo, sendo embora um dos Doze. Joao (13,2): O diabo ja tinha metido no coragao de Judas, filho de Simao Iscariotes, a decisaio de o entregar. Neste episédio, temos claramente dois grupos, duas visdes. Por um lado, Mateus € Marcos; por outro, Lucas e Joao, Os dois primeiros nao escondem o facto de a accao ter partido de Judas e de ele ter recebico por isso. Mas os dois seguintes vao imen- samente mais longe. Enquanto os dois primeiros apresentam uma atilude de livre consciéncia, donde, eventualmente, até articulada com Jesus, se ambos assim o en- tendessem necessario para a construcao do Cristo; no segundo caso, a ideia da cons- trugio teolégica do Messias esta totalmente posta de parte. De facto, Lucas e Joz0 remetem a traicao para um quadro de demonizagio de Judas, onde desaparece to- talmente qualquer ideia da necessidade de Jesus morrer, Enesta diferenca, diriamos nés, abissal, entre Marcos/Mateus e Lucas/Jofo que se encontra o nascimento do mito de Judas. Um mito que perdurara cerca de dois milénios, baseado nessa relacao entre a sua acc4o e o oposto a Deus, 0 deménio, A acusagiio Mateus (26, 21-25): Enquanto comiam, disse: «Em verdade vos digo: Um de vés me ha-de entregar.» Profundamente entristecidos, comegaram a per- guntar-lhe, cada um por sua vez: «Porventara serei eu, Senhor?» Ele res- pondeu: «O que mete comigo a mo no prata, esse me entregard. O Filho do Homem segue o seu caminho, como esté escrito acerca dele; mas ai daquele por quem o Filho co Homem vai ser entregue. Seria melhor para esse homem nao ter nascido!» Judas, o traidor, tomou a palavra e perguntou: «Porventura serei eu, Mestre?» «Tu o disseste» ~ respondeu Jesus. Marcos (14, 17-21): Chegada a tarde, Jesus foi com os Doze. Estavam & ‘mesa a comer, quando disse: «Em verdade vos digo: um de vés hé-de en- tregar-me, um que come comigo.» Comecaram a entristecer-se ea dizer-lhe, um apés outro: «Porventura sou eu?» Jesus respondeu-lhes: «fi um dos Doze, aquele que mete comigo « mao no prato. Na verdade, 0 Filho do Homem. Segue 0 seu caminho, como esté escrito a seu respeito; mas ai daquele por quem o Filho do Homem vai ser entregue! Melhor fora a esse homem nao ter nascido!» Lucas (22, 21-23): «No entanto, vede; a mao daquele que me vai entregar esta comigo a mesa! O Filho do Homem segue o seu caminho, como esta determinado; mas ai daquele por meio de quem vai ser entreguel» Comeca- rama perguntar uns aos outros qual deles iria fazer semelhante coisa Joao (13,21-30}: Tendo dito isto, Jesus perturbou-se interiormente e de- clarou: «Em verdade, em verdade vos digo que um de vés me ha-de entre- gar!» Os discipulos olhavam uns para os outros, sem saberem a quem se refe- Revista Lisorowa DE CIRNCIA DS Rete 321 Estavre ~ Nora 0¢ Lerrura ~ Pauto Menoes Puro ria. Um dos discipulos, aquele que Jesus amava, estava a mesa reclinado no seu peito, Simao Pedro fez-Ihe sinal para que lhe perguntasse a quem se refe- tia, Entao ele, apoiando-se naturalmente sobre o peito de Jesus, perguntou: «Senhor, quem €?» Jesus respondeu: «E aquele a quem Eu der 0 bocado de Pao ensopacio.» E molhou 0 bocado de pao, deu-o a Judas, filho de Simao Is- cariotes. E, logo apés 0 bocado, entrou nele Satands. Jesus disse~lhe, entao: «O que tens a fazer fé-lo depressa.» Nenhum dos que estavam com Ele & mesa entendeu, porém, com que fim Iho dissera. Alguns pensavam que, como Judas tinha a bolsa, Jesus Ihe tinha dito: ‘Compra o que precisamos para a Festa’, ou que desse alguma coisa aos pobres. Tendo tomado 0 bocado de pao, sait logo. Fazia-se noite. Em conjunto com o episédio anterior, o do aniincio, este, da acusacéo, é o cere da visio sobre Judas. Neste episédio, que sintomaticamente a tradigio crista tratou de cristalizar como «acusacao», temos 9 antincio piblico, por parte de Jesus, que algum dos 12 o iré entregar ou trair. Vejamos as diferentes versGes e nuumices Nos trechos de Mateus e de Marcos a situacao em tudo poderia encaixar com o que encontramos no Evangelho ile Judes (apesar de apenas um deles indicar exacta- mente Judas). Podemos mesmo artiscar uma leitura de Mateus aos olhos do texto sobre Judas, Essa leitura faria realgar o que Jesus diz: Judas entrega, nao trai, o que pode denotar uma acco concertada, necessaria, de conhecimento miituo ~ a frase onde Jesus afirma que 0 Filho do Homem segue o seu caminho dé exactamente a ideia da inalterabilidade dos factos que irdo ocorrer; mais, Mateus da realce ao facto de Judas comer do seu prato, 0 que atestaria a proximidade muito grande entre am- bos. Mesmo a afirmacao de que seria melhor Judas, pela accéo que iia fazer, nao ter nascido, pode remeter-nos para 0 quadro que no Evaugello de judas nos é dado quando Jesus mostra a Judas como ele seré maldito pelos tempos. Mais uma vez, temos uma coeréncia entre Mateus e Marcos. Passando a Lucas, a sittacao aparenta ser diferente. E diferente e, em primeiro lugar, na economia da narrativa: neste caso, 0 antincio esta depois do chamado «clom eucaristico», ao passo que em Mateus e Marcos est4 antes. Em segundo lugar, porque o trecho nao esté to “completo” como os anteriores. Lucas nunca afirma, neste trecho, que era Judas 0 traidor. Noutros trechos dis- se-o. Mas aqui, apenas indica que é um dos 12, ou que é um dos que come com Jesus, repetindo a formula de identificacao por proximidade jé usada em Mateus ¢ em Mar. Gos, Saberia “este” Lucas que era Judas? Ou néo seria um dado importante? O que surge da mensagem é uma bipolarizacao: sea leitura for leita com os olhos de quem. leu Joao, a frase inicial é uma acusagdo contra um inominado; se a leitura for feita Com outros olhos, podemos estar perante no uma acusacio, mas a afirmacio de veri- ficactio de que tudo se estava a passar como era suposto pelas Escrituras Joo é, como ja se constatara na passagem anterior, outro mundo. Se parece que Lucas ndo sabe exactamente o que dizer, Jodo sabe demais. Neste caso, Joo é um compromisso entre o que sabe e o que quer transmitir, No seguimento dos trechos anteriores, © que quer transmitir é uma visao negativa de Judas: comeca por criar uma ambiéncia terrifica, continua a usar a imagem do diabo. 322 Revista Lusorona ve Citscia Das Reuiciées ‘A ProOsiTo DA Lerrura 0'O EVANGELHO De JUDAS Mas ha dois factos de inesperado significado. O primeiro, e muito usado cinema- tograficamente, usa a imagem de Mateus, Marcos e Lucas da proximidade alimen- tar, comer do mesmo prato, mas altera-lhe o que Lucas tinha levado longe: de f6r- mula de incognita, passamos a ter um dedo indicador. Marcos e Lucas tinham usado desta forma a indicagao do rito alimentar; estes, nem sequer tinham levado a narra~ tiva ao ponto de Judas se acusar, como o fez Mateus (neste caso, é Judas que percebe @ jogo vocabular e de intengio de Jesus e se sente apontado, reagindo). joao 6 0 tinico gue torna claro, por via da accao de Jesus, quem € 0 traidor. Neste trecho de Joo, 0 jogo de senticos em torno da proximidade perde-se, como quem leu mal um livro & depois o tenta reproduzir, fuginco ao dbvio. Mas Jodo vai ainda mais longe na alteracdo das eventuais fontes que poderiam ter sido comuns a si e aos sindpticos. Ficando claro, para quem ouvira o discurso de Jesus, que o traidor era Judas, Jesus pede-lhe para cumprir o seu dever rapidamente Nada nesie final de trecho indica que a acco de Judas era contraria ao que deveria ser; 0 que nos aparece em texto é mesmo o oposto a esta ideia: Jesus diz a Judas para este fazer 0 que é suposto ser feito, Naturalmente, os restantes nada perceberam, Assim, este trecho de Joao continua a identificar Judas com a figura do deménio, um traidor, mas nfo pode passar ao lado de alguns elementos nesta acco, que se- riam por demais importantes e que séo, em nosso entender, portas de entrada num. outro campo da historia, A ptisio Mateus (26,47-51): Ainda Ele falava, quando apareceu Judas, um dos Doze, ecom ele muita gente, com espadas e varapaus, enviada pelos sumos sacerdotes e pelos ancidos do povo. O traidor tinha-lhes dado este sinal: «Aquele que eu beijar, é esse mesmo: prendei-o.», Aproximou-se imediata- mente de Jesus e disse: «Salve, Mestre!» E bejou-o. Jesus respondeu-the: «Amigo, a que vieste?» Entdo, avangaram, deitaram as maos a Jesus e pren- deram-no, Marcos (14, 43-46): E logo, ainda Ele estava a falar, chegou Judas, um dos Doze, e, com ele, muito povo com espadas e varapaus, da parte dos sums sacerdotes, clos doutores da Lei e dos anciaos. Ora, o que o ia entre- gat tinha-lhes dado este sinal: «Aquele que eu beljar é esse mesmo; prendei- Oe levai-o bem guardado». Mal chegou, aproximou-se de Jesus, dizendo: «Mestre!»; e beijou-o. Os outros deitaram-lhe as miios e prenderam-no. Lucas (22,47-48); Ainda Ele estava a falar quando surgi uma multidao de gente. Um dos Doze, o chamado Judas, caminhava a frente e aproximou- se de Jesus para o beijar, Jesus disse-lhe: «Judas, € com um beijo que entre- a8 0 Filho do Homem? Joao (18,2-8): Judas, aquele que o ia entregar, conhecia bem 0 sitio, por- que Jesus se reunia ali frequentemente com os discfpulos. Judas, entao, guiando o destacamento romano e os guardas ao servico dos sumos sacer- dotes ¢ dos fariseus, munidos de lanternas, archotes e armas, entrou 1a. Jesus, sabendo tudo o que Ihe ia acontecer, adiantou-se e disse-lhes: «Quem Rersta Lusdrona De CieNcia O48 RELCIORS 323 Estanre ~ Nora pe Lerruna ~ Pauto MENDES PTO buscais?» Responderam-lhe: «Jesus, o Nazareno.» Disse-lhes Ele: «Sou Eul» E Judas, aquele que o ia entregar, também estava junto deles. Logo que Jesus lhes disse: ‘Sou Eu’, recuaram e cafram por terra. E perguntou-lhes segunda vez: «Quem buscais?» Disseram-lhe: «Jesus, o Nazareno!» Jesus re- plicou-lhes: «Ja vos disse que sou Eu. Se é a mim que buscais, entio deixai estes ir embora.» Mais uma vez, Mateus e Marcos dAo-nos uma versio dos acontecimentos muito proxima, Em tudo a clescrigao é semelhante, apenas diferindo num dado um pouco naife: para Mateus, Jesus parece nao saber de nada do que se estava.a pasar... Amtigo, nique vieste? ‘Lucas, mais uma vez, o mais curto dos trechos, passa pela necessidade que ambos os evangelistas anteriores tiveram de descrever como Judas combinara entregar 0 Mestre, passando directamente para essa entrega, colocando nas palavras de Jesus a identificagio da forma: é com unt beijo que entregas o Filho do Homem? Ora, mais uma vez, Jodo toma a dianteira na construcao do mito. Judas surge & frente de um grupo de soldados romans ... situacao totalmente nova. Mas mais, 0 célebre beijo desaparece e surge toda uma situacdo em que Jesus quase se opie & pristo, Jesus grita, Jesus questiona, os que o querem prender caem. Mas, no limite, é Jesus que se identifica, que se entrega, quase desaparecendo desse episodio a per- sonagem Judas. Podemos sistematizar algumas ideias fortes desta leitura comparada de trechos dos 4 Evangelhos canénicos: 1, Nao so uniformes na opiniiio que transmitem; 2. Existe alguma uniformidade entre Mateus e Marcos; 3. Por vezes, alguma semelhanca entre os dois anteriores e Lucas; 4, Bxiste, algumas vezes, uma proximidade entre Lucas e Joao; Em relagio, especificamente, ao contetido: 5, Mateus e Marcos acusam Judas cle uma forma menos virulenta que Jodo; 6. Em algumas situasdes, Judas nao é acusado directamente, mas apenas indi- cado por uma situaao de proximidade; 7. Emalgumas situagées Judas parece apenas cumprir o que estava estabelecido; 8. Apenas Joao e Lucas criam uma demonizacao de Judas. bite ortelos de Judas podernos ter Do Judas dos sindpticos, do de Joao, até ao Judas do evangelho homénimo, muitas variantes, cambiantes e possibilidades de interpretacdo podemos encontrar. De certo, sobre Judas, quase nada temos. Um nome, mesmo este, incerto, no meio de 3 outros Judas que surgem nos textos", Mais que um nome, um possivel topéni- "Le 616: Judas filo de Tiago, também wim dos 12. ‘ioquia cam uma Carin Aposiélica. Me 63 ¢ Mt 13; ct 15,22: jus, amado Baris, envindo com Silas @ An= 55; Judas, mio ce Tiago, de Jesus e de Josée de SimBo, 3m [Rewsta Lusso oe Clewera 948 Reuicioes ‘A Propdsit0 oA Letruna 0'O EVANGELHO bE JUDAS mo: oriunclo ce Kariot? Assim sendo, Judas seria 0 tinico discipulo nao galileu de Jesus 0 que, por si s6, j4 é significative e nos pode apontar o sentido do personagem para campos diversos dos restantes discfpulos. Assim, seria da Judeia, ao contrétio cios restantes que eram galileus. Seria, tam- bem, o responsavel pelas contas do grupo dos 13, no sentido légico que 13 indivi- duos que vivem em comum necessitam de alguém que organize a logistica das des- locacdes e da alimentacao. De dacs relativamente concretos, terminamos neste ponto. De resto, tudo se afi- gura como traco mitico. Joao da 0 mote, em alguns aspectos aparentemente secun- dado por Lucas. Esta visio demonizada deve ter nascido em ambiente pos destrui- sao de 70 A.C. por Tito, cimentada no primeiro século do Cristianismo, onde o j referido Papias é um exemplo. Serd esta a linha que iré perdurar no tempo e fazer historia até nés. Toda’o per- sonagem que encontramos cimentada na Cultura Ocidental (no que de mais central ele tem e, mesmo, nos seus limites e periferias *) parte desta evolucdo detectada em Joao e resultado, possivelmente, de uma alteragao estratégica apés 70, Esta alteracao estratégica, que visava um afastamento aos judeus, cada vez mais probleméticos para Roma, coincide, grosso modo, com o nascimento de uma religiao de facto, e com 0 desaparecimento da seita. ‘Outras visdes de Judas, desaparecida que estava a seita judaica, apenas teriam lugar dentro do Cristianismo enquanto, também elas, seitas. E 0 caso cio grupo que teré produzido, lido e acreditado no texto Evangelho de Judas, logo afastado do cen- tio da crenga no século Il, Naturalmente, e num tempo mais recente, uma outra visio de Judas ressurgiu. Apés 0 holocausto, 0 ponto limite, para muitos, das consequéncias desta ideia de- monizada de Jucias, surgiu uma visto que levava Judas a um lugar politico. A per- sonagem, assim como todos os Judeus personificacios no seu nome, nao tinham rea lizaco o deicidio, antes tinham visto em Jesus um Messias bélico, mais ao jeito de um. outro Judas, 0 Macabeu. Nesta leitura, ¢ valorizando os escassos dacios biogréficos de Judas, o personagem era tido como um zelota. O seu intuito era o de procurar levar Jesus a liderar a re- volta contra Roma, libertando 0 Povo Eleito do jugo estrangeiro, efectivando um novo Reino. Um resvalar politico, mediante uma falha interpretacao teolégica, levara Judas a esta leitura, Longe deste mundo, o Judas do evangelho homénimo remete-nos para outras di- mensbes. J4 nao estamos no mundo do Judaismo. Nem tio-pouco no do Cristianismo nascente. Neste texto, a religiao nova esta jé assente como um dado, Mas, paralelamente a este facto, este texto ¢ em muito, transversal a cristaos e a outros gnésticos, eventualmente neopitagéricos, neodionisiacos e neoplaténicos. O que temos neste texto é toda uma visao do mundo, clo cosmo, das origens Mais que Judas, numa visio “seguidista” clas ideias comuns no mundo das reli- giosidades semitas e camitas, ajudar a concretizar 0 Cristo, mediante a morte de Jesus, o Judas deste evangetho em nada est préximo de um personagem que, por "Ver, por exemplo, que uma das mais mitics bandas de Heavy Metal, com toda uma carga simblica sath- nica, lomou, sigrificativamente, o nome de Judas Pres, ali, basendo no nome de uma tnisica de Bob Dylan, “The Ballad Of Frankie Lee And Jus Priest Resta Lustrowa D5 CIENCIA DAS REUGOES 325 Esrawre ~ Nora DE Lemurs = Paulo MenDes Piero sis6, com asua morte, redima o que quer que seja, Neste mundo gnéstico, asalvacso ganha-a cada um na medida do seu caminho, da sua pesquisa interior - até Jesus fara © seu percurso interior, tendo de se livrar do seu corpo, num sentido totalmente pitagorico e platénico de constrangimento do corpéreo face ao espiritual Neste evangelho, Jesus é claro: nem todos, e aqui repete ja alguns dos Evangelhos canénicos, chegar’o ao mesmo lugar de conhecimento. Judas ird mais longe; a Judas € dado a conhecer aquilo que os outros nem imaginam. Tal como no gnosticismo, 0 conhecimento € resultado de um percutso individual, sob a alcada de um mestre. Mas a relacao de conhecimento aqui patente vai mais longe e torna a remeter-nos para ideias ja antes indicadas, Jesus ¢ um personagem que ri; que ri com desdém de algumas acces rituais que os discfpulos realizam. Judas é 0 tinico que, nesse riso de- safiador ¢ de gozo de Jesus, vé a porta para avancar e pedir mais conhecimento. Este Judas, a quem Jesus pede para ir ter consigo para lhe revelar os mais altos mis- terios, é exactamente 0 oposto do Pedro de que falmos antes, o discipulo que parece nada ter percebido dos trés anos em que viveu com 0 Mesias. Pedro est na mole dos discipulos de quem Jesus ri, Judas 6 aquele que sai desse grupo amorfo e é es- colhido para ir mais Longe, Neste sentido, o texto que aqui nos tréy, nao é um Evangelho em sentido pleno e tradicional, Nao, nao se trata de um livro sobre Jesus, mas sim sobre Jucas. Nunca deveria ser um «Evangelho segundo Judas», mas sim um «evangelho de Judas», 0 seu «caminho». Isto é, este livro nao é o Evangelho [de Jesus] segundo Judas, mas sim o Evangelho de Judas [segundo Jesus]. 326 Revista Lusdrowa € CIENCIA ons RELIGIONS

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