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breton.html
Quinta-feira, 7 de maio de 2009
Entrevista - David Le Breton
'Tudo o que está no mundo passa pelo corpo'

David Le Breton, sociólogo e antropólogo francês, participará de um


seminário intensivo de doutorado na Faculdade de Filosofia e Letras
da Universidade de Buenos Aires e, apresentará seu livro "El sabor del
mundo. Una antropología de los sentidos" na Feira do Livro. A
reportagem é de Alina Mazzaferro, publicada no jornal Página/12, 04-
05-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: UNISINOS

O interesse que sua obra suscitou – pelo menos a que foi traduzida e
publicada na Argentina, composta de sete livros de uma extensa produção
que inclui mais de 20 – revela o crescente atrativo de um campo de estudo
que há duas décadas tinha poucos adeptos: a sociologia do corpo. Porque
Le Breton, sociólogo e psicólogo de formação, se dedica há mais de 15
anos ao estudo da corporalidade humana, à qual entende não como mera
biologia, mas, pelo contrário, como "fenômeno social e cultural, matéria
simbólica, objeto de representações e de imaginários".
Para ele, não há nada natural no corpo: os gestos e as posturas
corporais, o modo em que cada um vê, ouve e percebe o mundo que o
rodeia, as maneiras pelas quais sofre e aproveita, as formas de se relacionar
e de se comunicar com os outros, até as emoções e todo o conjunto das
expressões corporais são modelados pelo contexto social e cultural em que
cada ator se encontra submergido.
Assim, Le Breton se encarregou de estudar as diferentes concepções
do corpo da sociedade tradicional e moderna, segundo múltiplos pontos de
vista: desde os ritos de interação em diferentes sociedades e épocas, até os
jogos da sedução e os modos diferenciais em que o homem e a mulher
expressam seus sentimentos; desde as práticas do piercing e da tatuagem,
até a arte contemporânea que envolve o corpo como material estético;
desde o corpo do deficiente, até os homogêneos corpos cinematográficos e
televisivos; desde a bulimia e a anorexia, até todo o conjunto de
preocupações atuais com a beleza, a saúde e a aparência.
Todo um campo de estudo se abre diante de seus olhos a partir da
consideração do corpo como matéria simbólica no lugar de pura biologia.
"Antropología del cuerpo y Modernidad" (Nueva Visión, 1995), o primeiro
de seus livros publicado na Argentina e o mais conhecido no país, é para o
autor uma espécie de "caixa de ferramentas" que lhe permitiu desenvolver
o resto da sua obra. Ali, apresenta em cada capítulo as temáticas que
abordará depois em profundidade nos livros posteriores: o estudo dos
sentidos é desenvolvido em "El sabor del mundo..." (Nueva Visión, 2007);
"As Paixões ordinárias. Antropologia das emoções" (Vozes, 2009) se ocupa
das emoções; a dor e o sofrimento é objeto de análise em "Antropología del
dolor" (Seix Barral, 1998); a invenção moderna do corpo enquanto objeto
separado do ser que o carrega e a história da anatomia são trabalhados em
"La chair au vif" (Em carne viva, em tradução livre); o tema do rosto e da
máscara é estudado em "Des visages. Essai d’antropologie" (Os rostos.
Ensaio de antropologia); enquanto os corpos de um mundo voltado cada
vez mais sobre a tecnologia são analisados em "Adeus ao corpo.
Antropologia e sociedade" (Papirus, 2003).
Além disso, Le Breton publicou uma breve e esquemática mas útil
genealogia das teorias que se ocupam do corpo – "A sociologia do corpo"
(Vozes, 2008) – em que percorre todas as correntes sociológicas,
filosóficas e antropológicas que, histórica, implícita ou explicitamente,
abordaram as lógicas sociais e culturais do corpo, os imaginários em torno
dele, o controle político da corporalidade (trabalhado especialmente por
Michel Foucault) ou os vínculos entre o corpo e as classes sociais (tarefa
encarada principalmente pela sociologia de Pierre Bourdieu a partir da sua
noção de habitus).
O que é certo é que a abordagem de Le Breton está nos antípodas da
obra de Foucault, Bourdieu ou de autores pós-marxistas, que encararam o
estudo do corpo a partir de sua situação de classe. Le Breton desconfia da
microfísica do poder, que suporia um controle invisível e disseminado em
todos os âmbitos do social das ações corporais. Também não crê na
existência de um habitus de classe (essas disposições que, com o tempo,
vamos adquirindo a partir da experiência).
Para uma boa parte da intelectualidade argentina, essas suspeitas e
descartes podem ser incômodos, levando-se em consideração a atração que
esses autores ainda têm aqui. Mas Le Breton vem de outro ambiente
acadêmico. Nessas duas semanas em Buenos Aires, conquistou um público
e incomodou outro para o qual a experiência humana só tem sentido em
termos de classe. Le Breton disse inscrever-se em uma corrente de
pensamento muito diferente, de tradição norte-americana: o interacionismo
simbólico, representado pelo sociólogo Erving Goffman, considerado o pai
da microsociologia. Porque interessa a Le Breton estudar indivíduos e não
classes fechadas e homogêneas, e essa teoria lhe permite dar conta da
heterogeneidade do mundo social contemporâneo. Assim ele se expressou
em uma extensa e profunda conversa com Página/12.
Como o senhor começou a se preocupar pelo corpo?
Escrevi sobre o corpo porque eu era um jovem que se sentia mal em
sua própria pele. Estava começando a realizar a minha tese doutoral sobre a
constituição social e cultural do corpo, quando decidi partir para o Brasil,
com a vontade de me perder, de desaparecer. Estive ali durante meses,
viajando a pé e em barco, atravessando todo o país, inclusive o Amazonas,
até que finalmente decidi voltar para a França para terminar minha tese de
sociologia. Foi nessa época que comecei a escrever sobre as condutas de
risco dos jovens e também sobre o corpo.
Nesse momento, a sociologia não prestava atenção ao corpo?
O corpo havia sido objeto de análise de Michel Foucault, mas de um
ponto de vista mais histórico. O etnólogo François Loux já havia
trabalhado sobre o corpo na sociedade popular francesa, mas em geral a
pesquisa sobre o corpo não era valorizada nessa época. Para muitos de
meus colegas, o corpo não era mais do que uma forma biológica sobre a
qual não havia nada para se dizer. Obviamente, na Grã-Bretanha e nos
Estados Unidos, havia um certo número de sociólogos e antropólogos que
já trabalhavam esse tema, mas eram os inícios. Eu tentei aplicar os critérios
de análise da antropologia cultural à questão do corpo.
Como se aborda uma antropologia do corpo?
Tenta-se interrogar-se. Dou um exemplo: a questão das cores.
Poderíamos pensar que, para vê-las, só seria preciso usar os olhos. Mas, na
realidade, uma criança vai aprendendo a reconhecê-las progressivamente.
Primeiro aprende a reconhecer o rosto de sua mãe, de seu pai, dos objetos
que lhe são próximos, depois o jardim e a rua e o mundo que o rodeia. Se
seu pai o estimular a reconhecer as formas das aves, ele o fará. O que
significa que nosso olhar está orientado, do mesmo modo que o nosso
ouvido e o nosso paladar.
Então, não há nada natural, tudo é construído culturalmente...
Exato. Tudo é construído culturalmente por meio da interação de
uma criança com seus pais. Uma criança que sempre come o mesmo prato
de arroz terá pouco sentido do paladar. Em troca, se uma criança aprende a
preparar e a temperar pratos ao lado de sua mãe, será uma grande
cozinheira, com um grande sentido do sabor.
Essa é a tese do livro que o senhor veio apresentar na Feira do
Livro?
Em "El sabor del mundo...", dediquei-me a compreender como
vivemos no mundo, porque tudo o que está nele passa pelo corpo: devemos
escutar o mundo, tocá-lo, cheirá-lo, senti-lo. Não há mundo mais do que
através do corpo. Aproximamo-nos do mundo por meio da mediação dos
sentidos. E não só dos cinco sentidos que conhecemos, que são os que
herdamos da tradição grega, mas também de outros sentidos. Porque há
outras sociedades humanas com outras percepções sensoriais.
Acontece algo semelhantes com as emoções?
Em "As paixões ordinárias...", tento demonstrar que todas as
emoções provêm da cultura. Quer dizer que há uma cultura afetiva dentro
da qual crescemos e dentro da qual vamos nos situar, com nossos modos
pessoais de ser, obviamente, porque não somos clones nem robôs. Sempre
há uma variável pessoal no emocional, mas, quando passamos de uma
cultura a outra, vemos claramente como a cultura afetiva muda, a maneira
em que os sujeitos sentem e demonstram as emoções varia. Há sociedades
em que os sujeitos permanecem estóicos diante da dor, porque a
ritualização da dor implica em guardar o sofrimento para si. E há outras em
que as pessoas choram, gemem, gritam diante da dor.
E por que o "Adeus ao corpo"?
Não sou eu que digo adeus ao corpo! Nesse livro, tento analisar o
imaginário do corpo no mundo de hoje, que considera que o corpo é
insuficiente, imperfeito, que nos faz perder tempo, sobre ele recai a morte e
a enfermidade. Então, crê-se que se pudéssemos nos desfazer dele seria
melhor. Crê-se que a tecnologia poderá nos libertar da morte, nos dará uma
juventude eterna, uma crença que substitui hoje a que propunha a
existência de um Deus e de uma eternidade no paraíso. Tento compreender
o porquê dessa exigência de transformar o corpo no mundo contemporâneo,
por que sempre é preciso fazer regime e esportes, por que não temos mais
direito de ser nós mesmos e de estar com gosto em nossa pele.
Quais são os problemas que essa crença a favor da tecnologia nos
trará no futuro?
Vejo uma grande iniqüidade entre as sociedades mais ricas e as mais
pobres. A tecnologia do ciborg e a robotização se desenvolverá entre os
mais ricos. Dentro de vários anos, assistiremos a essa fusão entre a
tecnologia e a carne, o desenvolvimento da clonagem, um mundo em que
escolheremos o nosso filho em uma revista. Um mundo profundamente
injusto, porque as tecnologias serão para os ricos e contribuirão com a
iniquidade.

Para ler mais:


* 'O corpo tornou-se um simples acessório'. Entrevista com David Le
Breton
* Pós-máquinas ciberhominizadas? O pós-humano e o movimento social do
capital
* Os mestres do fazer e o homem artesão de Richard Sennett
* Consumo e cultura: Agenda política da cozinha. Entrevista especial com
Fátima Portilho e Eliana Saraiva

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