Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
HENRIQUE
E PAPÉISCORDEIRO
DOS CONSELHOS
MARTINSDE• SUZANA
ADMINISTRAÇÃO
BRAGA RODRIGUES
DAS EMPRESAS BRASILEIRAS
ABSTRACT This paper analyses the changes in corporate governance, focusing on its attributed traits and their effects on the roles and responsibilities
of the board of directors of Brazilian companies, considering the changes caused by globalization, privatization and the new global business
structure. A quantitative research was carried out in the 300 largest Brazilian companies listed in Bovespa (São Paulo Stock Exchange), investigating
the corporate officers perceptions of those changes. Findings point out that corporate officers are more concerned with the board controlling role,
although some importance is also given to the strategic role.
priedade cruzada entre as companhias e um amplo re- Taylor, 2001). As diferenças entre essas perspectivas
lacionamento entre as empresas e setores do governo estão exatamente no que os conselhos de administra-
propiciam um clima de corrupção latente. A lei japo- ção devem fazer e como devem ser constituídos.
nesa estabelece um conselho unitário, internamente Para Jensen e Meckling (1976), a idéia-chave da
recrutado, que inclui cinco ou mais membros, tendo teoria da agência (TA) é que existe um relacionamen-
também na figura do presidente o homem forte da to de agência ou contratual em que uma ou mais pes-
corporação. O conselho serve apenas para cumprir uma soas (o principal) contrata outra (o agente) para exe-
determinação legal. cutar algum serviço que envolva delegação de tomada
De acordo com Carlsson (2001), o modelo alemão se de decisão e autoridade para o agente. Se ambas as
caracteriza por forte presença do modelo de stakeholder, partes do relacionamento têm motivações diferentes,
onde as companhias não são voltadas apenas aos acio- então existem boas razões para acreditar que os agen-
nistas, pelo limitado papel do mercado de capitais, por tes nem sempre agem de acordo com os interesses do
uma expressiva liderança coletiva exercida pela partici- principal. Dessa forma, o principal pode limitar diver-
pação de empregados e sindicatos nas estruturas de go- gências de interesses entre eles, estabelecendo apro-
vernança. As corporações alemãs têm dois níveis de con- priados incentivos para o agente e, por meio de um
selho: de supervisão (Aufsichtsrat) e um de diretores custo da monitoração, designar os limites das ativida-
(Vorstand). O papel do conselho de supervisão consiste des dos agentes. Com isso, o principal e o agente irão
no cumprimento das determinações legais. As principais incorrer em custos de monitoramento e custos de vín-
decisões da empresa ficam nas mãos do Vorstand. Como culos, e irão divergir sobre algumas decisões do agente.
metade dos membros do conselho de supervisão é eleita A base da teoria dos custos de transação (TCE) lida
por sindicatos e empregados, ele se torna muito grande com a decisão das empresas sobre produzir para aten-
para funcionar na solução de problemas e tomada de dimento de suas necessidades, ou se elas devem com-
decisão. Isso leva à transferência das decisões quase que prar no mercado, de forma a diminuir os custos de tran-
exclusivamente para o conselho de diretores, aumentan- sação. A situação mais econômica – se o mercado ou a
do o seu poder (Carlsson, 2001). produção própria – deve prevalecer nas decisões da
As características do modelo latino, no qual o Bra- empresa (Coase, 1937; Williamson, 1975). O objetivo
sil se enquadra, dizem respeito a uma forte concentra- da firma é garantir boas operações utilizando mecanis-
ção da propriedade nas mãos de poucos acionistas e mos de governança. Então, a governança é pensada
numa alta concentração de poder nas mãos de um lí- como uma estrutura institucional em que a integridade
der ou de uma instituição específica. Nesse modelo, o da transação é decidida (Williamson, 1996).
Estado também tem participação direta nas empresas, Segundo Williamson (1996), tanto a TCE como a TA
seja como proprietário ou como regulador das ativi- argúem que o conselho surge internamente como um
dades produtivas (Scott, 1997; Carlsson, 2001). No instrumento de controle. O papel do conselho nas es-
entanto, para Bertero (2000) a análise da GC brasilei- truturas de governança é proporcionar às empresas um
ra passa pelo entendimento de uma sociedade patriar- mecanismo de custo relativamente baixo para moni-
cal, repleta de oligarquias e de distâncias entre as clas- toramento, recolocação e reordenação dos gestores.
ses sociais econômicas. Sob esse aspecto, a empresa é A teoria do representante (stewardship) contrapõe
percebida como sendo um patrimônio da família, le- diretamente os argumentos de oportunismo dos ges-
vando as questões de governança a serem tratadas nas tores (agentes) propostos pela teoria da agência. Sob
casas dos donos das empresas. esta ótica, os gestores são motivados por outras ra-
zões que não exclusivamente a financeira e, por isso,
Conselho de administração: perspectivas teóricas representam bem os interesses da empresa (Donaldon
As pesquisas sobre o papel do conselho de adminis- e Davis, 1991; Fox e Hamilton, 1994; Davis et al.,
tração e sobre a extensão de seu poder têm sido abor- 1997). Donaldson e Davis (1991) afirmam que os ges-
dadas a partir de seis perspectivas teóricas, a saber, a tores são motivados também pela necessidade de al-
teoria da agência e a teoria dos custos de transação, a cançar e ganhar satisfação intrínseca com a execução
teoria do stewardship (representante), a teoria da de- de trabalho desafiador, exercer autoridade e responsa-
pendência de recursos, a teoria da classe hegemônica, bilidade, obtendo o reconhecimento do chefe. Con-
a teoria da hegemonia gerencial e a perspectiva defini- clui-se então que existem outros fatores motivadores
da por lei – legalista (Zahra e Pearce II, 1989; Stiles e além dos financeiros.
O gestor subjacente a essa proposição está longe de se estabelecerem relacionamentos com outras organi-
ser oportunista e busca um bom desempenho, reali- zações, instituições públicas, governos, clientes e a
zando um bom trabalho e sendo um bom representan- comunidade, diminuindo as incertezas ambientais e
te (steward) da empresa. Para a teoria do representan- extraindo recursos para as operações da empresa.
te, o problema de motivação do gestor é inerente ao Para a teoria da classe hegemônica, o poder da so-
trabalho do executivo, e o desempenho da empresa ciedade é compartilhado por uma elite que dirige as
melhora quando a estrutura de governança facilita suas grandes empresas e que possui visões semelhantes da
ações (Donaldson e Davis, 1991; Fox e Hamilton, realidade (Mills, 1956). Nesse contexto, o conselho
1994). Isso porque, quando o gestor da organização de administração é visto como o agente que busca per-
também é o principal executivo do conselho de admi- petuar essa elite governante e encorajar seu fortaleci-
nistração, seu desempenho melhora, já que o poder e mento, compartilhando conselheiros (Glasberg e
a autoridade estarão concentrados numa única pessoa. Schwartz, 1983; Bazerman e Shoorman, 1983; Zahra e
Portanto, a organização se beneficiará das vantagens Pearce II, 1989; Stiles e Taylor, 2001).
da unidade de direção, além de forte comando e con- De acordo com Pfeffer e Salancik (1978), enquanto
trole. E isso gera retorno muito maior para o acionista a teoria da dependência de recursos é caracterizada
do que ocorreria com a separação entre o principal pela ênfase nas ações que servem aos interesses das
executivo e o presidente do conselho. organizações em lugar das famílias, indivíduos ou uma
Segundo Pfeffer e Salancik (1978), na abordagem classe social, a teoria da classe hegemônica adota a
da teoria da dependência de recursos, a questão cen- visão de que as organizações são os agentes das famí-
tral da organização é o gerenciamento para sua so- lias, dos indivíduos ou de uma classe social específi-
brevivência, sempre visto como problemático. A em- ca, em lugar de serem agentes das próprias institui-
presa sobrevive à medida que é efetiva, e a efetivida- ções. Ou seja, adota uma visão individualista dos in-
de organizacional depende das habilidades gerenciais teresses das empresas.
ou de grupos de interesses na captação de recursos A estrutura de negócios que emerge dessa dinâmica
externos. Dessa forma, o principal caminho para a é uma densa rede de interação entre as companhias
sobrevivência da organização é a sua capacidade para interdependentes, que buscam vantagens no ambien-
adquirir e manter recursos. Com mudanças no ambien- te em que estão inseridas e no seu mútuo relaciona-
te, as organizações e seus gestores enfrentam o dile- mento. O resultado disso é que as empresas possuem,
ma de não sobreviver ou de mudar as suas atividades temporária ou permanentemente, controle sobre cer-
para se ajustar a esses novos fatores ambientais. Isso tos recursos e podem influenciar substancialmente
posto, as empresas buscarão soluções para reduzir a fornecedores e clientes (Domhoff, 1969; Glasberg e
incerteza ambiental e a dependência de recursos ex- Schwartz, 1983). Para tanto, o conselho de adminis-
ternos escassos. tração deverá ser enfático na seleção dos diretores exe-
O suporte empírico dessa perspectiva emerge das cutivos de forma a escolher as pessoas certas em ter-
pesquisas realizadas sobre o compartilhamento mos de status e influência social. O conselho de admi-
(interlock) do conselho. Dessa ótica, a contribuição do nistração, por sua vez, tem que representar a elite ca-
conselho para a organização é diminuir os impactos pitalista e promover negócios favoráveis a todas as
ambientais pela criação e aumento dos benefícios empresas (Stiles e Taylor, 2001).
mútuos nas relações interorganizacionais (Pfeffer e A teoria da hegemonia gerencial parte do trabalho
Salancik, 1978; Zahra e Pearce II, 1989). O comparti- de Berle e Means (1932) sob a argumentação de que o
lhamento ocorre quando um grupo de membros do aumento acelerado do tamanho das empresas levou à
conselho de administração é partilhado por duas ou separação da propriedade e ao controle por meio da
mais companhias (Mills, 1956). dispersão do capital. Essa proliferação de acionistas
O compartilhamento dos conselhos é a uma forma levou também à diluição do poder do controle
mais ampla e geral para se administrar o ambiente, corporativo, antes exercido pelos donos ou sócios
por meio da designação de representantes externos majoritários. A difusão do poder dos proprietários em
(outsiders) para importantes posições nas organizações conjunto com a dependência de capital de instituições
(Pfeffer e Salancik, 1978). Sob essa perspectiva, o pa- externas colocou o poder da tomada de decisão nas
pel do conselho é o fortalecimento de amizades, a tro- mãos do executivo principal da empresa (Glasberg e
ca de informações e a identificação de facilidades para Schwartz, 1983).
Dessa proposição básica, a teoria da hegemonia ge- com essa visão, os conselhos são responsáveis pela li-
rencial elabora os princípios sobre os funcionamentos derança corporativa, mas sem interferir no dia-a-dia
internos das corporações e sobre as relações entre as das operações da empresa, que são atividades desig-
empresas. De um lado, internamente, a expectativa do nadas para o executivo principal. Na maioria das le-
controle gerencial é a produção eficiente do lucro, e o gislações que tratam da questão, os papéis do conse-
papel executivo é tratado sob a ótica da busca de resul- lho se relacionam com a seleção e demissão do princi-
tados suficientes para satisfazer acionistas dispersos e pal executivo da empresa, representação dos interes-
que não são atuantes, sem pressionar por uma maximi- ses dos acionistas, provimento de aconselhamento para
zação de lucros, que envolveria o risco de desastre fi- o executivo principal e monitoramento das ações ge-
nanceiro. Essa mudança de expectativa teve grandes renciais e do desempenho da empresa (Vance, 1983;
implicações e alterou os processos internos da compa- Demb e Neubauer, 1992; Bowen, 1994; Ward, 2000).
nhia. De outro lado, as inter-relações corporativas tor-
naram-se o maior foco das análises da teoria gerencia- Perspectivas teóricas e os atributos, papéis e
lista, porque a grande autonomia dada aos executivos e responsabilidades do conselho de administração
a baixa pressão pelo lucro máximo geraram uma era de As perspectivas teóricas que abordam os diversos pa-
laissez-faire entre as empresas, nas quais as relações tor- péis do conselho, ou seja, estratégico, de controle e
naram-se esporádicas, não coercitivas e altamente igua- institucional, relacionam os principais atributos a es-
litárias. A arena de conflitos existe somente nas rela- ses papéis, fortalecendo uns em detrimento de outros.
ções entre os proprietários e os gestores, e esse conflito Por vezes cabe destaque a alguns e por vezes todos
foi amplamente resolvido em favor dos gestores. A ação são tratados igualmente.
concertada entre as empresas se materializou em rela- Os estudos, segundo a perspectiva legalista, apon-
cionamentos não financeiros, no compartilhamento de tam que os quatro atributos do conselho – composição,
conselheiros, nas conexões entre os fornecedores e clien- características, estrutura e processo – afetam o seu de-
tes, e na coordenação de preços entre os competidores sempenho a partir de dois papéis primários, o institu-
(Glasberg e Schwartz, 1983). cional ou de serviço, e o de controle. No entanto, a atua-
Tradicionalmente, a teoria da hegemonia gerencial ção do conselho depende, em primeiro lugar, da con-
produz um retrato da nova classe de líderes corpora- centração da propriedade e, em segundo, do tamanho
tivos, que têm trabalhado à revelia de pressões exter- da firma. Nas empresas onde a concentração da pro-
nas. Essa liberdade gerou enormes poderes para os priedade é grande, os conselheiros têm um papel mais
gestores, mas produziu conexões frouxas e relativa ativo de controle e serviço, diferentemente das empre-
desorganização das estruturas dos negócios. Nesse sas com grande fragmentação acionária (Zahra e Pearce
contexto, o conselho é percebido como uma “ficção II, 1989). Nas empresas pequenas, as pesquisas apon-
legal” e é dominado pelo gestor, tornando-se ineficaz tam que o conselho é muito mais ativo no papel insti-
na redução potencial do problema da agência entre tucional para legitimar a empresa, enquanto nas gran-
gestores e acionistas (Mace, 1971; Vance, 1983). A res- des firmas a função de controle se torna vital, por esta-
ponsabilidade pela condução e controle da empresa é rem associadas a operações mais complexas (Jones e
assumida integralmente pelo gestor corporativo. Goldberg, 1982; Castaldi e Wortman, 1984).
Por fim, a perspectiva legalista abarca um conjunto As pesquisas que sustentam o argumento central da
de leis que define, entre outras coisas, a obrigatorieda- perspectiva da dependência de recursos reconhecem
de da existência, papéis e responsabilidades do conse- os três papéis do conselho, o estratégico, o institucio-
lho de administração. As funções dos conselhos são nal e o de controle, e mostram que eles são impactados
descritas pela legislação oriunda de cada país, mas na por dois atributos específicos, sua composição e suas
prática existem variações no modo como esses papéis características. A visão da dependência de recursos
são interpretados e como o poder tem sido delegado e reconhece que o conselho deve se envolver ativamen-
distribuído entre o conselho e os diretores (Scott, 1997; te na arena estratégica, deliberando e aconselhando o
Stiles e Taylor, 2001). executivo principal da organização, por iniciativa pró-
A abordagem legalista sugere que os conselhos con- pria ou sugerindo alternativas. Entretanto, os conse-
tribuem para o desempenho das empresas quando exer- lheiros não desenvolvem nem executam as estratégias,
cem de fato as responsabilidades que lhes são legal- pois essa é uma atividade do executivo operacional.
mente atribuídas (Zahra e Pearce II, 1989). De acordo (Zahra e Pearce II, 1989; Stiles e Taylor, 2001).
A teoria da classe hegemônica argumenta que o pa- papel de controle. Como o executivo da empresa é tam-
pel do conselho é coordenar as ações das firmas de bém o presidente do conselho, pouco importam os atri-
que se servem e, o mais importante, assegurar o con- butos “composição e características” e “estrutura”, mas
trole capitalista das instituições societárias. Disso re- se torna relevante o atributo “processos”, principalmen-
sulta que, nessa visão, os papéis institucional e de con- te no aspecto consenso. Segundo Stiles e Taylor (2001),
trole são os únicos destacados, sendo por sua vez as pesquisas empíricas, a partir dessa visão e da
impactados por três atributos, a composição, as carac- hegemonia gerencial, são limitadas pelo fato de não
terísticas e o processo (Zahra e Pearce II, 1989). Nes- considerarem o conselho de administração como uni-
sa perspectiva, a consideração do “processo” se torna dade independente e forte dentro da organização.
um paradoxo, uma vez que o papel do conselho é me-
ramente uma ficção. Entretanto, as pesquisas não de-
finem operacionalmente esse domínio. O desempenho PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
do conselho depende da concentração da propriedade
e do poder e estilo de trabalho do executivo principal O universo da pesquisa foi o conjunto de empresas
da empresa. Dessa maneira, o executivo pode reduzir listadas em bolsa de valores. Foram selecionadas como
ou aumentar o envolvimento do conselho, dependen- unidade de análise as 300 maiores empresas listadas
do da sua forma de atuação e poder na empresa. na Bovespa. O motivo dessa seleção foi principalmen-
As perspectivas econômicas da teoria da agência e te devido à representatividade, influência e importân-
da teoria dos custos de transação estabelecem os pa- cia dessas empresas para o país. Os sujeitos da pesqui-
péis do conselho a partir da influência dos quatro atri- sa ou unidade de observação foram os conselheiros e/
butos, composição e características, processos e estru- ou executivos que formam a governança corporativa
tura, como a abordagem legalista. No entanto, a gran- dessas empresas, sendo que o nível de análise foi o
de diferença está nas perspectivas econômicas, que individual, ou seja, qual é a percepção do respondente
destinam mais atenção ao atributo processos – princi- (conselheiro ou executivo) acerca dos papéis do con-
palmente na tomada de decisão – do que a visão le- selho de administração.
galista. A ênfase está no interesse com que os conse- Esse estudo se caracteriza como um levantamento
lhos executam seu trabalho, no modo como monito- do tipo survey, num desenho interseccional, onde os
ram as ações do executivo e, principalmente, como dados colhidos descrevem alguma população maior
essas atitudes levam à redução de custos de agência e num certo momento. Entretanto, o método adotado
de transação (Zahra e Pearce II, 1989). Nessa visão, neste estudo não se limita à natureza descritiva, mas
os papéis de controle, institucional e estratégico são assume funções exploratória, descritiva e explicativa.
executados pelo conselho, mas o controle se torna o Foi utilizado um questionário semi-estruturado (per-
mais importante, seguido do institucional e do estra- guntas abertas e fechadas), subdividido em três par-
tégico. Para avaliação do desempenho organizacio- tes. A primeira, denominada “dados do respondente”,
nal, essa perspectiva usa preferivelmente medidas continha dados de identificação dos respondentes do
baseadas no mercado, como, por exemplo, o valor de instrumento, com o objetivo de caracterizar a amos-
mercado da empresa. tra. A segunda parte, “atributos estrutura e processos
A teoria da hegemonia gerencial vê o conselho como dos conselhos”, buscou analisar (a) composição e ca-
um júri e não como uma instância que afeta efetiva- racterísticas, (b) estrutura, e (c) processos dos conse-
mente a organização. Disso resulta que os papéis es- lheiros das empresas, compondo o que se denominou
tratégico e de controle do conselho são passivos, so- anteriormente “atributos do conselho”. Na terceira
bressaindo-se apenas o institucional. Desse modo, ape- parte, “atribuições dos conselhos”, discutiram-se os
nas “composição e características” como atributos papéis e as responsabilidades dos conselheiros.
impactarão suas atividades, já que “processos” e “es- Para se estabelecer a influência das variáveis inde-
trutura” pouco servirão como inputs organizacionais pendentes (atributos) sobre as dependentes (papéis e
(Stiles e Taylor, 2001). responsabilidades dos conselhos), objeto deste artigo,
Finalmente, a unificação dos papéis do executivo foi realizado o teste qui-quadrado (Koosis, 1997). O
principal e do presidente do conselho de administra- teste qui-quadrado (Hogg e Craig, 1995) é uma ferra-
ção, segundo a perspectiva do representante, fortalece menta que tem por objetivo medir a incidência de as-
os papéis estratégico e institucional, mas enfraquece o sociação existente entre duas variáveis (perguntas) da
escala qualitativa de um questionário. A decisão sobre os papéis do conselho, foi o cargo ocupado. O cargo
a força da correlação é medida, na maioria dos casos, de conselheiro mostrou associação mais forte com o
pela estatística conhecida como “valor-p” (ou nível papel de controle (39%), seguido do estratégico (37%)
descritivo do teste). Enquanto probabilidade de influên- e, por último, do institucional (24%). Para os ocupan-
cia entre as variáveis, quanto mais próximo de zero é tes do cargo de executivo, o principal papel do conse-
a significância do teste (valor-p), mais se tornam plau- lho está relacionado com o estratégico (42%), seguido
síveis as evidências de associação. do de controle (34%) e do institucional (24%). Em
síntese, os dados sugerem que os conselheiros tendem
a considerar mais o papel de controle, enquanto para
RESULTADOS DA PESQUISA os executivos o conselho deve se preocupar mais com
o papel estratégico.
O levantamento estatístico foi resultado da pesquisa O segundo ponto se refere ao sexo. Sob esse aspec-
realizada com conselheiros e executivos sêniores de re- to, vale considerar que, mesmo com uma diferença
conhecidas empresas brasileiras, na qual foi utilizado pequena, foi encontrada a incidência de associação do
um plano amostral estratégico. Para isso, após contatos sexo feminino com o papel estratégico (40%) e do
verbais e escritos convidando os executivos a partici- masculino com de controle, com 39%. Quanto à for-
parem do projeto, conseguiu-se a devolução de 71 ques- mação acadêmica, apesar de ter sido encontrada in-
tionários (respondidos) dos 300 enviados, o que repre- fluência entre o grau de escolaridade e os papéis do
senta um percentual de retorno de 24% da amostra, conselho, os dados não apresentaram diferenças sig-
bastante significativo do ponto de vista estatístico. nificativas nos números para um papel específico em
O ponto de partida foi buscar a noção dos entrevis- detrimento de outro. Tanto para pós-graduados quan-
tados sobre as tarefas dos conselhos. Foram apresen- to para graduados a interdependência mais significa-
tados aos respondentes 13 papéis e responsabilidades, tiva foi para o papel de controle (38% para ambos),
e, em seguida, foi solicitada uma classificação, em or- seguido do estratégico (35% e 26%) e do institucional
dem crescente de importância, dessas atividades nas (27% e 26%). Entretanto, destaca-se que ambas as for-
empresas, para que se pudesse avaliar que papéis têm mações tendem a priorizar o papel de controle do con-
sido mais destacados em detrimento de outros. Sob selho de administração. A experiência profissional tam-
esse aspecto, vale destacar que, dos cinco primeiros bém apresentou forte indício de relacionamento com
papéis em importância para o conselho, três deles per- os papéis do conselho. Mas, independentemente do tem-
tencem à categoria que diz respeito à dimensão estra- po de experiência como conselheiro ou executivo, o
tégica e dois deles à categoria relativa ao controle. papel de controle se mostrou mais relevante para esse
Os cinco primeiros papéis considerados mais rele- elemento, seguido do estratégico e do institucional.
vantes foram o “envolvimento com a estratégia”, des- O número de membros do conselho exerce grande
tacado como sendo o mais importante pelos respon- influência sobre o papel estratégico, independentemen-
dentes, seguido do “desenvolvimento da visão corpo- te do número ideal apontado pelos respondentes. Em
rativa” (dimensão estratégica). Em terceiro e quarto, todas as alternativas, o papel estratégico (64%) se
na categoria de controle, ficaram “determinar a posi- mostrou muito mais significante que o segundo, insti-
ção de risco” e “monitorar a saúde da empresa”. E em tucional (24%), e o terceiro, de controle (12%).
quinto, novamente o grupo estratégico, “controlar a A presença de conselheiros externos fortalece o pa-
mudança estratégica da empresa”. O grupo do papel pel de controle do conselho, sendo que uma maior
institucional só aparece em sexto lugar, com a respon- quantidade de conselheiros externos, cinco ou mais,
sabilidade de “contatos com acionistas e stakeholders”. apresentaram-se mais significativamente associados
Feita a classificação dos papéis e responsabilidades também com o papel do controle (40%). Em seguida,
do conselho, buscou-se avaliar os impactos ou influên- aparece o papel estratégico, com destaque para um
cias das variáveis ou fatores constantes nos atributos número ideal de quatro membros (36%). Já o papel
dos conselhos, envolvendo composição e característi- institucional apresenta-se em terceiro lugar, pratica-
cas, estrutura e processos nas organizações, por meio mente com o mesmo número, independentemente da
dos níveis de significância (teste qui-quadrado). quantidade ideal de membros externos.
O primeiro elemento dos atributos “composição e O último elemento dos atributos “composição e
características”, que apresentou forte influência sobre características” que apresentou incidência de associa-
ção com os papéis do conselho foi o tempo de manda- Independentemente da forma, o fluxo de informa-
to ideal dos conselheiros. Independentemente do tem- ções entre os conselheiros é mais significante para o
po ideal, dois, três ou quatro anos, os papéis institu- papel de controle, seguido do estratégico e do institu-
cional e estratégico apresentaram relacionamento mais cional. O mesmo se dá quanto ao fluxo de informa-
contundente com esses atributos que o de controle. ções entre os conselheiros e a diretoria. Nesse caso,
Para um mandato de até dois anos aparece, primeira- destaca-se a comunicação do tipo “comunicados da
mente, o papel estratégico, com 46%; seguido do ins- diretoria e do conselho”, que se apresentou mais rele-
titucional, com 44%. No caso de três anos, os dois vante, com 39,02%, mas favorecendo ainda assim o
papéis mais importantes aparecem na mesma propor- papel de controle. A existência ou não de conselhei-
ção (45%). E de quatro anos em diante, estratégico ros que polarizam as discussões nas reuniões também
com 46% e institucional com 44%. O papel de contro- mostrou forte indício de associação com os papéis dos
le, apesar da ocorrência de associação, apresentou-se conselhos, sendo que, em ambos os casos (sim e não),
muito pouco freqüente nesse tópico. Na Tabela 1 são favorecendo o papel de controle, seguido do estratégi-
apresentados resumidamente os elementos dos atribu- co e do institucional.
tos “composição e características” do conselho com A Tabela 2 mostra resumidamente os elementos da
maior freqüência nas respostas e como os mais rele- estrutura com maior freqüência nas respostas e que se
vantes para a formação do perfil dos papéis e as res- apresentaram como os mais relevantes para os papéis
ponsabilidades dessa instância nas organizações. e as responsabilidades dessa instância na organização,
Para o atributo “estrutura”, o primeiro elemento – es- tendendo sempre a se associarem de forma mais signi-
trutura hierárquica – mostrou relacionamento estatísti- ficativa com o papel de controle em detrimento do
co com os papéis do conselho. A ausência de estrutura estratégico e do institucional.
formal influencia mais o papel de controle (38,67%), tan- Por fim, o atributo “processos” apresentou relacio-
to quanto a presença dela (37,63%), seja formada por namento forte com alto grau de confiabilidade aos pa-
comitês ou por força tarefa (task forces). Em segundo péis do conselho, a partir dos seguintes elementos. Em
aparece a associação do papel estratégico, com 35,48%, primeiro lugar, a periodicidade das reuniões, com in-
e em terceiro a do institucional, com 26,88%. fluência maior no papel de controle. As reuniões tri-
Tabela 1 – Papéis do conselho, segundo aspectos mais relevantes de sua composição e características.
ATRIBUTOS: PAPÉIS DO CONSELHO
TOTAL SIGNIFICÂNCIA
COMPOSIÇÃO E
ELEMENTO INSTITUCIONAL ESTRATÉGICO CONTROLE DO
CARACTERÍSTICAS
TESTE
RELEVANTES % % % %
Cargo ocupado Executivos 23,85 41,72 34,43 100,00 0,0000
Sexo Masculino 26,54 34,92 38,54 100,00 0,0000
mestrais foram mais representativas, com 40%; se- natureza estratégica, estrutural e política correlacionam-
guidas das mensais, com 38,18% e das bimestrais, com se paradoxalmente com o papel de controle. Os temas
37,87%. Em segundo lugar, a duração das reuniões, relacionados às políticas internas e aos recursos hu-
em que a informação mais freqüente foi que duram, manos são mais significantes para o papel estratégico
em média, 3 horas, privilegiando também o papel de nas organizações pesquisadas.
controle. Em terceiro, as tomadas de decisão do con- Com uma postura que privilegia mais o papel de
selho, nas quais, quando feitas por meio do voto, os controle em detrimento do estratégico e institucio-
papéis de controle e estratégico se tornam relativa- nal, os elementos do atributo “processos”, apresen-
mente mais relevantes, enquanto as decisões toma- tados sinteticamente na Tabela 3 com maior freqüên-
das por consenso fortalecem significativamente mais cia nas respostas, mostraram-se os mais relevantes
o papel de controle. Em relação ao quarto elemento, para os papéis e as responsabilidades dessa instância
independentemente de quem toma a decisão nas reu- na organização.
niões, o conselho todo, o diretor presidente ou um
grupo dominante de conselheiros, o papel de contro-
le é claramente mais significante, seguido do estraté- CONSIDERAÇÕES FINAIS
gico e do institucional. Destaca-se ainda que, quan-
do o diretor presidente é quem decide, o fortaleci- A partir do objetivo deste artigo de analisar as altera-
mento do papel de controle é ainda maior que nas ções dos atributos da governança corporativa e seus
tomadas de decisão por outros elementos da organi- impactos nos papéis e responsabilidades do conse-
zação. Havendo ou não avaliação dos trabalhos dos lho de administração das empresas brasileiras, cons-
diretores das empresas, quinto elemento, esse aspec- tata-se, ao se avaliarem as atividades dos conselhei-
to influencia mais fortemente o papel de controle. ros, que em 79% dos casos o conselho acredita que
Finalmente, destaca-se que os assuntos com os quais as tarefas que lhes foram designadas são adequadas.
o conselho nunca concorda, sexto elemento, também Em se tratando de papéis e responsabilidades, o
impactam os papéis e responsabilidades. Os temas de ranking apurado revela que, dos cinco mais impor-
tantes, o primeiro é o envolvimento na estratégia, O atributo estrutura mostrou significância forte com
seguido do desenvolvimento da visão corporativa, os papéis do conselho a partir dos elementos estrutura
determinação da posição de risco, monitoramento da hierárquica existente ou não, formação de estrutura hie-
saúde da empresa e controle da mudança estratégica. rárquica formal ou a partir de comitês, fluxo de informa-
Desses, três deles dizem respeito ao papel estratégico ção entre os conselheiros e com os diretores da empresa,
e dois ao de controle. O institucional só aparece em e a existência ou não de conselheiros polarizadores nas
sexto lugar, em contatos com acionistas e stakeholders. discussões que permeiam as reuniões do conselho. En-
Mas quando se analisa a incidência de associação tretanto, todos esses elementos apresentaram incidência
entre os atributos e os papéis dos conselheiros, obser- de associação mais forte ao papel de controle.
va-se uma nítida influência entre alguns atributos dos O último atributo, processos, se refere às atividades
elementos composição e características com as respon- de tomada de decisão, a partir de cinco elementos bá-
sabilidades do conselho. De uma forma geral, o cargo sicos, a saber: a freqüência e a duração das reuniões, a
ocupado pelos executivos, o número de componentes interface do conselho com o principal executivo da
no conselho, entre 9 e 11 membros, e o tempo do man- empresa, o nível de consenso entre os conselheiros, as
dato ideal dos conselheiros, de quatro anos ou mais, formalidades dos procedimentos e a extensão na qual
apresentaram-se fortemente associados ao papel estra- o conselho está envolvido na sua auto-avaliação. En-
tégico, enquanto os demais, sexo masculino, formação tretanto, os elementos que apresentaram influência
acadêmica com pós-graduação, experiência profissio- forte sobre os papéis e responsabilidades desta instân-
nal de mais de 6 anos e número ideal de conselheiros cia nas organizações foram a periodicidade das reuniões,
externos até dois, apresentaram-se com associação mais as duração das reuniões, a forma das decisões toma-
forte ao papel de controle, mas se sobrepondo ao estra- das pelo conselho, quem realmente toma as decisões
tégico. Para este atributo, o papel institucional foi mui- nas reuniões, se o trabalho do conselho é avaliado ou
to pouco significativo, em relação aos outros dois. não, por quem o conselho é avaliado e a natureza dos
Decisões tomadas pelo Por meio do con- 26,49 35,05 38,46 100,00 0,0000
conselho administrativo senso
Quem realmente toma as Conselho todo 26,56 35,41 38,03 100,00 0,0000
decisões nas reuniões
do conselho?
Avaliação do trabalho Sim 26,60 35,42 37,98 100,00 0,0000
dos diretores
HOGG, R. V.; CRAIG, A. T. Introduction to Mathematical Statistics. New MONKS, R. A. G.; MINOW, N. Corporate Governance. 2nd edition.
York: Prentice Hall, 1995. Cambridge, MA: Blackwell Business, 2001.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA (IBGC). PEARCE II, J. A.; ZAHRA, S. A. Board composition from a strategic
Disponível em <http://www.ibgc.org.br>. Acesso em 10 dez. 2001. contingency perspective. Journal of Management Studies, v. 29, n. 4, p. 411-
438, 1992.
JENSEN, M.; MECKLING, W. Theory of the firm: managerial behavior,
and agency cost and capital structure. Journal of Financial Economics. v. 3, PFEFFER, J. Size and composition of corporate boards of directors: the
p. 305-60, 1976. organization and its environment. Administrative Science Quarterly, v. 17,
n. 2, p. 218-228, 1972.
JOHNSON, J.; DAILY, C. M.; ELLSTRAND, A. E. Journal of Management, v. PFEFFER, J.; SALANCIK, G. R. The External Control of Organizations: A
22, n. 3, p. 409-438, 1996. Special issue. Resource Dependence Perspective. New York: Harper & Row, 1978.
JONES, T. M.; GOLDBERG, L. D. Governing the large corporation: more SCOTT, J. Corporate Business and Capitalist Classes. Oxford: Oxford
arguments for public directors. Academy Management Review, v. 7, n. 4, p. University Press, 1997.
603-611, 1982.
STILES, P.; TAYLOR, B. Boards at Work: How Directors View Their Roles and
KERR, J.; BETTIS, R. A. Boards of directors, top management compensation Responsibilities. New York: Oxford University Press, 2001.
and shareholder returns. Academy of Management Journal, v. 30, n. 4, p.
645-664, 1987. TURNBULL, S. Corporate governance: its scope, concerns and theories.
Scholarly Reserch and Theory Papers, v. 5, n. 4, 1997.
KESNER, I. F; VICTOR, B.; LAMONT, B. T. Board composition and the
commission of illegal acts: an investigation of Fortune 500 Companies. VANCE, S. C. Corporate Leadership: Boards, Directors, and Strategy. New
Academy of Management Journal, v. 29, n. 4, p.789-799, 1986. York: McGraw-Hill, 1983.
MILLS, C.Wright. The Power Elite. London: Oxford University Press, 1956. WILLIAMSON, O. E. The Mechanisms of Governance. New York: Oxford
University Press, 1996.
MIWA, Y. The economics of corporate governance in Japan. In: HOPT, K.
J.; KANDA, H.; ROE, M. J.; WYMEERSCH, E.; PRIGGE, S. (Eds.). ZAHRA, S.; PEARCE II, J. A. Boards of directors and corporate financial
Comparative Corporate Governance: The State of the Art and Emerging performance: a review and integrative model. Journal of Management,
Research. Oxford: Oxford University Press, 1998. p. 877-890 v. 15, n. 2, p. 291-334, 1989.