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RECOA – 2007

Hospital Geral de Santo António(*)


Serviço de Ortopedia
Director: Prof. Doutor António Oliveira

FRACTURAS DA RÓTULA
DA CLÍNICA AO TRATAMENTO….
Hélder Pereira (*)

As fracturas da rótula constituem cerca de 1% de todas as fracturas do


esqueleto. A posição subcutânea expõe particularmente a rótula ao
traumatismo. São geralmente fracturas articulares que prejudicam a função do
joelho causando morbilidade com repercussões no plano socioprofissional e
desportivo.

ANATOMIA E BIOMECÂNICA

A rótula é o maior osso sesamóide do


corpo humano. Tem a forma de um “triângulo
arredondado” de base superior e ápex inferior. É
formada por uma concha cortical periférica que
envolve osso esponjoso trabecular 13. Apenas a
face posterior é revestida por cartilagem, a mais
Fig. 1. Peça anatómica, corte transversal espessa que se encontra no ser humano 23 (fig.
1). A face posterior do pólo inferior também é
desprovida desse revestimento (é extra-articular, facto importante no
tratamento das fracturas a este nível). A face anterior da rótula é ligeiramente
convexa e a face articular encontra-se dividida por uma crista em duas grandes
faces, sendo mais frequentemente a face externa maior que a interna. Wiberg e
Baumgartl descreveram seis tipos morfológicos de rótula (fig. 2), considerando
que os tipos I e II seriam menos
propensos a luxação externa. Cada uma
das faces é dividida em 3 outras facetas
que articulam com o fémur em graus
sucessivos de flexão, descrevendo-se
uma faceta ímpar ao longo do bordo
interno da rótula, que apenas nos
extremos de flexão e cargas elevadas
entrará em contacto com o fémur.
No seu desenvolvimento comporta
Fig. 2 – Classificação Wiberg e Baumgartl
geralmente um único ponto de
ossificação secundário, visível a partir dos 3-5 anos (mais precoce nas
raparigas). Em 2 a 3% dos casos observa-se um segundo ponto de ossificação
(mais frequente no ângulo supero-externo) que quando não funde
completamente ao centro de ossificação principal origina uma variação
anatómica conhecida como rótula bipartida (geralmente é bilateral e tal facto
ajuda no diagnóstico diferencial com fractura a esse nível). Está também
descrito um centro de ossificação secundário para todo o bordo externo e outro
para o pólo inferior da rótula (no último caso pode estar associado ao sindroma
de Sinding-Larsen- Johanson). Ainda mais rara é a situação de rótula tripartida.
A rótula encontra-se “ancorada” ao joelho por um sistema cruciforme (fig.
3). Superiormente o tendão quadricipital insere-se na rótula em 3 planos
(superficialmente a expansão tendinosa do músculo recto anterior, plano médio
constituído pelas expansões dos tendões do vasto interno e vasto externo e
plano profundo formado por uma expansão fibrosa do vasto intermédio). No
plano transversal, a asa
interna ou ligamento
patelofemoral interno
estende-se do epicôndilo
interno aos dois terços
superiores do bordo interno
A
da rótula, ao passo que a asa
externa, melhor B
individualizada, vai do
epicôndilo externo à metade
superior do bordo patelar
externo. Os ligamentos
meniscofemoral interno e
externo vão do terço inferior Fig. 3 – Esquerda: Peça anatómica aparelho extensor; Direita: esquema
da rótula na face interna e demonstrando lig. patelofemoral externo A, e lig. meniscofemoral
externa respectivamente à externo B.
porção anterior do menisco
correspondente. As expansões dos vastos, conjuntamente com as asas
anatómicas da rótula constituem as “asas cirúrgicas”. No pólo inferior insere-se
o tendão rotuliano que se estende até à tuberosidade anterior da tíbia (TAT). A
fáscia lata que cobre a face anterior do joelho expande-se também até cada
lado da tíbia proximal. Estes elementos anatómicos formam, um importante
retináculo fibroso pré-rotuliano que tem duas funções: estabilização da rótula e,
em conjunto com a banda iliotibial, extensão secundária do joelho. Este
retináculo pode permanecer íntegro em
casos de fractura da rótula, permitindo
assim a extensão activa do joelho e
viabiliza o tratamento conservador dessas
fracturas.
A rótula recebe inervação através de
ramos dos nervos safeno, femoral cutâneo
anterior e sural cutâneo anterior.
A irrigação está a cargo de um anel
anastomótico formado por ramos
geniculares da artéria poplítea e ramos
comunicantes descendentes que ligam a
artéria femoral proximalmente às artérias poplítea e tibial anterior distalmente.
É uma irrigação peculiar, rica nos dois terços inferiores (fig. 4) e relativamente
pobre no terço superior. Por este motivo , uma osteossíntese com cerclage
periférica com risco de constrição vascular ou uma fractura transversal que
comprometa a irrigação do terço superior podem constituir obstáculos à
consolidação de fracturas.
A rótula tem como principal
função potenciar a força do
quadricípite. Afasta o tendão
quadricipital do centro da
articulação do joelho, aumentando
assim o seu braço de alavanca 10 e
potenciando até 50% a sua força
de extensão, dependendo do
ângulo do joelho. É nos últimos
graus de extensão que essa acção Fig. 5 – Acima: esquema dos vectores das forças no plano sagital
é mais importante. durante a flexão (ver texto); Segundo Maquet
12
No plano sagital (fig. 5) a
força de compressão patelofemoral Fig. 6 – Esquerda: esquema dos
vectores das forças no plano frontal.
R1 é a resultante da força de A resultante do quadricípite (FQ)
tracção quadricipital Fq e da força deriva de uma força de extensão
vertical e outra de subluxação
exercida pelo tendão rotuliano FR. externa da rótula (FR). Ao nível do
Essa força é directamente ligamento rotuliano a resultante FT
deriva de uma força FCE relacionada
proporcional à flexão, aumentando com o compartimento femurotibial
cerca de 6% por cada grau de externo e numa força RIT de
direcção interna que, em sinergia
flexão. Assim, a 60º de flexão com os músculos posteriores,
estima-se que a pressão exercida contraria a translação lateral da
extremidade superior da tíbia. A
na rótula seja de 4 vezes o peso força FR que comprime a rótula
do corpo, a subir e descer escadas contra a faceta externa da rótula
(força subluxante externa do ângulo
seja cerca de 3.3 vezes e no limite Q) é compensada pelos elementos
da flexão atinja 7.6 vezes o peso musculocapsuloligamentares
internos; Segundo Maquet
corporal. Apesar de geralmente a
força patelofemoral ser inferior à força femurotibial durante a carga, devido à
pequena superfície de contacto da articulação patelofemoral, estima-se que a
pressão nessa articulação seja
superior à sentida em qualquer
articulação de carga. São estes os
fundamentos que justificam as
fracturas de stress associadas a
determinadas práticas que solicitam
preferencialmente o joelho em flexão,
e também a base que suporta a
reabilitação inicial em extensão após
osteossíntese por fractura da rótula.
No plano coronal (fig. 6) existe Fig. 7 – Áreas de contacto patelofemoral durante o arco de
flexão. Baseado em Aglietti P, Insall JN, Walker PS, et al: A
uma força de subluxação externa, new patella prosthesis. Clin Orthop 107: 175, 1975
contrariada pelas estruturas capsulo-
ligamentares internas e, em extensão, pela acção do músculo vasto medial
(particularmente o vasto medial oblíquo cujas fibras se inserem na rótula com
uma inclinação de 50-55º, através de uma inserção tendinosa curta, sendo
assim o principal estabilizador dinâmico da rótula).
A superfície de contacto patelofemoral1 desloca-se no sentido proximal
na rótula ao longo da flexão (fig 7). A rótula centra na tróclea a cerca de 20º de
flexão, atingindo a superfície máxima de contacto aos 90º. Acima deste valor a
área de contacto começa a divergir em dois pontos separados. Assim, só a
partir dos 120º temos ambas as faces articulares da rótula, interna e externa
em contacto com o fémur, o que nos ajuda a compreender que uma fractura
vertical, interna ou externa, possa ser tratada com uma patelectomia parcial
sem prejudicar gravemente a função do joelho.

MECANISMO DE FRACTURA

O mecanismo mais frequente é o


traumatismo directo na face anterior do joelho, em
flexão, com contracção do quadricípite (fig. 8),
originando assim uma fractura transversal, com
desvio. Pode ocorrer na sequência de um
traumatismo de baixa energia (queda sobre o
joelho, pontapé durante uma agressão ou evento
desportivo) ou de alta energia (acidente de
viação com embate da rótula contra o tablier) Fig. 8 – Esquema de mecanismo de
causando vários padrões de fractura de acordo fractura (ver texto)
com o ângulo de flexão, a força do impacto, natureza da superfície de contacto,
ou qualidade do tecido ósseo. As fracturas cominutivas geralmente resultam de
situações em que a rótula é “encravada” entre os côndilos femorais. Num
traumatismo em extensão poderá resultar fractura da rótula sem solução de
continuidade do aparelho extensor (sem desvio ou pequeno desvio).
Mais raramente o mecanismo é indirecto.
Uma fractura pode ocorrer durante a contracção do quadricípite contra
resistência ou durante um movimento lateral da rótula (luxação) 17. No primeiro
caso inclui-se a fractura-avulsão da ponta da rótula na criança (sleeve-fracture)
e a fractura transversal, excepcionalmente vertical, no jovem desportista
(fracturas de stress em atletas com contracções frequentes ou flexão
prolongada e que geralmente mantêm integridade do retináculo pré-rotuliano).
Outros tipos de fractura
de stress foram descritos
em doentes com
encefalopatia espástica.
No caso do mecanismo
indirecto ser o
movimento lateral da Fig. 9 – Imagem de luxação da rótula; à direita visível fractura osteocondral e
rótula (luxação) pode fragmento livre intra-articular (setas vermelhas)
ocorrer uma fractura
osteocondral, eventualmente com lesão em espelho na tróclea (fig. 9).
DIAGNÓSTICO

Como geralmente acontece


em Ortopedia o diagnóstico
começa com a colheita da história
clínica e esclarecemiento da
sequência dos eventos. Os sinais e
sintomas mais frequentes incluem
dor aguda, hemartrose imediata
(gotículas de gordura na
artrocentese) e limitação ou
impossibilidade de efectuar
extensão activa. É importante

nesta fase excluir queixas noutros Fig.10 – Esquerda: fractura exposta; Direita: equimose anterior
pontos do corpo, principalmente
em traumatismos de alta energia (associação com fracturas ou luxações da
anca, fractura associada do fémur ou tíbia em 12% dos casos). À inspecção,
em 25% dos casos encontram-se lesões cutâneas (geralmente equimoses (fig.
10) ou escoriações mas em um quarto dos casos que cursam com lesões
cutâneas existe comunicação entre o foco de fractura e o exterior – fractura
exposta- fig. 10). À palpação é frequente encontrar uma depressão na face
anterior do joelho. Deve avaliar-se instabilidade ligamentar uma vez que está
descrita a lesão
associada do pivot
central (lesão do
ligamento cruzado
posterior – LCP –
em 3% dos casos,
lesão combinada do
LCP e ligamento
cruzado anterior –
LCA) ou luxação do
joelho. Deve
avaliar-se a
capacidade do
doente em elevar o
joelho em extensão
(“straight-leg raise”) Fig.11 –Esquerda: Rx de rótula bipartida unilateral (tangencial e face); Direita: fracturaa
ou extender o transversal de perfil
joelho parcialmente
flectido contra a gravidade (não são patognomónicos pelas razões anatómicas
já descritas). Sempre que existam dúvidas, em particular nas crianças, deve
avaliar-se o joelho contralateral.

O meio auxiliar de diagnóstico mais importante é o Rx (incidências de


face, perfil e tangencial da rótula – fig.11). Devem efectuar-se Rx contralaterais
nas crianças ou em suspeita de rótula bipartida.
O TC (tomograffia computorizada) ou RMN (ressonância magnética
nuclear) são mais raramente úteis, particularmente no diagnóstico de lesões
condrais ou osteocondrais, fracturas incompletas ou de stress (fig. 12).

Os diagnósticos
diferenciais mais
importantes são:
1- lesão do aparelho
extensor a outtro nível
(tendão rotuliano,
quadricipital, avulsão
da TAT, descolamento
osteoperiosteal do
tendão quadricipital ao
nível do pólo superior Fig.12- Imagens de RMN. Esquerda: fractura osteocondral (seta); Direita: fractura
da rótula descrito por incompleta da rótula com traço a partir da cortical anterior mas que poupa a face posterior
Trillat);
2- osteocondrite da rótula (situação rara), que pode ser confundida com
fractura osteocondral (contexto traumático, hemartrose com gotículas de
gordura);
3- rótula bipartida (geralmente bilateral, mais frequente no ângulo supero-
externo).

CLASSIFICAÇÃO

O tipo de fractura pode ser


descrito pelo padrão radiográfico (fig.
13). Podem ser transversais, verticais,
cominutivas, com ou sem desvio.
Fracturas osteocondrais podem ser
identificadas pela existência de um
corpo livre. Fractura-avulsão do polo
superior ou inferior (“sleeve fracture”
nas crianças). A clssificação de Duparc
tenta estabelecer uma relação com o
prognóstico e tratamento (tipo I: fractura
transversal simples na transição do
terço inferior; tipo II: cominução e
adelgaçamento do fragmento distal ao
traço transversal; tipo III: cominutiva, Fig. 13- Classificação morfológica de fracturas da rótula;
com adelgaçamento global da rótula por Classificação de Duparc
esmagamento – estrelada). Na
realidade, devido à grande variabilidade, nenhum método mostrou ser
completamente eficaz em estratificar o padrão de fractura e respectivo
prognóstico.
TRATAMENTO

Tratamento conservador

A viabilidade do tratamento conservador 2 vai depender essencialmente


da integridade do aparelho extensor, da existência de desvio entre os
fragmentos inferior a 1 mm e incongruência articular inferior a 1 mm. Como
indicações relativas deverão ser considerados a idade avançada, baixa
exigência funcional, osteopenia, patologia associada com probabilidade de
complicações anestésicas.
Em presença de hemartrose marcada deve fazer-se a drenagem por
artrocentese com intenção antálgica e de prevenir dano secundário da
cartilagem. Gelo local, analgésicos ou anti-inflamatórios conforme as queixas.
Aplica-se uma tala gessada com o joelho a 30º de flexão (prevenir rótula baixa).
Deve iniciar-se reabilitação passiva assim que seja tolerada, com mobilização
entre 0º e 60 ºde flexão. Não se deve ultrapassar a barreira dos 90º até à
estabilização da fractura, por volta das 6 semanas. Deve combater-se a
contractura do quadricipital, para evitar desvio secundário, podendo fazer-se
exercícios de mobilização vertical e lateral da rótula com a protecção da tala.
É permitida a carga parcial com tala em extensão e apoio externo.
Devem fazer-se raios-X seriados para controlar desvio secundário e
consolidação nas semanas 1, 2 e 6 após fractura.

Tratamento cirúrgico

O objectivo é a redução dos fragmentos, reconstituindo a superfície


articular com uma fixação estável que permita a mobilização precoce sem
desvio secundário 3. Deve realizar-se a cirurgia com o máximo respeito pelas
partes moles envolvidas, incisão vertical (ajustada nas fracturas expostas) e
evitar dissecção subcutânea anterior para evitar necrose de pele. A artrotomia
deve ser cuidadosa e limitada, as lesões condrais devem ser desbridadas para
controlo da redução na superfície articular.

Princípio da banda de tensão

Desenvolvido a partir dos trabalhos de Frederic


Pauwels sobre a transferência das cargas no osso, o
princípio da banda de tensão difundido nos anos 50
pelo Grupo AO 17 (Arbeitsgemeinshaft für
Osteosynthesefragen) descreve como se convertem
forças de distracção em forças de compressão pela
aplicação de um dispositivo excêntrico ou na face
convexa de um osso (fig. 14).
A técnica mais usada consiste na aplicação de 2 fios
Kirschner 2.0 mm, colocados de forma anterior e
paralelos (um em cada lado da linha média, dividindo Fig. 14- Na rótula, a colocação
a rótula em 3 partes iguais). Os fios K devem anterior da banda promove a
compressão no foco de fractura na
ultrapassar o comprimento da rótula superior e flexão do joelho (baseado AO
inferiormente. Faz-se depois passar um fio de aço em Principles of Fracture Management)
frente da rótula e atrás da ponta de cada fio K, fazendo uma figura de 8 ou de
moldura. O fio de aço pode passar na espessura do tendão quadricipital e
rotuliano para maior estabilidade da montagem. Ao tensionar o fio de aço
exerce-se um efeito de compressão nos vários fragmentos (fig. 15).
Deve evitar-se a colocação posterior dos fios K (efeito de afastamento anterior
dos topos ósseos – ver fig. 16) e a proeminência excessiva do material.
Existem muitas
variações desta
técnica 14, 15 (fig. 16),
nomeadamente a
apresentada por Lotke
e Ecker 11 em que,
para tentar evitar
alguma irritação
causada pela saliência
dos fios k estes são
substituídos, fazendo Fig. 15- Acima: imagens de
passar um fio de aço Rx (à esq- banda de tensão
figura 8; centro- perfil
por dois orifícios na mesmo joelho; dta: fio de
rótula. aço em moldura e cerclage)
À direita: pormenor de
Em fracturas técnica cirúrgica A-E
estreladas, em que a (baseado em Insall & Scott
Surgery of the Knee 4th ed
reconstrução Elsevier) Abaixo:
anatómica é
extremamente difícil,
podemos executar
uma cerclage fazendo
passar um fio de aço
perifericamente em torno da rótula, passando na espessura dos tendões
quadricipital e rotuliano para aproximar concentricamente os fragmentos.

Fig.16- Esquerda: efeito de colocação posterior fios K; Centro: técnica de Lotke e Ecker (Insall & Scott Surgery of the Knee
4th ed Elsevier); Direita: método de Pyrford que combina cerclage periférica com banda de tensão
Osteossíntese com parafusos

A aplicação de dois parafusos paralelos 3.5 mm é útil em fracturas


verticais, mas também em alguns casos de fracturas transversais, tornando
possível o efeito de compressão entre fragmentos 18 (fig. 17). Os parafusos
ficam dentro do osso minimizando as queixas relacionadas com o material de
osteossíntese, e o risco de migração é menor. Contudo, a sua aplicação em
osso muito osteoporótico pode ser um problema. Com parafusos canulados é
possível fazer passar um fio de aço pelos mesmos e tensioná-lo em torno da
rótula.

Fig.17- Esquerda:
fractura vertical da
rótula tratada por
osteossíntese com dois
parafusos; Direita:
fractura tipo II de
Duparc tratada com
osteosíntese por dois
parafusos canulados e
cerclage com fio de
aço.

Está também descrita a redução da superfície articular assistida por


artroscopia e fixação percutânea.

Fixador externo

Malgaigne descreveu em 1843 13 (antes da divulgação da assepsia e da


cirurgia aberta) o primeiro fixador externo (a garra
metálica – “griffe métallique”) para tratamento de
fracturas da rótula. Hoje tem uma configuração muito
diferente 21, consistindo em dois pinos percutâneos
com clamps laterais que permitem compressão entre
ambos (fig. 18). Pode ser útil em fracturas cominutivas,
expostas, pseudartroses, fracturas com fragmento
pequeno das extremidades, apesar de alguns autores
apresentarem bons resultados da aplicação Fig. 18- Fixador externo. Esquema de
Quan-Yi L, Jia-Wen W. Fracture of the
patella treated by open reduction and
external compressive skeletal fixation. J
Bone Joint Surg Am 1987; 69: 83-89
sistemática em fracturas transversais simples. Os pinos expostos por um
período prolongado causam incómodo adicional ao doente e aumentam o risco
de infecção
Patelectomia parcial

Na presença de uma fractura do polo superior ou inferior sem viabilidade


para osteossíntese, terá de se fazer exérese do fragmento e reconstituir
integridade do
aparelho
extensor. O
tendão
quadricipital
pode ser
reinserido ao
polo superior e
o tendão
rotuliano ao
inferior através
de pontos Fig. 19- Técnica de Cramer de patelectomia parcial. Baseado em Cramer K, Moed B: Patellar
transósseos fractures: Contemporary approach to treatment. J. Am Acad Orthop Surg 5:323, 1997
que podem ser
complementados por uma cerclage de descarga. Quando o retináculo pré-
patelar permanece íntegro geralmente não é necessário recorrer a enxerto de
tendão para reparar o aparelho extensor, mas essa é outra possibilidade
terapêutica. Cramer descreveu uma técnica de patelectomia parcial 5 que
consiste em fazer túneis ósseos longitudinais paralelos, próximo da superfície
articular (de forma a evitar báscula da rótula no plano sagital). Em seguida faz
passar um fio não-absorvível através do tendão, depois do túnel e conclui a
sutura sobre o osso (fig.19).
O tratamento das fracturas do polo inferior (que geralmente são extra-
articulares) é alvo de controvérsia entre osteossíntese vs. patelectomia parcial.
Bostrom 2 et al, na sua série apresentam 88% de resultados bons a
excelentes com patelectomia parcial comparados a 74% com osteossíntese.
Kastelec et al 9apresentam melhores resultados com osteossíntese com placa
em cesto do que com patelectomia parcial, justificando pelo maior risco de
patela baixa no último grupo, associado a piores resultados clínicos.
Em fracturas longitudinais, a exérese simples de pequenos fragmentos
laterais é recomendada. Contudo, se obrigar à exérese de mais de 50% da
rótula deve preferir-se uma patelectomia total devido ao risco de “maltracking”
patelofemoral.

Fig.21 – Esquema e Rx
pós-operatório de placa em
cesto segundo Kastelec et
al JBJS Am 86-A; 696-701.
2004

Patelectomia total

Este é o último recurso terapêutico quer pelo efeito mutilante quer pelas
importantes repercursões biomecânicas (aumenta a tensão do quadricípite em
15-50% e aumenta a tensão no tendão rotuliano em cerca de 30%). É
importante preservar o mais possível o retináculo prepatelar para manter o
máximo de função e verificar intra-operatoriamente um arco de mobilidade de
80-90º sem risco para a sutura e partes moles. O método mais difundido foi
descrito por Compére et al que preserva a continuidade e “tubuliza” o aparelho
extensor após a patelectomia (fig 22). Por vezes ocorre ossificação dentro
desse túnel criando-se assim uma “pseudorótula”, o que vem melhorar a acção
mecânica do aparelho extensor. Os resultados estão descritos como sendo
globalmente piores que os da fixação interna ou patelectomia parcial. A
diminuição de força do quadricípite com défice de extensão e alteração
funcional durante o apoio monopodálico em flexão (subir e descer escadas)
são achados frequentes.

PÓS-OPERATÓRIO
São importantes os cuidados com a pele, sobretudo durante a flexão (a
irrigação fica diminuída e o material superficial aumenta eventualmente a
agressão).
A reabilitação funcional segue, no essencial, as fases já descritas no
tratamento conservador.
O retorno à prática desportiva será possível entre 3 a 6 meses de forma
progressiva.
O material poderá ser retirado entre o 6º e 18º mês.

COMPLICAÇÕES
A mais frequente é a diminuição do arco de movimento, geralmente os
últimos graus de flexão o que acaba por ser razoavelmente tolerado pelos
doentes. A taxa de infecção está descrita entre os 3 a 10%, o que vem reforçar
a necessidade de cuidado com as partes moles (lavagem abundante,
manipulação mínima e cuidadosa). A perda de redução varia entre 0 e 20% na
literatura e as causas evitáveis mais frequentes são o erro técnico durante a
cirurgia e má colaboração do doente no plano de tratamento. Atraso de
consolidação ou pseudartrose são situações raras (inferior a 1% segundo
Carpenter e tal). Tem sempre de ser reconstituído o aparelho extensor e a
indicação será de revisão da osteossíntese (fixador externo é outra alternativa)
com enxerto autólogo. Em pseudartroses com longa evolução pode ser
necessário proceder a uma quadriciplastia para alongar o tendão quadricipital
(que entretanto terá sofrido retracção) antes de rever a osteossíntese. Após
fractura da rótula esse joelho é mais propenso ao desenvolvimento de artrose.
Esta pode surgir por várias causas: lesão da cartilagem apesar da superfície
articular ser restaurada (artrose pós-traumática), calo exuberante de reparação
da fractura que altera a dinâmica articular, restauro incompleto da superfície
articular e a reinserção inadequada do tendão rotuliano na rótula remanescente
após patelectomia parcial.
Apesar de não ser uma verddeira complicação, não raras vezes o
material de fixação é causa de queixas por irritação de tecidos moles e obriga à
sua remoção.

SITUAÇÕES ESPECIAIS DE FRACTURA DA RÓTULA


Fractura da rótula em crianças

Estando protegida por uma


cartilagem espessa, e nas crianças,
também pela laxidez ligamentar, as
fracturas da rótula representam menos de
1% da traumatologia infantil 6, 7. Contudo,

Fig. 23 – “Sleeve-fracture”
perante uma hemartrose, deve ser sempre investigada a rótula (avaliar sempre
também o joelho contralateral).
As fracturas do corpo seguem os mesmos princípios descritos para o
adulto.
Abaixo dos 16 anos, o mais frequente é a “sleeve-fracture” (fractura em
manga – fig. 23). Esta pode ocorrer com fragmento ósseo visível no Rx ou com
fragmento condral puro e neste caso a RMN conclui o diagnóstico. É de notar
que a patella alta não é um sinal constante. O tratamento é cirúrgico.
A fractura osteocondral é mais frequente nos adolescente, geralmente
após luxação e pode motivar extracção artroscópica do fragmento.

Pós-prótese total do joelho (PTJ)


Fig.24 - Classificação Goldberg. Clin Orthop
2366:115, 1988):
É uma
situação rara descrita • Tipo I
8, 20 (Implante estável, integridade ap
na literatura extensor ;fractura marginal)
como cerca de 3%
(varia entre 0.3 a • Tipo II
Ruptura ap extensor ou da fixação do implante
6.8%). A polémica da
colocação de
componente patelar
sai do âmbito deste
trabalho, mas os • Tipo III
A: Fractura pólo inferior com ruptura T. Rotuliano
factores de risco
B: Fractura sem desvio polo inf. e sem lesão T.
incluem factores rotuliano
relacionados com o
doente, com o
desenho dos
componentes e com • Tipo IV
a técnica cirúrgica. – Fractura-luxação lateral (“shear
Tem um fracture”)

prognóstico diferente
e especificidades de
tratamento que faz merecer classificação separada, como nos propõe Goldberg
et al (fig. 24). As situações que requerem tratamento cirúrgico estão
globalmente relacionadas a pior resultado clínico (fig. 25).
Fig. 25 –
Evolução
de fractura
tipo II
tratada com
banda de
tensão e
evolução
com
necrose da
rótula
Pós-ligamentoplastia do LCA (osso-tendão-osso)

Tem uma incidência inferior a 1%. Fig. 26- M. T.


Pereira, A. R.
Pode ocorrer durante a colheita do Adhikari. Case
enxerto e ser diagnosticada report:Patellar
tendon injury
intraoperatoriamente ou ser uma fissura following
que evolui e é detectada na fase de anterior cruciate
reconstruction.
reabilitação; também pode surgir na The Knee 6
sequência de queda 4, 16, 20. A fractura (1999) 285-287
vertical pode ser tratada com parafuso
(cuidado para não fazer compressão
sobre a zona dadora) e a transversal com
uma banda de tensão (fig. 26).

Fracturas de stress

São lesões de sobrecarga e podem ser confundidas com tendinite do


rotuliano 22. Muitas vezes surgem em desportistas (ski, basquetebol, futebol,
corredores de fundo), com gonalgia crónica no compartimento anterior, sem
história traumática. Tem incidência aumentada no genu varum/recurvatum e
está associado a torção externa excessiva da tíbia. O Rx geralmente é
conclusivo, mas em fracturas incompletas pode ser necessário TC ou RMN. O
tratamento baseia-se na correcção dos hábitos e do treino, mas pode ser
necessário cirurgia nas fracturas com desvio, ou exérese de pequenos
fragmentos.
Deve-se ponderar sempre a correcção de desalinhamento patelar subjacente.

CASUÍSTICA 2001-2006

Material e métodos

Efectuámos um trabalho de análise retrospectiva de todos os casos


operados na nossa instituição por fractura da rótula de qualquer etiologia no
período compreendido entre 01/11/2001 e 01/11/2006.
Foram registados 42 casos. 5 foram excluídos do estudo (4 por óbito e 1 por se
encontrar a residir no estrangeiro).
Foram consultados os processos clínicos e convocados os doentes para
uma entrevista. Responderam a esta convocatória 28 dos 37 doentes incluídos.
Estes foram avaliados pelo Knee Society Score (KSS) modificado por Insall em
1993, o grau de satisfação actual aferido por escala linear visual graduada de 1
a 10 e submetidos a exame radiológico (Rx de face, perfil e incidência de
Merchant). Dos 28 casos avaliados constam 16 homens e 12 mulheres, idade
média de 58 anos (mínima 18 e máxima 86 anos), 20 lesões ocorreram no
joelho direito e 8 no esquerdo. O mecanismo de lesão foi sempre traumatismo
directo, secundário a queda em 24 caos, acidente de viação (alta energia;
trauma no tablier) em 3 e um traumatismo desportivo (pontapé).
Resultados

Após avaliação radiológica as fracturas foram classificadas como 16


transversais sem desvio, 4 transversais com cominução, 4 cominutivas, 3
interessando o pólo inferior e um caso de fractura pós-PTJ III A de Goldberg.
Dois dos casos tinham antecedentes cirúrgicos no joelho em que
sofreram a fractura de rótula: um tinha sido submetido a artroplastia total do
joelho sem componente patelar 3 meses antes e outro tinha sofrido fractura da
mesma rótula sete anos antes, tratado com banda de tensão atingiu
consolidação, sofreu nova queda com fractura cominutiva (ver quadro 1).
Quadro 2

As opções de
tratamento foram: em 21 casos banda de tensão com fios K, em 4 casos
patelectomia parcial com reinserção do tendão rotuliano, uma osteossíntese
com parafuso e banda de tensão, uma patelectomia total e uma cerclage com
cabo de aço (quadro 2).

Os resultados obtidos no KSS – Knee e KSS – Função estã o


sumarizados nos quadros 3 e 4.
Quadro 3
Quadro 4

Verificamos a ocorrência de 3 complicações: um caso de infecção e


demontagem e dois casos de desmontagem da osteossíntese. Um foi tratado
com revisão da osteossíntese com parafusos e banda de tensão e em dois
casos foi feita patelectomia (ver quadros 5 a 7).

Quadro 5
Quadro 6

Quadro 7

Um doente foi submetido a patelectomia total primária. Trata-se do doente com


antecedentes de fractura prévia da rótula ipsilateral operada 7 anos antes com
banda de tensão com fios K em que se conseguiu consolidação e retoma das
actividades diárias. Não foi feita extracção de material (doente não tinha
queixas, não pretendia cirurgia). Sofreu nova queda resultando fractura
cominutiva em que não foi possível preservar mais de metade da rótula e
decidiu-se então pela patelectomia (ver quadro 8).

Quadro 8

Assim sendo no total, apesar de se assumir esta técnica como último


recurso terapêutico, 3 dos 28 doentes fizeram patelectomia de Compére (ver
quadro 9).

Quadro 9
Casuística 2001-2006
Patelectomia Total 3 casos

1,2
1
0,8
0,6
0,4
0,2
0
Fractura prévia Pós- Pós-infecção
KSS Knee= 83 Desmontagem KSS Knee= 90
KSS Function= 45 KSS Knee= 71
KSS Function= 80
KSS Function= 70
O grau de satisfação final Quadro 10

dos doentes está sumarizado no


Casuística 2001-2006
quadro 10, constatando-se que
os doentes se consideram
Grau de satisfação
razoavelmente reabilitados após Escala linear visual
a lesão da rótula, incluindo os
10
casos de patelectomia total e de
revisão de osteossíntese. Um 5
4 4
dos piores resultados clínicos 2
3

ocorreu na fractura pós-PTJ o 0

que poderá estar de acordo com 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10


o consenso actual de que estas
fracturas têm implicações
terapêuticas e prognóstico distintos, e por isso também classificação separada.

Discussão

Esta é uma série pequena, e um trabalho retrospectivo com consulta de


arquivos clínicos com as limitações daí decorrentes. Contudo é possível
constatar a variabilidade do padrão de fracturas da rótula numa população
adulta e maioritariamente idosa (com co-morbilidade não desprezível em
muitos casos). Os recursos técnicos disponíveis para o tratamento são também
muitos, com possibilidade de combinações para se adequar o mais possível ao
caso concreto. Os resultados obtidos podem ser considerados como razoáveis
com KSS – Knee médio de 86.39 (63-100) e KSS – Function médio de 76.06
(45-100), com uma taxa de complicações requerendo re-intervenção de 11%.
Contudo após a segunda cirurgia também esses doentes se consideraram
razoavelmente satisfeitos com os resultados obtidos.
Apesar de reafirmarmos o carácter excepcional da patelectomia total, os
bons resultados obtidos nestes casos poderão estar de acordo com a indicação
desta técnica quando não seja possível preservar pelo menos metade da rótula,
ou em casos limite de sequelas de infecção ou irregularidade grosseira da
superfíce articular.

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