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EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

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23.1 PUNIBILIDADE

23.1.1 Conceito

Tendo ocorrido um crime – um fato típico, ilícito e culpável –, deve ser, de


conseqüência, uma pena criminal.

Haverá, a princípio, a possibilidade de o Estado aplicar a sanção penal ao agente


do crime. Essa possibilidade de punir o agente do crime, de exercer o jus puniendi,
chama-se punibilidade. A punibilidade é a conseqüência jurídica do crime1.

Ensina FRANCISCO MUÑOZ CONDE:

“Com a constatação da tipicidade, da ilicitude e da culpabilidade pode-se dizer


que existe um delito completo em todos os seus elementos. Em alguns casos
exige-se, contudo, para a punição de um fato como delituoso, a presença de
alguns elementos adicionais, que não podem ser incluídos nem na tipicidade, nem
na antijuridicidade, nem na culpabilidade, porque não correspondem à função
dogmática e político-criminal dessas categorias.”2

No passado, os melhores doutrinadores consideravam a punibilidade um quarto


elemento do crime, o que, hoje verifica-se, é incorreto, pois que ela se situa fora do
crime, consequência que dele é.

A punibilidade é, em síntese, a possibilidade jurídica da imposição da pena ao


agente do crime.

Trata-se de uma categoria que não integra o conceito de crime, mas que, como
sua conseqüência jurídica, vai condicionar a imposição da resposta penal e que só

1 JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 389.

2 CONDE, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988. p.

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2 – Direito Penal – Ney Moura Teles

existirá quando estiverem presentes algumas causas, as condições objetivas de


punibilidade, e ausentes outras causas, umas chamadas escusas absolutórias, outras
denominadas extintivas da punibilidade.

Por exemplo: Flávio, maior, imputável, tendo subtraído para si dinheiro de seu
pai, terá cometido um crime de furto, não militando, em seu favor, nenhuma causa de
exclusão da ilicitude, e tampouco de culpabilidade; no entanto, não sofrerá sanção
penal, porquanto, apesar de típico, ilícito e culpável, esse fato não será punível, porque
o direito entende não dever incidir sobre esse agente a pena criminal, apesar de o crime
ter-se aperfeiçoado integralmente.

Num crime de ação de iniciativa privada exclusiva, por exemplo, na injúria, a


queixa deverá ser proposta no prazo de seis meses contados da data em que o agente
tomou conhecimento de quem foi o agente do fato. Transcorrido esse prazo, sem que a
ação penal tenha sido proposta por meio de queixa, não mais poderá ser iniciada, por
força da decadência do direito de agir, pelo que, mesmo tendo havido crime – fato
típico, ilícito, culpável –, não será mais possível a imposição da pena, porque a
punibilidade já estará extinta.

Diante de um crime, para haver a punibilidade, pode, às vezes, ser necessária a


presença das chamadas condições objetivas de punibilidade e, a um só tempo, devem
estar ausentes as escusas absolutórias e as causas extintivas da punibilidade, que
constituem o objeto do estudo a seguir.

23.1.2 Condições objetivas de punibilidade

Condições objetivas de punibilidade são circunstâncias que se situam fora do


crime, isto é, do fato típico – do dolo – da ilicitude, e da culpabilidade; sem elas não
pode ser imposta a pena, como resposta do direito.

É o que acontece, por exemplo, quando Maria, brasileira, em viagem à


Dinamarca, realiza ali o tipo legal do crime de aborto, violando o preceito do art. 124 do
Código Penal brasileiro. Segundo estabelece o art. 7º, II, b, do Código Penal, a lei penal
brasileira aplicar-se-á a crimes cometidos no estrangeiro por brasileiros. Para a
imposição da pena, todavia, é indispensável que o fato praticado seja “punível também
no país em que foi praticado” (art. 7º, § 2º, b).

Ora, se na Dinamarca Maria realizou um aborto lícito, permitido, o fato típico


por ela realizado não é punível no país em que se realizou. Logo, a lei penal brasileira não
poderá ser aplicada. Esta é uma condição objetiva de punibilidade. Situa-se fora do
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crime, fora do dolo do agente, extrinsecamente, e impede a imposição da sanção penal


apesar de o crime ter-se aperfeiçoado.

Outra condição objetiva de punibilidade, também relativa a crimes cometidos


no estrangeiro, é a constante do mesmo art. 7º, § 2º, alínea c, que exige, para a
aplicação da lei brasileira, “estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei
brasileira autoriza a extradição”.

Verifica-se que, nessas situações, apesar de ter havido um crime, a pena não
poderá ser imposta ao agente, pela ausência dessas condições de punibilidade, que são
objetivas.

23.1.3 Escusas absolutórias

Já as chamadas escusas absolutórias são situações concretas previstas na parte


especial do Código Penal que impedem a aplicação da pena ao agente de um fato típico,
ilícito e culpável, de um crime.

Não se confundem com as causas de exclusão da ilicitude – legítima defesa,


estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular de direito –
nem com as dirimentes – descriminantes putativas, erro de proibição inevitável, coação
moral irresistível, obediência hierárquica – que excluem o próprio crime.

São situações ditadas por princípios ou interesses de política criminal, que


impedem a imposição da pena, atingindo a possibilidade jurídica de punir, a punibilidade.

São duas as escusas absolutórias previstas no Código Penal.

Dispõe o art. 181 do Código Penal, que se refere aos crimes contra o patrimônio,
exceto os de roubo e extorsão e os praticados com violência ou grave ameaça:

“É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em
prejuízo: I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II – de
ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou
natural.”

Esta escusa absolutória impede a imposição de pena ao filho que furta do pai, ao
marido que pratica estelionato em prejuízo da mulher, na constância do casamento, do
pai que se apropria indevidamente de coisa de propriedade do filho.

São razões de política criminal que inspiram a construção da escusa absolutória.


Note-se que o crime existe, não havendo apenas a punibibilidade, tanto que o estranho
que dele participa não é beneficiado com a isenção da pena criminal (art. 183, II, CP).
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A outra escusa absolutória diz respeito ao crime de favorecimento pessoal,


definido, assim, no art. 348 do Código Penal: “Auxiliar a subtrair-se à ação de
autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão.” Se o agente
desse crime, o que auxiliar o autor de crime a subtrair-se à ação da autoridade pública,
for seu ascendente, descendente, cônjuge ou irmão, estará isento da pena (§ 2º, art.
348, CP).

Trata-se, outra vez, de uma escusa absolutória que não exclui a existência do
crime, impedindo, apenas, a imposição da pena.

É uma medida imperiosa que leva em conta a relação familiar, de intimidade,


entre o agente e o beneficiado pelo crime, determinando ao Estado abrir mão da
imposição da pena, por uma questão de compreensão do comportamento do indivíduo
revelador de seu espírito de coragem e de solidariedade, merecedor, assim, de um
benefício do direito.

23.1.4 Efeitos da extinção da punibilidade

As causas extintivas da punibilidade, em geral, atingem apenas o jus puniendi,


permanecendo o crime em sua integridade, com todos os seus demais efeitos e, quando
operarem após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, atingirão a
primariedade do agente.

Em algumas situações excepcionais, a causa de extinção da punibilidade atinge


o crime em sua totalidade, eliminando-o simplesmente, como ocorre na hipótese da
abolitio criminis e da anistia.

Quando a causa operar antes do trânsito em julgado da sentença condenatória,


extinguindo o direito estatal de punir o infrator da norma, este não será julgado e, de
conseqüência, garantirá a situação de primariedade, se existente até então.

23.1.5Extinção da punibilidade nos crimes acessórios complexos e


conexos

O art. 108 do Código Penal estabelece:

“A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou


circunstância agravante de outro não se estende a este. Nos crimes conexos, a
extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação
da pena resultante da conexão.”
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Há crime que é pressuposto de outro crime. Em outras palavras, um crime é


acessório em relação a outro, como, por exemplo, acontece com o furto (art. 155, CP) e a
receptação (art. 180, CP). A norma diz que a extinção da punibilidade de um crime não
alcança a punibilidade do outro.

Nos crimes complexos, um crime é circunstância qualificadora de outro, ou então


um deles é elemento constitutivo de outro, como, por exemplo, na extorsão mediante
seqüestro, definida no art. 159, composta dos tipos de seqüestro (art. 148, CP) e de
extorsão (art. 158, CP). Extinta a punibilidade de qualquer dos crimes elementares, ou
daquele que é qualificadora, nem por isso estará extinta a punibilidade do crime
complexo.

Nos crimes conexos – unidos por um nexo teleológico, conseqüencial ou ocasional


–, a extinção da punibilidade de um deles não impede a agravação da pena do outro,
que resulta da conexão.

Exemplo de crimes conexos é o homicídio cometido para assegurar a ocultação de


um crime de apropriação indébita. Se, quanto à apropriação indébita, a punibilidade
extinguir-se, o agente continuará respondendo pelo homicídio em sua forma
qualificada.

23.2 CAUSAS DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

A punibilidade do fato poderá ser extinta quando estiverem presentes algumas


causas estabelecidas na lei. Algumas delas podem aplicar-se a todo e qualquer crime,
outras a alguns em particular.

Estão previstas no art. 107 do Código Penal:

A “retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso”,


prevista no inciso III do art. 107, não é, em verdade, uma causa de extinção da
punibilidade, mas de extinção do próprio crime, a já conhecida e estudada abolitio
criminis, extinguindo, quando ocorrente, o processo ou a execução penal.

Quanto às demais, são objeto do estudo a seguir. A prescrição, por sua


importância, natureza e complexidade, será estudada em capítulo à parte,
isoladamente, o mesmo ocorrendo com a suspensão condicional do processo penal,
causa extintiva da punibilidade estabelecida na Lei nº 9.099/95, que é tratada no
próximo capítulo.

A seguir, a análise das causas de extinção da punibilidade previstas no art. 107


do Código Penal.
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23.2.1 Morte do agente

Morrendo o acusado da prática de um crime, antes, durante ou após o término


do processo, a possibilidade de o Estado exercer seu direito de punir extingue-se
automaticamente, até porque a Constituição Federal assegura que “nenhuma pena
passará da pessoa do condenado” (art. 5º, XLV).

Com a morte do agente, desaparece a relação jurídica existente anteriormente


entre ele e o Estado, que autorizava este a pedir ao poder judiciário a condenação penal.

Apesar de algumas opiniões favoráveis, é certo que a morte presumida, de que trata o
art. 10 do Código Civil, não pode equiparar-se à morte real, extinguindo a punibilidade.
Assim, somente à vista de certidão de óbito, poderá ser decretada a extinção da
punibilidade.

Doutrina e jurisprudência dominantes são uniformes ao afirmar que, na


hipótese de certidão de óbito falsa, não é possível, após o trânsito em julgado da
sentença que declarou extinta a punibilidade, rever-se a decisão, reabrindo-se o
processo, porquanto o Direito brasileiro não admite a revisão do processo em desfavor
do réu. Nessas situações, somente poderia haver processo pela falsificação e pelo uso do
documento falsificado.

Nada obstante a inexistência da chamada revisão criminal pro societate, no caso


de falsidade demonstrada e comprovada, a sentença que declarou extinta a
punibilidade se terá assentado numa premissa inexistente, a morte do acusado. Se esta
é a condição para a extinção da punibilidade, e verificou-se não ter ocorrido, não pode,
igualmente, perdurar a perda do direito de punir do Estado.

A verdade não pode quedar-se diante de uma simples formalidade, pelo que,
excepcionalmente, deve-se admitir a revisão contra esse réu, que teve extinta sua
punibilidade pela declaração falsa de sua morte.

23.2.2 Anistia, graça e indulto

Anistia é o esquecimento do fato, a renúncia, pelo Estado, de exercer o jus


puniendi; daí que, concedida, fica automaticamente extinta a punibilidade.

Dispõe o art. 48, VIII, da Constituição Federal que a anistia será concedida pelo
Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, por meio de uma lei
cujo efeito será apagar o crime, extinguindo a punibilidade e os efeitos penais, já que os
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de natureza civil não são alcançados pela renúncia estatal.

A anistia é geralmente concedida para crimes de natureza política, como gesto


de pacificação dos espíritos de um país, um povo, como aconteceu recentemente no
Brasil após o regime autoritário instaurado com o golpe militar de 1964. Atingiu, é
sabido, os crimes políticos e os com eles conexos. Nada impede, todavia, que a anistia
seja concedida para crimes outros.

A anistia é geral, alcançando os fatos por ela referidos e, de conseqüência, as


pessoas neles envolvidas.

O inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal mandou a lei considerar


insuscetíveis de anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, o terrorismo e os crimes chamados hediondos.

Graça e indulto em muito se assemelham, embora a diferença seja clara. São


formas de indulgência, clemência, reservadas ao arbítrio do Presidente da República, e
atingem apenas a execução das penas, não alcançando quaisquer dos efeitos civis da
condenação. Diferem no sentido de que a graça é individual – daí ser chamada indulto
individual – e, em regra, é solicitada pelo condenado, e o indulto é coletivo e resulta de
ato espontâneo do Presidente da República.

A Lei de Execução Penal trata desses institutos nos arts. 188 a 193. O indulto
coletivo pode ser total ou parcial, extinguindo ou diminuindo as penas. Neste último
caso, não haverá extinção da punibilidade, mas tão-somente a comutação da sanção
penal.

O indulto coletivo dirige-se a um grupo de condenados, que se enquadrem na


situação jurídica prevista no ato que o concede (decreto), que estabelecerá os requisitos
para sua obtenção.

Os requisitos poderiam, por exemplo, ser os seguintes: (a) condenados a penas


inferiores a quatro anos; (b) primários, de boa conduta social; (c) de bom
comportamento carcerário; (d) que tenham cumprido 1/3 da pena; (e) que não tenham
sido anteriormente indultados.

O Presidente da República, pelo Decreto nº 1.860, de 11-4-1996, concedeu o que


chamou de “indulto especial e condicional” a condenado a pena privativa de liberdade
inferior a seis anos, primário e de bons antecedentes, que tivesse cumprido no mínimo
1/6 da pena, condicionado a subsistência da condição de primário do condenado, e a
seu bom comportamento – durante 24 meses após a obtenção da liberdade.

Trata-se, como se vê, de um indulto que não visava à extinção, imediatamente,


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da punibilidade, mas apenas se decorrido o período de prova de 24 meses, sem


revogação.

A doutrina tradicional entende que o indulto só é possível após o trânsito em


julgado da sentença condenatória, não beneficiando os condenados com sentença
recorrida. A jurisprudência, todavia, vem entendendo que, se a sentença transitou em
julgado para o Ministério Público, o acusado tem direito ao indulto. Esse é o
entendimento correto.

23.2.3 Decadência

Tratando-se de ação penal de iniciativa privada – aquela incoada pelo ofendido


ou seu representante legal – ou de ação penal de iniciativa pública condicionada, a
queixa, peça inaugural do processo, ou a representação, no segundo caso, deve ser
oferecida, dentro do prazo de seis meses, contados da data em que o querelante teve
ciência de quem seja o autor do fato típico, e no caso de ação penal de iniciativa privada
subsidiária de pública, da data em que expirou o prazo para o Ministério Público
oferecer a denúncia.

É a norma do art. 103 do Código Penal.

Se a queixa ou a representação não tiverem sido apresentadas no prazo de seis


meses, o ofendido decairá do direito de ação ou de representação. Terá perdido o
direito de acionar ou delatar o infrator da norma penal.

Esse prazo é fatal e não se prorroga. A instauração de inquérito policial, para


apurar a materialidade da infração, ou a realização de qualquer diligência, não
suspende, nem interrompe, o prazo decadencial.

Extinto o direito de ação ou de representação, extinto estará igualmente o


direito de punir do Estado.

Nos crimes definidos na lei de imprensa, o prazo decadencial é de três meses da


data da publicação ou da transmissão, e não se interrompe com eventual pedido de
explicações. No crime de adultério, o prazo é de um mês.

Na ação privada exclusiva e na ação pública condicionada, começa a fluir o


prazo da data em que o ofendido ou seu representante toma conhecimento da autoria
do crime, e não da data em que o crime ocorreu, salvo, é óbvio, se o ofendido ou seu
representante dele tiver tomado conhecimento no mesmo momento. Se for ação
privada subsidiária de pública, o prazo começa a contar do dia em que expirou o prazo
para o Ministério Público oferecer a denúncia.
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Conta-se o dia do início do prazo, que é a data em que se tomou ciência do fato.

Se o ofendido tem menos de 18 anos, só seu representante legal pode oferecer a


queixa, e, quando tem mais de 18 e menos de 21 anos, a queixa poderá ser proposta por
ambos (art. 34, CPP). Supondo que o crime é praticado quando o ofendido tem 17 anos,
só seu representante legal pode oferecer a queixa. Se ele não o faz, no prazo legal, terá
perdido o direito de agir, pela decadência. Mas o próprio ofendido poderá, após
completar 18 anos, exercer o direito de queixa. Assim, para ele, o prazo decadencial
somente começará a fluir da data em que completar 18 anos.

Se o representante legal da vítima menor de 18 não tiver conhecimento de quem


seja o autor do crime e ela, após completar 18 anos, deixa transcorrer o prazo
decadencial, perdendo o direito de agir e, passados dois anos, quando ela já tem 20
anos, o representante legal vem a descobrir o autor do crime, poderá, a partir dessa
data, e dentro de seis meses, oferecer a queixa.

23.2.4 Perempção

Perempção é a perda, pelo ofendido ou seu representante legal – chamado


processualmente de querelante –, do direito de prosseguir na demanda contra o agente
do fato – dito querelado – em razão de inércia ou desídia no curso do processo
instaurado.

Dispõe o art. 60 do Código de Processo Penal:

“Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á


perempta a ação penal: I – quando, iniciada esta, o querelante deixar de
promover o andamento do processo, durante 30 dias seguidos; II – quando,
falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em
juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 dias, qualquer das
pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III – quando o
querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do
processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação
nas alegações finais; IV – quando, sendo querelante pessoa jurídica, esta se
extinguir sem deixar sucessor.”

Trata-se de uma sanção imposta ao ofendido que, como titular do direito de agir,
inicia o processo e, depois, não cumpre com seus deveres processuais, salvo se houver
motivo justo para tanto; daí que a perempção deve ser decretada pelo juiz, não
ocorrendo automaticamente.
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Só há perempção quando se tratar de ação penal de iniciativa privada exclusiva,


não ocorrendo quando a ação for de iniciativa privada subsidiária de ação de iniciativa
pública.

Perempta a ação penal, extinta, de conseqüência, a punibilidade.

23.2.5 Renúncia

Esta causa de extinção da punibilidade aplica-se apenas aos casos de ação penal
de iniciativa privada, exclusiva ou subsidiária de pública.

Renúncia é a desistência do direito de acionar o agente do crime. Se o ofendido e


seu representante legal são os titulares da ação, por força de lei, e não desejam, por ato
voluntário, promover a persecução penal, o Estado, que lhes concedeu esse direito, não
poderá punir, ficando, de conseqüência, extinta a punibilidade.

É entendimento doutrinário dominante o de que a renúncia deve preceder ao


início da ação penal, antes, pois, do oferecimento da queixa. Se tiver sido apresentada a
queixa, não mais poderão, ofendido e representante, renunciar.

A renúncia pode ser expressa ou tácita. Expressa quando constar de declaração


assinada pelo ofendido ou seu representante legal, podendo ser firmada também por
procurador, ainda que não advogado, com poderes especiais para renunciar, como
preconiza o caput do art. 50 do Código de Processo Penal.

Renúncia tácita é a que decorre da prática de um comportamento, um ato


qualquer, que seja induvidosamente incompatível com o exercício do direito de ação.

“Importam em renúncia tácita fatos inequívocos, conscientes e livres. Cumpre que


traduzam uma verdadeira reconciliação, ou o positivo propósito de derrelição do
direito de queixa. Não têm relevância, por exemplo, as continuadas ou
supervenientes relações de necessidade, de subordinação, de civilidade, ou de
conveniência social, intercedentes entre o ofendido e o ofensor, nem os meros
atos de humanidade praticados por aquele em favor deste. Se o ofendido ainda
ignora a existência do crime, nenhuma significação tem, no tocante à renúncia, a
continuidade dos laços de estima entre ele e o ofensor. Quando obtidos por
coação ou fraude, os atos de reconciliação carecem de qualquer valor jurídico.”3

O recebimento, pelo ofendido, qualquer que seja o meio ou a forma, do valor da

3 HUNGRIA, Nelson. Comentário ao código penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1955. v. 4, p. 120.
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indenização do dano causado pelo crime, não implica renúncia tácita, como dispõe
expressamente o parágrafo único, in fine, do art. 104 do Código Penal.

Dispõe o parágrafo único do citado art. 50 que

“a renúncia do representante legal do menor que houver completado 18 anos


não privará este do direito de queixa, nem a renúncia do último excluirá o
direito do primeiro”.

A queixa, quando o ofendido é menor de 21 e maior de 18 anos, pode ser oferecida


por ele próprio ou por seu representante legal, como diz o art. 34 do Código de Processo
Penal. Se um renunciar, o outro poderá propor a ação.

23.2.6 Perdão do ofendido, aceito

Dispõe o art. 105 do Código Penal: “O perdão do ofendido, nos crimes em que se
procede mediante queixa, obsta ao prosseguimento da ação.” O inciso V do art. 107
determina que o perdão aceito, nos crimes de ação privada, extingue a punibilidade.

Perdão é a desistência, pelo ofendido ou seu representante legal, de prosseguir


na ação penal. Difere do perdão judicial, porque este é concedido pelo juiz, em certas
situações em que a pena se torna desnecessária.

O perdão do ofendido diz respeito apenas à ação penal de iniciativa privada


exclusiva, até porque, nas ações subsidiárias de pública, o Ministério Público, se o
queixoso desistir, pode prosseguir no pólo ativo da relação processual, demandando a
condenação do agente do fato.

O perdão do ofendido ocorre após o início da ação penal privada, devendo ser
oferecido até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (§ 2º, art. 106).

O perdão concedido expressamente nos autos da ação penal é o chamado


processual, podendo, todavia, ser concedido fora dos autos do processo, de modo
expresso ou tacitamente. Nesse caso, diz-se perdão extraprocessual.

O perdão é expresso quando constar de declaração escrita assinada pelo


ofendido, seu representante legal ou o procurador com poderes especiais. Tácito é o
perdão que decorre da prática de um comportamento, ou de um ato incompatível com a
vontade de prosseguir no processo.

O perdão é, necessariamente, um ato bilateral, pelo que, se o agente não o


aceitar, recusando-o, não produzirá qualquer efeito. A aceitação, do mesmo modo, pode
ser processual, extraprocessual, expressa ou tácita.
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23.2.7 Retratação do agente

Nos crimes de calúnia e difamação, tipificados no Código Penal (arts. 138 e 139),
e nos crimes contra a honra praticados por meio da imprensa, inclusive o de injúria
(arts. 20, 21 e 22 da Lei nº 5.250/67), bem assim nos crimes de falso testemunho e
falsa perícia (art. 342, § 3º, CP), a retratação cabal do ofensor extinguirá a
punibilidade.

A retratação é a atitude do ofensor consistente em desdizer a afirmação feita. É


“voltar atrás”, desculpando-se pela afirmação proferida anteriormente.

Só excepcionalmente a lei admite a retratação como causa de extinção da


punibilidade. Diz o art. 143 do Código Penal: “O querelado que, antes da sentença, se
retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena.”

Nessas hipóteses, a retratação deve ser feita antes da sentença que decidir sobre
a ação, e o juiz deverá considerá-la idônea e adequada a reparar a ofensa causada, não
dependendo de aceitação do ofendido.

Já o art. 26 da Lei nº 5.250/67, a Lei de Imprensa, abrangendo também a


injúria, assim dispõe:

“A retratação ou retificação espontânea, expressa e cabal, feita antes de iniciado


o procedimento judicial, excluirá a ação penal contra o responsável pelos crimes
previstos nos arts. 20 a 22. § 1º A retratação do ofensor, em juízo, reconhecendo,
por termo lavrado nos autos, a falsidade da imputação, o eximirá da pena,
desde que pague as custas do processo e promova, se assim o desejar o ofendido,
dentro de 5 (cinco) dias e por sua conta, a divulgação da notícia da retratação. §
2º Nos casos deste artigo e do § 1º a retratação deve ser feita ou divulgada: a)
no mesmo jornal ou periódico, no mesmo local, com os mesmos caracteres e sob
a mesma epígrafe; ou b) na mesma estação emissora e no mesmo programa ou
horário.”

Poderá o agente retratar-se nos crimes de falso testemunho e falsa perícia,


conforme estabelece o § 3º do art. 342 do Código Penal: “O fato deixa de ser punível,
se, antes da sentença, o agente se retrata ou declara a verdade.”

A dúvida é saber se a retratação, nesses casos, deve ser feita antes da sentença
prolatada no processo em que foi cometido o crime de falso testemunho ou falsa
perícia, ou se no processo instaurado contra o agente do falso.
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A retratação, ensina DAMÁSIO E. DE JESUS, “só é possível até a sentença final do


procedimento em que foi praticado o falso testemunho”4. Tratando-se de processo de
competência do tribunal do júri, o agente pode retratar-se até o julgamento final, pelo
júri popular.

23.2.8 Perdão judicial

Perdão judicial é o ato pelo qual o juiz, apesar de condenar o agente, deixa de
aplicar a pena. Diz respeito a certas situações especiais, em que a aplicação da sanção
penal é absolutamente desnecessária ou não é recomendável, por motivos de política
criminal, ou em face do princípio da intervenção mínima.

São as seguintes as hipóteses em que o juiz deve aplicar o perdão judicial.

Art. 121, § 5º, Código Penal:

“Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as


conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a
sanção penal se torne desnecessária.”

Esta hipótese aplica-se, também, ao crime de lesão corporal culposa, por força do
que estabelece o § 8º do art. 129 do Código Penal.

A pena criminal tem como fim a prevenção e a reprovação do crime, não podendo
ultrapassar os limites da necessidade e da suficiência. Se, em certas circunstâncias, a
pena mostrar-se desnecessária, não deve ser imposta.

É o que acontece quando, por exemplo, o agente causa culposamente a morte do


próprio filho, ou a lesão corporal de pessoa querida, a esposa, companheira, mãe, uma
irmã, o próprio pai.

Não tendo agido com dolo, nem eventual, o agente se vê diante da lesão a um bem
jurídico importantíssimo de uma pessoa queridíssima, sofrendo profundamente com
seu comportamento negligente. Esse sofrimento, por si só, é já suficiente para causar-lhe
uma aflição indizível, de modo que a imposição de uma pena criminal se tornará
absolutamente desnecessária, em face de as conseqüências do fato terem, já, imposto
ao agente sofrimento muito mais grave que a sanção penal pertinente.

Outra hipótese de perdão judicial é a prevista no § 1º do art. 140 do Código Penal,


que se refere ao crime de injúria, assim preconizada:

4 Op. cit. p. 620.


14 – Direito Penal – Ney Moura Teles

“O juiz pode deixar de aplicar a pena: I – quando o ofendido, de forma


reprovável, provocou diretamente a injúria; II – no caso de retorsão imediata,
que consista em outra injúria.”

Tratando-se de injúria recíproca ou de reação a comportamento reprovável da


vítima, a resposta penal torna-se desnecessária. Não é justa, mas a pena seria um
exagero, pelo que a lei manda o juiz perdoar o agente, vale dizer, isentá-lo da pena
criminal.

Outra situação em que o juiz pode perdoar o agente, isentando-o de pena, por
desnecessidade da reprovação, é a preconizada no parágrafo único do art. 176, que
assim tipifica: “Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de
meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento.”

Permite a norma que o juiz, conforme as circunstâncias, deixe de aplicar a pena. É


certo que deverá levar em conta condições particulares do agente, sua situação pessoal,
dificuldades que atravessava, para, apesar de condená-lo, isentá-lo da pena, aplicando-
lhe o perdão judicial.

O perdão judicial é concedido apenas na hipótese de o juiz condenar o réu, e,


verificando seus pressupostos, deixar de aplicar-lhe a pena. Poderá a sentença ser
executada no juízo cível, pois reconhece a prática de um fato típico, ilícito e culpável,
um crime. Apenas o Estado não aplicará a pena, renunciando a seu direito de punir.
Fica, todavia, excluído o efeito penal de gerar a reincidência, como determina o art. 120
do Código Penal: “A sentença que conceder perdão judicial não será considerada para
efeitos de reincidência.”

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