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NTAÇÃO
O

Neste  início  do  século  XXI,  o  conntexto  histórico‐sociaal  tem  colo ocado  as  ‘novas’ 
tecnologias  dee  comunicaação  como  possibilid dade  de  prrogresso,  d de  inclusãoo,  de 
acesso  ao  con nhecimento o,  e  ainda  como  um ma  imposiçção  de  sab beres  frentte  às 
mud danças  do  mundo  (p pós‐)moderrno  e  do  processo  de  d globalizzação.  Seggundo 
Baum man  (2005 5,  p.11),  a  globalizaçãão  promov veu  transfoormações  q que  afetaraam  “a 
subjeetividade ccoletiva, a p produção ccultural, a v vida quotiddiana e as rrelações en ntre o 
eu  e 
e o  outro”.  Nesse  seentido,  o  sujeito 
s enccontra‐se  diante 
d da  n necessidad de  de 
incorrporar a cu ultura da ccontemporaaneidade, ssob pena de se sentirr marginalizado, 
de  seer  excluído
o,  de  ficar  (des)locado.  As  discuursividadess  –  sobre  aa  globalizaçção,  a 
tecnologia,  a  virtualidad de,  o  connhecimento o,  entre  outras, 
o são o  práticas  que 
goveernam  o  su ujeito  e  fazem  com  que  uma  ‘nova’ 
‘ ordeem  de  disccurso  e  ‘novos’ 
regimmes  de  verdade  (F Foucault,  1971) 
1 imppliquem  naa  constituiição  de  sua(s) 
identidade(s). 

omo  parte  da  investigação  de  minha  pessquisa3  de  doutorameento,  proponho 
Co
uma  abordagem
m  sobre  os 
o possíveiss  deslocam
mentos  iden provocados  pela 
ntitários  p

1
  Este  artigo  é  um  recorte 
r das  reeflexões  desenvvolvidas  no  esstágio  de  douttoramento  san
nduíche,  realizado  na 
FPCE//Universidade de Lisboa, sob b a orientação ddo Prof. Dr. Jorrge Ramos do Ó Ó e com financciamento da CA APES. 
2
  Douutoranda  em  Lingüística 
L Ap plicada  pelo  IE
EL/UNICAMP,  sobre  a  orientação  da  Pro ofa.  Dra.  Mariia  José 
Coraciini. fcsgalli@h hotmail.com  
GALLI, F. (2007) A fabricação de discursos em tempos de globalização. In, V. Trindade, 
N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do  Conhecimento.  Évora: 
Universidade de Évora. 
 
globalização e pela cultura digital, a partir das subjetividades e das representações 
construídas  pelo  sujeito‐aluno‐professor  em  relatos  escritos  sobre  a  prática  da 
leitura  no  ciberespaço.  Interessa‐me,  nesta  discussão,  analisar  os  discursos 
fabricados  pela  (pós‐)modernidade,  os  quais  estão  circunscritos  numa 
determinada  funcionalidade.  Nessa  perspectiva,  considero  a  hipótese  de  que  a 
leitura nas páginas da internet não se assume como uma prática totalmente nova, 
mas  caracteriza‐se  no  imbricamento  do  velho  e  do  novo  e,  portanto,  as 
subjetividades  vão‐se  (re)configurando  à  medida  em  que  se  interpenetram, 
transitando entre o mesmo e o diferente (Derrida, 1985), o que implica em romper 
completamente  com  as  ‘verdades  permanentes’  e  considerar  a  possibilidade  do 
sujeito ser (trans)formado pela tecnologia. 

A  partir  das  teorias  adotadas  na  pesquisa  –  Análise  do  Discurso  e  sua 
intersecção  com  as  Ciências  Sociais,  a  linguagem  é  concebida  como  não 
transparente,  intrinsecamente  heterogênea,  lugar  de  produção  de  sentidos 
relacionados  ao  processo  sócio‐histórico‐ideológico.  Os  recortes  discursivos 
utilizados ao longo deste artigo com o propósito mais de enriquecer a exposição do 
que propriamente ser objeto de análise profunda, contemplam excertos4 do relato 
de um estudante universitário de graduação em Ciências Biológicas, os quais estão 
impregnados  pela  ordem  do  discurso  que  prescreve  a  virtualização  do  atual  e  a 
atualização do virtual (Lévy, 1996), num processo de imbricamento. 

Na  era  da  comunicação  eletrônica,  as  modalidades  de  sua  produção  e 
circulação  parecem  promover  mudanças  no  suporte  dos  textos  e  fazer  do 
ciberespaço  um  ‘concorrente’  do  papel,  no  que  diz  respeito  à  veiculação  da 
escrita  e  ao  processo  de  leitura.  Essa  potencialidade  das  tecnologias  da 
comunicação e seus impactos sociais na vida do sujeito ‘não é boa, nem má, 
nem  neutra’,  entretanto  são  mudanças  que  se  apresentam  como  ‘devir  do 
outro  ou  heterogênese’  (Lévy,  1996).  Se  nada  é  mais  fixo,  tudo  tem  sido 
(des)materializado, como diz Bauman (1999, p.23) – os corpos, os textos, os 
pensamentos,  talvez  seja  possível  a  materialização,  a  (re)construção  e  a 
atualização  do  tudo  em  outro  lugar,  em  novos  espaços.  Esse  discurso  da 
efemeridade, da transitoriedade, do atemporal, institui a transformação dos 
espaços e também dos sujeitos, vistos como “nômades de um novo estilo”. 

Neste  contexto,  o  sujeito,  ao  se  inscrever  nas  formações  discursivas,  passa  a 
constituí‐las  e  a  ser  constituído  por  elas,  por  meio  das  práticas  discursivas  que 
estão  constantemente  movimentando‐se,  (entre)cruzando‐se,  (trans)formando‐se 
e  (re)apresentando  saberes.  As  práticas  discursivas  tendem  a  regular  uma 
sociedade,  a  administrá‐la  e  ainda  a  promover  modificações,  como  resultado  da 
oposição entre as forças sociais – interesses e posições diferentes – que acontece 
nas  relações  de  poder.  Segundo  Foucault  (1969,  p.139),  as  práticas  discursivas 
funcionam  como  um  processo  que  produz  transformações  constantes,  de  forma 

3
 Desenvolvida no âmbito do projeto integrado Do Píxel à Letra e da Letra ao Píxel (Língua materna e Língua 
estrangeira), sob a coordenação da Profa. Dra. Maria José Coracini (DLA/IEL/UNICAMP). 
4
 Serão representados pela letra S (sujeito), seguida pelo número de seqüência. 

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GALLI, F. (2007) A fabricação de discursos em tempos de globalização. In, V. Trindade, 
N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do  Conhecimento.  Évora: 
Universidade de Évora. 

que  um  discurso,  decorrente  de  uma  dada  formação  discursiva,  é  constituído  a 
partir de “regras de aparecimento e também [de] suas condições de apropriação e 
utilização”.  

Vejamos o excerto a seguir: 

S1 – A internet vem contribuindo positivamente, pois disponibiliza artigos 
científicos, publicações em congresso, jornais e revistas, facilitando o uso 
e não tendo nenhum custo para isso, apenas o pulso telefônico. Eu utilizo 
a internet para fazer trabalhos, pesquisas científicas, ver  meus e­mails e 
conversar com as pessoas. 

A tecnologia aparece no discurso do sujeito como um espaço que, acima de tudo,  
proporciona  a  ampliação  do  conhecimento,  e  abre‐se  como  uma  solução  mais 
abrangente para aquisição do saber científico, ainda que no nível do imaginário. A 
descrição  sobre  a  importância  da  internet  submete‐se  a  uma  hierarquia:  é  usada 
em primeira instância para fins acadêmicos, enquanto que ver e‐mails e falar com 
o  outro  é  um  uso  secundário.  O  sujeito  assume  uma  posição  no  discurso,  que  é 
produzido  pelas  relações  de  forças  –  relações  de  poder,  que  levam  ao  prazer  e 
produzem  regimes  de  verdade.  Poder  e  saber  sustentam‐se  de  forma  recíproca  – 
não há poder sem saber nem saber sem poder, pois como afirma Foucault (1979, 
p.142)  “o  exercício  do  poder  cria  perpetuamente  saber  e,  inversamente,  o  saber 
acarreta efeitos de poder”. E é por meio do poder que as verdades são construídas, 
preservadas  ou  modificadas,  em  determinados  momentos  e  lugares,  conforme 
nota‐se no excerto acima. 

O poder envolve uma liberdade regulada e implica em circulação, difusão, redes, 
consumo, e não posse. Desse modo, a ‘interpelação’ do sujeito como uma relação de 
poder disciplinador, abrange toda a sociedade e se fixa em todo e qualquer lugar, 
funcionando  como  um  sistema  de  relações  circulares.  A  mídia,  então,  assume  um 
papel  bastante  relevante  na  constituição  da  identidade  do  sujeito:  controle  e 
normatização  acontecem  via  múltiplos  processos  de  poder,  compreendido como “a
multiplicidade de correlações de forças imanentes ao domínio onde se exercem e constitutivas
de sua organização” (Foucault, 1988, p.88‐89).  O  poder,  então,  provém  de  todas  as 
partes,  nas  relações  dinâmicas,  móveis,  que  mantêm  ou  destroem  grandes 
esquemas de dominação, e também se relacionam sempre com inúmeros pontos de 
resistência. 

Ao mesmo tempo em que há resistências, o poder é aceito como num embate de 
forças  contrárias,  produzindo  modificações,  deslocamentos,  transformações.  O 
poder não envolve um ‘estado de dominação’, mas uma determinação social, como 
se percebe no excerto acima, quando o sujeito expõe suas representações sobre as 
vantagens da internet e o uso do suporte tecnológico no âmbito do saber científico, 
desejo  que  se  configura  como  efeitos  de  verdade  produzidos  no  interior  dos 
discursos.  A  tentativa  de  controlar  e  homogeneizar  a  identidade  do  sujeito‐aluno 
na escola (e também na sociedade), a partir da instituição de verdades, é constante, 
e envolve relações de poder ao determinar discursos institucionalizados – como os 

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GALLI, F. (2007) A fabricação de discursos em tempos de globalização. In, V. Trindade, 
N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do  Conhecimento.  Évora: 
Universidade de Évora. 
 
que compõem o excerto de S1: a importância da internet para leituras e trabalhos, 
as  exigências  das  ‘novas  tecnologias’  na  (pós‐)modernidade  –  que  passam  a  ser 
reproduzidos  e  desejados  por  todos.  Dentro  deste  contexto,  como  as  relações  de 
poder são inerentes às relações humanas, o sujeito é levado a ocupar o lugar, social 
e  historicamente  legitimado,  lugar  que  é  desejado  e  ordenado  ao  mesmo  tempo, 
que  representa  o  saber  e  o  poder  (Foucault,  1979),  a  ‘verdade’  e  o  julgamento 
daquilo  que  é  instituído  como  ‘correto’  e  precisa  ser  cumprido  –  um  saber 
reconhecido. 

As  formações  imaginárias  que  resultam  das  projeções  feitas  pelo  sujeito 
aparecem  em  seus  dizeres  e  evidenciam  a  emergência  de  discursos  construídos 
pelo  imaginário,  fabricados  como  um  modelo  sacralizado  a  ser  seguido.  Tais 
dizeres colocam em funcionamento as imagens de si e as imagens do outro, já que é 
a  partir  do  olhar  do  outro  que  nos  vemos  e  nos  constituímos  sempre  (Coracini, 
2003),  o  que  parece  acontecer,  talvez  de  forma  mais  intensa,  com  o  sujeito  da 
virtualidade,  do  mundo  contemporâneo,  em  razão  das  exigências  com  relação  ao 
domínio  e  uso  da  tecnologia  serem  cada  vez  mais  freqüentes.  Essa  imposição 
incide  no  sujeito  como  um  julgamento, necessidade  –  imagens  que se  relacionam 
ainda  ao  desejo  de  pertença  a  uma  comunidade,  que  “representa  um  abrigo  em 
relação  aos  efeitos  da  globalização  em  todo  o  planeta”  (Bauman,  2005,  p.12). 
Assim,  a  identidade  se  molda  no  atravessamento  dos  discursos,  como  se  nota  no 
excerto  a  seguir  em  que  o  sujeito  relata  as  possibilidades  da  tecnologia  e  expõe 
suas representações5 sobre os antigos rituais e as atuais exigências: 

S1  –  Prefiro  ainda  ler  um  livro  do  que  ler  livro  on­line,  ter  o  papel  em 
mãos dá um sentido mais real para a leitura. Costumo entrar na internet 
todo  dia,  afim  [sic]  de  ver  meus  e­mails  e  quando  tem  que  procurar 
trabalhos. Leio mais textos científicos e revistas da minha área. 

O excerto acima traz representações sobre os suportes papel e tela, e, embora o 
sujeito afirme sua preferência pelo texto‐papel e lhe atribua a idéia de ‘mais real’, 
releva,  na  seqüência,  que  para  a  leitura  de  textos  científicos  e  trabalhos 
acadêmicos,  faz  uso  da  internet.  Esse  discurso  é  uma  tentativa  de  adequação  às 
mudanças que o mundo globalizado exige, não somente no sentido do que se pode 
e deve ser dito, mas o como dizer em determinado contexto – neste caso, no meio 
acadêmico.  Nessa  perspectiva,  a  rarefação  do(s)  discurso(s)  torna‐se  mais 
concreta,  na  medida  em  que  as  discursidades  sobre  a  tecnologia  se  instauram 
como uma regra de conduta que transforma o sujeito e sua maneira de pensar, o 
enquadra  num  processo  de  regulação  e,  de  certa  forma,  determina  relações  de 
poder na ordem do conhecimento (Ó, 2003, p.33). 

Os referenciais de espaço também estão presentes na formação discursiva 
acima, o que aponta para a idéia de senso comum do virtual como a ausência 

5
 O conceito de representação adotado nesta pesquisa vem da teoria cultural pós‐estruturalista que salienta a 
sua dimensão de significante, faz menção – como qualquer sistema de significação – a uma construção do real 
e, consequentemente, a uma forma de atribuição de sentido (Hall, 2000). 

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GALLI, F. (2007) A fabricação de discursos em tempos de globalização. In, V. Trindade, 
N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do  Conhecimento.  Évora: 
Universidade de Évora. 

de presença, como existência impossível em oposição a real (Lévy, 1996). O 
virtual significa aquilo que existe em potencial, e não se opõe ao real, mas ao 
atual. Assim como Baudrillard (1999) – para quem as distâncias e separações 
foram  abolidas  e  há,  hoje,  um  imbricamento  entre  homem  e  máquina,  ou  o 
surgimento  do  ‘homem­máquina’  –  Lévy  afirma  que  as  noções  de  espaço  e 
tempo se alteraram e, assim, devem ser compreendidas como inseparáveis. A 
noção  de  localidade  está  relacionada,  nos  dizeres  acima,  à  concretude  do 
texto­papel  e  à  proximidade,  em  cujo  espaço  o  sujeito  “pode  se  sentir  chez 
soi,  à  vontade,  um  espaço  no  qual  raramente  se  sente  perdido”  (Bauman, 
1999,  p.20),  o  que  lhe  traz  mais  conforto.  Por  outro  lado,  há  o  fato  de  que, 
para fazer parte desta sociedade da informação, o esperado (pelos outros) é 
que  o  sujeito  diga  que  faz  buscas  e  lê  na  internet,  em  especial  assuntos  de 
interesse  profissional  –  forma  de  legitimação  do  conhecimento,  numa 
relação com a verdade e a constituição do saber (Foucault, 1984, p. 241). 

O  ciberespaço  acaba,  pois,  por  estabelecer  a  fabricação  de  discursos  e  de 


verdades na sociedade do espetáculo, impregnada pela ideologia da globalização. A 
partir  do  imaginário  sobre  a  possibilidade  de  participar  e  ocupar  um  lugar  neste 
contexto, há conseqüências que implicam diretamente na constituição do sujeito, já 
que  a  tecnologia  parece  evidenciar  o  (des)centramento  da(s)  identidade(s).  As 
representações  sobre  a  tecnologia  e  o  processo  de  leitura,  conforme  mostram  os 
excertos,  não  correspondem  a  uma  dicotomia  ‘velho/novo’,  mas  a  um 
imbricamento,  transitando  num  inter‐espaço  ‘texto‐papel/texto‐tela’  e 
(re)configurando  as  subjetividades6,  num  processo  de  ressignificação  do(s) 
discurso(s). Assim, o sujeito parece encontrar‐se – há um tempo e, ainda, por um 
longo  tempo  –  dividido  no  sem  limites  do  limiar,  no  (entre)lugar onde  passado  e 
presente  se  misturam  e  se  mesclam,  momento  em  que  o  controle  se  esbarra  nas 
(in)certezas (Derrida, 2004) e aponta as fronteiras movediças das identidades. 

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DERRIDA,  J.  (1985).  Torres  de  Babel.  Trad.  Junia  Barreto.  Belo  Horizonte:  UFMG, 
2002. 
6
  A  subjetivação  pode  ser  vista  com  dobra,  num  “processo  de  agrupação,  de  agregação,  de  composição,  de 
disposição  ou  agenciamento  ou  arranjamento,  de  concreção  sempre  relativa  do  heterogéneo:  de  corpos, 
vocabulários,  inscrições,  práticas,  juízos,  técnicas,  objetos  (…)  que  nos  acompanham  e  determinam”. 
(Domènech e al., 2001, p.124) 

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GALLI, F. (2007) A fabricação de discursos em tempos de globalização. In, V. Trindade, 
N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do  Conhecimento.  Évora: 
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