Sie sind auf Seite 1von 20

Rua dos Ferreiros, 165 Email: ceha@madeira-edu.

pt
9004-520 – Funchal
Telef (+351291)214970
alberto.vieira@madeira-edu.pt
Fax (+351291)223002 http://www.madeira-edu.pt/ceha/

Vieira,
Vieira, Alberto (1983)

O Vinho da Madeira
(Breve resenha histórica
histórica)
órica)

COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO:

Vieira, Alberto (1983), O Vinho da Madeira, (Breve resenha histórica), Funchal, CEHA-Biblioteca
Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/1983-AVIEIRA-
breveresenha.pdf, data da visita: / /

RECOMENDAÇÕES
O utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras, usando
a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao rigoroso
respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprir escrupulosamente
a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática, de direitos de
propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente responsável pela
infracção aos comandos aplicáveis.
ALBERTO VIEIRA

(BREVE R E S E N H A H I S T O R I C A )

INSTITUTO DO VINHO DA MADEIRA

DIRECCÃO REGIONAL DOS ASSUNTOS CULTURAIS (MADEIRA)


DIRECCÃO REGIONAL DOS ASSUNTOS CULTURAIS (ACORES)
Perfuma e alegra o solo um vinho histórico,
produto cle castas primitivas, sangue de raça
a perpetuar na ilha o nome de Portugal. Foi
este vinho companheiro dos colonos na rota
da clescoberfa ; postou-se de guarda 6 portu
de suas casas, de brayos abertos, numa ramada
acolhedora a -pcireni.es, amigos e vizinhos ;
dá-lhe vida no trabalho ; vibra-lhe na altnu
em festas de família e todos os anos se renova
no barril ou quartola para o aquecer no In-
verno, estugar-lhe o passo nas romarias de
Verão, firmar proimessas, selar contratos, fechar
negócios e ser providência económica no seu
lar.
(Eduardo C. N. Pereira- Il7&as de
Zargo, Funchal, 1967,I,pp. 558/E))
I - INTRODUCÃO fado, será uma sensacão gustafiva horrível
que poderá levar a sua rejeicão.
A o saborearmos um cúlice de vinho M a - E hoje, que bebemos ?
deira Velhíssimo ficamos extasiados com o seu O Vinho Madeira, celebrado por
aroma e sabor, pondo de parte ci imagem que monarcas, príncipes, generais, explora cfoetasl
ores e
o mesmo reflecte, da sua IaboraqGo há um ou e:cpedicionistas, há alguns anos a esta parte
dois séculos ; a época de esplendor do vinho vem perdendo o seu mercado e os seus po-
Madeira. Ignoramos a parte amarga : o colo- tenciais apreciadores. Tal estado deve-se à si-
no nu sula labuta diária no campo e nas ade- tuaqão criada entre finais do séc. XVIII e prin-
gas, o árduo trabalho das vindimas, os borra- cípios do séc. XIX, em que a grande procura
cheiros no seu passo cadenciado - denuncia- fez nascer da sua água e do fogo quantidades
do pelo eco dos seus cantares - por entre as apreciáveis cle vinho velho. Depois foi o faskio
encostas da ilha. em 18'14. h4ais tarde a natureza fez acabar
Para podermos recriar essa ambiência te- com ns cepas de boa qualidade, fazendo-as
mos que agarrar os restos materiais e docu- subs:i:uir pelo produtor directo, as quais hoje
mentais e fazê-los reviver na sua labuta sa- permunecem lado a lado com as castas eu-
zonal, ou antes, fazer desbobinar o filme que ropcicrs iivmci prosmicuidade escandalosa.
se esconde por entre a ferrugem, a traqa e o Sendo ponto assente que foram as castas
pó. São o Unico elo de ligaqcio com esses mo- nobres europeias que criaram e man+iveram
mentos de esplendor da faina viI-i/vinicola do a fama do vinho Madeira durante mais de 2
povo ilhéu, durante cerca de ?rês séculos. séculos, torna-se imperiosa a regulamentação/
O calendário da História insulana man- /reconversão da viticultura madeirense, caso
tém incipagável algumus colheitas : seja nossa intenqão manter viva a lembranqa
1730 -Vinho de Roda-o Madeira ad- desse famoso vinho.
quire novo aladai- nas zonas tro-
P
picais e ceco se divulga a notícia
e se apura o gosto da aristocracia «G vinho da Madeira correu mundo-
inglesa, que passa a preferir o singrou por todos os mares e rompeu todus
«Eaçt India Madeira» ao <;Com- as fronteiras» (E. Nunes, Porque me orgulho
mon Madeira)), «London Market», de sei. jhcideirense, p. 27). Como tal foi um
«London Particular». O Madeira capiiuso embaixuclor nafural que levou o nome
salta das escuras adegas para o da ilha da Madeira aos confins do Mundo.
soalheiro porão das naus. O Vinho Macieira desde tempos recuados
1794 -Vinho Estufado - o vinho de roda adquiriu fama no mundo colonial europeu,
tornando-se a bebida preferida do militar, e,(-
dá lugar ao vinho esfufado ; a
grande procura faz evoluir as téc- pedicionista, aventureiro, em terras da Améri-
nicas de trato, enquanto vai per- ca ou da Ásia. Escolhido pela aristocracia co-
dendo qualidades, facto que rne- lonial manteve-se no mercado londrino, eu-
rece a sua rejeição a partir de ropeu e colonial como o seu vinho por exce-
1814. lência, durante séculos.
1815 - ~ á t t l e o f Waferloo - época de O Vinho da ilha não só deu fama à ilha,
mudanqa e, de triste memória, pa- como se evidenciou, desde meados do séc.
ra os interesses hegemónicos de XVI, como o único meio de sustento tendo,
Napoleão, ficou na História d o vi- deste modo, caracterizado o devir histórico
nho ilhéu a marcar uma colheita insulano por 3 séculos.
de boa1 oferecida ao infeliz im- O iIl?éu desde 1575 fez mudar os cana-
perador, quando passou pela ilha. viais por vinhedos, os quais alastraram a to-
A tradição refere que a referida das as terras cultivadas, devorando a floresta
oferta regressou ti ilha depois da a norte e a sul. Nesta febre vitícola o madeli-
morte d o imperador, tendo sido rense esqueceu que devia semear cereais e
comprada e engarrafada em 1840 plantar árvores de fruto. O vinho era a sua
por C. Blandy. única fonte de sustento ; com ele se adquiria
o alimento necessário, trazido da América nas
Beber um Madeira de 1730, o «East India naus americanas, ou a indumentária e manu-
Madeira», é fazer o impossível, é deleitar-se facturas trocadas aos ingleses por pipas de
com um dos mais famosos rubinéciares, que vinho.
concerteza mereceria a aprovação dos deuses Viveu a Madeira, desde o séc. XVII a prin-
do Olimpo. cípios d o XIXI embalada pela opulência de-
Beber o Madeira de 1794, o vinho estu- rivada d o comércio vantajoso do vinho e, com
tão avulfados proventos o madeirense adqui- e 6 videira o nome do pastor (em grego Sta-
riu o luxo exuberante do meio aristocrático hyle). Por outro lado a mitologia grega atri-
londrino. O incola habituou-se a vida cortesã gui essa faqanha a Dionísio, enquanto a latina
europeia, ganhou hábitos ingleses e, nas suas refere que foi Saturno quem introduziu as pri-
quintas rodeadas de sumptuosos vinhedos e meiras videiras em Creta e ensinou aos povos
jardins rivalizava o estrangeiro. Os arredores do Lacio os segredos da viticultura.
d o Funchal, nomeadamente o Monte, St.0 An- Desde tempos imemor6veis que os poetas
lónio, S. Martinho, povoaram-se de quintas, e escritores fizeram o elogio do vinho : A
onde se esbogava uma vida cortesã em mi- Iliada e Odisseia, Vergilio na Eneida ... Ana-
niatura mergulhada no mais opulento luxo, creonte cantou-o e imortalizou-o no ((Elogio
sustentado pelos proventos d o vinho. uo vinho», Catz e Aguiquiloco, filhos de Paros
Erguia-se assim a cidade do Vinho, que e do sacerdote Telésides divinizaram-no, Safo
escapava ao aperfado burgo do açúcar. O exulto-o e Salomão, no CClntico dos Cânticos
Funchal engalanava-se de palácios, igrejas e elogia-o. Mas, sem dúvida o repositório mais
capelas ; ao mesmo tempo que crescia na di- numeroso e contraditório de referências ao
reccão E e N. Temos os majestosos palácios vinho encontra-se na Bíblia. Aí no Antigo e
de S. Pedro, da Câmara Municipal, a casa O r - N o v o Testamento o vinho ora é exultado-O
nelas (R. 'do Bispo) e Tomaszewski (R. Ferrei- EcBosSas~es, Provérbios, Livro de ~ a c a r i a s ,os
ros). Evmnge!hsç, Ciêintiço dos Cêinticos -, ora é vi-
lipendiado - O Ecleriiastes, Provérbios, livro
li - A VINHA E O V I N H O N A HISTÕRIA do profeta Isaías e Jeremias, livro de Oseai.
Mas no fundamental a literatura bíblica e cris-
A vinha existe desde a mais remota an- tã fala do vinho com certo benemérito, pois
tiguidade (período terciario), tendo sido di- que este faz parte do sacrifício eucarístico.
vulgada no mundo através dos hebreus, gre- Aliás tal situacão conduziu a uma forte ex-
gos e romanos. É de admitir que a vificultura pansão da cultura da vinha no mundo cristcio.
tenha como ponto de partida a Ásia meridio- O ritual cristão fez do pão e do vinho
nal, donde se estendeu à Ásia central, Europa os dois elementos substaiiciais da sua prútica,
e Extremo Oriente. N o entanto algumas trans- fazendo-os símbolos da essência da vida hu-
formações de ordem social e religiosa fizeram mana e do seu Salvador-Cristo. O vinho e o
com que esta cultura fosse abandonada em pfio avançaram conjuntamente com a Cristan-
algumas áreas, como no Japão, China e em dade, levados por monges e bispos. Tal rea-
muitos países muçulmanos ; em detrimento da lidade veio revolucionar os húhitos alimenta-
sua expansão na Europa cristã e colonial res do ocidente cristão, a partir do séc. VII,
(África do Sul e Austrália). estabelecendo o comer pão e beber vinho co-
A origem CIOvinho deu lugar a uma série mo o símbolo do sustento humaiio.
de lendas e mitos despoletados a partir do Foi assim que o vinho chegou a Madeira
relato bíblico cle Noé, a que se aliou a fan- no séc. XV ; a expansão europeia aliava-se a
tasia d o narrador. Segundo Ezler (Ibagoge expansão da cristandade e como l a l o vinho,
Phisico magico medicale, Augsburgo, 1630), produto essencial não podia ser esquecido na
N o é teria tomado conhecimento com as pro- r e l a ç i o das bagagens dos aventureiros que
priedades da Iabrusca por intermédio dum reconliecerom e promoveram a ocupacão do
cabrito que o mesmo soltou em Córico (mon- arqvipélago. Os poucos grãos de trigo e cepas
tanha da Silicia) e que comendo a dita planta a o encontrarem solo virgem e fértil adapta-
se embebedou, de tal modo que comeqou a ram-se rapidamente as condições mesológicas
atacar o restante rebanho. Outra lenda, con- d o meio insular e conquistaram aos poucos a

tada r
or Cornai (Theolsgia vitis viniferae,
Heids berg, 1614) refere que o pastor Staphy-
10s da Etólia, que servia habitualmente Oinos
totalidade do solo cultivável da ilha, manten-
do-se em perfeita harinonia, adocicados por
uma nova especiaria - o açúcar. Mais tarde
notou, enquanto apascentava o seu rebanho o ilhéu alheio ou esquecido desta dualidade
que uma das cabras saia habitualmente do re- harmoniosa e adocicada, esqueceu o pão e
banho e se demorava mais que as outras. o acúcar e entregou-se com todas as suas for-
Tempos depois veio a descobrir que esta se cas ao vinho ; única cultura capaz de manter
demorava a comer o fruto de uma árvore- o seu sustento, mercê de uma forte rentabili-
a uva. Levando o fruto a o seu senhor este o dade. O vinho tornava-se assim no alimento
espremeu e fez com ele um líquido suave - e moeda de troca do ilhéu.
o vinho, que deu a beber a Liber Pater, seu Acompanhar os primórdios da história da
hóspede e este como prova de agradecimento vinha na ilha é uma tarefa arrojada, pois que
deu o seu nome ao vinho (em grego oinos) 0s nossos avoengos nos legaram poucas refe-
rências documentais, onde seja possível colher peare que nos dá conta de o Duque de Cla-
dados sobre a sua introdução e expansão. N o rence ter manifestado o desejo de morrer afo-
entanto aqui e acolá podemos colher elemen- gado numa pipa de matvasia ; o mesmo re-
tos que devisdamente articulados nos podem fere na peca Henry IV (parte I) que Falstaff
d a r uma ideia da fase inicial da história do teria vendido a alma ao diabo, por um copo
vinho na ilha. de vinho Madeira e uma perna de capão.
Em meados do séc. XV, com o movimento A cultura da vinha absorvia assim, ia na
d e ocupaqão e aproveitamento da ilha temos segunda metade d o séc. XV, uma porção con-
como certa a introdução de cepas vindas do siderável da área arroteada da ilha, nomea-
reino e mais tarde das zonas viticolas do mar damente na zona vizinha do Funchal, onde
Mediterrâneo. João Goncalves Zarco, Tristão encontramos I1 vinhas e II latadas. N o século
Vaz Teixeira e Bartolomeu Perestrello ao re- seguinte a cultura da vinha aumenta a sua
ceberem o domínio das capitanias do arqui- área e alarga-se além Funchal ; na primeira
pélago, sob a direcqão do monarca e do In- metade do séc. XVI temos I 9 vinhas e 6 latadas
fante D. Henrique, procederam ao desbrava- no Funchal, 7 vinhas em C. de Lobos e 6 vi-
mento e ocupaqão do solo com diversas cul- nhas e 7 latadas distribuídas por Ponta de Sol,
furas trazidas do reino - o trigo, a vinha e a Ribeira Brava, Canico e Calheta. Será ci partir
cana. da segunda metade do século que a vinha
Num curto espaço de tempo a paisagem conquista em definitivo o solo da ilha, substi-
ilhoa havia-se transformado e em terras onde tuíndo os canaviais do Funchal e zonas limí-
apenas se vislumbrava o esplendoroso e denso trofes, ocupando as clareiras então abertas
arvoredo comeqam a surgir clareiras huma- no norte - Ponta Delgada, Porto da Cruz.. .
nizadas, devidamente assinaladas pelo casa- Os trigais e canaviais davam assim lugar
rio. Nas planuras ribeirinhas do oceano, onde as latadas e balseiras ; a vinha tornava-se na
havia local para varar um barco viu-se surgir cultura exclusiva do colono madeirense, a qual
o Homem na sua fúria constante contra a na- este dá todo o seu engenho e arte. O vinho
tureza. N o Funchal do funcho fez resplande- adquiria o primeiro lugar na actividade eco-
cer os campos dourados de trigo, entremeados nómica da ilha, mantendo-se na dianteira por
aqui e acolá or canaviais e vinhedos. Em mais de três séculos. O ilhéu, desde o último
E
Câmara de Lo os, depois de afugentarem os
lobos marinhos, subiu encosta acima de pica-
quartel d o séc. XVI dedicou-se por exclusivo
a cultura da vinha, tirando dela o necessário
reta na mão traçando o rendilhado dos socal- para o seu sustento diário e, igualmente, para
cos donde fez plantar a videira em vistosas manter uma vida de luxo, sumptuosos palá-
latadas. cios e igrejas.
Assim foi a vinha conquistando o solo Se em 1547 Hans Standen refere que a
ilhéu em todas as direcções, tornando-se o vi- economia da ilha se define pelo binómio vi-
nho um produto importante na actividade agrí- nho/aqúcar, já em 1578 Duarfe Lopes colocava
cola d o ilhéu. Já em 1455, Cadamosto ao pas- o vinho em primeiro lugar nas exportações e
sar pela ilha ficou deslumbrado com o que em 1669 o consul francês afirmava que o vinho
viu na área vitícola do Funchal ; era o principal negócio da ilha. Toda a docu-
« .. .tem vinhos, mesmo muitíssimos bons, mentação dos sécs. XVIII/XIX é unânime em
considerar o vinho como a principal e total
se se considerar que a ilha é habitada
há pouco tempo. São em tanta quan- riqueza da ilha ; a Gnica moeda de troca. A
tidade, que chegam para os da ilha e Madeira não tinha com que acenar aos navios
se exportam muitos deles» (A. Aragão que por ai passavam, ou a demandavam, se-
- A Madeira vista por estrangeiros, não o capo de vinho ; o resto que necessitava
Funchal, 1981, p. 37). para o seu viver quotidiano era trazido pelos
navios estrangeiros, que a i trocavam por vinho.
O vinho na Madeira do séc. XV apresen- Esta situaqão tornava a economia insular nu-
tava-se com um produto competitivo do trigo ma situação periférica delicada, pois que a
e do açúcar, com grande peso na economlia sua posiyão de dupla dependência em relação
local. Desde o início foi um potencial produto ao mercado externo minava os alicerces da
d o mercado externo da ilha. Sendo já expor- sua base material, fazendo-a oscilar consoante
tado em 1455, segundo testemunho de Cada- a conjuntura favorável ou desfavorável d o
mosto, comprovado em documento de 1461 mercado fornecedor (inglês e americano) e
em que se dii conta do dízimo de exportação consumidor (colonial britânico).
pago pelo vinho a saída. Aliás em 1478 temos Contra esta política exclusivista imposta
referenciada a sua exportação para o mercado pelo mercantilismo inglês se manifestaram,
londrino, segundo o testemunho de Shakes- quer o governador e capitão general Sá Pe-
reira, em regimento de agricultura para o Ill - A VITICULTURA MADEIRENSE
Podo Santo, quer o corregedor e desembar-
yador António Rodrigues Veloso em 1782 nas A região viti-vinícola da Madeira esten-
instruqões que deixou na Câmara da Calheta, de-se por cerca de 1850ha, representando 2,5%
quando aí esfeve em alçada. M a s foi tudo em da superfície total da ilha (782 km2) e 8% da
vão, ninguém era capaz de frenar a febre vi- área agricultada (248 km2). Tempos houve em
ticsla, nem seria possível convencer o viticul- que essa área era superior, como em 1845 em
tor a abandonar a vinha num momenfo em que mercê da redução derivada do oidio, ain-
que o vinho da ilha tinha grande procura no da ocupava 2500ha. N a primeira metade d o
mercado internacional. E, poucos eram os anos séc. XIX essa área, que se estendia a quase
em que a colheita era suficiente para satis- todo o solo arável, d o norte e do sul, cifra-
fazer a grande procura ; por vezes socorria-se va-se em cerca de 50% da área cultivada.
aos vinhos inferiores d o norte e, até mesmo, A vinha mercê das condições orográficas
ao vinho dos Açores e Canárias para poder e climáticas estende-se até aos 700 metros de
saaiar-se o colonialista europeu sedento. altitude no sul e 300 metros no norte. Igual-
Saciado o colonialista europeu, a pro- mente a distribuição das diversas espécies de
dução passou a ser excedentária e o vinho da vitis-vinifera - sercial, verdelho, malvasia, ter-
ilha passou a ser preterido em favor d o vinho rantez-obedece a um escalonamento em al-
de França, Espanha e Cabo. O fim das guer- titude ; que aliado as condições climáticas dão
ras europeias, em princípios d o séc. XIX, abriu ao vinho produzido as qualidades caractei-ís-
as comportas d o vinho europeu ao potencial ticas :
mercado colonial asiático e americano. A re- - o sercial nas zonas altas entre os 600
tirada d o colonialista das áreas colonizadas e 700 metros, na área do Jardim da Serra e
fez perder o gosto pelo vinho d a ilha. Como no alto do Estreito de C. de Lobos, St.0 An-
consequência disto temos a manifestacão dos tónio.
priimeiros sintomas da rejeição a partir de - o verdelho, zonas intermédias iunto ao
1814; agravando-se a situacão de ano para mar entre os 500 e os 400 metros, Ribeira da
ano. As colheitas de 1819 a 1821 mantiveram- Janela.
-se estagnadas nos armazéns sem comprador, -o boal, desde os 400m. nas áreas ri-
isto de tal modo que em 1820 20000 pipas beirinhas, Campanário, Ponta do Purgo.
aguardavam comprador. A situacão era de tal -tinta negra mole, aos 300m., C. de Lo-
modo aflitiva que em documento da época se bos, S. Martinho, St.0 Cruz, Gaula.
referenciava : «Estão as casas ricas de vinho, - malvasia, nas zonas baixas junto do
pobres de sustento e de alimento» (ANTT- mar, conhecidas por fajãs, Fajã dos Padres,
Provedoria e J. R. Fazenda do Funchal- N.0 Paul e Jardim do Mar, Arco da Calheta, M a -
4, 11, p. 23). dalena, Cunhas.
Reviver a ilha no período que decorre Estas são as castas mais apreciadas que
dos anos de 1840 a 1860 será rememorar um deram nome ao vinho da Madeira, infelizmen-
dos momentos ímpares da fome, miséria da te no séc. XIX com a filoxera muitas destas
história insulana que se poderá igualar aos foram exterminadas ou preteridas em favor
momentos aflitivos da Europa da segunda me- das cepas americanas, resistentes à filoxera e
tode do séc. XIV. Se a Europa de então se de maior produção. Tardou e ainda continua
seguiu o surto expansionista europeu, ti ilha a tardar a reconverscio da vi.fiicultura madei-
se sucedeu a diáspora madeirense, mercê da rense, facto que vem contribuindo para uma
solicitação e aliciamento feito pelos ingleses certa desconfiança por parte do potencial mer-
e seus acólitos. Entre 1840150 o madeirense cado consumidor.
perdse o amor à sua terra e v a i ao encontro A cultura da vinha na ilha faz-se desde
dum novo paraíso fugaz, criado pelo inglês tempos imemoráveis em latadas, armadas so-
nas Antilhas. branceiras aos passeios, terreiros, veredas ou
O oidio (1852)) a filoxera (1872) deram o nos poios construídos encosta acima a partir
goljpe final Cr cultura da vinha n a ilha ; a M a - do litoral. Entretanto nalgumas regiões d o nor-
deira perdeu o seu sustento, o seu mercado, te da ilha predominou durante muito tempo a
as suas parreiras. A recuperacão é a meta de vinha de pé ou as balseiras. Mas hoje é do-
todas as iniciativas, mas de pouco tem valido minante o sistema de latadas construidos com
este extremado sebastianismo vit.icola, pois o arame.
processo apresenia-se como irreversível. A o A faina vitícola estende-se por todo o ano
ilhéu apenas poderá gravar na memória a agrícola, obrigando o viticultor madeirense a
ideia de esplendor, que caracterizou esse vasto uma acção constante de cuidados. Mas sem
período da história insulana. dúvida, o período de maior actividade situa-
-se na época d a vindima, que decorre de IV-O MADEIRENSE E O VINHO
Agosto a Outubro. De Janeiro a Julho as ta- -VINIFICACÃO
refas e culidados assíduos com a vinha surgem
espaçadamente de acordo com o ciclo da
Se ao madeirense, em geral, é facultada
vinha : a arte e engenho da viticultura, a vinificação,
pelo contrário, mantém-se no segredo dos deu-
-em Janeiro poda-se, cava-se e aduba- ses, sendo tarefa da exclusiva responsabilidade
-se. do comerciante do Funchal.
O Funchal, feitas as vindimas, adquire
- d e M a i o a Junho sulfata-se, esfolha-se e uma nova dinâmica que se prolongam por al-
enxofra-se. guns meses; o tempo suficiente para fazer
fermentar e envelhecer o vinho na estufa. De-
O viticultor madeirense faz das suas vi- pois as restantes tarefas que imprimem ao vi-
nhas um jardim e a ele se dedica o ano intei- nho as características químicas e organolépti-
ro, acompanhando a passo e passo o evoluir cas fazem-se espagadamente ao longo dos
d a videira e o aparecimento, crescimento e anos enquanto o vinho envelhece nas escuras
amadurecimento d o cacho d o qual extrairá o adegas.
vinho. A urbe funchalense setecentista e oifocen-
De Agosto a Outubro o meio rural ani- tista adquiriu uma nova fisionomia ; a área
ma-se com a azáfama das vindimas, atraindo ribeirinha da alfândega e porto apinham-se
forasteiros e assalariados sazonais. Velhos, de complexos vinícolas dos exportadores de
adultos, novos e crianças, numa alegria inex- vinho, compostos por lojas escuras e espaqo-
cedível marcada pelos cantares regionais, po- sas, uma estufa e oficina de tanoaria num am-
voam os vinhedos e áreas circunvizinhas dos biente amenizado por corredores e latadas de
lagares. Enquanto os velhos e novos, munidos vinho.
de facas e navalhas, cortavam os cachos e Até meados do séc. XVIII apenas se co-
enchiam os cestos «vindimas», os homens de nhecia o envelhecimento e trato no canteiro,
«molhelha» a o ombro transportam os barre- foi a partir de então que se experimentaram
leiros acogulados ao respectivo lagar. novos processos, primeiro com o adicionamen-
A o findar o dia, terminada a apanha da to de aguardente, depois com a estufagem
uva, os homens, de pé descalqo e calca arre- (1794). Este último processo generalizou-se e
gaqada, esmagam as uvas fazendo cair o hoje em dia todo o vinho Madeira é submetido
mosto na tina. A o longo da noite prossegue a estufagem durante três meses, findos as
esta árdua tarefa com a impesa e repisa, acom- quais permanece 3 ou 4 anos no canteiro até
panhada de um farto maniar regado com vi- ser engarrafado.
nho e aguardente, de modo a que a noite se O trato aliado as condiqões mesológicas
anime com os cantares cadenciados. Depois, imprimem ao vinho produzido características
alta madrugada, os homens munidos de bor- gustativas inestimáveis e inconfundíveis :
rachos ou barris transportam o mosto as ade-
gas. - o malvasia - SWEET -conhecido pela
Nos tempos que decorrem esta faina per- sua doqura e aroma, que se serve a
deu todo o seu aspecto busólico que a caracte- acompanhar o queijo.
rizava, a o meslmo tempo que retirou ao ho-
mem o fardo pesado. A tecnologia moderna -o bual - MEDIUM SWEET - vinho
veio substituir o homem e amenizar as suas equilibrado que sabe bem em todos os
tarefas, de tal 'modo que não mais vimos os momentos, devendo beber-se acompa-
borracheiros ou barrileiros e os lagares de nhado com doces, nomeadamente o
vara vêm sendo substituidos por prensas me- bolo de mel.
canizadas ou máquinas mais avanqadas. Mes-
mo assim em certas zonas permanecem estes - o sercial - DRY -cõr de topázio cla-
hábitos arcaizantes a dar um traqo peculiar ro, seco e alcoólico, sendo habitual-
a paisagem ; no Porto da Cruz, por exemplo, mente usado como aperitivo a acom-
o vinho americano ainda continua a ser trans- panhar azeitonas e peanuts.
portado em borrachos.
Tempos houve em que a produção de -Verdelho e Terrantez - MEDIUM DRY
vinho na ilha atingiu as 40.000 ou 20.000 pi- -cor de rubim, apreciado em todos
pas, sendo d e superior qualidade. N a ac- os momentos, ou como aperitivo, sendo
tualidade o seu volume não ultrapassa as ci- servido habitualmente a acompanhar a
fras referentes a o de superior qualidade. sopa.
V-O VINHO DA MADEIRA NO MUNDO o vinho da ilha e fê-lo apreciar pelos seus
patrícios.
Desde o séc. XV que o vinho ilhéu traçou O momento de apogeu de exportação do
a sua rota no mercado internacional, acom- vinho da ilha para estes mercados situa-se en-
panhando o colonialista europeu nas suas ex- tre finais d o séc. XVIII e princípios do séc. XIXI
pedições e fixacão na Ásia e América. O co- altura em que a saída atingiu a média de
merciante inglês, aqui implantado desde o séc. 20.000 pipas. Durante este período mais de
XVII soube tirar partido deste produto tazen- */3 do vinho exportado destinava-se ao mer-
do-o chegar em quantidades volumosas às cado colonial americano, de que se destacam
mãos dos seus comlpatriotas que se haviam as Antilhas, as plsantações do sul dla América
espalhado pelos quatro cantos do mundo co- do Norte e N. York. A primeira metade do
lonial europeu. séc. XIX é pautada por uma acenfuada alte-
Vários factores de ordem conjuntural fi- ração na geografima do mercador consumidor
zeram com que o comerciante inglês se ins- do vinho da Madeira ; é o período de afir-
talasse na ilha e cá se afirmasse como um mação dum novo mercado para cobrir as exi-
potencial negociante do seu vinho. Destes po- gências de novos e velhos alpreciadores. A
demos salientar : Richard Pickford (1638/82), Inglaterra, Rússia tomam o lugar do mercado
W. Soltom (169511714), James Leacock (1741), colo~niala partir de 1831.
Francis Newton (1745), Blanldy (181 1).
0 movimento do comércio do vinho da VI - CONCLUSAO
Madeira ao longo dos sécs. XVIII e XIX im-
brica-se de modo directo no movimento das Hoje, passados mais de quinhentos anos
rotas marítimas coloniais que tinhlanl passa- sobre a introdução cla vinha na Madeira, todos
gem obrigatória pela ilha na ida. A estas rotas nós mantemos bem vivo no rol das nossas
fundamentais se juntavam outras subsidiárias. recordações os tempos áureos do comércio e
De um modo geral estas ordenavam-se segun- apreciação do vinho ilhéu, Mas, infelizmente,
do aquilo a que se ousou chamar comércio hoje essa imagem histórica que marcou o nos-
de triangulaqão, dando assim ao comércio do so vinho foi defraudada ou rejeitada ; defrau-
vinho da ilha características peculiares ; são dada porque depois dos momentos de grande
as rotas da Inglaterra colonial que tocam a procura se fazia vinho Madeira de tudo e
Madeira para refresco e cargla de vinho e se mais siarde com a filoxera se substituiu as
dirigem ao respectivo mercado das Indias Oci- castas nobres pelo produtor directo, resistente
dentais e Orientais, donde regressam, via Aço- ao insecto e de maior rentabilidade ; esque-
res, com o recheio colonial. São os navios cida ou rejeitada porque o ilhéu Fez desapa-
poriugueses da rota das Indieas, ou do Brasil recer a maior parte dos testemunhos materiais
que fazem escala na ilha onde recebem o vi- que documentavam esse provir, destruindo ou
nho que conduzem às praças onde se dirigem, lançando ao lixo os últi~mosresquícios desses
donde regressam com o saque pelo largo pas- momentos de esplendor, isto de tal modo que
sando pelos Açores. São, ainda, os navios in- nos tempos que decorrem são poucos os restos
leses que se dirigem à Madeira com manu- disponíveis que possam ser ufilizados ou de-
Facturas e fazem o retorno tocando Gibraltar, posiiados em lugar conveniente, de modo a
Lisboa, Porto. E, finalmente, os navios ameri- que possamos legar aos nossos vindouros
canos que da América trazem as farinhas para aquilo que os nossos pais e avós nienospre-
a ilha e regressam carregados de vinho. zarani.
A impedir e bloquear este movimento te- Que perspectivas para um vinho que du-
mos as guerras europeias e coloniais, a acção rante muito tempo apenas teve como suporte
dos piratas argelinos, insurgentes... E, final- de comercializuqão a sua imagem histórica
mente, as condições cl~imáticas, os ventos e rememorada por monarcas, poetas ou drama-
correntes marítimas ; as primeiras restringindo turgos ?
o trânsito atlântico a determinadas épocas, as Que fazer perante uma actividlalde viti-
segundas demarcando as rotas aos veleiros. -vinicola rotineira e costumeira alheia aos
Por todas estas razões o vinho ilhéu con- avanços tecnológicos e botânicos ?
quistou, desde o séc. XVI o mercado colonial Estas e muitas mais questões pairam n o
europeu na África, Asia e America afirman- panorama político-económico regional faltan-
do-se até meados do séc. XIX como a bebida do aqui e acolá soluções adecluadas capazes
por excelência do colonialista e das tropas de reabilitarem ou fazerem perdurar a ima-
coloniais em acção. Regressado o colonialista gem, fama e qualildade do vinho da Madeira.
Ci sua terra de origem, depois do surto do mo- N a visão do historiador, o vinho da Ma-
vimento independentista, trouxe na bagagem deira celebrado e saboreado por monarcas e
aristocratas quinhentistas e seliscentistas, com-
panheiro de viagem de exploradores e colo-
nialistas setecenfistas e oitocentistas ; aquele
que os deuses d o Olimpo se o bebessem tro-
cavam pelo néctar ; perdeu-se nos pergami-
nhos da história.
A capacidade e ganância do ilhéu oito-
centista fê-lo perder qualidades e clientes. E,
a natureza castigou-o com o oídio e filoxera,
fazendo destruir as cepas que produziam o
vinho afamado.
Das soluqões a reposição do ((status quo»
caduco passaram muitos anos e o potencial
aprecialdor d o rubinéctar insular fê-lo substi-
tuir pelas hodiernas bebidas alcoólicas.
A História é um movimento irreversível e
rogressivo d a acção do Homem, daí que o
Ristomriadormanifeste o seu desagrado com as
medidas ou soluções que militem uma repo-
sição num meio onde se torna impossível. Ape-
nas nos resta, a nós (historiadores e historia-
dos) agarrar o f i o conldutor do temlpo e re-
temperados com as exigências e acções pas-
sadas avançar pelo rumo que o passado/pre-
sente nos traçar.
Deste m o d o a viti-vinicultura madeirense
está carecida duma política capaz de abarcar
os problemas existentes, cujas raizes históricas
são muito profundas, a qual passa pela exiç-
tência duma região demarcada e a condução,
até as últimas consequências da reconversão
da vitis vinifera, repondo o conjunto de castas
que deram e continuam a dar nome 6 ilha.
Praz-$nossalientar a accão e impulso do Ins-
tituto do Vinho da Madeira que teima em dar
aos nossos avoengos a imagem merecida do
vinho ilhéu.

NOTA :

Para a elaboração desta breve resenha histdrica


sobre o ,vinlto d a Madeira servimo-nos do material
colhido para a elaboração de alguns trabalhos, e m
vias de pu,blicação, sobre o referido tema. Remete-
mos as informações complementares e a comtatação
do que aqui s e refere para os seguintes textos :
1.0 - O vinho da Madeira - séculos XVIII/XIX
( p ~ o d u ç ã o ,preços, circuitos e mercados).
No p ~ e l o .
2.. -O vinho da Madeira - Álbum. No prelo.
S.a-EIistória do Vinho da Madeira, séculos XV
a X X ( e m preparação).
ANTOLOGIA DE TEXTOS ALUSIVOS
AO VINHO DA MADEIRA

-«Se eu fosse wrn antiquário, s6 ,teria olhos para


as coisas uell~m.Mas sou um historiador. E? por
isso que amo a vida.»
Henri Pirenme

Ao saborearmos um cklice de vinho Madeira


velhissimo, ficamos extasiados pelo seu aroma e
sabor pondo de parte a imagem que 0 rmsmo re-
flecte, da sua laboraçáo há já um ou dois s6culos ;
a Epoca de esplendor do vinho da Madeira. Ignora-
mos a parte amarga : o colono na sua labuta diária
no campo e nas adegas, o árduo trabalho das vin-
dimas, os borracheiros no seu passo cadenciado, de-
nunciado pelo eco dos seus cantares, por entre a s
encostas da Ilha.
P a r a podermos recriar essa ambibncia temos
que agarrar os restos materiais e fazê-los reviver
na sua labuta sazonal, ou antes fazer desbobinar o
filme que se esconde por entre a ferrugem e a traça.
Os restos materiais, já carcomidos pela traça
e ferrugem e, ainda, exalando o aroma caracteris-
tico do vinho Madeira, são o Único c10 de ligação
com esses momentos de esplendor.
No ,princípio, foi a idade da madeira com as
latadas, o almude, o funil, o barril e o lagar ; depois
tivemos a idade dos metais, com as prcnsas, medidas
de cobre e folha, os filtros, cubas.. .; e, finalmente
na era da tecnologia, altamente sofisticada, toda essa
utensilagem foi devorada em favor d'outra padro-
nizada e univeraalizada.
Os materiais ora expostos traçam-nos a Histdria
e Ciclo de Vida do Vinho da Madeira : - A enxada,
o podão, a máquina de sulfatar, o fole, documen-
tam a faina viticola de Janeiro a Julho.
-Os cestos, o lagar, a prensa, as medidas, o
barril recriam-nos a ambiencia característica d a fai-
na das vindimas.
-O borracho aviva-nos o ambiente nostSlgico
das manhãs e tardes de Setembro, em que os bor-
racheiros animam a paisagem com o seu cantar ca-
denciado e triste. Hoje, o barril c posteriormente o
automóvel destronaram-no.
-A tanoaria, com a sua utensilagem caracte-
rística, a partir da qual o tanoeiro trabaula a ma-
deira, com engenho e arte. de prémios, desde a medalha de ouro à legião de
-Os materiais de laboratório -pipetas, alco- Honra. ( :. . . )
ómetros, colorimetros, areómetros, ferrómetros.. . - oferecido a reis e a principes regentes, a chefes
que apuram a qualidade e trato do vinho. de estado e a ministros, a senhores feudais e a bur-
- Os materiais de engarrafamento -máqiiina gueses opulentos.. .
de encher, de capsular, rotular-que preparam o O vinho de Anacreonte, que o levava a coroar-se de
célebre rubinéctar de modo a que possa chegar rosas quando esvasiava a última taça, não seria um
atempadamente ao lugar de consumo. malvasia c!e cuja casta vieram p a r a a Madeira al-
São vestígios de um passado, relíquias preciosas gumas cepas ?.. .>
até hoje esquecidas, que atestam o viver e a faina
(E. Nuqtes- Porque me orgzclho de
quotidiana dos nossos vindouros.
se?- madeirense, Lisboa, 1951, pp.
Alberto Vieira 87/29)
I/io/sa
(texto de abertzcra ao catúloyo da exposição reali- O MADEIRENSE MODELA O ROCHEDO
zada em Outubro de 1988 no Junchal)

fB E o vilão ataca e tritura a rocha para a trans-


forn%arem solo agrícola; geme sob o peso de enor-
-Há trBs cousas por excelência boas e deliciosas mes pedras para construir um socalco ; marinha
n a Madeira: é o clima, são a s mulheres e s2o os pelas f,zlésias para conquistar um palmo de terra,
vinhos ; umas como outras, coino que nos einbria- mesquinha gleba, pouco maior por vezes do que u m
galn ; umas corno outras são dignas de elogio e ninho de águias alcaildorando no pendor de uma
pedexn apreciações moderadas.
'
13 que o clima excita-nos a vida, que tanto as mu-
lliercs como os vinhos sabem enlevar o espírito fa-
f ~ a g a .Antes de s e r agricultor, é cabouqueiro e ar-
quitecto, ~ ~ de solb a ~ sol e ttranisioma
~ o seu
a sua courela, num jarclim. Onde a cor-
zendo palpitar corações. ( . . .) re, o ag-ricultor heróico e operoso faz milagres ; a
O vinho n6.o 6 uma simples combinação ; 6 um pro- levada e ele a levada, Novos
ùlema de gosto, um e um grande agente paios se sobrepõem a outros paios, e assim esse tra-
terapêutica de primeira ordem.» balhador humilde, além de transportar sobre os om-
(João Azcgusto Martins -Madeira, bros o peso da s u a cruz, constrói nos degraus d a
Cabo Verde e Guiné, Lisboa, 1981, montanha o seu próprio calvdrio. d a Madeira so-
PP. Sg//tl) brepovoada que luta heroicamente para viver.
Este vilão inadeirense, de torso hercúleo, más-
6 cara rude e austera, personiiicação da paisagem,
-Perfuma e alegra o solo um vinho histórico, pro- figuxa de painel quinhentista; o homem que cinzela
duto de castas primitivas, sangue de raça a perpe- montanhas, escala abismos e amansa torrentes, é
tuar na ilha o nome de Portugal. Foi este vinho tima figura estranha. Nno se deixou vencer pelas
companheiro dos colonos n a rota da descoberta; seduçoes traiçoeiras do clima desta antessala dos
postou-se de guarda a porta de suas casas, de braços trópicos que despertam e m nós, lusíadas indolentes,
abertos, numa mmada acolhedora a parentes, anli- sonhadorcs e sensuais, o horror ao esforço paciente
gos e vizinlios ; dá-lhe vida no trabalho ; vibra-lhe e metódico. A maus olhos, o viláo é u m português
na alma em festas de família e todos os anos se que teve a coragem de partir a guitarra, aquela
renova no barril ou quartola para o aquecer no In- guitarra que todos nós trazemos n a alma e no co-
verno, estugar-lhe o passo nas romarias do Verão, raç&o a consolar-nos, com seus acordes de plangente
firmar promessas, selar contratos, fechar negócios fatalismo, dos desencantos e dos fracassos da vida.
e ser providência económica no seu lar.» (J. Vieira Natividade. Madeira - a
(E.Pereira -Ilhas de Zaryo, Irun- epopeia rural, Fu?zcAaZ, 1954, pp.
chaZ, 1967, voz. I , pp. 558/9) 89/40)

6
-O vinho da Madeira correu mundo -singrou por A VINHA N A MADEIRA
todos os mares e rompeu todas a s fronteiras. Est5
permanentemente nos festins de Francisco I de Fran- FIús-de ?tela e n c o n t ~ a rcepas viçosas
ça e de Carlos I1 da Inglaterra ; faz parte das rc- em partes do terreno trampluntadas
feições de Fernando da Bulgária e é colocado nos já mostrando seus frutos pampinosas
porões da nau-cárcere que conduz Napoleão ao ca- por mãos d a natureso ayricultada :
tiveiro de Santa Helena. Anda por congressos in- f a r á que destas purras viçosas
ternacionais, conquistando fama e enriquecendo-se fiquem as terras brevemente inçadas
porque farão nos séculos vindouros manda prodigiosa a par de um preço excessivo e
o prazer das nações, os seus tesouros por esta s6 também simples razão os habitantes des-
tas ilhas abandonaram toda a especie de agricultura
S e j a pois esta a planta mais querida e indústria que não fosse a cultura dos vinhos, fa-
d e que tratem os incolas primeiros : zendo-se indiscretamente dependentes da sorte, boa
s e j a p terra de cepas revestida ou m& deste só único produto. Com O produto das
e m vez d e louros, cedros e pinheiros : vinhas pagavam toda a classe de artigos necessários
a cultura das parras s e j a a Zide à. vida e de luxo e, apesar de tudo a circulação de
dos que forem aZi teus companlteiros então em metais preciosos foi prodigiosa, a pro-
dizer-te nada mais m e cumpre agora, priedade civil e rural se elevou a um valor difícil
n a enseada que vês ó Zarco ancora. de se acreditar e a principal de todas, o jornal se-
guiu a mesma proporção regulando e sendo regulada
(Francisco Paula Medina e Vascon- pelo valor dos vinhos e de toda a espécie de pro-
celos - Zargueida, Lisboa, 1806, priedades.
canto IX, estrofes XXIII e XXIV) Após dos ingleses que se apoderaram do comér-
cio e das riquezas acidentais que promoviam, veio
8
o luxo e este fatal companheiro da riqueza também
EXCLUSIVISMO DO VINHO seguiu aos habitantes destas ilhas em todas as suas
direcções.
-O vinho 6 o iinico genero abundante que pro- Tal era o estado d a província em 1815, quando
duz esta ilha e faz toda a sua riqueza é a moeda pela queda de Napoleáo Bonaparte teve lugar a paz
que mais gira como equivalente do mais que im- continental. E pois nessa época que principiam as
porta p a r a sustento de seus habitantes alimentados misérias desta ilha, ainda que desde esse instante
unicamente do seu produto sem recurso de nenhuma s e não manifestassem, porém foi desde então que as
o u t r a produção de outras bebidas capazes de adul- nações do continente ficaram habilitadas a concor-
t e r a r os vinhos bons de embarque ou paralizar a rerem ao mercado ingles e do mundo com os vinhos
venda dos baixos nas tabernas, que desta forma não da Madeira e ainda mais a suprir esta província dos
vendidas s e exportam com descrédito dos legais de géneros e do mundo com os vinhos da Madeira e
embarque. ainda mais a suprir esta província dos géneros de
primeira necessidade que possuindo-os como é da
- A Madeira é uma província de precária sub-
natureza desta operam infinitamente mais baratos
sistênciii. e não produz grão que chegue para con-
e regulando estes toda a espécie de valores, lança-
sumo de dois meses e outros vegetais frutuosos ape-
ram estas c a u s a e esses efeitos a esta capitania em
n a s darão subsistência para mais um mês, de ma-
embaraços extraordinhrios, porém consequentes.
neira, que o sustento de 8 p a r a 9 meses lhe é im-
portado. E l a não tem fábrica, nem produção alguma A imensa circulação de capitais, a carestia con-
o u t r a filha d a natureza, ou de arte que socorra a sequente dos jornais e a exclusão que tinham seus
esta e a s outras precisaes, além dos seus vinhos ge- vinhos no mercado inglês formou a base natural da
nerosos. carestia deste produto. A paz continental rompeu
toda a espdcie de equilíbrio nas relações e interesses
(Documentos de 1819 e 1881, in Ar- desta ilha.
quivo Hist6rico-Ultramarino -Ma- As nações da Europa que pela guerra tinham
deira e Porto Santo, N.' 4 6 9 5 ; Ar- sido distraídas dos exercícios pacíficos e pelo blo-
quivo Nacional d a Torre do Tombo queio continental privadas de concorrerem com seus
-Provedoria e J u n t a d a Real Ba- vinhos no mercado a par dos d a Madeira, se apres-
wewda do Funckal- N.' 963, fol. saram anciosas a aparecer com este produto não só
85Va/6; Arquivo Regional d a Ma- no mercado inglês, mas também DO do Mundo. E m
deira -Registo Geral d a Cdmara tempo desse bloqueio as nações que o sofreram se
do Bunchal, T, 15, fols. íOOV0/4) aplicaram a criar entre s i recursos de toda a espécie
e que conforme as visitas do seu valor criaram em
e último resultado a base da independência desses po-
O V I M O CAI E M DESGRAÇA vos.
A Madeira nesse tempo mais feliz, excluíu pela
As aturadas guerras continentais e o recíproco mesma razão toda a espécie de agricultura e indús-
bloqueio que impuseram o governo inglés e Napoleão tria que não fosse a criação dos vinhos. El por isto
Bonaparte, fizeram com que a ilha d a Madeira s e que agora s e vê nas tristissimas circunst$ncias de
encontrasse com vinhos no mercado inglês e ser compra de todo o artigo de necessidade e luxo e
por isto ela s 6 quem fornecia a Grã-Bretanha e suas essas nações que habilitadas agora com a paz, com
imensas colónias deste artigo. F o i por esta simples esta província igualmente concorrem com os vinhos
causa que este produto do seu solo obteve uma de- infinitamente mais baratos. Se a isto se acrescenta
a natureza custosíssima da agricultura da Madeira
A MOLESTIA DAS MOL*STIAS
comparada com a dessas nações que além de a for-
necerem d e trigo e milho e, enfim, de tudo, rivali-
Aparaceu entre nós a moléstia das vinhas em
zam com ela com seus vinhos por preços inferiores,
1852, com ela a aniquilação completa da produção
s e achará à primeira vista a razão da posição de-
quasi exclusiva do nosso país, d a única produção
sesperada e difícil em que estes povos se encontram
agrícola que ainda dava vida às nossas relações co-
agravados cada vez mais por outras causas imedia-
merciais com os povos estrangeiros e de que vivia-
tas, acidentais e secundárias, que por sua enorme
mos bem ou mal ...
gravidade e transcendência passo a expor.
J á antes da moldstia das vinhas, não eramos
No tempo da prosperidade, os ingleses aqui es-
ricos, nem felizes ; a nossa indústria agrícola a tro-
tabelecidos com o fim de amadurecer os vinhos e
peçar todos os dias em graves erros económicos não
de d a r a maior quantidade possível ao mercado, es- s e aperfeiçoara, nem desenvolvia, as vinhas em mui-
tabelcccram a s estufas, nas quais fazendo ferver os
t a s localidades não produziam as despesas d a cu1-
vinhos lhe davam uma naturalidade ou velhice for-
tura e pode-se dizer que os lavradores a s cultivavam,
çada c prematura e como tais os vendiam. Então
não já por interesse, mas por amor, ou por uma
pcla escassez deste artigo no mercado ing16s e do
espécie de gratidão aos interesses passados.
mundo, livre do bloqueio continental foi dissimulada
J á antes da moléstia das vinhas, milhares de
ou não advertida esta falsificação, sempre em des- colonos abandonavam esta terra desgraçada e emi-
credito d a real e superior qualidade dos vinhos, co- gravam para países pestíferos da América, alguns
mo também da pública fé ; por uma fatalidade e ao levados, é verdade, pela ambição e fascinados por
mesmo tempo justiça os médicos decidiram que os promessas sedutoras de vis aliciadores, mas a maior
vinhos d a Madeira e não havendo uma corporação parte fugidos da fome e miséria.
poderosa, que revestida de certos privilégios sepa- Já antes da moléstia das vinhas eramos um po-
msse os bons vinhos dos maus, todos caíram em vo desgraçado, que marchdvamos descuidados e a
descrédito. passos sui-dos no caminho que nos havia de conduzir
Por estas causas, os vinhos destas ilhas têm h á ii ruína inevitável. JA nessas épocas passadas, aquele
seis anos ficado estancados nos seus annaz6ns ou que despertasse da espkcie de torpor em que todos
nos do mercado de Londres e outras partes, pois o jazíamos e reflectisse um pouco, havia por certo de
que se t e m embarcado de então para cá tem sido antever um futuro mais Iiorrendo e assustador, do
mais objecto de uma operação forçada e prejudicial, que o presente que tanto nos assombra.
do que eleito de ordens encomendadas para esses Entho será porventura a causa finica de nossos
mercados. Desde que esses transtornos tiveram lu- males, ou a que devannos prestar maior atenção, a
g a r foi preciso comprar tudo, absolutamente tudo moléstia das vinhas, quando a despeito desta ha-
com o dinheiro que sc tinha acumulado no tempo víamos de sentir aqueles ? Ou ser& verdade que a
dessa efémera prosperidade, porém como o com6rcio moléstia das vinhas não fez mais do que apressar
ingl@se r a o comércio por excelência destas ilhas e uma crise, porque mais cedo ou mais tarde, havíamos
o que portanto se tinha apoderado do seu giro grosso de passar devido a outras ?»
e meúdo, este apenas viu o transtorno a que estas
ilhas eram condenadas, passaram seus principais (Texto de A. Gonçalves publicado
agentes com seus capitais para Inglaterra e outras no <cClamorPUblico», N." 8, p. 1)
partes, deixando apenas seus caixeiros recompensa-
dos com a firma da casa, estes sem fundo não po- O
deram derramar espécie alguma de recursos no pais DA DESGRAÇA AO DESEJADO
e só se destinaram a exercer a perniciosa operação
das liquidações que não tiveram lugar nos tempos Do vasto Oceano flor, gentil Madeira,
d e prosperidade. O com6rcio nacional foi cousa que Que de ?nurta viçosa o cimo enlaças,
n ã o existiu de 1810 e por isso sobre seus recursos Sdúria a teu seio amamentando as Graqas
n a d a se pode ventilar nem esperar. O dinheiro que Co' o vitreo SILCO d a imortal Parreira.
nesse tempo s e acumulou nas mãos dos habitantes
teria sido suficiente a amparar este golpe s e instan- Daquele, que em ti viu a ilzix primeira,
taneamente o luxo não ihes houvesse arrancado. Se acaso d crivel que i~zdaapreço faças,
Entre o prazer das brincadoras taças,
Recolhe a minha produção rasteira.

(Relatório d o governador José Lú- E donativo escasso, eu bem conheço ;


cio Travassos Valdes de 1887, in Mas o desejo, que acornpa~zÃaa ofrenda,
Arquivo Histbrico Ultramariao, Na- Lhe avulta a estima, 17te engrandece o preço.
deira e Porto Santo 2 J . O 10 856)
Deixa que a roda o meu Destino prenda;
Enz cessando estes males, que padeço, estremecer a s folhas das vinhas. Vclhos e gente
Talven então mais altos dons t e renda. nova, munidos de facas e navalhas, cortavam os
cachos que lançavam para dentro dos cestos peque-
(soneto de Francisco Alvares de N6- nos, os quais por s u a vez, s e despejavam em barre-
brega, in Luís Marino -Musa In- leiros, que se enchiam, até que as uvas, acamadas
sular, Funchal, S/D, p. 54) umas sobre as outras para cima d a roda da beira
se acogulavam. (...) trabalhadores a carregarem os
barreleiros As costas a caminho do lagar ...»
A desgraça d a Madeira
foi a doença da vinha (H. E . de Gouveia, A Canga, Coim-
escusa procurar mestre bra, pp. 116/7)
p'ra apreliãer a doutrina
B
(E. A. Pestana -Ilha da Madeira Por Regimento de 12 de Agosto de 1785 se
-
- I Folclore Madeirense, Funchal, rqegulamentou o processo das vindimas n a ilha, de
1965, p. 196) modo a evitar os abusos praticados pelos colonos,
que «não esperão que a s suas uvas estejão perfei-
Q tamente sazonadas p a r a a s vindimarem ; nem no
CULTURA DA VINI-IA tempo da vindima fazem a precisa escollia que se
requer para que não se misture o verde com o ma-
(<As terras menos alagadas, como é natural, são duro.. .».
a s que dão melhores vinhos. Nas propriedades mais No mesmo regimento se estipulava a data certa
bem cuidadas, o solo é aberto a t é a profundidade para a vindima em czda localidade, ficando o cum-
de dois metros ; o bacelo, plantado fundo, alonga-se primento desta regulamentação a cargo de um ins-
pelo gavião a procurar a humidade do subsolo, Única pector coadjuvado por inspectores locais.
que lhe dissolve os elementos necessários à sua nu- (ADF - GC -N . V O , foh. 29V0/S8)
trição. P a r a que a vinha se não tente com a alimeu-
taçáo fácil de Inverno, mas improficua no Vcrão,
das mais altas camadas de terreno, a s raízes supe- TROVAS ã VIiVDIlVA
riores são coitadas permitindo-se-lhe unicamente es-
s e árduo trabaiho de mineiro que há-de garantir-lhe, Alenina q'andais à folha
por longos anos, o sustento e a produç50 dos seus n a parreira d9alica?zte
saborosos e abundantes cachos de ouro. dai-me w n cac7~inl~o d'zsvas
Só no fim de três anos é que o bacelo dá colheita p a r a d a r ao nmr amante
apreciável. O seu tratamento não é muito trabalhoso :
dá-lhe uma cava em Janeiro para arejar a terra, Tletzl~avinho venha vi?d~o
metendo-se-lhe o empoçamento d a água das chuvas v z d ~ omais meia canada
e o seu escoamento profundo n a direcção do pé. g?:em quiser beber mais vinho
Duas enxofrações, uma esfollia depois da flor ponha a boca n a levada
vingada, c outra mais tarde para amadurecer o bago, No meio daqzrele nzar
é tudo quanto se concede de mais privativo à vinha. está uma p a r r e i ~ ad'2~vas
Indirectamente recebe ela outros benefícios que vi- não há faca que a s corte
s a m ao desenvolvimento de certas culturas hortícu- lá se perdem de maduras
Ias, medrando sob a s latadas durante o tempo em
que a ausência d a folha permite a luz do sol chegar Contando a bela pinga
ao terreno agricultado». desta nossa terra inteira
em todo o mundo não há
(Quinto Centevzário do Descobrimen- vinlto como o d a Madeira
to da Madeira, F t ~ n c l ~ a 1922,
l, pp.
/tl/Z) O meu amor anda às uvas ;
eu sou o seu ajudante.
8 Vou apanlkando e comendo,
AZAFAEdA DAS VINDIMAS qu'a pameira tem b a s t a ~ ~ t e
(Carlos M. Santos -Trovas e bai-
«Os colonos ao passo que as uvas amaduravam, lados da ilha - estudo do folclore
dirigiam-se ao senhorio ou feitor a pedir licença pa- musical da Madeira, Funchal, 1942,
ra fazcrerri a colheita, a apalavzarcm o dia de em- pp. 105, 109, 139, 150).
préstimo dos lagares. (. . .) E. A. Pestana-Ilha d a Madeira
...por toda a parte, em montados, fajzs, cabeços, - -
I Folclore Madeirense, Funchal,
fraldas da montanha, u m agitar de braços fazia 1965, p. 142).
O LAGAR TIZPICO MADEIRENSE
fuso de pau branco, das nossas serras, continua man-
tendo o costume, posto que absoleto, dos avoengos.
A mesma corda grossa a enrolar o monte dos en-
gaços, se bem que o chincho a v á substituindo, as
mesmas peças de madeira, o tampão e os dormentes,
A espremadura das uvas faz-se a pé ca!cante, sobrepostos aquele e até tocarem a parte inferior
a dentro dum reservatório que antigamente era um da vara, a mesma pedra redonda, volumosa e pesada,
simples tronco escavado, em geral de dragoeiro, que com um buraco ao de cima, onde s a i um ferro que
constituia o velho lagar de coxo. se encaixa na base do fuso e s e prende a ele.
Fez-se depois de tkbuas justas, caiafetadas em (Horácio Bento de Goz~ueia- Ca-
caixa aberta com biqueira na base, sobre um suporte ~lltenhosda. ilha, Funchal, S / D , pp.
de traves, encimando-o a vara do lagar, grossa viga 124/5)
articulada num extremo e apoiada no outro por uma
porca, onde vem morder um alto parafuso de ma-
deira, ligado a um pesado bloco de pedra. Esta sus-
pende, ao elevar-se o parafuso de pau branco, trans- O TRANSPORTE DO VINHO
furando a vara, e actua como reforço, premindo de
alavanca inter-resistente sobre o bagaço, depois deste
ter sofrido o primeiro piso, a pé nu lavado.
Há pequenos lagares mais simples, sem para-
fuso, e então o reforço do peso é feito num prato,
como os de balança decimal, onde sucessivamente A pele (de cabra) emprega-se no fabrico de
se vão colocando pedras, aumentando a potência de borrachos (odres) para transportar vinho dos laga-
espremeçáo, sobre o cfrascab, em forma de pão de res para os armazéns, ...O borraclio 6 feito de pre-
açúcar, formado pelos engaços e folhelho, apertado ferência da pele do macho, voltada de dentro para
espiralrnente por uma resistente corda fabricada de fora, depois de sangrado junto dum ouvido e de es-
esparto ou raízes de era. folado pelas orelhas. Pelas aberturas do pescoço e
( A . Sarme~ato - Notlcia histórico- dos ombros, cortados nas articulaçóes inferiores,
aparta-se a pele d a carne deixando parte do tecido
-militar sobre a iZha do Porto San-
to, Fz~nclaal, 19.33, pp. 9 4 / 5 ) da barriga para fortalecer aquela nessa região. «Fe-
cliado o borracho pelos membros e extremidades
BB deste é lavado interiormente com água e cinza, a
EVOLUÇAO fim de s e poder arrancar mais facilmente parte do
pelo. E deitado em seguida a curtir num banho de
casca de vinhático que lhe dá uma cor avemelhada.
Pisam os homens as uvas nos lagares, de calça Passadas estas operações, procede-se à insuflaçáo
arregaçada até ao joelho, músculos estriados e faces do a r pela abertura do pescoço, apertando o borra-
congestionadas. E há 44 lagares em actividade, cons- cho pela parte média para que fonne cintura e se
truidos de cimento, assim como a s tinas. Os de ma- torne mais cómodo para o transporte (horizontal-
deira de til com tinas feitas de ripas arcaizaram-se mente) sobre os ombros. A suspensão faz-se ligando
e aproveitaram-se as tábuas. O cimento conferiu aos a pele dos membros próximos, anteriores e poste-
lagares uma eternidade que a madeira não podia riores, em forma de ansas, às quais se prende a
dar. E, de feito, a substituição desta por aquele testeira-arriscol-formada de duas cordas paralelas
trouxe vantagens ao lavrador. Pois os lagares de (de lã, linho ou estopa entrançada) que vem apoiar-
madeira, todos os anos, por altura das colheitas, ti- . ccnduton> (A. Sarmento -Zo-
-se sobre o frontal c1o
nham de ser calafetados. Através das juntas das ologia Local).
tabuas, com o batuque das repisas e no ardor ainda
maior de tirar do bagaço a água-pé, as pranchas (E. C. N. Pereira- iilzas de Zargo,
davam de si e o mosto começava de pingar. As tinas I, Funchal, p. 423)
apertadas por arcos de ferro também se desconjun-
tavam. Deixou, portanto, de haver a preocupação do e
conserto, semanas antes das vindimas, além de que CONDUÇAO DOS V I N H O S E M 1777
era outra a durabilidade.
Introduziu-se, há muitos anos, a prensa no lagar, «...não se praticáo as colheitas como no reino,
mas, no norte da ilha não vingou o moderno aper- que v90 passando dos lagares a encubar nas adegas.
feiçoamento da técnica no espremer das uvas. Mais mas como as terras estão aqui divididas em porções
dispendioso, menos prático e de resultados não su- módicas de colonos, estes pisando suas módicas por-
periores ao processo primitivo. Pelo que o sistema ções, que logo imediatamente conduzem a meia parte
da vara corpulenta @e pinho ou de castanho e o respectiva ao senhorio para a cidade, nem dão lugar
e
A ESTUFA

Consiste o processo de estufar vinho, na seguinte


maneira. Qualquer que seja o edifício (em geral são
de abóbada), deve ser hermeticamente rebocado a
estuque, deixando-se-lhe apenas a porta por onde
entra o vasilhame, a qual é tarnb6m entaipada, de-
pois que a cascadura se acha estivada dentro, e
apenas s e lhe deixa um postigo por onde um só
homem possa caber, para ir diariamente examinar
com uma lanterna se há novidade dentro. No edifício
deve haver uma fornalha, praticamente no interior,
porém de maneira que facilmente seja alimentada de
fora com o necessário combustível, findo o que 6
fechada. E m todo o circuito do muro da mesma
estufa h á um cano ou tubo de cantaria ou tijolo, que
faz circular o intenso calor da fornalha por toda a
parte, calor que muitas vezes excede a 160 graus
de Farenheit, e então líquido ferve dentro da vasilha,
como u m a chaleira em cima de brasas, tendo-se-lhe
previamente feito um furo no fundo superior para
não arrebentar. Durante 3 meses ou 100 dias se acha
ncsta continua fermentação na qual perde em geral
10 p 100 da sua totalidade ; então apaga-se a for-
nalha e dias depois vão as pipas para o canteiro a
fim do vinho ser tratado. E notá,vel, que at8 durante
o mais auge do calor, entrão neste Inferno artificial
homens a isso costumados, e com a ajuda da lan-
terna correm os sinuosos espaços com que o vasi-
lhame está estivado, o estancão facilmente algum
esvaziamento, ruptura ou broca.»
(P. P. Câmara- Not4cia pobi'e a
ilha da Madeira, Lisboa, 1891, pp.
76/7)
Composição, impressão e gravurm
na Tipografia Angrense, com o-
rientação gráfica de Alamo
Oliveira. Angra do He-
roismo. Março de
MCMLXXXIII

Das könnte Ihnen auch gefallen