Sie sind auf Seite 1von 12

As festas da Santa Maria de Ordes de 1935

Dias de luita pola República

Edita e distribui:

Ordes, Verao de 2009


Guia de leitura
LH (ele agá) pronucia-se como LL em espanhol: Carvalho, filho, alho.
“O galego é um idioma extenso e útil porque –com pequenas variantes– fala- NH (ene agá) pronuncia-se como Ñ em espanhol: Minho, Corunha,
se no Brasil, em Portugal e nas colónias portuguesas.” sobrinho.
CASTELAO, Sempre em Galiza, Buenos Aires, 1942. SS (esse duplo), a pronúncia é a mesma que a do esse simples (S):
congresso, nosso, Rússia.
Ç (cê cedilha), pronuncia-se igual que o zeta (Z) ou cê (C) diante de E, I:
“...que o galego se pareça ao português nom tem nada de particular, porque o justiça, açúcar, Traço.
português nom é mais que o galego um pouco modificado, de maneira que se
tem que parecer por força, e nom é estranho que se pareça.” -M (eme final), a pronúncia da consonante nasal final é a que todas e
todos lhe damos habitualmente na Galiza: fim, paixom, latim.
PARTIDO GALEGUISTA, panfleto repartido em Ourense em Novembro de 1934.
J (jota) e G (gê), pronúncia-se igual que o xis (X) de peixe: geografia,
janela, religiom.
***
A parte disto também é importante saber que:
O galego que se ensina na escola está escrito com o sistema Z, Ç, CE, CI, podem-se pronunciar com sesseio (como na franja atlántica
gráfico do espanhol adaptado para a nossa língua; o habitual em da Galiza e no resto da lusofonia) ou sem ele (ceceio).
todos os contextos de colonizaçom é isto, que o povo colonizado QUA- (quando, qual, quatro...) pode pronúncia-se kuando, kual, kuatro
escreva a sua fala com a grafia do povo colonizador por como na maioria da lusofonia e na franja oriental da Galiza, mas
considerá-la mais prestigiosa. Mas isto, no nosso caso, evita que pronunciar kando, kal, katro como se fai na nossa comarca é também
o conjunto de galegas e galegos poda identificar-se com a escrita correcto.
tradicional galega que, com pequenas diferenças, foi adoptada G, quando nom é seguido de E ou I, pode pronunciar-se com gheada
em Portugal, Brasil, Angola, Moçambique e os restantes países de (ghato, ghrátis, ghota) –que é umha característica fonética exclusiva da
fala galega no mundo. nossa zona dentro da lusofonia– ou sem ela.

Como a grande maioria do galeguismo defendeu, o galego que


nós empregamos adequa-se à norma histórica e internacional.
Do mesmo jeito que quando escrevemos em espanhol o fazemos
igual que umha argentina, umha asturiana ou umha andaluza,
ainda que as quatro pronunciemos de forma distinta, também
pensamos que é bom que os países galegófonos ou lusófonos
escrevamos igual.

Para facilitar a leitura, que pode resultar estranha à primeira


vista, apresentamos-che as correspondências fónicas das letras e
terminaçons menos comuns na grafia habitual do galego:
2
INTRODUÇOM a vila viveu umha jornada de reivindicaçom popular republicana
em protesto perante uns festejos que, em plena IIª República,

Entre os objectivos da Associaçom Cultural Foucelhas está o de fôrom dirigidos polo poder direitista para opor-se ao regime

recuperar a memória histórica, lembranças vivas de um passado democrático do momento. O conflito tivo fortes repercusons e foi o

de luita pola liberdade que ainda hoje nos seqüestram ao mesmo baptismo de fogo do Bloco da Juventude (Bloque de la Juventud)

tempo que –num caso único entre todos os Estados europeus com que sob a batuta de Manuel Garcia Gerpe agrupava a jovens do

um passado ditatorial– os assassinos do regime franquista republicanismo, comunismo e nacionalismo galego da comarca de

seguem a receber honores e dar-lhe o seu nome a ruas, praças, Ordes. Por outras razons que exporemos mais adiante verá-se

colégios e monumentos de todo tipo; talvez recordando que também como essas Festas da Santa Maria, cheias de simbologia

realmente nunca se fôrom. nacionalista espanhola e católica, com a guarda civil disolvendo
com violência à mocidade campesinha das paróquias que fora à

Entendemos por memória histórica nom um compéndio de datas festa, foi um preámbulo do que seriam os anos de terror e

célebres, grandes batalhas e acontecimentos gloriosos, isso que a adoutrinamento do nacional-catolicismo da ditadura.

historiografia francesa chama a história événementielle; senom


um conjunto de vivências e recordos que conformam a tradiçom de Por último, falando de memória histórica seria bem injusto nom

um povo e que ainda tenhem capacidade mobilizadora, por isso, a falar da Asociazón Cultural Obradoiro da História, que desde o

memória está imbricada sobretodo no quotidiano, no próximo, e 1996 levou a diante um frutífero e generoso trabalho pola

nas práticas que a actualizam. Na história podemos estar, mas na recuperaçom da memória histórica da nossa comarca. Sem

memória somos. Obradoiro da História e o seu esforço estas páginas que tés entre as
maos nom seriam possíveis, pois nutrem-se da divulgaçom das

Nestas páginas, e coincidindo com as festas pratronais de Ordes suas investigaçons. Agradecemos-lhe, pois, o seu trabalho e

da Santa Maria e o Sam Roque, no 15 e 16 de Agosto dedicaçom.

respeitivamente, queremos aproveitar para recordar como


justamente nestas mesmas datas, mas há já setenta e quatro anos,

3
1. O PODER LOCAL E OS CAMALEONS as tropas de Franco demonstram do que serám capazes dous
anos depois, e em Catalunha o direito à autodeterminaçom é
“Ao inimigo, que se embosca e se camufla com a proibido a punta de espingarda. Assim as cousas, até 1936, no
cómoda roupagem de ‘republicano’, é preciso caçá-lo
como às lebres, na sua própria ‘camada’. Há que sitiá- que a Frente Popular ganha as eleiçons estatais, nom se pode
lo e situá-lo, e obrigá-lo a dizer onde está, evitando
dizer que se viva “numha república”. Ordes nom é alheio a estas
que nade nas águas turbas de um republicanismo de
última hora.” linhas gerais, e assim de claro o expressa o republicano ordense
MANUEL GARCIA GERPE, 1943. Manuel Garcia Gerpe1: “A República nom chegou a Ordes até
Fevereiro de 1936”. Os historiadores contemporáneos coincidem
plenamente nas consideraçons do
O poder local está, polo geral, afastado das grandes mudanças
militante de Izquierda
políticas a nível nacional e internacional, e muitas vezes
Repubicana e do Bloco da
apresenta umha lógica própria. A proximidade social entre as
Juventude de Ordes; segundo
candidaturas e o eleitorado fai que as redes sociais densas (e mui
Bernardo Máiz “...na volta de
especialmente as redes clientelares) e os compromissos pessoais
Ordes muitas pessoas procedentes
ou familiares joguem um papel mais importante do que a
da monarquia, no 1931 agrupadas
ideologia. O concelho de Ordes da IIª República nom era umha
na Derecha Liberal Republicana
excepçom, e estas dinámicas políticas de longa duraçom também
de Maura e Alcalá Zamora, fôrom
estavam presentes. “Por isso –explica Grandío Seoane– os
fazendo-se oco na CEDA e no
Concheiros seguem a dirigir o concelho de Ordes. Ainda que
Partido Radical e mesmo na
sejam destacadas figuras do anterior regime, seguem a ser os que António Concheiro Igrejas
ORGA-FRG, dando-se desse jeito”
possuem o controlo das redes clientelares”. Aliás, a nível estatal,
o que Emilio Grandío chama “a continuidade das velhas elites
no 1934 os direitistas da CEDA (Confederación Española de
Derechas Autónomas) entram no governo de Lerroux iniciando 1
Manuel Garcia Gerpe (Ordes, 1908; Buenos Aires, 1949) será o líder ideológico do
republicanismo no concelho de Ordes., combaterá no exército republicano e morrerá
umha política de dura repressom contra a esquerda: em Astúrias
em Buenos Aires luitando contra o fascismo.

4
locais de poder”. Por isso –conclui o historiador– “...a minha 2. AS FESTAS DA SANTA MARIA DE ORDES DE 1935
impressom é que em Ordes só depois das eleiçons de Fevereiro
do 1936 houvo verdadeiramente mudanças, irtiamente coutadas
pola sublevaçom fascista de Julho desse mesmo ano.” O próprio
Garcia Gerpe –de cujo artigo de 1943, “Como se forja un pueblo”,
seguiremos quase sempre o fio– é um testemunho de luxo de
todo isto, pois foi António Concheiro Igrejas, quem seria
primeiro presidente da cámara municipal do Ordes republicano,
o que lhe di abertamente que “ele, como Marañón, era
monárquico”. E, como demonstram os factos, nom mentia: o
Ministro de Justiça terá que ordenar –prévia denúncia de Garcia
Gerpe– a José Sanches Guisande, Juiz de Iª Instáncia de Ordes,
que retire a simbologia monárquica da Sala da Audiência. No 14
de Abril de 1932, primeiro aniversário da república, o governo Festa campestre em Ordes durante a IIª República

ordense boicotará os actos de celebraçom que, porém, levarám a


cabo de forma autónoma os socialistas, comunistas e Segundo a tradiçom as festas patronais da Santa Maria eram

nacionalistas galegos do concelho, ainda baixo as ameaças de organizadas pola Comissom de Festas, conformada por gente do

peche do Teatro Troche, local que acolheu a festa. Este era o comércio e da mocidade junto com um representante da cámara

governo republicano de Ordes entre 1931 e 1936. É nesta série de municipal. Até esse momento a reivindicaçom republicana

ofensivas monárquicas e direitistas onde se enquadra o relato ocupava um lugar central nas festas populares: o aguazil

que queremos recuperar: o escándalo de umhas festas patronais percorria a vila invitando à gente a engalanar as suas casas com

anti-republicanas em Agosto de 1935 que erguerá a indignaçom as cores da República, da cúspide da Igreja pendurava-se umha

de todas as pessoas democratas do Estado. bandeira monumental, e os palcos de música também eram
adornados com a tricolor, assim como a casa do concelho. Esse
5
ano, quando a Cámara Municipal anuncia que se encarregará em de lámpadas eléctricas, cujos lampejos pareciam ameaçar a
exclusiva da organizaçom dos festejos, que passam de gestionar- plácida mansedume de aquelas evocadoras noites de estio”,
se colectivamente ao secreto de quem nom prepara nada bom, as relatava Gerpe. A procissom da Santa Maria triplicou o seu
suspeitas já correm pola vila de boca em boca. percorrido, treinando às gentes de Ordes para o que lhe
aguardaria nos vindouros anos do franquismo. O comum era que
a verbena durasse até as duas ou três da manhá, mas esse 15 de
Agosto a sinistra Guardia Civil espanhola também irá
preparando-se para a repressom que exercerá nos seguintes
meses. A festa, narra Garcia Gerpe: “terminou a ‘sablazos’,
obséquio bárbaro cruel que a nefasta Guarda Civil brindou,
especialmente à juventude campesinha que de diversos lugares
acudia a desfrutar da alegria do espectáculo verbeneiro.”

3. O “BLOCO DA JUVENTUDE” DE ORDES NA IIª REPÚBLICA


Nenas e nenas de Ordes com o uniforme da Frente de Juventudes a princípios dos
anos 40.
Mas a efervescência política da República, se bem nom calhou
nas instituiçons municipais, sim que se notou, e muito, na
A corporaçom municipal de Concheiro Igrejas estava a preparar
crescente vida organizativa e associativa que viveu a vila e as
um boicote à República. O 15 de Agosto amanheceu com a
paróquias rurais desde 1931. O mestre Joám Bascói estava a criar
bandeira republicana retirada do mastro da casa do concelho, na
na mui activa paróquia de Vila Maior3 o Partido Socialista. Em
cúspide da igreja principal nom estava a enorme bandeira
2

3
tricolor senom umha “gigantesca cruz com admirável profusom Na paróquia de Vila Maior cumpre-se a trágica fórmula segundo a qual as zonas com
maior repressom fascista eram também as de maior nível organizativo. A
2
Pois até o ano 1958 a Capela de Lourdes nom foi abandonada até o derrube polos combatividade desta paróquia resalta-a Gerpe, quando sinala que na comemoraçom do
“conservadores” da vila. De estrutura primitiva románica, era a antiga igreja paroquial aniversário da República em 1936, que “Foi a maior demonstraçom cívica que se
de Ordes. recordava. Milheiros de pessoas percorrérom as ruas de Ordes. De Vila Maior descera

6
Parada junto com os trabalhadores do caminho de ferro chegam labregos, trabalhadores manuais e campesinhos, alguns
também os primeiros pulos organizativos de carácter sindical. estudantes, empregados e comerciantes. O Outubro vermelho

Em Ordes Manuel Garcia Gerpe inspira o Grupo de Jovens de Astúrias, do que teríamos que recordar perseguiçons em
carne própria, encendera ainda mais as nossas fogueiras.”
Republicanos, e em todos os concelhos de comarca as
associaçons agrárias inçam todas as paróquias. O nacionalismo,
A breve resenha à revoluçom asturiana serve-nos para recordar o
na sua curtíssima vida partidária, também estava a aflorar na
que expugemos ao princípio: durante os dous anos do Biénio
comarca de Ordes. Em Outono de 1933 cria-se o Grupo
Negro a República nom foi tal, e os movimentos populares de
Galeguista de Ordes. Em Março de 1934 cria-se o de Traço, com
Astúrias (combatido por Franco e o Exército de África) e
um número de militantes com os que o nacionalismo de hoje em
Catalunha fôrom fortemente reprimidos, nom só nos seus
dia nom pode sonhar: mais de cinqüenta pessoas. Em Parada há
territórios senom criando umha onda expansiva que chegaria a
também um grupo vencelhado ao Partido Galeguista, e só a
republicanos de todo o Estado; veja-se o desterro de Castelao e
sublevaçom fascista do 1936 cortará as azas do Grupo Galeguista
Alexandre Bóveda, ou a perseguiçom aos ordenses que sinala
que se estava a formar em Cerzeda desde começos de ano.
Gerpe sem, desgraçadamente, dar mais detalhes.

Sobre o grupo que nos interessa, o Bloco da Juventude, Manuel


Garcia Gerpe (1943:37-38) comenta o seguinte: 4. MANIFESTAÇOM POPULAR NO SAM
ROQUE

“‘Temos que dar a batalha’. Este era o nosso berro, o berro de O caso é que esta juventude ordense
‘quatro rapazes’ como dérom em chamar-nos,... ‘é mester atacá-
oganizada no Bloco da Juventude
los, trabalhar, derribá-los’. Eu descia de Madrid umha ou duas
artelhou umha resposta para a
vezes ao mês para trabalhar na formaçom do Bloco da
descarada celebraçom anti-republicana
Juventude; cinco jovens mestres, um advogado, muitos jovens
de Concheiro Igrejas e a violência
a paróquia quase na sua totalidade...” (Gerpe, 1943:43). Dous vizinhos desta paróquia
serám assassinados polos falangistas: Manuel Moar Cao e Manuel Sanjurjo Varela, policial que cargara contra os
este último torturado até a morte. Manuel Garcia Gerpe

7
campesinhos durante o baile da Santa Maria. O incidente foi o “A verbena sanroquenha de aquela noite rematava umha hora
detonante da luita da mocidade; “Qualquer cousa, qualquer antes, e a Guarda Civil reprisava os ‘sablazos’ e apaleamentos.
motivo deve servir de pretexto para desmascará-los –refere-se Desnecessário creio recordá-lo, o seu branco era o jovem e

Gerpe aos governantes municipais anti-democratas–. As festas inocente campesinho. Digno colofom a um dia de festa
programado por aquelas gentes reaccionárias. Perfídia.
patronais (Santa Maria) de Agosto de 1935 vam a proporcionar-
Covardia. Barbárie. Traiçom.”
nos umha magnífica oportunidade”. Na jornada seguinte, dia do
Sam Roque, a mocidade desfruta da festa com tranquilidade e
A Guarda Civil espanhola, que precisamente nascera como
alegria nas comidas familiares até que, umha vez rematadas,
polícia rural, será uns meses depois um dos principais agentes –
iniciam umha manifestaçom que se dirige perante a casa do
ajudada polos falangistas e um estranho lumpen do que em toda
presidente da cámara, onde se concentram e exigem a berros o
Europa se serviu o fascismo– da repressom fascista, que no
inçado da bandeira republicana à vez que protestam contra o
concelho ordense se salda com 11 pessoas fusiladas, 9 cadeias
caciquismo:
perpétuas, vários exilados, 6 pessoas assassinadas (algumhas
delas durante as torturas ou “passeadas”) e posteriormente
“Exigimos a bandeira republicana. Que se coloque a bandeira
vários guerrilheiros assassinados em combate (como Manuel
tricolor na Casa do Concelho, Abaixo o caciquismo! Abaixo!
Viva a República!. ” Ponte) ou detidos e executados (como Beningo Andrade o
“Foucelhas”). Gerpe ressalta bem que o principal alvo da

Concheiro Igrejas, encorajado polo seu pai, bota lume na violência policial era o campesinhado que baixava das aldeias até

provocaçom berrando-lhe à manifestaçom desde a janela da sua a festa da capital comarcal; o campesinhado era objecto de um

casa que “yo hago lo que me viene en gana”, arrogáncia que racismo espanholista total, e o melhor exemplo do que havia que

quenceu os ánimos dos manifestantes até que por pouco chegam exterminar: galegos, campesinhos e agora, ademais, organizados

às maos. À noite, durante a verbena, a repressom policial volveu no Bloco da Juventude, sendo, aliás, –como sinala Gerpe– o seu

aplicar-se em vingança pola manifestaçom da tarde; assim no-lo núcleo principal, polo menos quantitativamente.

conta Garcia Gerpe:

8
5. O CONFLITO NA IMPRENSA NACIONAL E ESTATAL Num dos parágrafos lê-se: “Desde aqueles heróicos tempos da
ditadura nom recordamos outros festejos patronais que
superassem aos deste ano”. Ao remate, em tom irónico, di:
Mas os enfrentamentos entre democratas e reaccionários nom
“Cremos que depois de tanto acerto, o presidente terá dado a
ficam aí, antes ao contrário, começam. O jovem Gerpe envia ao
pauta para outros anos, pauta que haverám de seguir os que o
enviado de imprensa em Ordes um artigo que La Voz de Galicia
substituam no seu posto de presidente, se é que o senhor
publicará nessa mesma semana, no 23 de Agosto. O texto
Concheiro nom continua, qual é o nosso desejo, regendo os
arremetia contra o inexplicável facto de que um presidente
interesses do Município. Aos muitos parabéns receba você o
municipal “republicano” boicotasse durante as festas a
nosso sincero.” E, ai!, quanta razom tinha sem sabê-lo o autor do
simbologia republicana e laica trocando-a por procissons,
artigo, pois desde esse mesmo ano as festas da Santa Maria de
sermons e missas cantadas que recordavam mais à penitência da
Ordes nom volverám a ver a bandeira republicana, enquanto a
Semana Santa do que à alegria do Verao.
“rojigualda” segue a dia de hoje no alto do mastro após a
Restauraçom Bourbónica promovida por Franco4. O artigo num
princípio “nom tivo mais alcances momentáneos [...] que o
saboroso comentário das gentes de Ordes e dos muitos
veraneantes que costumam passar os meses de estio na saudável
altiplanície da nossa vila...”, mas quando a notícia é recolhida por
4
Como mostra do continuismo entre o governo de Franco e o do seu sucessor Juan
Carlos I valha este fragmento do Discurso de Juramento do monarca: “Una figura
excepcional entra en la Historia. El nombre de Francisco Franco será ya un jalón del
acontecer español y hito al que será imposible dejar de referirse para entender la clave
de nuestra vida política contemporánea. Con respeto y gratitud quiero recordar la
figura de quien durante tantos años asumió la pesada responsabilidad de conducir la
gobernación del Estado. Su recuerdo constituirá para mí una exigencia de
comportamiento y de lealtad para con las funciones que asumo al servicio de la Patria.
Es de pueblos grandes y nobles el saber recordar a quienes dedicaron su vida al
servicio de un ideal. España nunca podrá olvidar a quien, como soldado y estadista, ha
Procissom da Santa Maria escoltada pola Guardia Civil espanhola
consagrado toda la existencia a su servicio.”

9
El Liberal de Madrid dous dias depois, em primeira página e com comerciantes, etc., declararám a favor dele. O próprio Concheiro,
a indignaçom que o acontecido merecia, as cousas tomárom ademais, realiza umha cínica declaraçom que com o tempo se
umha nova dimensom: “A notícia correu, voou, e estendeu-se torna macabra. Alega que é inexacto que nom ondeasse a
qual regueiro de pólvora”. bandeira republicana nos edifícios públicos, pois sim a havia na
Escola Nacional Nº2, situada na rua do Recreio. Efectivamente

6. A SUSPENSOM DE CONCHEIRO IGREJAS nessa escola estava presente a bandeira, porque fora colocada
polo mestre de primária José Garcia Fernandes, e pagaria-o com
a sua vida quando o 8 de Fevereiro de 1937 o fusilam em Boisaca
Embora governasse Gil Robles e
polo seu activismo político na vila.
Lerroux, e António Concheiro
passasse por gil-roblista, o
O desenlace a todo o processo iniciado nas festas da Santa Maria
Ministro de Governaçom
de 1935 é bem paradigmático do que passou em tantos outros
ordenou a suspensom do
lugares de Galiza. António Concheiro Igrejas evita, com a
presidente “republicano” da
Sublevaçom Fascista do 36 ser julgado polas supostas
cámara municipal. Antes da noite
irregularidades cometidas entre 1931 e 1935. O mestre que içou a
chega a Ordes o juiz militar
bandeira, José Garcia Fernandes, nom pudo, pola mesma razom,
Aramburo (filho do general da
levar a cabo o projecto de construçom de novas escolas no
Guarda Civil fiel à República
concelho que iniciará quando a Frente Popular chegou ao poder,
O mestre do Recreio, José Garcia fusilado por Franco), um
Fernandes assim como o de um liceu de ensino meio que nom chegará até
suboficial, um sargento, um cabo
mui tarde a Ordes. Em troques, será fusilado junto a outros dez
e dezasseis guardas. A instruçom do procedimento foi umha farsa
republicanos ordenses. Manuel Garcia Gerpe, que no momento
na que as testemunhas escolhidas tinham todas em comum,
do golpe estava em Madrid, luita no exército republicano,
menos Gerpe, umha característica: serem amigos de Concheiro; o
perdida a guerra foge a França no 1939, onde é internado em
cura, o secretário da cámara, o médico o farmacêutico,

10
vários campos de concentraçom, por onde busca, desesperado, à REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
sua companheira Esperanza Panadero Caballero. Umha vez
reunidos partem para Paris. Lá, a polícia francesa ocupa o local GARCÍA GERPE, Manuel. 1941. Alambradas. Mis nueve años por los campos de
concentración de Francia. Buenos Aires.
do SERE (Serviço de Evacuaçom de Republicanos Espanhóis) e
GARCÍA GERPE, Manuel. 1943. “Como se forja un pueblo”. Revista-Memoria
detém a Gerpe. É posto em liberdade aos cinco dias, e parte para
Sociedad Unión del Partido Judicial de Órdenes. Buenos Aires. 36-48.
a República Dominicana para dali ir a Buenos Aires, onde morre Reproduçom facsímiar in: Achegamento à Segunda República en
exilado em 1949. Os dous faziam parte do governo municipal Ordes. Documentos.
frente populista que, entre Março e Julho de 1936, projecta a GRANDÍO SEOANE, Emilio. 2001. “A II República. Teoría e práctica política.” In:
Achegamento à Segunda República en Ordes. Documentos. 4-6.
criaçom de escolas mistas em Parada, Montaos e Via Maior,
MÁIZ VÁZQUEZ, Bernardo. 2001. “Algúns aspectos da IIª República en Galicia”.
elabora um censo para que as pessoas sem recursos podam ter
In: Achegamento à Segunda República en Ordes. Documentos. 7-9.
assistência médica de balde, etc., etc... António Concheiro PAZOS GÓMEZ, Manuel. 2001. Achegamento à Segunda República en Ordes.
Igrejas, contodo, nom só se eximirá de ser julgado por Documentos. Obradoiro da História: Ordes.
irregularidades, senom que nos últimos anos do franquismo PAZOS GÓMEZ, Manuel e Daniel PEREIRO LÓPEZ. 2002. Ordes. Crónica fotográfica
do séxulo XX. Espiral Maior: A Corunha.*
volverá a ser o presidente da cámara municipal como
representante local da ditadura de Franco. Com a Restauraçom
HEMEROTECA
Bourbónica seguirá a mesma estratégia que todas as elites
franquistas instaladas no poder, e num movimento que já tinha
“Órdenes”. La Voz de Galicia. 23 de Agosto de 1935, pág. 36.
ensaiado décadas antes, fai a jogada do camaleom para “Así estamos”. El Liberal. 25 de Agosto de 1935, pág. 1.
apresentar-se com renovados galons democráticos (através da
UCD, Unión de Centro Democrático) às eleiçons municipais nas Ambos os dous artigos jornalísticos estám recolhidos em Achegamento à
Segunda República en Ordes. O autor do primeiro artigo, que é reproduzido
que, confirmando a característica longue durée do poder local,
praticamente na íntegra no El Liberal madrileno, foi obra de Manuel García
ganha. Governará até que no 1983 Coaliçom Galega, um partido
Gerpe, como ele mesmo reconhece, embora nom apareça assinado.
nacionalista moderado e de centro-direita, toma o poder.
*
Deste livro tomaremos todas as fotografias que reproduzimos aqui.

11
A todo aquele chamaleon vulgaris que, ainda hoje, quando escuita a palavra
“foucelhas”, fica pálido sem outra cor que vestir que a da sua miséria moral.

***

Este caderninho foi feito, editado e distribuído por:


Associaçom Cultural Foucelhas
Comarca de Ordes
Verao, 2009

Para pôr-te em contacto com nós:


foucelhas@gmail.com

Podes visitar-nos na Internet aqui:


foucelhas.agal-gz.org

Agradecemos-che que cópies, distribuas, compartas e difundas publicamente esta


obra (na sua totalidade ou em parte), sempre que cites a sua procedência original.
Nom uses, isso sim, a obra para fins comerciais.

Fotografia da capa: umha das primeiras iluminaçons artísticas nas festas patronais.
Anos 1950.

12

Das könnte Ihnen auch gefallen