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Nildo Vianna
"Desde o início do século 20 se fala em uma “crise do marxismo”. Apesar
disso, ele continua vivo, tanto que toneladas de tinta são gastas em textos
sobre sua crise. Então, se o marxismo continua vivo, há sentido em se falar
de uma crise? Mas, inversamente, poder-se-ia dizer que não existe
nenhuma crise no marxismo e que ele está tão forte quanto antes?"
Desde o início do século 20 se fala em uma “crise do marxismo”. Apesar disso, ele
continua vivo, tanto que toneladas de tinta são gastas em textos sobre sua crise.
Então, se o marxismo continua vivo, há sentido em se falar de uma crise? Mas,
inversamente, poder-se-ia dizer que não existe nenhuma crise no marxismo e que
ele está tão forte quanto antes?
A definição de crise fornecida por Habermas é muito mais ampla e útil. Para
Habermas, uma crise ocorre quando um sistema encontra dificuldades em se
reproduzir. Esta definição, porém, também possui limitações, pois, além da
utilização da noção de “sistema”, que é problemática, a idéia de crise perde toda
sua radicalidade e até mesmo sua utilidade, já que o marxismo e o capitalismo,
entre outros exemplos, apresentam, como uma de suas características, o fato de
possuírem dificuldades em realizar sua reprodução.
A definição de Habermas pode servir como ponto de partida para uma outra que
consiga apreender o significado deste fenômeno. Sendo assim, sugerimos que o
conceito de crise expressa uma situação onde um determinado ser (utilizamos esta
categoria em substituição à noção de sistema utilizada por Habermas) encontra
dificuldades cada vez maiores para se reproduzir. Portanto, aplicando esta definição
de crise ao marxismo, podemos dizer que ele só pode entrar em crise quando suas
dificuldades de reprodução se tornam maiores que as que lhe são comuns.
E isto vem ocorrendo atualmente com o marxismo? Para responder a esta questão
é necessário anteriormente definir o que é o marxismo. A melhor definição do
marxismo, a nosso ver, foi a fornecida por Karl Korsch: ele é uma expressão teórica
do movimento operário. Portanto, só pode ser considerado marxismo a teoria que
seja expressão do movimento operário e isto exclui, evidentemente, tanto o
“marxismo” acadêmico quanto o “marxismo” dos partidos e dos regimes de
capitalismo de estado da Rússia e leste europeu. Estes “marxismos” são, na
verdade, formas de deformação do marxismo e são justamente estas ideologias
pseudomarxistas que estão em crise e não o marxismo autêntico.
Essa idéia de crise do marxismo se reflete nas academias e nos partidos políticos
porque, de fato, existe uma crise no pseudomarxismo produzido e reproduzido
nestes lugares. Marx dizia que a “ideologia dominante é a ideologia da classe
dominante” e, sendo assim, as idéias das classes exploradas são marginais. Isto
significa que o marxismo autêntico é um marxismo marginal – ele fica à margem
das academias, do estado e dos partidos políticos.
Desde Rosa Luxemburgo, em 1903, passando por Sorel, Korsch, Deutscher, até
chegar a autores contemporâneos como André Gorz, Agnes Heller, Perry Anderson
e E. Laclau, a análise da “crise do marxismo” oscila entre uma ou outra destas
explicações. Mas, hoje, existe um outro motivo para a atual versão da crise: a
derrocada dos regimes “socialistas” da Rússia e Leste Europeu e a vitória do
neoliberalismo.