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Religião para
Adolescentes.
2009
Prefácio
A presente obra vem a completar nossa primeira obra – Filosofia para Adolescentes – cujas aulas
eram em boa parte, teóricas e, acrescentar outras áreas do conhecimento humano – Sociologia, Religião
e História, áreas que, normalmente, professores de filosofia são brindados, especialmente em escolas
públicas, que têm carência de professores dessas áreas. Mas, do limão, fizemos uma limonada, pois é
muito útil poder mostrar aos alunos a diferença e semelhança entre Filosofia, Sociologia (Ciência
social), Religião e História, quatro das principais formas que os seres humanos encontraram para
exteriorizar seu pensamento. A elas poder-se-ia acrescer Arte.
Procuraremos ser fiel à ordem das aulas e ao conteúdo ministrado, bem como, reações dos alunos
(participação, engajamento, ou afastamento e repulsa, sim, repulsa à metodologia, algo comum, natural,
fisiológico, em adolescentes) e resultados obtidos (formais, provas, trabalhos, apresentações e informais,
expressões, humor, conversas paralelas). Procuraremos apresentar primeiro as aulas de filosofia, depois
de Sociologia e, então, religião e História, Contudo, o leitor deve estar advertido que elas ocorreram em
paralelo: em uma mesma semana, dávamos as três disciplinas para as cinco turmas de primeiros anos do
Ensino Médio, pela manhã, turmas 211,212,213,214 e 215 e História à turma de terceiro ano do ensino
médio, turma 431, no horário noturno.
Queremos lembrar que a disciplina de História não era por nós esperada, mas nos foi oferecida e
como professor ganha pouco, representava um acréscimo financeiro a mais. Acontece, porém, que não
temos formação em História e um filósofo apenas toma emprestado as descobertas arqueológicas para
refletir sobre conceitos abstratos. Mas, tal empresa representou um desafio interessante – em dois ou três
finais-de-semana relemos um livro de história e recuperamos conhecimentos guardados uns vinte anos
na memória, quando éramos adolescentes e ainda estávamos no colégio.
Ainda, devo lembrar que passei neste ano de 2009 a usar um microfone portátil com uma pequena
caixa de som de 7 watts na cintura e os alunos gostavam do equipamento, aliás, eles gostam de tudo que
e relaciona à tecnologia e como nesta época da vida, a educação tem um gosto intragável e se
dependesse da maioria deles não iriam à escola, o uso do microfone prendia a atenção deles. Chego a
ponto de concluir que a pior aula dada por um professor, com microfone é ainda superior à melhor aula
dada sem microfone!!
Considerações metodológicas:
Quando se lida com adolescentes, deve-se considerar algumas questões:
1- Adolescentes são crianças com corpos de adultos, e, por isso, mantém a infantilidade em um
grau elevado. Uma boa maneira de conquistar sua atenção e respeito é:
(a) mostrar-lhes um filme daqueles que não precisam pensar muito, de ação ou romance, de
preferência dublado;
(b) distribuir-lhes guloseimas;
(c) praticar esportes com eles.
2- Eles não suportam rotina, aulas que parecem, para eles, repetitivas, embora sejam apenas
continuações, com acréscimos importantes. Por isso, eles dão valor a mudanças de ambiente: ir à sala de
informática em um dia, ir ao pátio tomar sol no inverno, ir à sala de vídeo, etc. Aliás, quem não gosta?
Mas, há um detalhe a considerar: quando eu entrei na faculdade de filosofia (a primeira que fiz foi
de Administração) me senti mentalmente esgotado e, mais para o final do curso, não tinha mais vontade
de ler um livro inteiro. Será que os adolescentes, em função do excesso de informação mais o conflito
que vivenciam em famílias, geralmente, desestruturadas, não estão exaustos mentalmente? Pensei em
um trabalho para um eventual pós-graduação: medir os batimentos cardíacos de professores e alunos
para saber o grau de stress que vivem em suas atividades!
3- eles estão sem limites, pois vem de casa sem limites, os pais ou avós os deixam fazer o que bem
entendem e sobre para o professor disciplinar, só que o professor não tem instrumentos que uma mãe ou
um pai teriam, como o de puxar a orelha ou dar um tapa na cara diante de desobediência. A psicologia
moderna dirá que isto é ultrapassado, mas lhes dar tudo o que desejam (adolescentrismo) não os educará
para o mundo, pois o mundo não lhes dará tudo o que desejarem! Na escola onde trabalho neste
momento, 2009, nem suspensão ou expulsão os alunos podem sofrer, pois o governo não quer mais
evasão escolar, mas isto não resolve o problema de termos alunos indisciplinados e a única coisa que o
professor pode fazer é tirar para fora da sala os mais desordeiros. Nada os agrada, os levamos para a sala
de vídeo, para o laboratório de informática, excursionamos ao museu de ciências, em dias frios tomamos
sol na rua, quando eles aproveitam para escapar!
Parecem que eles esperam por limites: às vezes respondo com grosseria à indisciplina deles: já
mandei alunos calarem a boca, outra vez, disse a um deles que deveria deixar de ser criança e virar
homem, outras vezes chamei seus pais, porque –lhes disse – com os alunos não era mais possível um
acordo. E quando os pais vêm à escola se horrorizam com o que os filhos fazem ou será que fingem?
Dizem que em casa não são assim! O mais curioso disto tudo é que temos a impressão de que deixaram
ao professor a tarefa de dar limites, mas como? Em geral, quando o aluno incomoda, tiramo-lo da sala,
mas muitas escolas são proibidas de suspender ou expulsar alunos.
O que é certo é que eles foram acostumados (condicionados, mesmo) a um tipo de aula, em escola
pública, em que o professor deixa uma tarefa no quadro e sai da sala e, mais tarde, verificará se eles
anotaram no caderno e fizeram professor curioso e com algum conhecimento amplo da vida. E é isso
que devemos cobrar dos alunos, um ser completo, não um especialista, pelo menos, nesta época de
formação escolar. Lembro que fui um estudante que esperava ansioso por novos conteúdos, pois, assim,
poderia aprender o conhecimento que a humanidade dispunha e tinha acumulado. Tinha esperança,
também, de que tal conhecimento representasse uma oportunidade de me tornar bem sucedido, mas há
muitos obstáculos e nossos sonhos morrem antes de ultrapassar todos: burocracia, para abrir empresas,
gastos para registrar marcas que imaginamos, recursos para implementar ideias, etc. podemos, ainda
assim, escrever nossas ideias e publicá-las na internet de graça!
Um dos argumentos em defesa dos adolescentes é que a escola tecnologicamente está defasada
com o restante dos equipamentos que os adolescentes estão habituados a trabalhar. Mas, experimente
leva-los à sala de informática e pedir uma pesquisa a eles: lhe darão qualquer coisa que aparecer e
apenas a copiarão, sem acrescentar opinião ou argumentos consistentes. Além disso, não estão
habituados a uma comunicação de duas vias, mas apenas a receber informações prontas, pensadas por
outras pessoas, cantores, especialmente.
Solução? Os meus alunos de terceiro ano do ensino médio parecem arredios (uma aluna pediu que
eu deixasse textos para que eles lessem e fizessem algum trabalho e eu respondi que não era ela que
decidiria como eu daria aula, embora eu, nas aulas seguintes, tenha assimilado nas minhas aulas os
trabalhos sem o constante monólogo do professor), desconfiados, agridem verbalmente (perguntam qual
é a tarefa e não esperam a explicação ou se não a entendem dizem que a culpa é do professor, eximindo-
se da mesma), expressam-se com receio e dificuldade de e têm pouca auto-estima, fruto de uma infância
sem afeto?
Mas quando há pontos ou notas envolvidos eles participam. Em parte, propus aulas que não os
massacrassem com excesso de informação, questões difíceis de resolver ou provas que os fizessem
estudar muito e memorizar a matéria - acho que conquistei algum respeito deles. Levei-os ao laboratório
de informática, à sala de vídeo, ofereci-lhes pipoca para os motivar a assistir o DVD de Sócrates, só não
fomos no museu de ciências, porque ele não abre à noite. Não é preciso mais rigor do que a exigência da
presença e de alguma participação por parte deles para a escola cumprir atarefa primeira: ampliar a
percepção (muitos a chamam de pôr a razão no controle, como se existisse um órgão sede da
racionalidade, como bem questionou Popper) acostumada a percepções limitadas a seus hábitos
cotidianos; reparem como um adolescente percebe detalhes que passam despercebidos pelos adultos:
reparam o tipo de sapato que usamos, se a roupa está suja de respingos de lama (pois mesmo com chuva
forte, eu vou de bicicleta para o colégio), a tudo que é pequeno eles prestam atenção! Não é por acaso,
também, que eles, em geral, têm dificuldade de pensar em um nível abstrato, pois neste nível o particular
e o singular (este, esta e isto ou aquilo, aquela, aquele) se encontram desfocados e se dá lugar ao
“existe”, “alguns”, “todos”, expressões que não falam de uma pessoa, que tem um nome, veste uma
certa roupa, moro na rua tal, mas de grupos maiores de pessoas até se o universo tem limite, o que
compreende o conjunto de todas as coisas que existem dentro dele ou mesmo, por especulação, fora
dele.
4- um dia apareceu no colégio um mágico. Precisavam ver a reação dos alunos, adolescentes que
transpareceram as crianças que ainda estão neles. Hipnotizados, saíam das aulas sem pedir e quando
chamava a atenção deles, não estavam nem aí. Senti uma inveja do poder do mágico de prender a
atenção dos alunos. Certamente falta isso na educação ou, então, deixar que eles façam a mágica... de
criar algo que saia de dentro deles mesmos! Um professor não tem a obrigação de ser um mágico, mas
pelo menos a humildade de querer ser um mágico, para ver olhos brilhando na sua frente.
1a aula introdutória:
Na primeira aula, apresentamo-nos, nosso histórico, faculdade de origem, antes, dissemos que nos
formamos em Administração, depois, arduamente, nos encontramos em Filosofia, depois de ter pensado
em Arquitetura – formas e cores eram, para mim, um atrativo e mais do que isto, uma necessidade
neurológica, porém perder tempo decidindo tipos de tecido ou embelezando a casa de “cabeças vazias”,
nos afastou daquela idéia.
Mostrei-lhes alguns livros que publiquei na internet, apresentei-lhes um livro específico que
escrevi e que dele queria que eles imprimissem um texto que usaremos no segundo trimestre e, para
motivá-los a se mover!, prometi 10 pontos (não queria realmente que fossem 10 pontos, mas saiu da
boca!, oferecei como alternativa: dar 5 pontos para cada disciplina, filosofia, sociologia e religião, mas
prefeririam os 10 pontos!): trata-se do texto, um resumo feito por mim na verdade, da obra “O povo
brasileiro”, de Darcy Ribeiro, que sem igual, mostra a origem da sociedade brasileira, os povos que a
formaram – índios, negros e europeus, a desigualdade presente desde o descobrimento, ou melhor,
invasão! No restante da aula, apresentamos, então, as diferenças entre filosofia, ciências e religião e,
depois, as semelhanças entre elas. Primeiramente, devemos observar que tendemos a ver as três áreas
como separadas, tal como três propriedades, três terrenos que se limitam por cercas, muros,
intransponíveis, mas isto não é verdade.
A melhor imagem seria a seguinte, onde as três áreas têm diferenças, mas, também, semelhanças.
Embora o filósofo seja um solitário, que tenta entender o mundo, a partir de suas experiências e,
também, das experiências que observa nos outros e a religião trás consigo verdades ditadas por líderes
religiosos que dizem tê-las ouvido de um Deus e a Ciência (não esquecer: Sociologia representa aqui as
ciências) parte da observação e testes realizados com uma quantidade de pessoas ou fatos significativos
estatisticamente, isto é, um número que representa uma sociedade inteira, ainda assim, é sobre os
mesmos fatos, é sobre a mesma vida, que filósofo, religioso e cientista se debruçam e sobre os quais
fazem suas investigações, suas reflexões.
Filosofia Ciências Religião
Diferenças: Solitário, faz Pesquisador de Recebedor,
pesquisas sobre suas grupamentos possuidor e
próprias experiências humanos, a partir de divulgador de
e observa as das fatos passados e verdades prontas
pessoas que lhe são presentes.
próximas
Semelhanças: Suas investigações tratam dos mesmos temas, como origem do
universo, existência ou não de Deus e de uma alma imortal, sentido
da vida, felicidade, infelicidade, conflito entre emoções e
racionalidade, origem das sociedades, competição e concorrência,
violência, contratos, estética, morte, condições de verificabilidade
de suas teorias, bem, mal, costumes, leis, etc.
2a aula introdutória:
Fizemos um exercício para observar se eles compreenderam a aula anterior:
(A) Identifique nas sentenças abaixo quais são relacionadas à filosofia, às Ciências e à Religião:
( ) Dr. Zerbini, foi quem primeiro realizou um transplante de coração em humanos, no Brasil, após
uma série de tentativas usando bezerros.
A resposta é “Ciência”, embora apareça um homem solitário, ele na verdade, é um médico (as
pistas são “Dr.” e “transplante”) e médicos trabalham em grupo com enfermeiros, auxiliares de
enfermagem, anestesistas e residentes.
( ) René Descartes defendia que devemos ser céticos em um primeiro momento até que se prove a
verdade de alguma afirmação.
Um homem, solitário e, só por isso, já é “filosofia”. Também, ele expõe sua maneira de pensar
sobre fatos a sua volta, a necessidade de cautela, a partir de experiências que ele viveu ou algumas de
outras pessoas que ele observou (não há um número de observações, por isso, não é “ciência”!), antes de
julgar se algo que ele pensou ou que os outros disseram, é verdadeiro ou falso. Não se duvida, aqui, do
caráter dos outros, apenas se sua percepção e seus sentidos lhe deram toda a informação necessária de
que ele precisa para emitir sua opinião.
( ) Em Israel, encontraram um código secreto na Bíblia, a partir de versículos, onde palavras são
localizadas em linhas verticais, horizontais ou em diagonais, como, por exemplo, “Bin”, “Laden”,
“atacará”, “torres”, “Gêmeas”, “2001”, antes mesmo que os eventos ocorram.
É curioso, porque aqui os alunos disseram se tratar de religião; ocorre que embora se leia a
palavra Bíblia, não se trata da leitura direta do livro, mas através do uso da matemática e embora se
possa duvidar de seu caráter como ciência experimental, ainda assim, quem dela se utiliza, realiza, pelo
menos, experiências mentais tomando, algumas vezes, conteúdos vindos do mundo material. Uma linha
reta, perfeita, é uma idealização mental, mas pode se referir a um projeto de uma nova estrada em
construção, por exemplo. Trata-se, então, de uma ciência.
( ) Os Maias faziam sacrifícios com crianças e escravos que eram oferecidos ao Deus-sol para que
este nunca se apagasse.
Aqui, aparecem as palavras “sacrifício” e “Deus”, por isso, se trata de “religião”. Aproveitamos o
exemplo para perguntar aos alunos se algo assim poderia acontecer hoje: o professor poderia ir ao jardim
de infância da escola e pedir à professor que lhe desse uma criança para oferece-la em sacrifício a um
Deus? Embora a idéia seja grotesca, sua proposição visa a fazer o aluno pensar: o que mudou entre as
maneiras de pensar, dos Maias até nós? Não eram eles também considerados humanos? De que modo
evoluímos, se evoluímos? Houve alguma mudança dentro do cérebro?
( ) Platão acreditava que existiam dois mundos, este, físico, e um outro eterno. De onde mais
tiraríamos a idéia de um círculo perfeito, por exemplo, se nada no mundo material, uma maçã, a lua, é
uma esfera perfeita?
Aqui, se trata de “Filosofia”, pois há um indivíduo, manifestando uma teoria a partir de sua própria
reflexão, ainda que tendo observado o mundo, não testou todos os objetos para saber se são, por
exemplo, esferas perfeitas. Uma vez um aluno, no ano anterior, perguntou se o olho humano não poderia
ser um exemplo de esfera perfeita. Pedi que ele enviasse um e-mail a um oftalmologista, porque era a
pessoa que mais próxima estava de olhos, mas o aluno nunca me respondeu esta questão. Em geral, no
tempo de escola não nos sobra tempo, tal é a quantidade de aulas e informações recebidas, bem como, a
importância exagerada a provas escritas.
Religião
Primeira aula:
Apresentei-lhes um mapa, uma linha do tempo mostrando as religiões que iríamos estudar no ano.
Minha idéia inicial era a de entrarmos primeiro no estudo das religiões, mas preferi começar das
questões etimológicas (o que significa religião) e das filosóficas (se Deus existe, se temos alma e se ela é
imortal):
O que é religião?
Ela vem de “religio”, do latim, língua do norte da Itália que se popularizou na medida em que o
império de Roma se expandiu pela Europa, norte da África e Oriente Médio.
Há diferentes explicações para o significado de “religio”, atribuídas a intelectuais romanos:
Para o orador e pensador Cícero, ela significa “relegere”, reler, pois os povos relêem os textos
sagrados constantemente;
Para Lactâncio, significa “religare”, pois a religião religa um povo a um Deus e ela pressupõe que
houve um momento anterior em que povo e Deus estavam juntos e, por alguma razão, se separaram.
Já Santo Agostinho, importante filósofo e teólogo medieval, acreditava que “religio” se referia a
“religire”, cujo sentido se relacionava a busca por parte de uma sociedade humana para ser eleita como
povo escolhido por um Deus. De Santo Agostinho, se pode lembrar muitas teses, como a tese, que não
se encontra escrita na Bíblia, sendo uma interpretação posterior daquele pensador, de que Adão e Eva
cometeram o pecado original, de terem comido do fruto da árvore do conhecimento (do bem e do mal)
ou, então, sua frase “No interior do homem está a verdade” (In interiore homini habitat veritas) e,
também, de tiradas bem humoradas: o que Deus fazia antes de criar o mundo? Respondeu ele: preparava
o mundo para quem faz esta pergunta. Ou, ainda, seu pedido a Deus para que o tornasse livre de desejos
sexuais – “Daí-me a castidade, mas não ainda”.
Finalmente, Macróbio (eu brinco com os alunos: que ele era primo do micróbio, embora este
último fosse um pouco menor!), para quem “religio” se referia a “relinquere”, relíquia, algo deixado
pelas antigas gerações como um legado aos mais novos.
Não vejamos esta aula como inútil, pois amplia o entendimento sobre religião, a valoriza como
uma criação humana, respeita e tolera as gerações anteriores na sua tentativa de explicar o mundo e, à
parte, oferece ao aluno um novo método de investigação, desconhecido por muitos deles, talvez a todos:
a etimologia!, o estudo das origens das palavras e, como elas, os motivos porque gerações e mais
gerações pensam e agem de um determinado modo específico, o que nos poupa, como detetives, ou
melhor, arqueólogos, de ter que remover toneladas de terra para achar uns poucos vestígios materiais,
que indicariam alguma causa para um comportamento humano.
Um exemplo que mostramos em algumas turmas: a palavra “humano”, vem de “Homini”, esta, de
“homo”, que no latim vem de “humus” (em greo, significa “o mesmo”, daí homossexual, o que sente
atraído por pessoas do mesmo sexo), terra, o ser que vem da terra e que dela se utiliza na sua
subsistência. Uma vez perguntei à professor de grego antigo (fui um dos poucos que fez dois anos desta
disciplina, embora depois a esqueci quase por completo) se “anthropos” não significava uma negação
(an-) de tropos (confundi tropos com topos, de topografia, estudo do terreno, da terra), ou seja, o ser
humano significaria aquele que não tem lugar fixo. Ela disse que não e eu, hoje, acho que minha idéia se
opõe à interpretação milenar e, também, bíblica, de que o ser humano nasceu da terra ou da argila,
soprada (e animada, de dar uma alma) por um Deus.
Na mesma aula, mostrei um diagrama com as principais religiões mais antigas e, também, aquelas
que surgiram a partir das primeiras, procurando mostrar-lhes o caminho que realizaremos para conhecer
um pouco do fenômeno cultural chamado “religião”. Sob a ótica de um filósofo é natural que se busque,
primeiro, um olhar abrangente, tentando abarcar, se fosse possível, todas ou quase todas as religiões,
para, depois, estudá-las em separado, relacioná-las, identificar semelhanças e diferenças e, finalmente,
definir (escrever) ou apenas propiciar o aparecimento da idéia (imagem) da religião em nossa mente.
Segunda aula:
Nesta aula apresentei a teoria de David Hume sobre a origem das religiões: primeiro os povos
antigos idolatravam animais e fenômenos naturais, tais como, cobras (deusa Naja, e a Vaca na Índia),
crocodilos, o deus Anúbis (com cara de cachorro, no Egito, etc), a dança da chuva, dos ameríndios, o
relâmpago, do deus Thor, dos nórdicos (um aluno explicou-me que era o pai de Thor que os lançava e
não o Thor). Depois, os povos, menos temerosos em relação à natureza, fizeram os deuses à sua
imagem, como disse Nietzsche, e tinham razão, pois, agora, enfrentavam outras tribos de homens e
precisavam de um Deus que entendesse dos sentimentos humanos. Curioso, também, é o fato de que
para aquele povo, só ia para o céu quem morresse em batalha, de morte violenta, as demais pessoas iam
para o inferno. O que não era muito diferente para os gregos antigos: a boa morte se realizava em um ato
heróico e que envolvia grande coragem.
Terceira aula:
Outro ponto envolvendo as religiões: a sua função estética, sua capacidade, como escreveu Will
Durant, de amenizar ou esquecer o “caráter tétrico” da morte, seu apoio às artes – pintura, escultura,
músicas, arquitetura – tem relação com transformar coisas banais em coisas sagradas. As cerimônias
como batismo, casamento e velório/enterro, também, são expressões desta função estética: hoje, muitos
casais apenas passam a viver na casa de um deles, mas muitos ainda guardam álbuns sobre a experiência
de estar em um altar, de dizer “sim” um ao outro, ainda que não acreditem mais no padre que está em
frente deles! A arte, da qual a religião se utiliza, é uma ferramenta fortíssima para transpor o que
Nietzsche chamou de absurdo da existência e a tentativa de dar-lhe algum significado!
Quarta aula:
Pelo menos uma aluna veio até mim e disse que as aulas estavam chatas, neste formato, isto é,
passar dois parágrafos com teorias antigas. Então, nesta aula, apresentei-lhes um teste que encontrei na
revista Superinteressante, no qual há perguntas com “sim” ou “não” que vão levando a pessoa testada a
outras perguntas, como outros “sims” e “nãos” e, finalmente, chega à cinco conclusões que indicam que
você tem características de um evangélico ou de um católico ou de um budista ou de um ateu.
Quinta aula:
Falei sobre algumas teorias sobre Deus. Os alunos perderam tempo debatendo se Deus se escrevia
com maiúscula ou minúscula. Em uma turma perguntei: faria diferença “unicórnio” com “u” maiúsculo
ou minúsculo. Como eles crêem que Deus existe, sem questionar??
Outras teorias: por que crer em um Deus e não em muitos? A explicação é que, pela definição do
que seja Deus, um ser onisciente, onipresente e onipotente, não se pode pensar que possam existir vários
da mesma espécie, pois, assim, um limitaria o outro e nenhum deles teria as qualidades que imaginamos
pertencerem a uma divindade. Um deus, por exemplo, não saberia o que o outro sabe ou não ocuparia
todos os lugares, pous haveria lugares que estariam ocupados por outros deuses.
E, finalmente, citei Orígenes (século IV dC) que disse que Deus e o universo existiam
eternamente, porque se tivesse havido um momento em que o universo não existisse, então, neste
momento, Deus não exerceria seu poder absoluto. Expliquei em algumas turmas que Deus não seria
todo-poderoso se não tivesse sobre o que exercer o poder; uma aluna observou que Ele poderia ser
poderoso, embora não exercesse tal poder. Lembrei de alguém que tivesse músculos, mas nunca tivesse
levantado nada – como saber que ele poderia, se não levantou nada? Reconheço que a tese, antes forte,
agora, parecia frágil!
Uma outra maneira é tratar da diferença entre potência e ato: Deus antes do mundo existir tinha a
capacidade, mas não a exercia e, assim, ocorreu uma mudança na essênciadivina, o que é contraditório
com a noção de Deus, um ser imutável. Porém não quis entrar na questão de potência e ato...Poderia,
também, ter tratado de questões como: se Deus poderia criar uma pedra que Ele não pudesse levantar,
mas não me lembrava direito dos argumentos a favor e contra tal tese...que, aliás, são fáceis de encontrar
na internet!
Sexta aula:
Vou apresentar-lhes um vídeo sobre o “Inferno de Dante” Alighieri, mas que, por ser um
documentário do Discovery Channel vai além, utilizando uma linguagem contemporânea, apresenta as
diversas explicações do que seja o inferno até mesmo o ponto de vista do falecido papa João Paulo II, de
que seja um estado mental, não um lugar.É um vídeo mais próximo dos adolescentes porque trata, por
exemplo, de tatuadores que falam sobre as imagens satânicas que desenham e tatuam na pele como um
processo de catarse, de lembrança de fatos desagradáveis, mas superados.
Um aluno, evangélico, mostrou-me a visão evangélica de inferno; pedi que me lembrasse disto
quando debatêssemos sobre o inferno. Esse mesmo aluno mostrou trechos da Bíblia em que Jesus
levitava ou subia aos céus (isto ocorreu na aula em que eu mencionei o papel estético da religião, de
embelezar a vida, quando eu lembrei os pintores renascentistas Rafael e Michelangelo com suas pinturas
mostrando Jesus voando) e eu lhe disse que a Bíblia era um livro de literatura, de lendas. O que fazer?
Há um documentário que mostra que a Bíblia foi escrita por escribas durante o reinado de Davi... Que
época para se viver: um monte de páginas de papel encadernada e cheia de palavras escritas à tinta é
prova de Deus?
Sétima aula:
Continuação da exibição do filme “O inferno de Dante”. Eles continuam a mencionar que não
gostam ou não conseguem ver filmes com legendas!
Vou fazer questões, quem sabe em forma de jogo dividindo a turma em dois grupos. Fiz isso no
ano passado com as turmas de 2o ano do ensino médio.
Uma aluna sugeriu que eu perguntasse a eles qual é a sua visão de inferno, não sei, quero mostrar a
eles que anjos e demônios (anjos maus) não podem existir, pois não é possível seres só com forma, sem
matéria, como pensava São Tomás de Aquino, em seu Tratado sobre os anjos.
Oitava aula:
Fizemos um jogo entre os sexos masculino e feminino, onde o professor perguntava algo sobre o
filme e quem acertasse ganhava um ponto e, quem vencesse o jogo, ganharia algo como 6 pontos e quem
perdesse, 4 pontos, de um total, no semestre de 24 pontos.
Foi muito produtivo, eles participaram, não teve conversas paralelas, mas se todo dia tivesse um
jogo assim eles perderiam a curiosidade, algo normal, nós também, adultos, somos assim!
Que questões fiz?
Nona aula:
O trabalho final do trimestre foi sob a forma de palavras cruzadas. Perguntei-lhes:
(1) palavra latina, um dos sentidos da palavra religião (religio), que significa religar o povo a seu
Deus original
(2) Religio vem de uma palavra latina que pode significar quando um povo reelege Deus como seu
guia.
(3) Religio pode, também, significar reler os textos sagrados.
(4) Religio pode, ainda, significar uma tradição, uma relíquia herdada das gerações passadas.
(5) Primeiros deuses da humanidade tinham forma de ....
(6) Fenômeno natural,simboliza a ira divina... (aqui cabia no espaço: terremotos, maremotos, etc)
(7) Depósito de lixo de Jerusalém no tempo de Jesus, simbolizou o inferno cristão.
(8) Lugar para onde vão os que morreram, mas não foram batizados.
(9) O inverno para os esquimós e para Dante Alighieri é .... (temperatura).
2↓
R
1 R E L I G A R E
3 R E L E G E R E
I 5↓ 9↓
G A F
4 R E L I N Q U E R E
R 8↓ I 7↓ I
6 R E L Â M P A G O
10 D Í A E
M I E
B S N
O A
Fiz algumas alterações em outras turmas: em vez de limbo pus purgatório, um lugar de espiação,
onde as almas perdoadas vão para purificarem-se antes de encontrar Deus, perguntei que tipo de
pecadores estavam no último círculo junto com Lúcifer (TRAIDORES) e, ainda, pedi que completassem
com uma palavra (ESPERANÇA) a frase que, na obra de Dante, está na entrada do inferno:
“Abandonem a _________quem entrar aqui”.
(5a) prova do governo do mundo – Aquino observava que mesmo os objetos inanimados tinham
um movimento. Causado pelo quê? Ou quem, Deus. Leibniz, no século XVII, dirá o mesmo. Hoje,
diremos: ora, é a força da gravidade. O que os alunos não sabem é que a ciência não tem uma resposta
para a pergunta: o que é a gravidade?
(5.1) Para Aristóteles, os objetos tinham em si mesmos um movimento natural (o que tinha mais
terra em sua composição tendia para baixo, o que tinha mais ar, para cima, etc)
(5.2) Para Issac Newton, ela era uma força de atração entre os corpos, embora ele se questionasse
como ela exercia atração se havia o vazio entre os objetos.
(5.3) Para Albert Einstein, os corpos com muita massa (massa, não gravidade!) deformam o espaço
(vazio) a sua volta, por isso, corpos, como a lua, giram ao redor da Terra, pois, esta última, previamente,
“afundou” o espaço a sua volta. Uma experiência para reproduzir a tese: pôr uma bola de boliche sobre
uma cama e, em seguida, atirar uma bola de gude, esta irá se mover naquela área afundada.
Não creio que esta tese resolva a questão, talvez acrescente um algo mais, a crença em que o vazio
não é realmente vazio, mas há uma matéria ainda que não seja percebida nem visualmente, nem por
instrumentos. E a minha dúvida reside no fato de que; “por que a Terra ou uma estrela ou um buraco
negro” deformaria o espaço em apenas um plano? Não faz sentido. Um físico disse que a Terra deforma
o espaço em vários planos, mas não vemos as outras dimensões. Eu e o gnomo que está aqui ao meu
lado não concordamos com esta resposta, pois supõe existir o que não se tem provas, talvez apenas se
encaixem bem em equações matemáticas, mas os números aceitam o que atribuímos a eles! (Nota: o
gnomo não existe, é uma figura imaginário popular, objeto que serviu de apoio à minha ironia aos
físicos).
Décima segunda aula:
Entendemos interessante apresentar mais uma teoria a favor da existência de Deus e algumas
objeções à sua inexistência:
A favor: todos os povos, mesmo os mais isolados no planeta, têm a crença em uma força superior,
um Deus.
Teorias contra a existência de Deus, elaboradas por um autor chamado Sebatien Faure (1858-
1942):
- Como o mundo veio do nada? De onde veio a matéria?
- Houve um transbordamento de Deus, supremo bem, e, assim, surgiu a matéria, que, distanciada,
se resfriou e se “solidificou”?
- Como um espírito pode manipular a matéria para criar um universo?
- Como um ser perfeito pode criar seres imperfeitos?
- Como é possível que Deus tenha estado inativo antes de criar o universo e, depois, ativo,
ocorrendo aí uma mudança, algo inconcebível para um ser tido como imutável?
- Se Deus não tem nenhum desejo, necessidade, por que criaria um universo?
- Se Deus é a causa do universo e este o efeito, não há efeito sem uma causa, mas, também, não há
causa sem efeito, assim, Deus e o universo são eternos!
- Por que um Deus infinitamente bom criaria um universo onde os seres cometem maldade?
Escreva “V” (verdadeiro) ou “F” para falso para cada uma das frases abaixo:
1. ( F ) Aquino desistiu da sua prova do governo do mundo após Newton formular a lei da
gravidade. [disse-lhes que Aquino viveu no séc. XIV e Newton, no XVI, mas não é preciso saber disso,
basta que se saiba que Aquino formulo 5 provas, incluída a 5a, do governo das coisas, cujo exemplo mais
simples é “uma pedra cai, porque não tem movimento em si mesma, mas uma força a puxa, Deus”]
2. ( V ) O fato de uma criança vir de seus pais e estes de seus pais e assim em uma série sem fim
(ou sem começo), para Aquino, é um absurdo.
3. ( V ) “Todos os povos crêem em um ser superior”, por isso, esta é uma prova da existência de
Deus [Deus aqui em um sentido amplo, não um Deus cristão].
4. ( V ou F ) “O universo não pode ter vindo do nada”, é uma prova da inexistência de Deus (não
necessariamente, pois de um lado, a igreja cristã defende isso, que veio do nada, mas há outro ponto de
vista, que se não veio do nada, então veio de um Deus e, felizmente, meus alunos perceberam isso!)
5. ( F ) Se há mal e este está em algum grau nos homens é de se supor que exista um ser que tenha
o mal em um grau máximo, segundo Aquino. [Aquino nunca defendeu isso, apenas que Deus é o grau
máximo de bondade ou bem]
6. ( V ) Um ser não dá a si mesmo a causa de sua existência, assim é preciso que exista um ser que
seja a causa da existência de tudo o que existe, Deus, para Aquino.
7. ( F ) “O perfeito vir do imperfeito” é uma prova da inexistência de Deus. [o certo é o imperfeito
vir do perfeito...]
8. ( ) “se Deus é a causa do universo existir e este o efeito, não há causa sem efeito, mas, também,
efeito sem causa”e, por isso, este é um argumento a favor da inexistência de Deus. [ou, pelo menos, da
co-existência entre Deus e o universo]
Nota: os alunos se espantaram pelo fato de o professor lhes dar 7 pontos por apenas copiar, mas,
desse jeito, eu consegui alguns momentos de paz, atenção e participação deles, tão raros!
Há, também, na internet um site (The Sect of Homokaasu - The Gematriculator) em que ao
digitarmos um texto, conforme o uso de certas palavras ou mesmo letras, o programa calcula o quanto
somos bons. Curioso, não?
Entre as observações que eu fiz, a principal foi perguntar: como estas religiões, muito antigas,
vivendo no deserto, poderiam determinar o momento da fecundação? Um aluno respondeu: quando
parasse a menstruação. Dissemos, sem lembrar direito, que havia um número de dias entre a
menstruação e a ovulação, sem dizer da irregularidade do ciclo hormonal feminino. De qualquer modo,
se tomassem a interrupção da menstruação, ainda assim, poderiam errar em duas semanas. Seria um erro
fatal? Talvez, não, como veremos mais adiante no quadro sobre as teorias científicas.
Na semana seguinte tivemos uma visita de uma orientadora sexual, de uma empresa farmacêutica e
ela nos deu uma dica fácil sobre o uso da tabela como um dos métodos contraceptivos, embora nem
sempre confiável: Se a mulher mestroa no dia 1o, por exemplo, ela observa que sua próxima
menstruação será perto do dia 1o do outro mês. Então, ela subtrai 15 dias e sabe que no dia 15 do
presente mês ela ovulará e mais: saberá que 4 dias antes e 4, depois da ovulação, ela estará no período
fértil, capaz de engravidar.
A seguir, apresentei aos alunos algumas teses sobre em que momento se poderia fazer ou não
aborto:
semana, há os primeiros reflexos a estímulos e na 8a, há um circuito de três neurônios, base para o
pensamento racional. Outros cientistas, acreditam que é só na 20a semana que o feto tem vida, pois, o
tálamo, parte do cérebro que centraliza as sensações, está pronto. Os defensores das teorias da 8 a ou da
20a semana crêem que só há um ser humano quando as conexões neurais estão prontas, pois, aí,
adquirirão “humanidade” e “consciência de si mesmo”.
Decisão judicial: Em 2004, o Supremo Tribunal Federal do Brasil, autorizou o aborto de fetos sem
cérebro (anencéfalos).
Nota: em uma outra turma, que antecipamos o período por ausência de um outro professor,
pedimos que eles elaborassem 10 perguntas com respostas sobre um tema livre, mas relacionado à
religião. Dei o exemplo dos jogadores de futebol que rezam antes do jogo ou do recém eleito presidente
dos Estados Unidos, Barack Obama, que foi criticado durante a campanha, por ser filho de um
muçulmano, ele poderia tender a apoiar os terroristas, um absurdo; lembrei, também, que a candidata a
vice-presidente da chapa adversária, não sei o que Paulin (tal a insignificância política), era ligada à
religião cristã ultraconservadora do Alasca, cujos dogmas envolvem proibição à pesquisa com células
tronco (proibição com a qual toda pessoa que respeita a vida humana deveria concordar, exceto, quando
se usa células tronco dos cordões umbilicais), mas ela e sua religião pensavam que Deus voltaria no
Alasca! Sobre o exercício proposto, os alunos tiveram inicialmente dificuldade de entendê-lo, mas penso
que ele foi útil para forçar os alunos a refletirem sobre algo que eles não tinham pensado, especialmente
porque a religião está em tudo: pense em maquiagem feminina (e, hoje, em menor grau, a masculina),
embora não saibamos a origem (egípcia, ameríndia?), ela destaca as feições do rosto para produzir
beleza e a beleza não faz o tempo parar? E quando o tempo para, não é algo a-temporal tal como a
eternidade? E o belo não é (dizemos) algo divino? Uma verruga e a religião? Há um ditado popular que
diz que não se deve apontar o dedo para uma estrela cadente, porque surgirá no dedo uma verruga!
Assim, não se deve apontar para as estrelas, que os antigos pensavam que fosse um mundo eterno
(supralunar) e apontar o dedo pode ser símbolo de desafio, assim, não se deve desafiar os céus ou aquilo
que é eterno? Claro, eu sei que uma conclusão como esta é algo que não se deve esperar nem de alunos
de faculdade..., mas, certamente, porque os educadores não estimulam tais reflexões!!
Vigésima aula:
Apresentei a teoria de Platão sobre a alma:
- ela está encarcerada no corpo (um aluno se opôs: disse que é o corpo que sofre o que a alma lhe
faz,semelhante a tese de Demócrito: “se o corpo pudesse levar a alma ao tribunal, a acusaria de maltrata-
lo!”);
- a alma move a si mesma, o pensamento parece ser causado por si mesmo, por exemplo, assim, o
que tem em si a sua própria causa é eterno;
- a alma existe antes do corpo e contempla as verdades eternas quando está junto de Deus, como as
verdades da matemática (a soma dos ângulos internos de um triângulo é 180o, hipotenusa ao quadrado é
igual a soma do quadrado dos catetos, etc). Se a alma contempla verdades eternas é porque ela mesma é
eterna.
Aqui, poderia ter falado sobre a obra Mênon, na qual Platão, na voz de Sócrates, exemplifica esta
tese ao perguntar a um escravo noções de matemática que a alma já trazia consigo: Qual a área de um
quadrado de lado 2? 4, respondeu o escravo. E qual a área de um quadrado com o dobro do lado? 8,
respondeu o escravo. Sócrates, o corrigiu: a área produzida é 16, observou que a alma do escravo sabia
disso, mas não recordava bem e, acrescentou, que se dividirmos o quadrado em quatro partes e
desenharmos uma diagonal em cada um deles, geramos um novo quadrado, este sim, de área 8.
- Deus é uma espécie de artesão que molda na matéria formas, como a forma humana.
NOTA:
Em umas das turmas, falávamos sobre a possibilidade de existirem espíritos e estes interagirem
com os vivos (de carne e osso). Falei que o espiritismo defendia que há um perispírito que une matéria e
espírito, mas, perguntei: o que os une ao perispírito, ele é material ou eterno? Se há nele as duas
naturezas, o que as mantém coladas nele? Se parasse de correr, o que impediria minha alma de continuar
em movimento? Lembrei, ainda, da imagem de água e óleo que não se misturam: assim eu via a idéia de
que alma e corpo não poderiam interagir!
Falávamos, também, de um filme que passou na tevê e cuja frase: “o mal é a prova da existência de
Deus” o iniciava. Um aluno disse que sem o mal não há bem e lhe perguntei se no paraíso há mal e se só
houver bem, então eles não precisam existir juntos sempre! Perguntei, também, se há um mal absoluto
ou se o mal é relativo como, quando o professor dá uma nota baixa achando que está fazendo o bem e o
aluno vê a avaliação como um mal que lhe atingiu!
Falei, ainda, sobre a aura que os espíritas crêem ser a foto da alma. Mas, como explicar que pedras
tem, também, aura quando tiramos fotos delas? Tem elas também alma e vão para o céu depois que se
desagregarem ou racharem?
* Outra de sua teoria consiste em tentar localizar um lugar da alma dentro do cérebro, na glândula
pineal, que fica no centro do cérebro e, para ele, parecia o lugar ideal para que ali a alma, aquilo que
pensa, decidisse seguir as inclinações (e paixões) que vem do corpo e lhe informam e incitam a agir.
Hoje, a ciência observa que as respostas do cérebro para o corpo são muito rápidas para que pudessem
ser submetidas a uma alma racional. E as pessoa que não tem a glândula? Cuja função está relacionada,
sabe-se hoje, é “regular os chamados ciclos circadianos, que são os ciclos vitais (principalmente o sono
quando produz melatonina, ao ser estimulada pela escuridão e inibida pela luz, hormônio que age no
sistema nervoso) e no controle das atividades sexuais e de reprodução (ela tem tamanho grande na
infância e diminui na puberdade)” (Wikipédia).
* há, ainda, uma terceira contribuição cartesiana: os animais não têm alma, são só corpo (como
uma máquina) e somente os seres humanos teriam corpo e alma (aquilo que pensa). Digo aos alunos que
esta tese influenciou muito a ciência e , por isso, ainda hoje, animais são utilizados como cobaias em
pesquisas científicas. Em contrapartida, fala-se muito, hoje em direitos dos animais ou, além, libertação
dos animais das péssimas condições a que são submetidos, em laboratórios ou fazendas para abate.
NOTA:
Há algumas questões para debate. Se a alma não é a fonte da vida, então, o que causa a vida?
Minha resposta é: os alimentos que comemos, o ar que respiramos.
E a consciência, é orgânica? Parece não ser. Quando as sensações entram no corpo e vão ao
cérebro, ficam guardadas nos neurônios, mas deve haver um lugar em que elas sejam percebidas. Se
tudo for matéria, como a matéria percebe que há outras matérias, isto é, sensações que impactam em
algum lugar do cérebro? Temos uma teoria sobre a consciência: ela não parece ser orgânica, pois não se
submete a certas experiências como quando prendemos a respiração (um ato voluntário de uma função
que, em geral, é involuntária), mas você não pode parar de ter consciência!!
Bem, do que trata o filme “O fim da colheita”? Ele mostra um grupo de estudantes universitários
cristãos apresentam suas crença em Deus a um clube de filosofia. Primeiro, um deles diz que Deus é
uma força invisível que ele sente porque tem fé, mas os filósofos se opõem a essa tese pois não há como
prová-la. Então, outro cristão resolve apresentar uma tese que ele encontrou na biblioteca que diz que
Deus criou o mundo em sete dias e estes sete dias corresponderiam a mil anos cada. Assim, desde Adão
até Cristo teriam passado 4 mil anos e de Cristo até hoje, mais 2 mil anos. Assim, o fim do mundo
estaria próximo. Este filme, me parece tendencioso, pois mostra os filósofos como arrogantes, embora
eles apenas queiram provas (que mal a nisso!), em nossa opinião, é útil, porque dá valor à busca de
respostas, justificativas, provas, além da simples fé (além do mais como distinguir esquizofrenia de
inspiração divina?). É tendencioso, também, porque parte de uma premissa questionável (duvidosa):
pressupõe que cada um dos sete dias corresponde a mil anos, mas Adão foi criado no primeiro dia?
Outro filme, não exibido, mas bem polêmico é “O túmulo secreto de Jesus”, que discute uma
possível localização para o resto de ossadas que poderiam ser de familiares de Jesus Cristo. Embora não
tenha sobrado ossos de Cristo, se questiona se isto alteraria a crença em sua ressurreição? Muitos
religiosos dizem que não, que ossos são resquícios de um corpo, apenas.