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ARTIGO ARTICLE 525

Mandados judiciais como ferramenta


para garantia do acesso a medicamentos
no setor público: a experiência
do Estado do Rio de Janeiro, Brasil

Can court injunctions guarantee access


to medicines in the public sector?
The experience in the State of Rio de Janeiro, Brazil

Ana Márcia Messeder 1


Claudia Garcia Serpa Osorio-de-Castro 2

Vera Lucia Luiza 2

Abstract Introdução

1 Departamento de There are increasing numbers of legal suits con- No Brasil, com a homologação da Constituição
Assistência Farmacêutica
cerning access to medicines brought against the Federal de 1988, define-se saúde como um direi-
e Insumos Estratégicos,
Ministério da Saúde, Rio de Janeiro State Health Department. The sit- to universal a ser garantido pelo Estado. Com
Brasília, Brasil. uation indicated the need for a study to clarify base nessa idéia, reformou-se o sistema de saú-
2 Escola Nacional de Saúde
the underlying issues. A sample of 389 court suits de pública brasileiro, implantado em 1990, pela
Pública, Fundação Oswaldo
Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. from January 1991 to December 2001 (stratified Lei no 8.080, sob o nome de Sistema Único de
by year) was used. A cross-sectional design was Saúde (SUS), que tem como princípios a univer-
Correspondência
used to describe and analyze the legal suits in re- salidade de acesso aos serviços, a integralidade
A. M. Messeder
Coordenação Geral de lation to the responsibilities defined under the da assistência, o controle social, a igualdade e a
Planejamento, Articulação Unified National Health System (SUS). Results descentralização político-administrativa 1.
e Gestão de Programas,
Departamento de Assistência
suggest major delays in court decisions. Most Valendo-se desses novos princípios de rees-
Farmacêutica e Insumos suits are filed by the Public Defender’s Office for truturação da atenção à saúde, tornou-se ne-
Estratégicos, Ministério users of the National Health System. The most cessário repensar a assistência farmacêutica.
da Saúde. Esplanada dos
Ministérios, Bloco G,
frequent cases involve medicines for the cardio- Após um processo de discussão envolvendo di-
sala 830, Brasília, DF vascular and nervous systems, many of which ferentes segmentos da sociedade, institui-se a
70058-900, Brasil. involve continuous use. Prescribing practices are Política Nacional de Medicamentos, pela Por-
ana.messeder@saude.gov.br
institutionalized through the inclusion of the taria Técnica do Gabinete do Ministro do Mi-
most frequently prescribed drugs in public fi- nistério da Saúde (PT/GM/MS) no 3.916, de 30
nancing lists, which makes rational drug use de outubro de 1998 2. Esta Portaria tem, dentre
difficult to achieve. Municipalities are not ful- seus objetivos, formular as diretrizes de reo-
filling their responsibility to supply medicines to rientação do modelo de assistência farmacêu-
users, and the State is thus encumbered with tica, com a definição do papel das três instân-
these responsibilities. However, the State does not cias político-administrativas do SUS.
adequately supply medicines to the municipali- Em 1999, com o objetivo de cumprir as di-
ties. The apparent lack of awareness among both retrizes estabelecidas na nova Política Nacio-
lawyers and clients generates stress between the nal de Medicamentos, iniciou-se o processo de
Executive and Judiciary branches and limits the descentralização da assistência farmacêutica
resources for collective pharmaceutical services. no Estado do Rio de Janeiro.
Com tal reestruturação, era esperado que
Drugs; Public Defender Legal Services; Pharma- houvesse uma facilitação do acesso da popula-
ceutical Services

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 21(2):525-534, mar-abr, 2005


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ção aos medicamentos, uma vez que as com- obtidos do arquivo documental e também do
petências de cada nível de gestão foram defini- banco de dados de “Mandados judiciais contra
das de modo a haver uma ação coordenada en- o Estado do Rio de Janeiro pleiteando medica-
tre os três níveis. O nível de gestão municipal, mentos para uso individual”, ambos existentes
aquele mais próximo da população, seria o res- na Superintendência de Assistência Farmacêu-
ponsável pela execução das ações, incluindo a tica da SES/RJ 5.
dispensação de medicamentos essenciais, tan- Para a seleção das ações, empregou-se uma
to aqueles adquiridos por ele próprio, quanto amostragem aleatória estratificada por ano de
os fornecidos pelos outros dois níveis de ges- início da ação 6. A amostra apresenta 389 ações,
tão. À gestão estadual caberia a responsabili- correspondendo a 14,0% do universo 7. Dentro
dade de organização e coordenação das ações de cada estrato foi mantida a mesma propor-
de assistência farmacêutica dentro do Estado, cionalidade (Tabela 1).
além da responsabilidade específica quanto à Os dados coletados visaram traçar um per-
dispensação dos medicamentos de alto custo fil dos mandados judiciais existentes. As variá-
(ou excepcionais). O gestor federal seria res- veis de interesse escolhidas foram: o número
ponsável pela regulação de todo o sistema, de- do processo (determinado pelo Judiciário); o
vendo providenciar os mecanismos de finan- ano de início; o status da ação (julgada, não jul-
ciamento, bem como propor as diretrizes das gada ou encerrada por falecimento do autor);
ações a serem implantadas pelos estados e mu- os medicamentos pleiteados, classificados com
nicípios 1,3,4. base no “Código Anatômico, Terapêutico e Quí-
Os registros de mandados judiciais na Se- mico” – código ATC 8; a participação dos medi-
cretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro camentos pleiteados em alguma lista de finan-
(SES/RJ) iniciam-se em 1991. Desse ano até ciamento público (para aquisição); a condição
1999, o ritmo de entrada das ações é paulatino patológica do autor pela Classificação Estatís-
e as indicações direcionadas a algumas enfer- tica Internacional de Doenças e Problemas Re-
midades. No entanto, a partir de 2000, perce- lacionados à Saúde 10a Revisão (CID-10) 9,10; a
be-se um grande aumento no número de ações unidade de atendimento (se hospital universi-
impetradas contra a gestão estadual solicitan- tário, federal, estadual ou municipal, posto de
do medicamentos para todos os tipos de indi- atendimento de Secretaria Municipal de Saúde,
cações terapêuticas, inclusive de atenção bási- clínica conveniada ao SUS, clínica não conve-
ca 5. Ao final de 2002, somavam-se 2.733 ações niada ao SUS e médico particular); o condutor
judiciais contra o Estado. da ação (defensoria pública, escritório modelo
O crescente número de ações enseja a ne- e escritório particular); o município de domicí-
cessidade de investigar o fenômeno, iniciando- lio, o tipo de gestão do município de domicílio
se pela sua descrição. As dificuldades da popu- (gestão plena do sistema municipal – GPSM ou
lação parecem evidenciar-se tanto no acesso gestão plena de atenção básica – GPAB, de acor-
aos medicamentos de atenção básica, quanto do com a Norma Operacional Básica – NOB/96)
no desconhecimento sobre o papel de cada ins- 3 ; e se a mesma ação foi também impetrada

tância de gestão no processo, levando-a a ma- contra o município de domicílio do autor.


nifestar mais intensamente seu poder de rei- A análise foi realizada, inicialmente, calcu-
vindicação. Essa situação pode estar no cerne lando-se a freqüência simples de todas as va-
do açodamento da SES/RJ por ações judiciais, riáveis, com o intuito de descrever as caracte-
pois o atendimento de muitas dessas ações não rísticas principais dos mandados judiciais. A
é de competência do nível estadual de gestão. descrição das freqüências das variáveis de-
O presente trabalho tem como objetivo ela- monstrou algumas características que podiam
borar uma análise descritiva dos mandados ju- apresentar relação com outras variáveis estu-
diciais para fornecimento de medicamentos a dadas, indicando a necessidade de cruzamen-
pacientes individuais, impetrados contra a to. Foram feitos os seguintes cruzamentos de
SES/RJ, de janeiro de 1991 a dezembro de 2002, dados: os 16 medicamentos mais freqüentes
e discutir as possibilidades de explicação desse nas solicitações versus as condições patológi-
fenômeno. cas dos pleiteantes; os medicamentos mais so-
licitados em cada estrato versus o ingresso des-
ses medicamentos nas listas de financiamento
Materiais e métodos público para aquisição. Além dos anteriores, os
medicamentos pleiteados, categorizados pela
Realizou-se estudo seccional. Os dados relati- sua inclusão em listas de financiamento públi-
vos às ações judiciais impetradas contra o Es- co oficiais, foram cruzados com o tipo de ges-
tado do Rio de Janeiro entre 1991 a 2002 foram tão dos municípios de domicílio dos autores.

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MANDADOS JUDICIAIS PARA GARANTIA DO ACESSO A MEDICAMENTOS 527

Resultados Tabela 1

Descrição das variáveis Universo e amostra de mandados judiciais


impetrados contra o Estado do Rio de Janeiro,
Com relação ao status das ações analisadas, Brasil, por ano de início da ação (estrato).
87,9% (342) de todas as ações não haviam sido Janeiro de 1991 a dezembro de 2002.
julgadas até o final do período estudado. Das
restantes, 10,0% (39) foram julgadas e em 2,1% Ano de início Total de Amostra
(8) houve o falecimento do autor. A análise por (estratos) ações

estrato não parece demonstrar lógica específi-


1991 1 1
ca de julgamento por antigüidade. Ao contrá-
1995 4 1
rio, parece haver uma concentração aleatória
1996 88 12
dos julgamentos nos anos de 1996 (33,3%) e
1997 314 44
1997 (61,4%). Nos anos de 2001 e 2002, há um
1998 79 11
baixo percentual de ações julgadas (2,0 e 1,3%,
1999 85 12
respectivamente).
2000 345 48
Quanto ao condutor da ação, 53,5% (208)
2001 713 100
das mesmas foram conduzidas pela defensoria
2002 1.144 160
pública; 20,3% (79) por escritórios de advocacia
Total 2.733 389
particulares; 6,7% (28) por escritórios-modelo e
19,5% (76) das ações não continham informa-
ção sobre os escritórios condutores. A análise
por estrato demonstra que, a partir de 1999, há
uma tendência de crescimento no número de 6,7% são ações que não fornecem qualquer da-
ações conduzidas pela defensoria pública e uma do sobre o município de domicílio do pleiteante.
diminuição importante daquelas conduzidas A investigação empreendida para esclarecer
pelos escritórios modelo. No que tange à parti- se ambos – estado e município – seriam réus da
cipação dos escritórios particulares, o número mesma ação impetrada por autores domicilia-
se manteve constante no período estudado. dos em municípios de GPSM, evidenciou que
Ao se analisar o tipo de unidade de saúde 50,2% delas eram impetradas contra ambos e
em que os autores das ações eram acompanha- 35,5% apenas contra o Estado. Do total de ações,
dos, observou-se que 36,8% dos autores eram 14,3% não continham essa informação.
oriundos de hospitais universitários, 19,5% de Classificando os medicamentos solicitados
clínicas conveniadas ao SUS, 11,1% de hospi- de acordo com o código ATC 8 e relacionando
tais federais, 10,5% de postos de atendimento os tipos pleiteados e os grupos principais da
das Secretarias Municipais de Saúde, 10,5% de classificação, obteve-se que 21,0% fazem parte
médicos particulares, 5,4% de clínicas não con- do grupo de medicamentos para o sistema ner-
veniadas ao SUS, 3,6% de hospitais municipais, voso (N); 17,5% para o sistema cardiovascular
1,3% de hospitais estaduais e 1,3% sem infor- (C); 15,8% para o trato alimentar ou metabolis-
mação sobre a origem do prescritor. mo (A); 13,0% são antiinfecciosos de uso sistê-
Considerando os municípios isoladamente, mico ( J); 7,9% são antineoplásicos ou agentes
constata-se que quase 70,0% dos autores são imunomoduladores (L); 5,2% são medicamen-
domiciliados no Rio de Janeiro. Caso se consi- tos que atuam sobre o sistema respiratório (R);
dere o Grande Rio, que inclui os municípios da 4,1% são medicamentos que atuam no sistema
Baixada Fluminense (Belford Roxo, Duque de hematopoiético (B), 4,1% no sistema músculo-
Caxias, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Quei- esquelético (M); 3,4% são preparações hormo-
mados e São João de Meriti), Niterói, São Gonça- nais sistêmicas – excluindo hormônios sexuais
lo e Rio de Janeiro, observa-se que quase 90,0% e insulina – (H); 2,1% classificam-se como me-
dos autores são domiciliados nessa região. dicamentos que atuam no sistema genituriná-
Tendo-se em conta a habilitação dos muni- rio – incluindo os hormônios sexuais – (G); 2,1%
cípios, de acordo com a NOB/96 3, em municí- são medicamentos que atuam nos órgãos sen-
pios de GPSM e GPAB, e somando-se as por- soriais (S); 1,4% são preparações dermatológi-
centagens relativas ao número de mandados cas (D); 1,4% fazem parte do grupo que inclui
em cada tipo de município, observa-se que vários medicamentos não classificados nos ou-
82,0% das ações são de autores domiciliados tros grupos (V ); e 1,0% é de medicamentos pa-
em municípios habilitados na GPSM. Das de- ra parasitoses (P). A Tabela 2 mostra a classifi-
mais, 11,3% são ações de autores domiciliados cação dos 16 medicamentos mais solicitados
em municípios habilitados na GPAB. Cerca de até o quinto nível do código ATC.

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Tabela 2 terapia de intercorrências da AIDS. A partir de


1999, pela variabilidade de condições patológi-
Medicamentos mais freqüentemente solicitados cas entre os impetrantes das ações, ocorre uma
nos mandados judiciais impetrados contra o Estado grande diversificação com relação aos medica-
do Rio de Janeiro, Brasil, classificados pelo quinto mentos pleiteados. No ano de 2000, os medica-
nível do Código Anatômico, Terapêutico e Químico- mentos mais solicitados são: Toxina botulínica
código ATC 8. Janeiro de 1991 a dezembro de 2002. A, Riluzol e Olanzapina. Em 2001, os medica-
mentos mais solicitados foram os Acetatos de
Medicamentos mais Freqüência ciproterona e de goserelina. Neste ano também
freqüentemente solicitados n % se iniciam os pedidos de Hidrocloreto de seve-
lamer, Mesalazina e Peg-interferon. No ano de
Sulfassalazina 47 12,1
2002, os medicamentos Hidrocloreto de seve-
Indinavir 32 8,2
lamer e Mesalazina são os mais pedidos. Além
Mesalazina 29 7,5
desses, no ano de 2002, aumentam os pedidos
Zidovudina 27 6,9
para os medicamentos Peg-interferon, Carbi-
Cloridrato de sevelamer 26 6,7
dopa + Benserazida e Infliximab.
Estavudina 20 5,1
A Tabela 4 apresenta os medicamentos sob
Prednisona 17 4,4
financiamento público que são pleiteados nos
Acetato de ciproterona 16 4,1
mandados judiciais.
Captopril 15 3,9
Saquinavir 15 3,9
Sulfametoxazol + trimetropina 15 3,9
Didanosina 13 3,3
Discussão
Furosemida 13 3,3
Uma vez que a maioria das ações impetradas
Espironolactona 12 3,1
ainda não teve seu mérito julgado, continuam
Acetato de goserelina 12 3,1
sendo cumpridas sem que haja uma correta
Olanzapina 12 3,1
avaliação da adequação do pleito. Esta adequa-
ção, do ponto de vista até então externado pelo
Judiciário, parece envolver apenas as garantias
constitucionais do cidadão; no entanto, apa-
A doença por HIV não específica (B24 – clas- rentemente se ignora o ponto de vista clínico e
sificação da CID-10) 9 era, até 1998, a condição as conseqüências sobre a saúde do indivíduo.
patológica dominante nas ações; sua freqüên- Em algumas situações, o cuidado à saúde defi-
cia, entretanto, diminui, de superior a 90,0% nitivamente não estará sendo resguardado pe-
(entre 1991 a 1998), para apenas 16,7% no ano lo uso do medicamento pleiteado. Um exem-
de 1999 e 14,6% no ano de 2000. A partir de 1999, plo é o pleito para o medicamento Gangliosí-
surge uma diversificação importante das con- deo, cuja eficácia não está comprovada e que
dições patológicas dos pleiteantes. Em 2000, tem sido reiteradamente retirado do mercado
incluem-se a doença de Crohn, a hepatite viral pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
crônica C e a doença renal em estágio final. (Resolução Executiva n o 2. http://e-legis.bvs.
Nos anos de 2001 e 2002, também figuram entre br/leisref/public/showAct.php, acessado em
as condições patológicas mais freqüentes a hi- 01/Mar/2004), tendo seu fornecimento sido
pertensão essencial e a doença isquêmica crô- mantido sob recurso judicial, levando à neces-
nica do coração, condições de atenção básica. sidade de o órgão regulador criar normativas
especiais para o uso do medicamento.
Análise descritiva de possíveis Percebe-se ainda que o problema quanto à
relações entre as variáveis falta de tempestividade no julgamento das ações
tende a se agravar, tendo em vista o grande au-
A relação entre os pedidos dos 16 medicamen- mento do número de pedidos. Esta situação
tos mais solicitados e a condição patológica confirma as dificuldades do Judiciário em lidar
dos autores é apresentada na Tabela 3. com o julgamento dessas ações, tendência pre-
Ao serem separados os pedidos de medica- sente também nos primeiros anos de registro
mentos de acordo com o ano de início do pro- dos mandados, quando havia um número con-
cesso, pode-se perceber claramente um padrão sideravelmente menor de pedidos. As ações im-
nos pedidos. Até 1998, observam-se, quase que petradas naquela época também não foram jul-
exclusivamente, pedidos de anti-retrovirais, es- gadas tempestivamente. Cabe salientar ainda a
pecialmente o Indinavir, o Saquinavir e a Zido- possibilidade de falecimento de autores, ocor-
vudina – e da Sulfassalazina, também usada na rido sem que a SES/RJ tenha sido comunicada.

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MANDADOS JUDICIAIS PARA GARANTIA DO ACESSO A MEDICAMENTOS 529

Tabela 3

Medicamentos mais solicitados e respectivas indicações, classificadas pela CID-10, constantes nos mandados
judiciais impetrados contra o Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Janeiro de 1991 a dezembro de 2002.

Medicamento Condição patológica (indicação) pela CID-10 Número de ações


correspondentes

Sulfassalazina B24 – Doença por HIV NE 40


K51.8 – Outras colites ulcerativas 5
K50.1 – Doença de Crohn do intestino grosso 1
M06.9 – Artrite reumatoide NE 1
Indinavir B24 – Doença por HIV NE 32
Mesalazina K50 – Doença de Crohn 15
K51.8 – Outras colites ulcerativas 9
K50.1 – Doença de Crohn do intestino grosso 4
Zidovudina B24 – Doença por HIV NE 27
Cloridrato de sevelamer N18.0 – Insuficiência renal crônica em estágio final 26
Estavudina B24 – Doença por HIV NE 20
Prednisona M06.9 – Artrite reumatoide NE 4
M32.9 – Lupus eritematoso disseminado NE 3
K50 – Doença de Crohn 3
K50.1 – Doença de Crohn do intestino grosso 1
K51.8 – Outras colites ulcerativas 1
B24 – Doença por HIV NE 1
M34.9 – Esclerose sistêmica NE 1
G70.0 – Miastemia gravis 1
J84.1 – Outras doenças pulmonares intersticiais com fibrose 1
Acetato de ciproterona C61 – Neoplasia maligna de próstata 16
Captopril I10 – Hipertensão arterial sistêmica 3
I25.9 – Doença isquêmica crônica do coração NE 3
I50.0 – Insuficiência cardíaca congestiva 2
I11 – Doença cardíaca hipertensiva com insuficiência cardíaca 1
I 42 – Cardiomiopatia Dilatada 1
I 43 – Cardiomiopatia em doença infecciosa e parasitaria 1
K51.8 – Outras colites ulcerativas 1
M06.9 – Artrite reumatoide NE 1
Saquinavir B24 – Doença por HIV NE 15
Sulfametoxazol + Trimetropina B24 – Doença por HIV NE 14
Q02 – Microcefalia 1
Didanosina B24 – Doença por HIV não específica 12
Furosemida I10 – Hipertensão arterial sistêmica 2
I50.0 – Insuficiência cardíaca congestiva 2
I25.9 – Doença isquêmica crônica do coração ne 1
I11 – Doença cardíaca hipertensiva com insuficiência cardíaca 1
I 42 – Cardiomiopatia dilatada 1
I 43 – Cardiomiopatia em doença infecciosa e parasitaria 1
B18.1 – Hepatite crônica viral B sem agente delta 1
B18.2 – Hepatite crônica viral C 1
Espironolactona B18.2 – Hepatite crônica viral C 2
B18.1 – Hepatite crônica viral B sem agente delta 1
I10 – Hipertensão arterial sistêmica 1
I50.0 – Insuficiência cardíaca congestiva 1
I11 – Doença cardíaca hipertensiva com insuficiência cardíaca 1
I 42 – Cardiomiopatia dilatada 1
I 43 – Cardiomiopatia em doença infecciosa e parasitaria 1
K74.6 – Outras formas de cirrose hepática e as NE 1
Acetato de goserelina C61 – Neoplasia maligna de próstata 13
Olanzapina F20.9 – Esquizofrenia NE 7
F20.0 – Esquizofrenia paranóide 2
F20.1 – Esquizofrenia hebefrenica 1
F20.6 – Esquizofrenia simples 1
F31.2 – Transtorno afetivo bipolar, episodio atual maníaco 1
com sintoma psicótico

NE = não específica.

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530 Messeder AM et al.

Tabela 4

Medicamentos constantes dos mandados judiciais impetrados contra o Estado do Rio de Janeiro, Brasil,
por tipo de financiamento público para aquisição e tipo de gestão do município de domicilio do pleiteante.
Janeiro de 1991 a dezembro de 2002.

Tipo de financiamento Freqüência Tipo de gestão


n % GPAB GPSM Sem dado
n % n % n %

Excepcional 280 31,4 23 8,2 240 85,7 17 6,1


Estratégicos 162 18,2 16 9,9 134 82,7 12 7,4
Atenção básica 125 14,0 8 6,4 115 92,0 2 1,6
Saúde mental 17 1,9 0 0,0 17 100,0 0 0,0
Estadual 33 3,7 6 18,2 19 57,6 8 24,2
Sem financiamento definido 274 30,8 22 8,0 242 88,3 10 3,7

GPAB = gestão plena de atenção básica; GPSM = gestão plena do sistema municipal.

Neste estudo foi possível apenas a análise das res de pedidos. Esses hospitais são unidades
notificações recebidas pela secretaria, o que que costumeiramente avaliam novas tecnolo-
representa um fator limitante. Ocorre, contu- gias; resultam, desse modo, em unidades pres-
do, que a não-notificação das ocorrências con- critoras de fármacos ou de tratamentos inova-
duz a SES/RJ a considerar a ação como não jul- dores. No momento em que os hospitais uni-
gada, com a decorrente manutenção do aten- versitários prescrevem medicamentos ainda
dimento ao pleito, contribuindo para menor não padronizados pelo resto do sistema, mas
eficiência na aplicação dos recursos da assis- não os fornecem, geram, de facto, uma deman-
tência farmacêutica estadual. da não atendida permanente. Esta situação
A análise por estrato, da variável condutor predispõe o uso dos mandados judiciais como
da ação, mostra que as perdas de informação recurso ao acesso. Este achado está em concor-
quanto a esta variável, anteriores a 1999, foram dância com observações realizada por outros
muito altas. Isso se dá pelo fato de o arquivo autores 11.
documental de mandados judiciais da Supe- A maioria dos autores das ações é domici-
rintendência de Assistência Farmacêutica da liada na região do Grande Rio (90,0%). É nesta
SES/RJ conter apenas os dados organizados região que coexistem a maior concentração
adequadamente a partir daquele ano. Verifica- populacional do Estado, uma maior concentra-
se que a grande maioria dos mandados é con- ção de unidades de atendimento à saúde e pos-
duzida por escritórios de advocacia gratuita sivelmente maior acessibilidade aos mecanis-
(defensoria pública e escritórios-modelo das mos do Judiciário (defensoria pública, escritó-
universidades). Cabe ainda ressaltar que os es- rios-modelo de universidades), favorecendo o
critórios particulares são, em grande parte, in- acúmulo de ações.
tegrantes das associações de portadores de con- Observa-se cerca de um terço delas (35,6%)
dições patológicas específicas ou de organiza- sendo impetradas apenas contra o Estado do
ções não governamentais (ONG); esta consta- Rio de Janeiro. Quando isso acontece, o Estado
tação indica que grande parte desta assessoria será obrigado a atender à ação, mesmo que es-
também é gratuita, ainda que não pública. As ta pleiteie medicamentos que sejam da compe-
informações dando conta da relativa constân- tência de fornecimento do município. Cabe
cia quanto à participação de escritórios parti- ressaltar que municípios habilitados na moda-
culares parecem indicar que, pelo menos no lidade GPSM se comprometem a prestar aten-
período estudado, as ações judiciais pleitean- dimentos de baixa, média e alta complexidade
do medicamentos não se configuram como a seus munícipes e aos não residentes, de acor-
mercado para a advocacia particular. do com as Programações Pactuadas Integradas
Nota-se que apenas 16,0% dos pedidos fo- (PPI) 3. Isto implica que, em se tratando de ações
ram gerados por autores atendidos em unida- de munícipes de municípios habilitados na
des fora do SUS e que a grande maioria vem de modalidade de GPSM, estas deveriam ser im-
unidades vinculadas ao sistema. Destas, os hos- petradas contra os municípios, o que não vem
pitais universitários são os principais gerado- acontecendo. Tanto a informação acima quan-

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 21(2):525-534, mar-abr, 2005


MANDADOS JUDICIAIS PARA GARANTIA DO ACESSO A MEDICAMENTOS 531

to o fato de que metade das ações é impetrada obrigando o réu a fornecer medicamento antes
contra ambos, Estado e município, indicam a do julgamento do mérito da ação) não leva em
falta de esclarecimento por parte da defensoria conta questões relativas à racionalidade do uso.
pública, principal condutor, sobre as compe- A demora no julgamento das ações apenas
tências de fornecimento. agudiza a situação, podendo, potencialmente,
Com relação aos medicamentos pleiteados, trazer prejuízos aos pacientes, o que nos reme-
percebe-se que os três grupos mais demanda- te ao início desta discussão.
dos (sistema nervoso, sistema cardiovascular e Nota-se que a prescrição de medicamentos
trato alimentar ou metabolismo) incluem me- está, com base nos poucos elementos de verifi-
dicamentos de uso contínuo, ou seja, para o cação descritos no texto dos processos, adequa-
tratamento de condições crônicas. De modo da, em termos gerais, às condições patológicas
geral, várias dessas condições são tratáveis pe- indicadas (Tabela 3). Há ressalvas, porém.
lo elenco da atenção básica. Pleitos dessa na- O medicamento Sulfassalazina é um antiin-
tureza podem indicar falta de acesso no muni- flamatório não esteroidal e sua indicação para
cípio dos pleiteantes. Por outro lado, se o pleito pacientes com doença por HIV não específica
é mal direcionado (como vimos acima), a ins- pode ser decorrente de infecções associadas à
tância ré será obrigada a fornecer, por toda a condição patológica principal, não descritas
vida do indivíduo, ou até o julgamento da ação no processo. Já o medicamento Captopril é um
– que, como evidenciado, está longe de ser ime- inibidor da enzima de conversão de angioten-
diato – medicamentos que não são de sua com- sina (ECA), usado no tratamento da hiperten-
petência. são arterial sistêmica e da insuficiência cardía-
Dos 16 medicamentos mais solicitados (Ta- ca, dentre outras indicações 15. Em algumas
bela 2), apenas 6 (Sulfassalazina, Mesalazina, ações, entretanto, a indicação arrolada não pa-
Cloridrato de sevelamer, Acetato de ciprotero- rece ser relacionada à condição patológica des-
na, Acetato de goserelina e Olanzapina) são me- crita. A indicação, nesse caso, caberia a uma
dicamentos excepcionais, de competência de possível condição patológica secundária à des-
dispensação pelo Estado do Rio de Janeiro, de- crita para o autor, situação que evidencia a fal-
pendendo da condição indicada pelo Ministé- ta de adequada caracterização deste item na
rio da Saúde 12,13. Os medicamentos Indinavir, ação. Nesses casos, não é possível concluir so-
Zidovudina, Estavudina, Saquinavir e Didano- bre a racionalidade da indicação. Ainda que
sina são medicamentos incluídos no Consen- fosse solicitado parecer técnico quanto à racio-
so Terapêutico do Programa Nacional de DST/ nalidade, a qualidade da informação seria um
AIDS, adquiridos pelo governo federal, caben- fator limitante.
do ao município de domicílio dos autores sua O medicamento Sulfametoxazol + Trime-
dispensação 14. Os medicamentos Captopril, tropina é uma associação de dois quimioterá-
Sulfametoxazol + Trimetropina, Furosemida e picos com efeito sinérgico, pois atua por blo-
Espironolactona fazem parte do elenco esta- queio seqüencial de duas etapas compreendi-
dual do Programa de Assistência Farmacêutica das na biossíntese bacteriana do ácido folínico
Básica, também cabendo ao município de do- 15. A indicação para microcefalia, condição des-

micílio dos autores a sua dispensação. Perce- crita no banco, seria sustentável apenas no ca-
be-se, assim, que grande parte dos pleitos de- so da condição patológica não estar adequada-
veria estar sendo encaminhada para os muni- mente descrita. Persistem aí dúvidas quanto à
cípios e não para o Estado. Este proceder im- racionalidade da indicação.
plicaria também uma maior responsabilização Tendo em vista o perfil de utilização revela-
das autoridades sanitárias dos municípios, in- do pelo banco de dados, em que 13,6% dos me-
timadas a cumprir a lei. dicamentos pleiteados são para tratamento de
Uma consideração importante quanto ao agravos do sistema nervoso, e que destes pedi-
pleito dos autores é a avaliação das condições dos o mais freqüente (9,9% do total) refere-se
patológicas apresentadas. A avaliação da con- ao medicamento Olanzapina, faz-se necessária
dição patológica é essencial, sobretudo em re- uma consideração quanto à sua prescrição. A
lação aos medicamentos excepcionais, que pos- indicação da Olanzapina, respaldada pela lite-
suem sua dispensação condicionada à doença ratura corrente, depende obrigatoriamente da
do paciente. Uma verificação da correta pres- satisfação de duas condições: refratariedade ao
crição dos medicamentos é um dado impor- tratamento com antipsicóticos convencionais
tante para avaliar a real necessidade dos pedi- e intolerância à Clozapina 15. Resta considerar
dos e a adequação da indicação terapêutica, se estas determinações foram cumpridas em
dentro do marco do uso racional de medica- todos os pleitos, o que não foi possível avaliar,
mentos. Antecipação de tutela (ordem judicial pela ausência de dados na ação.

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532 Messeder AM et al.

A análise enfocou apenas os 16 medicamen- petência estadual de fornecimento (Tabela 4).


tos de maior ocorrência nos mandados anali- Os demais 68,6% dos pedidos pleiteavam me-
sados. O pressuposto é de que esses medica- dicamentos que, apesar de apresentarem va-
mentos, por serem mais prescritos, sejam aque- riados mecanismos de financiamento (medi-
les para os quais o clínico está mais atento quan- camentos estratégicos, de atenção básica, de
to aos efeitos e às indicações. Mesmo dentre os saúde mental), têm sua dispensação sob com-
16 estudados, houve possível inadequação en- petência municipal, seja de municípios habili-
tre prescrição e indicação. Com relação aos tados sob GPAB, seja de municípios sob GPSM
medicamentos não avaliados, prescritos even- 2,16,17 . Os medicamentos sem mecanismos de

tualmente e possivelmente não tão bem conhe- financiamento explícitos, que representam
cidos, é evidente que a indicação pode não es- 30,8% dos pedidos, devem ser financiados pe-
tar ocorrendo com base na melhor evidência los municípios, de acordo com o seu nível de
científica. Confirmação desta hipótese depen- complexidade. Os municípios de GPAB devem
de de análise subseqüente. financiar os medicamentos de atenção básica,
O perfil das ações até o ano de 1999 indica enquanto os municípios de GPSM devem fi-
pleito a medicamentos que já faziam parte de nanciar os medicamentos de qualquer nível de
listas de financiamento público, mas ainda não atenção. Dos pedidos de medicamentos sem fi-
eram regularmente fornecidos. A partir de 1997, nanciamento público explícito, 88,3% são de
ocorre a estruturação do Programa Nacional de munícipes de municípios habilitados sob GPSM,
DST/AIDS, com a distribuição gratuita dos me- o que remete a competência do fornecimento
dicamentos anti-retrovirais, facilitando assim dos medicamentos a esses municípios. Os 8,0%
o acesso da população a esses medicamentos. de pedidos de medicamentos sem financia-
Nota-se, como conseqüência, menor número mento explícito pleiteados por munícipes de
de processos judiciais pleiteando-os. Os medi- municípios habilitados sob GPAB devem ter
camentos Toxina botulínica, Riluzol e Olanza- seu nível de complexidade avaliado. Quando
pina já eram considerados como excepcionais não forem de atenção básica, compete ao esta-
desde 1996, mas a partir de sua inclusão na gra- do o auxílio ao município para o fornecimento.
de de dispensação da SES/RJ, em 2001, a inci- Destaca-se o fato de que nenhum município
dência de mandados para esses medicamentos do Estado do Rio de Janeiro apresentou plano
caiu de modo importante. municipal de assistência farmacêutica ou con-
A dinâmica que determinava a intensidade templou a questão de forma explícita em seu
dos pleitos não incluía a pressão sobre a com- plano municipal de saúde. Contribui também
posição das listas. A partir de 2000, o fenômeno para esse quadro a superposição dos elencos
de incidência de pleitos a medicamentos parece públicos de financiamento de medicamentos
seguir uma seqüência diferente da anterior. Há pelas três esferas de governo, em que alguns
uma relação entre o aumento dos pedidos de itens são contemplados por todas as esferas en-
medicamentos por meio de mandados judiciais quanto outros itens da Relação Nacional de Me-
e a inclusão de medicamentos nas listas oficiais dicamentos Essenciais (RENAME) são órfãos
de financiamento. Observa-se que a seleção de de mecanismo formal de provisão 11.
medicamentos para inclusão em listas de finan-
ciamento leva à diminuição da incidência de
ações judiciais pleiteando esses medicamentos. Conclusões
Um exemplo claro é a atual lista de medica-
mentos excepcionais. Em 2000, iniciam-se plei- Os mandados judiciais para fornecimento de
tos para Mesalazina e Riluzol. No ano de 2001, medicamentos, no período de 1991 a 2001, pa-
mantêm-se pedidos de Mesalazina e Riluzol, e recem mostrar um caminho que se inicia pela
iniciam-se os pedidos de Peg-interferon e Hi- busca do acesso aos medicamentos anti-retro-
drocloreto de sevelamer. Em 2002, acentuam- virais e passa pelos medicamentos excepcio-
se os pedidos de Hidrocloreto de sevelamer, nais. Usuários desses medicamentos vêm de-
Mesalazina e Peg-interferon e surgem os pedi- monstrando maior poder de organização e pres-
dos de Levodopa + Benserazida, Infliximab, Sin- são por seus direitos. Nos últimos anos, no en-
vastatina e Rivastigmina. Na última revisão da tanto, há incorporação dos medicamentos da
lista de medicamentos excepcionais (PT/GM/ atenção básica, o que pode ser indicativo da
MS n o 1.318/02) 12 houve a inclusão de todos omissão das gestões municipais (a quem com-
esses medicamentos no elenco do programa. pete o fornecimento) e estaduais (a quem com-
Das ações impetradas contra o Estado do pete parte do financiamento).
Rio de Janeiro, apenas 31,4% dos pedidos soli- Nota-se de modo importante, a indicação
citavam medicamentos excepcionais – de com- do estado como réu em pleitos que, de acordo

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MANDADOS JUDICIAIS PARA GARANTIA DO ACESSO A MEDICAMENTOS 533

com as normativas administrativas, deveriam a alternância entre medicamentos mais plei-


ser direcionados às instâncias municipais. Esta teados no decorrer dos últimos anos, o que não
situação tem como conseqüências a des-res- se explica por “surto” de determinada condição
ponsabilização dos municípios, a não-efetiva- patológica, leva a supor que essas tendências
ção do SUS e a alocação indevida de recursos de utilização se devam à introdução de inova-
da Assistência Farmacêutica Estadual, com- ções terapêuticas (fato corroborado pelas in-
prometendo outras ações. clusões nas listas de financiamento público) e
Os cidadãos, por outro lado, parecem total- ao descumprimento de protocolos clínicos pe-
mente desorientados no que tange aos pleitos. los prescritores.
Compreende-se que a missão constitucional Entende-se que as questões aqui relatadas
dos governos é de atender às necessidades da devam nortear ações que visem melhorar o re-
população; porém, a falta de esclarecimento, lacionamento entre os poderes Judiciário e Exe-
inclusive da defensoria pública, quanto à divi- cutivo. A melhor organização do Executivo de-
são de responsabilidade entre os gestores, pa- ve ser acompanhada de maior rapidez na ava-
rece não assegurar a melhoria de acesso aos liação dos processos pelo Judiciário, bem co-
medicamentos pelo cidadão além de impedir a mo sua atenção renovada aos pareceres técni-
concretização da descentralização. cos dos mesmos. Com isso ambos contribui-
Percebe-se, ainda, relativa despreocupação riam fortemente para a segurança e bem-estar
das instâncias condutoras e julgadoras das do indivíduo pleiteante e do restante da popu-
ações com as questões relativas ao uso racional lação, beneficiada coletivamente pela resultan-
dos medicamentos e os possíveis danos oriun- te melhor gestão dos recursos públicos.
dos da má indicação e do mau uso. Além disso,

Resumo Colaboradores

O crescente número de mandados judiciais impetra- A. M. Messeder realizou a busca bibliográfica, coleta
dos contra a Secretaria de Estado de Saúde do Rio de e análise de dados, discussão e redação do artigo. C.
Janeiro, Brasil, buscando acesso a medicamentos ense- G. S. Osorio-de-Castro contribuiu com a revisão da
jou a condução do estudo. Um desenho seccional foi análise de dados, revisão dos resultados, discussão e
utilizado para descrever as ações impetradas de janei- revisão do texto final. V. L. Luiza participou da revisão
ro de 1991 a dezembro de 2002, analisando-as frente à da análise de dados e revisão do texto final.
definição de competências dentro do Sistema Único de
Saúde (SUS). Utilizou-se amostra estratificada de 389
ações, tendo como base o ano de início. Os resultados
sugerem demora no julgamento das ações, sendo a
maioria conduzida pela defensoria pública para usuá-
rios do SUS. Os medicamentos mais solicitados foram
os de ação sobre os sistemas nervoso e cardiovascular,
muitos de uso contínuo. Notou-se a oficialização de
práticas prescritivas, com a inclusão de medicamentos
freqüentemente solicitados nas listas de financiamen-
to público, dificultando adesão ao uso racional de me-
dicamentos. Medicamentos da competência de forne-
cimento dos municípios são solicitados ao Estado, que,
por sua vez, falha no repasse. A aparente falta de escla-
recimento dos autores e condutores das ações gera des-
gaste na relação executivo-judiciário e desvio dos re-
cursos para ações coletivas de assistência farmacêutica.

Medicamentos; Defensoria Pública; Assistência Farma-


cêutica

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Recebido em 19/Abr/2004
Aprovado em 01/Out/2004

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