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O ACADÊMICO

ANO 1 - Nº 1 - TERÇA-FEIRA, 24 DE NOVEMBRO DE 2009 - PELOTAS, RS

CAFV entrevista Luís


Roberto Barroso

Um dos maiores constitucionalistas do país, advogado de


Cesare Battisti e professor da UERJ. pg8-9

ARTIGOS pg5-7

Envolvimento Sustentável
Descubra quais os projetos são desenvolvidos
na Faculdade de Direito e INTEGRE-SE Com Montaigne
pg10-11
A Rede Sob Ameaça

Superficialidade e Direito
Sentença de um juíz poeta
O PALCO Remanescentes, o quilombo pelo-
tense e o direito de propriedade
pg12

A Universidade e a Administração
Pública.
contato@cafv-ufpel.com OPINE
2 O ACADÊMICO
APRESENTAÇÃO

História d’O Acadêmico


Este periódico nasceu no ano de 1919 coordena- reconquistar um espaço como meio de comunica-
do pelo então estudante Jorge Salis Goulart, tornando- ção e formação do pensamento crítico no seio aca-
se um elo entre os estudantes e o grêmio acadêmico dêmico, colocamo-nos à frente da volta do periódico.
jurídico (atual CAFV), sendo uma publicação de vei-
culação limitada aos corredores de nossa instituição. O ACADÊMICO traz na sua simplicidade a se-
mente de uma mudança que pode vir a contribuir
Em 1932 o jornal fora retomado sob a coorde- para a educação jurídica qualificada, visando à legí-
nação do Professor Bruno de Mendonça Lima, sendo tima formação dos futuros “aplicadores do Direito”.
Ernani de Couto o aluno responsável pela elabora- Acreditamos que o reconhecimento seja fruto do es-
ção do mesmo. Nessa época O ACADÊMICO teve vida forço e da dedicação com que elaboramos esse jor-
intensa e grande renome dentro e fora de Pelotas, nal, uma vez que visamos algo maior e primordial: o
uma vez que promoveu o intercâmbio com outras incentivo a reflexão. Não queremos entregar concei-
faculdades de Direito do país trazendo como princí- tos prontos, queremos que cada um elabore, crie ou
pios a difusão do bom nome desta instituição assim modifique o seu para, assim, produzirmos os nossos.
como primava pela publicação jurídica de qualidade.
Por fim, reafirmamos o nosso compromisso, em-
Embora tenha ganhado prestígio e reconhe- penho e motivação e direcionamos nossos esforços para
cimento, perdeu sua vitalidade com a saída dos es- a consolidação do jornal assim como a sua credibilida-
tudantes envolvidos com o jornal, culminando na de e reconhecimento na busca por uma Universidade
sua extinção em 1934. Sendo em 1962 o último re- e uma formação acadêmica diferenciada. Nas palavras
gistro da publicação do periódico na forma de uma de Ernani de Couto na 1ª edição em 11 de maio de 1932:
edição comemorativa aos 50 anos da Faculdade. “Que os Deuses reservem para O ACADÊMICO vida
longa e prosperidade”.
Em decorrência da necessidade de formar no-
vamente esse elo com a comunidade estudantil e

Nota pública
Comissão Editorial do
O CAFV, Centro Acadêmico Ferreira Vianna, vem pe- Jornal “O Acadêmico”:
rante os acadêmicos da Faculdade de Direito da UFPEL,
dos quais constitui sua entidade representativa, mani-
Diagramação e arte final:
festar-se acerca da saída repentina do bar de sua sede. Bruna da Rocha
A referida saída deu-se em razão de determina-
ção judicial, cujo processo está em trâmite desde o
Matérias:
ano passado e da qual o CAFV não é parte. Ressalta que Bruno Kauss, Carina Goulart,
a presença do bar em seu espaço não está sob sua in- Larissa Vollrath Bento, Lawrence
gerência ou possibilidade de atuação a curto prazo. Estivalet e Luís Henrique Orio

Por fim, reitera sua constante preocupação em disponibilizar


no seu espaço os serviços que a comunidade discente demanda. Seleção de Artigos:
Carina Goulart, Iuscia Barboza e
Larissa Vollrath Bento
Atenciosamente,
Coordenação Geral do Centro Acadêmico Ferreira Vianna
Gestão 2009: Camarão que dorme a onda leva Revisão:
Larissa Bento e Lawrence Estivalet

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O ACADÊMICO 3
– Da gestão CAMARÃO QUE DORME A ONDA LEVA CAFV 2009

Os guardados de 2009
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la / Em cofre não se guarda coisa alguma / Em cofre
perde-se a coisa à vista / Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-
la ou ser por ela iluminado / Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar
por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela / Por isso melhor se guarda
o vôo de um pássaro / Do que um pássaro sem vôos / Por isso se escreve, por isso se diz, por isso
se publica, por isso se declara e declama um poema: / Para guardá-lo: / Para que ele, por sua vez,
guarde o que guarda: / Guarde o que quer que guarda um poema: / Por isso o lance do poema: /
Por guardar-se o que se quer guardar. (Antônio Cícero em Guardar)

O primeiro ano, ainda assim, teve


seu calendário mantido junto ao do res-
to da UFPel, motivo pelo qual tivemos que
pensar em duas aulas inaugurais, uma com
o juiz e Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, sobre o
princípio da dignidade da pessoa huma-
na, e outra com a Prof. Dra. Deisy Ventu-
ra, sobre os desafios da formação jurídica
contemporânea, para além de duas festas,
uma mais interna à Faculdade, o Botequim
Delegação UFPel – EGED 2009 (FURG)
do CAFV e, em seguida, também a Ca-
lourada do CAFV, ora no João Gilberto.
Queremos pensar este ano
como algo a ser guardado ou, mais do Intentando abrir espaços de de- Calourada - Botequim do CAFV

que isso, como um conjunto de pesso- mocracia e debate na Faculdade, ademais,


as e fatos a serem guardados. Faremos, também promovemos 6 sessões do projeto
neste pequeno texto, um breve relato, Dialogando com a 7ª Arte, discutindo temas
pontual e não exaustivo, das ações e sociais junto a estudantes dos
relações que certamente ficam, abran- mais variados cursos da UFPel,
gendo palestras, debates, confrater- palestra sobre Ações Afirma-
nizações e amigos promovidos pelo tivas, com a Prof. Dra. Jânia
CAFV, que somos todos nós que, nun- Saldanha, oficinas de Direito
ca sozinhos, estamos por esta Facul- e Arte, com o prof. da FURG e
dade e estes anseios sem dormir, não mestrando na UNISINOS Hec-
deixando que onda nenhuma nos leve. tor Soares, além da excursão
e ajuda na organização do
O ano de 2009 foi peculiar. XIX Encontro Gaúcho de Estu-
Já de começo, sem sermos consulta- dantes de Direito (EGED), que
dos, quiserem que tivéssemos mais ocorreu na FURG, e da 44ª Se-
um mês de férias, sem justificativa Palestra SEMAC –
mana Acadêmica de Estudos
Prof. Ms. Cristine Zanella (FADISMA) Jurídicos e Sociais, que teve
senão a própria falta de competên- Palestra – Prof. Dr. Jânia Saldanha (UNISINOS/UFSM)

cia burocrática de alguns setores da cerca de 300 inscritos e 16 es-


UFPel, que em nada, nada mesmo, afe- paços de discussão, entre pai-
taria a Faculdade de Direito. O CAFV néis, oficinas, debates e mostra de pesqui-
sa, com alguns dos maiores expoentes dos Tudo o que organizamos, e inclusive
promoveu, com o apoio de vários pro-
meios jurídico e social nos temas tratados. este jornal e o recente campeonato de futsal,
fessores da Faculdade, ações de re-
foi pensado em reuniões abertas, junto a to-
versão deste adiamento, conseguindo,
dos que querem construir uma Faculdade me-
finalmente, que começássemos con-
lhor, faça ou não parte da diretoria eleita do
forme fora previsto, para o bem, so-
CAFV. Democracia é isso: trabalharmos jun-
bretudo, dos estudantes do sexto ano,
tos pelo que discutirmos ser parte de nossos
que poderiam perder sua formatura.
anseios, nossas vigílias, com os olhos abertos

contra o aparelhamento e a falta de democra-
cia e o coração sereno e aberto às críticas, às
iniciativas de maior participação e às lembran-
ças de mais um ano que fica selado na histó-
ria da Faculdade de Direito. Guardemo-nos!

Palestra – Juiz Dr. Ingo Sarlet (PUC-RS)

Palestra - Prof. Dr. Deisy Ventura (USP)

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4 O ACADÊMICO
CAFV 2009 – Da gestão CAMARÃO QUE DORME A ONDA LEVA

Movimento Estudantil de Direito:


atitude e participação
Es sólo una cuestión de actitud / entender lo que está escrito en el
viento / Es sólo uma cuestión de actitud / ir con taco aguja en pista
de hielo / Es sólo una cuestión de actitud / recibir los golpes, no
tener miedo / Es sólo una cuestión de actitud / y no quejarse más
de todo por cierto / Es sólo una cuestión de actitud / atreverse a
atravesar el desierto (Fito Paez)

Se é espantosa a falta de democracia além de sempre participar das reuniões de de retomar a força da FENED já no próximo
dos partidos aparelhando o movimento es- centros acadêmicos de direito do RS, ajudan- Encontro Nacional de Estudantes de Direi-
tudantil, se é assustador o disputismo dos do a organizar os demais EGEDs, pensando- to, que ocorrerá, em 2010, na Universidade
espaços esvaziados, das siglas vazias, das os, levando-lhes excursões para debate e inte- de Brasília (UnB), legitimando-a novamente
entidades desacreditadas, é importante que gração entre os estudantes de Direito do RS. frente aos estudantes de Direito, a diretórios
se faça o contraste com outro movimento A nível nacional, ademais, o CAFV acadêmicos de Direito do país, às suas coor-
estudantil, apartidário declaradamente, que passou a integrar, no final de setembro, a denações regionais de estudantes de direito
busca, sempre, atrever-se a afirmar que um Comissão Gestora (CG) da Federação Nacio- (COREDs) e a entidades como a OAB e a Asso-
outro movimento é possível, e tê-lo mais do nal dos Estudantes de Direito (FENED), como ciação Brasileira de Ensino de Direito (ABEDi).
que como princípio, buscando-o, efetivando- representante da Região Sul do Brasil. A FE- Esperamos mais do que representar
o, na UFPel, no Rio Grande do Sul, no Brasil. NED, que teve problemas gravíssimos de apa- nossos estudantes nesses espaços, com se-
O Centro Acadêmico Ferreira Vian- relhamento partidário recentemente, com o riedade e competência; com a mesma posi-
na (CAFV) faz parte da mesa do Conselho ENED em Belém do Pará tendo sua plenária ção democrática da qual nunca abrimos mão,
de Centros Acadêmicos da UFPel, estando fantasma anulada e outras desorganizações pois esperamos, muito antes, levá-los aos
presente em diversas discussões que se im- inaceitáveis, tem também uma história muito EGEDs, aos ENEDs, às discussões da Univer-
põem, quase que literalmente, na Universida- forte de construção democrática alternativa à sidade, para que se crie uma cultura política
de Federal de Pelotas, como a de implantação União Nacional dos Estudantes (UNE), com es- diferente da que atualmente as mais diversas
dos centros, que pode vir a suprimir a quase paços de debate horizontais e grandes nomes siglas na UFPel promovem; intentamos uma
centenária Faculdade de Direito, e solidário do meio jurídico nacional a reconhecendo ou cultura de participação, transparente e dire-
a problemas como superlotação de ônibus, tendo dela participado quando estudantes. ta, e não simplesmente de votação, de tiros
laboratórios interditados e bibliotecas fecha- Nesse sentido, e como atual Comis- no escuro em grupos repentinos e fechados.
das dos colegas dos outros campi da UFPelp, são Gestora, a principal meta que temos é Dessa feita, fica o convite: participe! O
problemas certamente não desconexos. CAFV, a Faculdade, a Univer-
Também fazemos parte, em ní- sidade e também a sociedade
vel regional, da diretoria da Coordena- esperam que os estudantes
ção Regional de Estudantes de Direito recuperem sua ousadia, sain-
(CORED-RS), crendo-a como um espa- do das quatro paredes e das
ço político de construção democrática aulas-expositivas do ensino
dos estudantes, junto a D.A.s de Direi- jurídico e também expondo
to da FURG, da UNISINOS, da UFSM, da sua opinião, seus anseios, nos
UFRGS, da FADISMA, da UNIRITTER e espaços democráticos que es-
da URI. E tendo inclusive organizado o tão ou precisam ser abertos
EGED na UFPel, no ano passado, para para que deles participemos.

CORERED - Pelotas

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O ACADÊMICO 5
ARTIGOS

Envolvimento Sustentável
Por Anderson de Mello Rechow¹

Quando duas palavras se grudam nos discursos políticos, gócios ligados à pecuária na Amazônia, já que a criação de gado
nunca mais se desatam. Exemplo: desenvolvimento sustentável. Na é a principal causa do desmatamento. Os pecuaristas retruca-
oratória demagógica, isso é sinônimo de um progresso responsá- ram, colocando em pauta o desenvolvimento da região Amazônica.
vel, freado e refreado. Só que na prática ninguém quer maneirar no Mas a floresta precisa é de conservação, e não de desenvolvimento!
fermento e nossa vida só se entope de porcarias num desatino in- Assim como nós também não precisamos diminuir a espessura da TV e o
controlável. Mesmo assim o binômio não sai de cena. Seu prestígio tamanho do celular. Temos mesmo é de olhar para o grande débito acumu-
só cresce, junto com a nossa insensatez e o tal desenvolvimento. lado e assimilar a gravidade da conjuntura. Enquanto a geração de 60 se
O progresso, ele próprio, é a causa do nosso delírio. Representa preocupava em reinventar o mundo, a geração atual tem o trabalho de evitar
um desvario que vem com as necessidades fajutas criadas em guerras, que nosso pequeno planeta não se esvaia num colapso. Os veteranos falha-
passeios espaciais, mergulhos abissais, etc. É assim que o quotidiano ram, e se não houver uma virada os “bixos” caminharão pela mesma trilha.
se dissolve em problemas artificiais, de segunda ordem. Pelo menos
se as grandes invenções fossem ingênuas, como a panela de teflon,
estaria tudo bem. Mas junto com a prosaica panela que não deixa gru- ¹Estudante de Direito na Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
dar, a Segunda Guerra nos legou a bomba atômica. Tivemos prejuízo. Contato por <andersonreichow@gmail.com>.
Nessa brincadeira descontrolada da civilização, sempre sobra o
pior para a dimensão ecológica da existência. E tem gente que vê nos proto-
colos ambientais um entrave para, adivinhem, a evolução da humanidade.
Recentemente o Ministro do Meio Ambiente anun-
ciou um pacto verde com o BNDES para vetar incentivos a ne-

Com Montaigne
Por Marcelo C. S. Maraninchi²

Dizer Montaigne: como? Tanto já se falou sobre ele; ele o pedantismo, a educação das crianças, os canibais, os odores,
mesmo já falou tanto sobre si. Falar sobre Montaigne só faz sen- a embriaguez, os polegares, a virtude... qualquer tema me ser-
tido se falarmos com Montaigne – na esteira do que Roland Bar- ve, uma simples mosca pode ser o pretexto) e por um método
thes ensina. E mesmo reconhecendo que o gênio suspende as fo- de abordagem livre (em um mesmo capítulo, fala sobre espirros,
lhas do calendário e se situa, sempre, fora do tempo, vale dizer viagens, medo, luxo nas vestimentas e povos do novo mundo).
que Montaigne nasceu na França do século XVI, no ano de 1533, “O que sei eu?” é a pergunta que orienta os Ensaios e a
na região da Aquitânia, onde o espírito francês mistura-se com resposta de Montaigne é tanto mais extraordinária pelo fato de
traços ingleses, tempera-se com os bascos, e de resto, com todo o que aquilo que ele sabe, vai sabendo enquanto escreve. O ser e o
mundo, já que sua capital, Bordeaux, é uma cidade portuária em saber de Montaigne confundem-se porque é a própria escritura
permanente contato com o exterior. Daí talvez o cosmopolitismo que faz o homem, não as certidões do registro civil. E chega o mo-
de Montaigne, e já abandono minha escritura para ceder à voz do mento de perguntar: qual a relevância dos Ensaios para o direito?
próprio autor, que diz melhor: Não porque o disse Sócrates, mas Em primeiro lugar, a pergunta “o que sei eu?” é muito
porque em verdade o penso, todos os homens são meus com- pertinente ao jurídico (no aspecto legiferante, jurisprudencial,
patriotas (...). Abraço um polonês como abraçaria um francês, doutrinário – que sei sobre os fatos que se discutem nos au-
fazendo passar os laços que unem os indivíduos de uma nação tos? Que sei sobre as provas? Que sei sobre o direito, o justo, o
após os que vinculam uns aos outros os habitantes do mundo. legítimo?). Os Ensaios pretendem tratar de quase tudo e nisso
O tal século de Montaigne, o XVI, constitui um período mar- também se assemelham ao direito, que visa regular a quase to-
cado por mutações significativas, como as grandes navegações e talidade dos fatos. Um direito totalizante pode evocar facilmen-
descobertas, por meio das quais o mundo se redesenhou e rein- te um direito totalitário, o que Montaigne combateu com máxi-
ventaram-se os mapas; a difusão lenta, mas crescente, da palavra mo vigor – esta é, aliás, sua maior contribuição ao jurídico: as
escrita, fruto da invenção da imprensa; o resgate da razão, pelo três gerações de direitos fundamentais são antecipadas em sua
livre exame dos textos (mesmo, e sobretudo, os sagrados); e as obra; mesmo direitos sociais e difusos que só foram consagra-
reformas religiosas, que retiraram dos católicos o monopólio do dos no século XX (e que ainda são com freqüência inobservados),
discurso cristão. Nesse Renascimento, nem tudo é louvável: oito como a cultura e o meio-ambiente, foram defendidos por ele.
guerras de religião varrem a França e deixam episódios incontor- André Gide, em um ensaio sobre Montaigne, com-
náveis para o imaginário ocidental, como a Noite de São Bartolo- para-o ao Cristo, quando, no Evangelho de João, respon-
meu, em que milhares de protestantes foram mortos. Logo, é ain- de a pergunta posta por Pilatos (“que é a verdade?”): eu sou
da mais importante que em meio à total intolerância Montaigne a verdade. Arriscando uma traição, prefiro roubar as pala-
tenha estabelecido padrões de civilidade e liberdade válidos até vras de Pilatos sobre o Cristo e usá-las para dizer Montaig-
hoje: cada homem traz em si a forma inteira da condição humana. ne: eis o homem. Eis o homem que é credor de todos nós.
A obra que porta suas idéias e que se confunde com sua
vida são os Ensaios. O título diz tudo, ou quase: não se trata de
um pensamento sistemático, mas de uma sucessão de tentati- ²Estudante de Direito e de Letras na Universidade Federal de Pelotas
(UFPel). Contato por <mcsmaraninchi@yahoo.com.br>.
vas e experiências. Montaigne cria um gênero literário novo em
que a escritura é marcada pela subjetividade do autor (tenho
uma maneira de pensar que me isola dos outros, e, por outro
lado, sou de uma ignorância pueril acerca do que todo mun-
do sabe), pela diversidade de temas (há ensaios sobre o medo,

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6 O ACADÊMICO
ARTIGOS

A Rede Sob Ameaça


Por José Antônio Magalhães³

Em Agosto do ano passado, foi aprovado no Senado o Subs- Enquanto isso, no Ministério da Justiça, Tarso Genro se posicio-
tutivo ao Projeto de Lei da Câmara nº89 de 2003, que pretende re- nou contra o projeto do Senador Azeredo, criando uma proposta para
gulamentar o uso da internet, criando inclusive um novo conjun- diminuir os seus efeitos danosos. Contudo, o novo projeto está sendo
to de tipos penais. Proposto pelo Senador tucano Eduardo Azeredo, reputado como ainda mais preocupante que o anterior. A proposta alar-
o projeto, ainda em trâmite, vem sendo alvo de duras críticas por mantemente inclui os provedores de conteúdo para que, assim como os de
parte dos internautas, que já chegaram a apelidá-lo de AI-5 Digital. acesso, precisem ser capazes de levantar todos os dados de seus usuários
Inicialmente a intenção era que os usuários fossem obrigados a e mantê-los disponíveis por longos períodos, sob pena de fortes sanções.
fornecer vários dados pessoais para qualquer atividade realizada na rede. Acontece que, como provedor de conteúdo, enquadra-se
Os provedores então teriam que fornecer esses dados, bem como o histó- todo e qualquer site onde se acesse qualquer conteúdo. Dizer que
rico de tudo o que o usuário praticou enquanto conectado, para as auto- cada provedor de conteúdo terá que ser capaz da fiscalização que
ridades. O Art.22 do Substitutivo aprovado, embora não exija expressa- se pretende é tornar inviável a esmagadora maioria dos sites dispo-
mente o provimento de dados pessoais, ainda institui o vigilantismo na níveis no país. Os pequenos sites nunca poderiam preencher as exi-
rede e cria a figura do provedor delator, com pena para o que descumprir. gências e desapareceriam. Os grandes, de origem internacional, não
Esta espécie de medidas sufocadoras, além de atentar con- iriam implementar as mudanças, restando dois caminhos: ou se-
tra a privacidade dos usuários comuns, seria extremamente one- ria exigida a fiscalização apenas de sites brasileiros, o que seria
rosa para os provedores, que teriam que estabelecer um sistema uma injustiça, ou os sites internacionais seriam bloqueados no país.
para coletar os dados e mantê-los armazenados pelo período de O que os opositores da liberdade na internet não percebem é
3 anos. Os provedores, é claro, repassariam este custo aos usuá- que a fiscalização dos usuários e de seus movimentos, assim como o
rios, tornando a internet extremamente cara para uso doméstico. tratamento dos dados virtuais como se fossem bens móveis comuns,
Ao mesmo tempo, enquanto os usuários comuns são fis- é um erro. Não percebem que o que temos aqui é um novo paradig-
calizados e onerados desnecessariamente, os verdadeiros cri- ma, que oferece muito mais possibilidades boas do que ruins, mas que
minosos não serão afetados. Com efeito, os usuários mal in- não pode se submeter aos mesmos princípios usados anteriormente.
tencionados saberão mascarar a sua identidade na rede, como A rede de computadores é o centro de uma nova era da cultura de mas-
sempre fizeram, ou usarão identidades falsas. Sairão intocados. sas, que obedece a um novo conjunto de princípios. Sua característica
E as críticas não se resumem a isso. Um dos principais opositores é a fluidez de informações e a liberdade de acesso extremas. Mesmo
do projeto na internet, o acadêmico e blogueiro Sérgio Amadeu, defende que pareça um tanto assustador que não possamos aplicar a esse novo
que a dubiedade dos dispositivos pode impossibilitar qualquer ativida- meio os nossos velhos métodos, esta é a realidade com que temos que
de na internet, mesmo o puro e simples acesso a qualquer site da rede. lidar. É preciso muito cuidado com o novo, mas é preciso também que
Essas desproporções levam os críticos a se perguntarem por não nos deixemos desperdiçar as possibilidades que ele nos oferece.
que há tanto interesse e pressa na aprovação dessas providências sem
a devida discussão com a comunidade. O Doutor em Filosofia Bajonas
de Brito Junior levanta que “os que mais desejam algemar a internet
são os que mais lucram com ela: os bancos e as empresas de cartões ³Estudante de Direito na Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
de crédito” imaginando que terão maior proteção para seus dados Contato por <antonio6077@hotmail.com>.
contra os criminosos “às custas da privacidade de toda a população”.

Superficialidade e Direito
Por Lawrence Estivalet 4

Vejo aquela pessoa na rua como vejo os prédios. É apenas Dessarte, não temos sido uma sociedade que se uniu pelo
mais uma que passa. Na televisão, todo dia, as tragédias são digeridas bem comum, mas, sim, vários grupos unificados, que, frente a
junto ao café: engolimos e seguimos a rotina. Mas de que maneira isso quaisquer conflitos, precisam expor um lado, qualquer lado, des-
se reflete em juízos morais, isto é, no modo pelo qual julgo uma ação? de que esse lado seja seu, fazendo com que, muitas vezes, criem-
Quando falamos em maniqueísmo, vulgo bem versus se pontos e contrapontos apenas para se ter o que defender. É a
mal, logo o tachamos de simplismo oco. Em outras palavras, dialética do espetáculo: se não há conflito, dois lados, um para
ser-bom-e-ir-pro-céu ou ser-mau-e-ir-pro-inferno já não é uma torcer e outro para bater, não há razão de existência. E nós, so-
escolha racional para a maioria das pessoas, que, com o avan- ciedade, pedimos ao Direito – sociedade –, que decida o corre-
ço das ciências, notaram haver maior complexidade na socieda- to. Porque, em honestas palavras, não somos capazes sozinhos.
de, seja no que concerne às relações interpessoais, seja no que É necessário que, de uma vez por todas, debrucemo-nos
concerne ao indivíduo em si. Desse modo, não há que se falar sobre e para a crítica, para a instigação, para a investigação: é che-
em um indivíduo intrinsecamente mau, tampouco se falará em gada a hora de nos posicionarmos contrários à naturalização de
relações inerentemente doentias. Seria o mesmo que dizer que tudo, oriunda desse simplismo (mal-)digerido que nos é imposto
nasceram com o Diabo, o que, embora aceitável religiosamen- pela lei, pela mídia, notando que o Direito não parte apenas do
te, cientificamente faz-se anedota. E o Direito não é uma piada. consagrado pelas auctoritas: parte do dia-a-dia, da cultura, das
Contudo, estamos frente a uma superficialização cada vez ruas. Não é possível que se fechem os olhos à realidade social,
maior dos problemas, fazendo com que nossa Ciência Jurídica, por aos avessos culturais e legais e, ainda assim, se possa falar em
parte das outras, seja motivo de risos. Quando, por exemplo, dis- "justiça". Pois que sem observar cada situação-problema com a
cutimos aborto, ignoramos que há diversas concepções de come- consciência de que nos falta uma consciência, perpetuaremos o
ço de vida: falamos apenas em uma boa e em outra má; no mes- desprestígio intelectual e moral do Direito – que, quanto à eficá-
4
mo caminho, quando vemos alguém cair, nosso reflexo imediato cia, encontra-se separado de qualquer ética minimamente séria.
se traduz em buscar algum pé no qual a pessoa tenha tropeçado.
Um pé mau, claro, porque de maneira nenhuma haverá sido pedra, Estudante de Direito e de Filosofia na Universidade Federal de
desequilíbrio ou distração; sempre há alguém e alguém culpado. Pelotas (UFPel). Contato por <lawrencestivalet@gmail.com>.

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O ACADÊMICO 7
ARTIGOS

Remanescentes, o quilombo pelotense e o direito


de propriedade
5
Por Elbio Hermes da Silva Gomes, Diego Furtado Linhares e Robson Jardel dos Santos Leal

O texto apresenta uma abordagem interdisciplinar sobre a escra- bos e a improdutividade de determinadas porções de terras por estarem situ-
vidão e algumas de suas conseqüências atuais, fundamentado na antropo- adas em beira de estradas e em pés de serra. Notou-se que o poder estatal não
logia, história, sociologia, direito constitucional, direito de propriedade e, garante os direitos fundamentais básicos. Aquelas comunidades são tratadas
igualmente em uma pesquisa de campo nas comunidades quilombolas, em desigualmente, vivendo isoladas, quase que escamoteadas da nação. Sem tra-
Pelotas. Para isso adotamos o método qualitativo, onde aplicamos aos qui- balho fixo, garantia legal de nossa Constituição e da Consolidação das Leis do
lombolas um questionário composto de quatorze perguntas (em outubro de Trabalho (CLT); onde estes brasileiros sobrevivem da realização de “bicos” em
2007). Por se tratar de comunidades específicas, a cada entrevista aplicada propriedades particulares e assim por diante. Parece faltar interesse estatal na
uma novidade. Pesquisa de campo qualitativa tem dessas, e como nos ensi- aplicação dos direitos estabelecidos, demonstrando com isso desconsiderar as
na Boaventura de Sousa Santos (2006) só no contado direto para se come- minorias e afrontar o direito de propriedade constitucionalmente consagrado.
çar a entender os diversos sabores e dissabores dos inúmeros grupos sociais. As vozes por nós ouvidas, no calor das entrevistas, nos relataram fatos que cha-
A formação histórica, cultural e o desenvolvimento do Brasil ocorreram maram a atenção, como por exemplo: o desconhecimento da história dos seus
através da migração forçada de escravos oriundos da África para trabalharem no antecedentes; a falta de conhecimento da ciência direito e com o que essa palavra
cultivo da cana de açúcar, café e outras culturas. Em nossa região o trabalho escravo pode se correlacionar; a falta da titulação das terras tanto no modo tradicional
foi importantíssimo para o crescimento econômico da nossa cidade - as atividades quanto no amparo peculiar legal previsto no contexto do artigo 68º do ADCT. O
nas charqueadas trouxeram prestígio e riqueza para os aristocratas do charque. baixo grau de escolaridade também é impressionante, com a maioria tendo cur-
Trabalhar na charqueada era considerado cruel, desumano e exausti- sado apenas a escola primária e outros fatos que seguem a mesma linha negativa.
vo. Além disso, os escravos traziam consigo a tristeza de serem escravizados A propriedade definitiva de suas terras com os respectivos títulos de propriedade
e maltratados, sem perspectivas de sobreviverem ao trabalho e aos castigos constituiriam um passo significativo para diminuir as desigualdades, evitando
a que eram submetidos. Nestas circunstâncias fugiam em direção a denomi- assim a migração dos remanescentes para a zona urbana e o aumento da popula-
nada Serra dos Tapes (zona rural de Pelotas) formando os quilombos, sendo ção carente nas áreas marginalizadas das cidades, eliminando conflitos e injus-
o maior e mais importante o Quilombo de Manoel Padeiro. Após a abolição tiças historicamente impostas aos negros. Conforme constatamos, tal direito de
da escravatura, os negros ficaram entregues à sorte, pois não possuíam bens propriedade ainda não foi concretizado devido à morosidade burocrática estatal.
nem propriedades, fazendo com que alguns ex-escravos permanecessem nas
fazendas trabalhando simplesmente para se alimentar. No entanto alguns
permaneceram em seus antigos quilombos e muitos passaram a residir em 5
Estudantes da Faculdade de Direito Anhanguera.
torno dos centros urbanos constituindo assim as periferias (DE LEÓN, 1991). Contato por <elbiogomes@hotmail.com>.
Constatamos a precariedade em que vivem esses remanescentes de quilom-

A Universidade e a Administração Pública


Por Bruno Irion Coletto6
No começo deste ano letivo os grandes jornais do Estado noticiaram o estado preste o serviço público com qualidade e eficiência, como constitu-
a situação de Geovan Araújo, morador de rua aprovado no vestibular da UFR- cionalmente previsto. Ser aprovado em concurso público como é o vestibu-
GS dezenove anos após concluir o ensino médio. Geovan não havia consegui- lar e se matricular
5 na universidade não pode ser uma corrida de obstáculos.
do efetivar sua matrícula por não possuir o histórico escolar de sua escola Não obstante, no caso narrado, havia um documento público certifican-
no Piauí. Entretanto, ao fim, ele conseguiu se matricular pela pressão da mí- do que o estudante tinha sido aluno de determinado colégio estadual e que a
dia, e com a ajuda do Governador de seu estado que remeteu os documen- confecção do histórico demoraria. Será que esse problema não poderia ter sido
tos por fax. Ocorre que, no mesmo dia, outro estudante aprovado no vesti- resolvido administrativamente? Não é exigível e razoável que haja uma alterna-
bular sofreu com o mesmo problema: calouro da Faculdade de Direito teve tiva mais urbana, eficiente e legal ao simples e curto indeferimento da matrícu-
sua matrícula rejeitada por não possuir o histórico escolar que comprovas- la? O próprio edital do Vestibular e o sistema de matrícula não deveriam prever
se ter ele cursado mais da metade do ensino fundamental em escola pública. mecanismos para resolver essas (previsíveis) situações sem maiores traumas?
Este estudante, logo após a verificar seu nome no listão, dirigiu- Lembremos: estamos a discutir o direito fundamental à educação, de modo que
se a sua escola para pegar uma via do seu histórico escolar. Informaram- o poder público deve facilitar sua efetivação ao invés de dificultá-la. Assim, evi-
lhe que este demoraria muito para ficar pronto, prometendo o documento taríamos o desgaste de chamar o suplente, ele se matricular e posteriormente ser
para mais de três meses depois do pedido e que ele deveria voltar mais tar- citado em processo judicial, correndo o risco de ser desligado da universidade.
de. Porém, sabendo que sua matrícula dependia de tal documento, diligen- Com efeito, há que se diferenciar o que é legal, previsto na legislação
ciou junto ao órgão da SEC para agilizar a confecção do documento. Prome- e no próprio edital do Concurso Vestibular do que é um legalismo desarra-
teram para o início de março (diminuindo o prazo para quase dois meses), zoado. Muito se fala da boa e da má burocracia ou do formalismo excessi-
mas lhe forneceram uma Declaração que poderia resolver o problema, pois vo. Nesse ponto, não se discute o histórico em si; naturalmente, exigir o his-
declarava e atestava que ele havia estudado todo o ensino fundamental lá. tórico escolar é perfeitamente cabível e plenamente legal. No entanto, falha
Quando se dirigiu a Universidade para efetivar a matrícula, apesar o serviço público quando não exerce seu papel de ponderar as nuances dos
de não possuir exatamente o documento exigido no Edital, possuía a Decla- casos concretos, constituindo-se em um sistema incapaz de dar uma presta-
ração. Detalhe: o documento dizia claramente que ele “(...) foi aluno de nos- ção eficiente e justa a qualquer situação que fuja minimamente do padrão.
sa instituição onde cursou o ensino fundamental iniciado em 1985 e concluí- Se a administração pública tivesse sempre que agir como máquina, sem pon-
do em 1992. O referido aluno portanto realizou seu ensino fundamental todo derar as situações da vida real, não precisaríamos de funcionários públicos
junto a nossa instituição que é uma escola pública. (...)”. Mas, mesmo assim, nem de administradores públicos, precisaríamos apenas de computadores...
sua matrícula foi indeferida. Ou seja, não conseguiu se matricular apesar No caso do estudante do direito, apesar de ter interposto recurso ad-
de efetivamente ter comprovado que estudou em escola pública, e por um ministrativo em conjunto com o Centro Acadêmico, hoje, passado mais de
documento emitido pela própria escola (assim como o histórico escolar!). meio semestre, o recurso sequer foi apreciado. Pelo menos, por meio da De-
Pois bem, a discussão trazida à tona por fatos como estes (os quais, fensoria Pública da União ele conseguiu liminar que lhe garantiu a matrícula.
com certeza, são mais corriqueiros do que parecem), gira não apenas em Contudo, o suplente foi chamado e esta cursando a Facul-
torno da burocracia da universidade, mas também sobre o dever da admi- dade. Ao que tudo indica, também deverá ser chamado para se ma-
nistração pública de fornecer documentos ao cidadão em tempo razoável. nifestar no processo, pois se for procedente, perderá a vaga. Cer-
Ora, parece cristalino que a administração pública em geral tem o tamente este constrangimento poderia – e deveria – ser evitado.
dever de prestar informações de forma célere. Poderia-se, aqui, citar dispo- O calouro de direito teve que começar sua vida acadêmi-
sitivos e princípios constitucionais que garantem o devido processo no âm- ca apelando para o já abarrotado Poder Judiciário, afinal, governado-
bito administrativo e a celeridade processual no fornecimento de documen- res não podem ajudar individualmente a cada cidadão deste país...
tos. Contudo, fato é que para alguns estudantes brasileiros – os aqui citados
são apenas dois exemplos – obter documentos é um processo kafkiniano 6
bastante parecido com aquele em que se tenta cancelar uma linha telefô-
nica. Faz-se do cidadão uma bola de pingue-pongue, de setor em setor, de Estudante de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
ramal em ramal, até que em um longínquo dia a administração lhe “presta (UFRGS). Contato por <coletto.bruno@gmail.com>.
o favor” de lhe fornecer os raros exemplares dos documentos requeridos.
Ironias à parte, a administração pública de modo geral não pode de-
pender de pressão para fornecer documentos em tempo hábil. É preciso que

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8 O ACADÊMICO
ESPECIAL

CAFV ENTREVISTA: ADVOGADO E PROFESSOR


DR. LUÍS ROBERTO BARROSO Por Lawrence Estivalet e Luís Henrique Orio

Começando um pouco pela sua trajetória, Quanto à teoria do Direito,

1 Gostaríamos de saber o que trouxe o senhor para o 3 Com base em que premissas o senhor acre-
Direito e, em específico, para o Direito Constitucional. Além dita que se perpetua a Dogmática Jurídica Tradicio-
disso, por que a escolha pela Academia e pela advocacia. nal, com sua pretensão de completude, pureza cientí-
fica, racionalidade da lei e neutralidade do intérprete?
O Direito foi um caminho natural na minha vida. Não tive mui-
Eu acho que o direito contemporâneo passou por uma revo-
tas dúvidas quando prestei vestibular. Minha família era de Vassou-
lução profunda e silenciosa em menos de uma geração. Essas cate-
ras, no interior do Estado do Rio, e mudamos para o Rio de Janeiro
gorias tradicionais, que vêm do positivismo jurídico, ainda têm am-
quando meu pai prestou concurso para o Ministério Público estadual.
plo curso e, de certa forma, ainda preenchem um papel relevante.
Minha mãe era igualmente advogada, em uma época na qual era me-
Mas há um conjunto de idéias novas, que se articulam em uma visão
nos comum as mulheres seguirem uma carreira profissional. De modo
pós-positivista do direito, que contribuiu para o desenvolvimento
que eu cresci nesse ambiente e me identifiquei com ele desde cedo.
de uma cultura jurídica menos rígida e mais progressista. Uma re-
Durante a Faculdade, eu me dividia entre estudar e participar intensa-
aproximação entre o direito e a ética, entre o direito e a teoria da
mente do movimento estudantil. Isso foi na segunda metade da década
justiça. Nesse mesmo processo, o princípio da dignidade da pes-
de 70 do século passado. Já não eram os anos de chumbo, mas ainda eram
soa humana passa para o centro do sistema jurídico e cria-se uma
tempos difíceis. Eu ajudei a reconstruir o Centro Acadêmico e era editor
cultura fundada nos direitos humanos, nos direitos fundamentais.
de um jornal universitário, o “Andaime”, que combatia o regime militar.
É claro que esse direitos não se realizaram em plenitude. Longe
Em 1979, penúltimo ano da Faculdade, eu tive que tomar uma decisão
disso. Mas no plano das idéias, no plano moral, esta é uma cultu-
entre ir para a política ou ficar no direito. Foi aí que fiz a escolha pelo di-
ra vitoriosa. Tudo agora é uma questão de tempo e de compromis-
reito constitucional, que na minha cabeça era uma forma não partidária
so com as transformações das estruturas reais de riqueza e poder.
de fazer política e ajudar a desenvolver as instituições democráticas.
A minha escolha principal na vida foi pela academia. Desde a primei-
ra hora, era isso que eu queria. Eu sou um professor que advoga, e 4 Como o senhor pensa que podemos conci-
não um advogado que dá aulas. Mas a advocacia foi uma casualidade
liar os compromissos da legalidade democrática
na minha vida. Não fazia parte do meu projeto. Em 1985, eu pres-
tei concurso para a Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro
com o compromisso pela emancipação dos sujeitos?
e pensava em parar por ali. Seria um professor e teria um cargo pú-
blico razoavelmente remunerado. No início da década de 90, quan- Na minha época do movimento estudantil, onde havia por
do eu voltei da minha pós-graduação em Yale, nos Estados Unidos, parte de muitos a crença em alternativas revolucionárias autoritá-
os Estados da federação viviam uma crise financeira muito gran- rias, causou grande impacto um artigo do Carlos Nelson Coutinho
de e a soma da remuneração das minhas duas atividades – UERJ e intitulado “A democracia como valor universal”. Ele foi enxova-
PGE – era muito baixa. Eu era recém-casado e precisei complemen- lhado pela turma que tinha uma visão mais radical. Mas eu acho
tar minha receita. Aí comecei a advogar, no início bem modesta- que ele estava certo. Nós temos que saber fazer o processo social
mente.Ainda hoje eu advogo em um número limitado de questões. avançar dentro do quadro das instituições democráticas, do plu-
ralismo, da tolerância. Mas temos que ter compromisso com uma
democracia inclusiva, com projetos ambiciosos em matéria de edu-
cação, saúde, saneamento, financiamento habitacional para fa-
mílias de baixa renda, serviços públicos de qualidade. Criar, pro-
2 Como foi a sua atuação enquanto estudante de gressivamente, um ambiente de igualdade de oportunidades.
Direito na UERJ? Tivemos acesso à notícia de que o se-
nhor fez parte da equipe editorial do jornal Andaime.
Conte-nos um pouco a respeito dessa experiência. 5 A educação jurídica tem alguma importância nesse
papel? Qual?
Como disse, nós tínhamos um grupo que participou da re-
construção do Centro Acadêmico Luiz Carpenter-Livre, como o
chamávamos. Não éramos mais do que uma dúzia, talvez duas
Penso que tem tido, sim. O direito deixou de ser um mundo à
parte, com sua linguagem hermética e seus ritos impenetráveis, e pas-
dezenas. Mas havia muitas divisões. Era uma época de extrema
sou a ser um componente importante da realidade social e política.
politização e havia representantes de todas as tendências: des-
Acho que nós nos aproximamos da sociedade. O próprio Poder Judi-
de a esquerda liberal até os que defendiam a luta armada. O gru-
ciário, há trinta anos atrás, era visto como algo distante do povo, do
po ao qual eu pertencia chamava-se “Construção”, que congre-
cidadão comum, a famosa “torre de marfim”. Era um condomínio de
gava os socialistas democráticos e os liberais progressistas. Na
gente conservadora, elitista e reacionária, com as exceções que confir-
minha biblioteca de casa eu ainda tenho uns pôsteres dessa época.
mam a regra. Hoje, o Judiciário faz uma interlocução importante com
Depois de muitos rachas, o nosso grupo se reuniu e nós fundamos
a sociedade e tem sido um agente importante para o avanço social e
o Andaime. Foi uma experiência de vida muito enriquecedora. Em
mesmo para a moralidade política. Não quero induzir a uma imagem
primeiro lugar, pela oportunidade de passar do discurso à atuação
fantasiosa, mas há um Judiciário parceiro da sociedade. Antigamen-
concreta. Era um jornal mensal, mas dava um trabalho danado. Nós
te, juízes e tribunais se achavam diferentes e, de certa forma, supe-
escrevíamos o jornal, rodávamos ele de madrugada na gráfica da
riores. Magistrados não pagavam nem imposto de renda. Hoje isso
Tribuna da Imprensa e depois vendíamos na Faculdade. Eram cer-
ca de mil exemplares por edição. E ele contribuiu para um debate seria impensável. É muito nítido o avanço civilizatório nessa matéria.
importante naquele final de regime militar. E isso em um ambien-
te tradicionalmente conservador, como era a Faculdade de Direito.

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O ACADÊMICO 9
ESPECIAL

Tendo em vista sua inserção no tema, mediante Ainda sobre temas que estão em pauta na discussão
publicações vinculadas à ADPF do governador pública, gostaríamos de saber a sua opinião sobre
Sérgio Cabral,

9 A privatização dos presídios. Suas causas, sua efetivi-


6 Qual a sua expectativa em relação à ação proposta
dade e seus perigos; e
pelo governador Sérgio Cabral acerca do reconhecimen-
to de direitos dos ditos LGBT, tendo em vista (i) a recente Não me movo, nessa altura da vida, por palavras de ordem nem
decisão acerca do STF MED e (ii) a proposição de ADPF clichês. E procuro não ter preconceitos. Nessa, como em outras ques-
da Procuradora-Geral da República, Deborah Duprat? tões envolvendo privatização, a pergunta a fazer é a seguinte: qual
fórmula é melhor para a sociedade, para a dignidade humana, para
a proteção dos diretos fundamentais? Quando a telefonia era esta-
Acho que os que são contrários vão se apegar na questão do
tal e uma empregada doméstica não tinha acesso a um telefone fixo,
cabimento da ADPF. Mas acho que há chance de se formar uma maio-
muito menos a um celular, o modelo não era democrático. Se agora
ria favorável, nas duas ações. tem acesso, a preço razoável, o modelo melhorou. Então, foi bom. Se
a estrada ficou melhor com o pedágio, mas um trabalhador não tem
7 Há quem defenda que a união estável é uma es- mais condições de trabalhar na cidade vizinha porque o pedágio con-
pécie de casamento de segunda classe. Por que, en- some seu salário todo, o modelo é ruim. Tem de haver uma alternativa
tão, não se buscar diretamente o casamento para os pa- para ele. De modo que é preciso olhar sem preconceitos. Se a experi-
ência com a privatização permitir que o sistema penitenciário deixe
res LGBT? Seria a união estável um avanço estratégico?
de ser o mundo de horrores que é, eu acho boa. Se mantiver tudo
Está lá no belo verso do poeta espanhol Antonio Machado: “Ca- como está, e virar fonte de lucro para os de sempre, eu acho ruim.
minante no ha camino; Se hace camino al andar”. Eu acho que a ex-
tensão do regime da união estável foi o caminho natural, na medida 10 A recente decisão do STF acerca da inexigibilidade do diplo-
em que se caminhava. É provável que o caminho continue e leve a no- ma para exercer a profissão de jornalista tem qual amplitude? Hou-
vos lugares. Não se pára a história com visões morais rígidas. Eu acho ve, de fato, desregulamentação da profissão? Se sim, pode-se dizer
que a ética e a autenticidade levam mais longe do que as estratégias. que o Jornalismo foi a primeira de muitas profissões que seguirão
pelo mesmo caminho?

8 Qual a dimensão da interferência de prin- Eu não me considero um interlocutor especialmente qualificado


cípios religiosos nas decisões judiciais e legisla- para debater esta questão. Não a estudei. Como observador não-engaja-
tivas em questões como direitos LGBT e aborto? do, a decisão do STF me pareceu razoável na questão da profissão de jor-
nalista. Mas não refleti sobre sua repercussão sobre outras profissões.
A Igreja é uma força social importante em um país como o Brasil
e acho que ela tem todo o direito de participar do debate público e pro-
curar influenciar os comportamentos da sociedade. Mas sua autorida-
de tem de ser a dos argumentos e não a do poder. O poder estatal tem
Por fim, quanto à sua atuação na defesa do caso
que ser laico, tem que ser fundado na razão pública, e não em doutrinas Battisti,
morais ou religiosas abrangentes. A marca da democracia é o pluralis-
mo, a existência de desacordo moral razoável entre as pessoas. Temos 10 O senhor pensa que há politização excessiva do Judi-
que encontrar meios de convivência civilizada e harmoniosa entre di-
ferentes. Quem pensa de maneira diferente da minha não é meu inimi-
ciário ao se defrontar com problemas como esse? Por quê?
go, mas meu parceiro em um mundo marcado pelo pluralismo e pela
diversidade. Criminalizar a conduta razoável de quem pensa diferen- O caso Battisti é um exemplo típico – embora não rotineiro – de
má mistura entre política e direito. Para atender um pedido da Itália
temente de mim é uma forma autoritária e intolerante de vIver a vida.
e por adversidade política com o Ministro da Justiça do Brasil, inúme-
ras linhas jurisprudenciais consolidadas e corretas correm o risco de
serem postas de lado. Isso em relação à distinção entre ato vinculado
e discricionário, em relação à competência em matéria de relações in-
ternacionais e em relação ao controle do mérito de atos políticos. E
até no tocante à prescrição. Sem mencionar uma visão dos fatos que
se funda em que não tenha havido nem legislação de exceção nem
– Luís Roberto Barroso possui graduação anos de chumbo na Itália. É claro que a jurisprudência pode mudar,
em Direito pela Universidade do Estado mas não se deve tratar os precedentes com desimportância. O direito
do Rio de Janeiro (1980), mestrado (L. precisa de coerência, de respeito às categorias conceituais, à impesso-
L. Master Of Laws) pela Universidade de alidade. Nos Estados Unidos costuma-se dizer que “hard cases make
Yale, EUA (1989) e doutorado em Di- bad Law”. Este é um bom exemplo. A Itália, a política, o anticomunis-
reito pela Universidade do Estado do mo tardio, a cobertura da imprensa e outras circunstâncias brasileiras
Rio de Janeiro (2008), livre-docência transformaram uma questão simples em uma questão complexa. Ape-
pela Universidade do Estado do Rio sar de tudo o que acabo dizer, se o STF decidir no sentido da extradi-
de Janeiro (1990). Atualmente é pro- ção e o Presidente da República optar por extraditar, a decisão deverá
fessor titular da Universidade do ser acatada. É preciso ter maturidade e respeitar as instituições mes-
Estado do Rio de Janeiro. mo quando elas não satisfazem nossas expectativas circunstanciais.
Tem experiência na área
de Direito, com ênfase
em Direito Público.

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10 O ACADÊMICO
INTEGRE-SE! nos projetos de extensão da Faculdade de Direito!

Integre-se!
I EFAJUP
Serviço Universitário de Resistência e
No primeiro “Encontro de formação de assessoria
Justiça para a Autonomia jurídica universitária popular”, o SURJA lançou re-
bentos. Durante os dias 10 e 11 de Julho, antevéspe-
Algo que nasceu de um imperativo de consciência de
ra do Dia Mundial do Rock, e já no ensejo impetuoso
quem lhe deu o ímpeto inicial não poderia ser batiza-
da data (opcional, ;-p), produziu-se intenso debate,
do senão com um também imperativo. Imperativo este
pré-propiciado por farto e abalizado material bi-
que não pretende determinar, em sua acepção grama-
bliográfico, acerca das possibilidades e caracterís-
tical, mas sim expressar uma exortação, um clamor.
ticas de um coletivo de estudos e práticas eman-
Ao bradar “SURJA”, quiçá ainda um sussur-
cipatórias e os caminhos de sua criação na UFPel.
ro, o Serviço Universitário de Resistência e Jus-
Pautando-se por um esforço multidisciplinar e de
tiça para Autonomia, coletivo que aqui se
abertura das portas da percepção do Direito, de
apresenta, hermana seus braços e corações às cole-
um paradigma libertário e incitante de educação e
tividades para as quais surgir para o mundo é um
de uma revelação social autônoma, valendo-se de
desafio árduo e uma vocação a ser compartilhada.
experiências históricas e precursoras de serviços
legais e assessorias universitárias, delinearam-se
leves feições do serviço. O entorno dialético teve
ainda atividades lúdicas e dinâmicas inspiradoras.
Não esgotadas as variáveis, mas já vislumbrado um
SURGE o SURJA horizonte, novos EFAJUPs de aformoseamento do
SURJA virão, para os quais fica registrado o convite.
Bem assim, o Serviço Universitário de Resistência e
Justiça para Autonomia se pretende, pois, um seg-
mento de ação ampla junto a coletividades que des-
cascam a unha seu dia-a-dia subumano, acompanha-
das aquelas do necessário estudo e aprofundamento
teórico. O mister do serviço é de assessoria multidis-
ciplinar, com as ferramentas de práticas educativas
principalmente, aproximação de recursos e orienta-
Projeto Areal – Direito de Ação:
ção e, em caráter adjacente, através de demandas ju-
O Projeto Areal – Direito de Ação tem como ob-
diciais de caráter coletivo. O diagnóstico das realida-
jetivo a prestação de atendimento jurídico à co-
des de atuação e mesmo a sua especificação prática
munidade carente do bairro Areal. Com a super-
serão expandidos com o desenvolvimento do grupo.
visão de uma assistente social e de professores
Se o sistema trata de perpetuar a inércia e suprimir
da Faculdade de Direito, os estudantes de Direito
os sonhos, o SURJA se puxa para resistir a esta força
colocam em prática os conhecimentos adquiridos
inibitória. Resistir às forças que levam à inação e ao
em sala de aula através da assistência judiciária.
descompromisso é outro viés de sua personalidade.
O projeto surgiu em 1999 com uma parceria en-
As instituições e institutos, por mais bem norte-
tre a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e a
ados que sejam, se mostram eventualmente re-
Unidade Básica de Saúde (UBS) localizada no bair-
trógrados e consagrados pela realidade material
ro Areal. Desde então o projeto de extensão tem
e com vistas a esta manter; daí que há de se bus-
sede no Centro Social Urbano do bairro Areal.
car a revisão das convenções, refazendo-as ins-
A principal finalidade deste projeto é assegu-
trumento de alcance de autonomia e prota- rar, para a população mais carente, os direi-
gonismo amplo, ao cabo dos quais se possa tos previstos na nossa Carta Maior; é garantir
produzir novos e progressistas paradigmas de valor. para essa comunidade o direito à informação
jurídica e o acesso à justiça de forma gratuita.
Ciente da dimensão do desafio, ciente da eficácia A seleção para os alunos interessados em participar
da utopia, eis aí o SURJA. do projeto ocorre no início de todos os anos, e todos
os estudantes de Direito da UFPel podem se inscrever.

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O ACADÊMICO 11
nos projetos de extensão da Faculdade de Direito! INTEGRE-SE!

Dialogando com a 7ª arte:


Dialogando com a 7ª arte é um projeto de extensão que tar opiniões sobre os mais diversos (e sempre relevantes)
tem por finalidade incentivar o debate sobre temas jurí- temas. Ao mesmo tempo em que o objetivo do projeto é
dicos, sociológicos e filosóficos na comunidade universi- “mergulhar” em determinado tema e aprofundá-lo em cada
tária. Para tanto, utiliza-se do cinema como ponto de par- sessão, também o é que se tenha a oportunidade de fazer
tida: os filmes são o pontapé inicial da discussão, que já isso várias vezes, cada vez com um tema diferente em foco.
versou sobre violência, aborto, sexualidade, ditadura etc. O Dialogando com a 7ª Arte ocorre mensalmen-
Esse projeto nasceu por iniciativa de membros do Centro te, aos sábados à tarde, na Faculdade de Direi-
Acadêmico Ferreira Vianna (CAFV), em 2008, e atualmente é to da UFPel. É gratuito e confere certificado confor-
um projeto de caráter transdisciplinar, contando com pes- me o número de sessões das quais se participou.
soas de diversos cursos na sua organização: Biologia, Ciên- Para mais informações,
cias Sociais, Direito, Filosofia, Jornalismo e Administração. visite: http://www.cafv-ufpel.com/
A cada sessão é apresentado um tema diferente. O objeti-
vo é abrir um espaço para discutir, argumentar, apresen-

A Escola de Educação em Direitos A partir de atividades ligadas à comunidades do muni-


Humanos e Cidadania – EDHUCA cípio de Pelotas e de outros dez municípios da zona sul
da Faculdade de Direito da UFPel (Rio Grande, Capão do Leão, Morro Redondo, Turuçu,
realiza o “Projeto Tribunos da Ci- Canguçu, Arroio Grande, Jaguarão, Pedro Osório, Cerri-
dadania” e o “Projeto EDHUCA: A to e São Lourenço), tais projetos têm dois objetivos cen-
Escola que Protege”, ambos tratam- trais dentro da ótica universitária: concretizar o tripé
se de projetos de extensão finan- educacional composto por ensino, pesquisa e extensão,
ciados pelo Governo Federal, e vi- e, aproximar a Universidade de sua região de abrangên-
sam sobretudo a democratização cia, fazendo assim com que a comunidade apodere-se
do acesso à justiça e a promoção, defesa e proteção dos conhecimentos acadêmicos de que pode desfrutar.
dos direitos das mulheres, crianças e adolescentes.
A seguir breve descritivo dos projetos mencionados:

TRIBUNOS DA CIDADANIA - é um projeto de inclusão social local será instada e estimulada para discutir temas e apresen-
que tem como objetivo defender, garantir, e promover os di- tar demandas relativas às suas necessidades. Serão formados
reitos fundamentais do homem, na sua diversidade, indivisi- grupos de discussão sobre o direito, a justiça, a mediação e o
bilidade e universalidade, especialmente o dos grupos mais exercício dos direitos, formados por alunos e lideranças locais;
vulneráveis da população, assegurando o acesso democrático
à justiça e à tutela jurisdicional do Estado. Pretende contri- 2 Realização de Curso de Formação em Mediação de Conflito,
buir para a construção coletiva de uma cidadania livre, igua- ministrado pela Associação Brasileira de Árbitros e Mediado-
litária, inclusiva, pacífica, solidária, participativa, multicultu- res - ABRAME. O curso tem como público alvo acadêmicos e
ralista e democrática, pautada pela ética, pela tolerância, pela aplicadores de direito em geral, as Promotoras Legais Popu-
justiça social, e pela autonomia e dignidade do ser humano. lares e lideranças comunitárias do município de Pelotas; e,
3 As mulheres que atuam como lideran-
Algumas das ações desenvolvidas pelo projeto: ças em suas comunidades serão capacitadas
para atuarem como Promotoras Legais Popu-
1 Assessoria Jurídica Popular: esta funcionará de forma descen- lares, podendo estas ao final do curso de ca-
tralizada, em bairros de Pelotas tendo como foco a Mediação de pacitação resolucionarem demandas de for-
Conflitos. Os alunos estagiários realizarão atendimentos sema- ma pacífica em seus bairros antes mesmo da
nais e serão orientados por dois advogados especializados em necessidade de se recorrer as vias judiciais.
resolução pacífica de conflitos. Neste contexto, a comunidade

Algumas ações a serem desenvolvidas:

EDHUCA: A ESCOLA QUE PROTE- 1 Capacitação de 800 profissionais ligados à educação


GE – é um projeto de extensão vol- básica visando o enfrentamento da violência domésti-
tado para a capacitação de profis- ca e escolar contra mulheres, crianças e adolescentes;
sionais da área da educação básica 2 Produção e construção de material didático e para-didáti-
para lidarem com o enfrentamento co para instrução quanto a temática principal do projeto; e,
da violência escolar e doméstica, 3 Atendimento especializado às demandas educa-
transformando assim a escola em um cionais das escolas atendidas pelo projeto através
espaço de difusão de informações relacionadas a defe- de fóruns, debates, discussões, teatros, palestras,
sa dos direitos das mulheres, crianças e adolescentes. etc., relacionados à Educação em Direitos Humanos.

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12 O ACADÊMICO
O PALCO Espaço de cultura e arte!

O Jovem
“Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não Na floresta, não existe
há ninguém que explique e ninguém que não entenda” justiça ou castigo.
- Cecília Meireles.
Quando o álamo projeta
sua sombra sobre o solo,
o cipreste não reclama:
“isto é contra a lei”.
Mas a justiça dos homens
é como a neve
Sentença de um Juiz Poeta que se derrete
ao primeiro olhar do sol

Aos dias 21 de janeiro do corrente ano, acordam os in- Dá-me a flauta e canta,
tegrantes da Segunda Turma Recursal Cível dos Juizados o canto é a justiça
Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, por una- do coração,
nimidade dar provimento ao recurso de nº 71001770171. e o lamento da fauta
O juiz de Direito Dr. Afif Jorge Simões Neto assim proferiu sobrevive
seu voto: ao crime e ao castigo.
Este é mais um processo
Daqueles de dano moral Khalil Gibran
O autor se diz ofendido
Na Câmara e no jornal.

Tem até CD nos autos


Que ouvi bem devagar
E não encontrei a calúnia O Direito ao Delírio
Nas palavras do Wilmar.
Que tal começarmos a exercer
Numa festa sem fronteiras
Teve início a brigantina O direito de sonhar?
Tudo porque não dançou Que tal se delirarmos um pouquinho?
O Rincão da Carolina. No próximo milênio, o ar estará limpo
de todo veneno
Já tinha visto falar
O televisor deixará de ser
Do Grupo da Pitangueira
Dançam chula com a lança o membro mais importante da família
Ou até cobra cruzeira. As pessoas trabalharão para viver,
em vez de viver para trabalhar.
Houve ato de repúdio Os economistas não chamarão
E o réu falou sem rabisco
nível de vida o nível de consumo,
Criticando da tribuna
O jeitão do Rui Francisco nem chamarão qualidade de vida
a quantidade de coisas.
Ninguém será considerado herói
Que o autor não presta conta ou tolo só porque faz aquilo que
Nunca disse o demandado
acredita ser justo, em vez de fazer
Errou feio o jornalista
Ao inventar o fraseado. aquilo que mais lhe convém.
Julgar briga de patrão A comida não será uma mercadoria,
É coisa que não me apraza nem a comunicação um negócio,
O que me preocupa, isso sim porque comida e comunicação
São as bombas lá em Gaza.
são direitos humanos.
Ausente a prova do fato A educação não será um privilégio
Reformo a sentença guerreada apenas de quem possa pagá-la.
Rogando aos nobres colegas A polícia não será a maldição daqueles
Que me acompanhem na estrada que não podem comprá-la.
A justiça e a liberdade,
Sem culpa no proceder
Não condeno um inocente irmãs siamesas
Pois todo o mal que se faz condenadas a viverem separadas,
Um dia volta pra gente voltarão a juntar-se, bem unidas
ombro com ombro.
E fica aqui um pedido
E os desertos do mundo e os desertos
Lançado nos estertores
Que a paz volte ao seu trilho da alma serão reflorestados.
Na terra do velho Flores.
Eduardo Hughes Galenao
Montevidéu, Uruguai - 3 de Setembro de 1940
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