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por
Elísio Gala
RESUMO
A auto-avaliação das Escolas, implicando a identificação das fraquezas e virtudes associadas à
prossecução dos seus objectivos, deixou tradicionalmente de fora, as bibliotecas escolares. Implícita
a esta exclusão estava a consideração das referidas bibliotecas como totalmente irrelevantes ou
muito pouco significativas para as práticas e resultados associados ao ensino e à aprendizagem.
Os textos que nos foram dados para análise e comentário1, dão-nos conta: da tensão
(vantagens/desvantagens) existente no processo de avaliação (externa/interna); das mudanças
sociais suscitadoras de mudanças de paradigma e dos paradigmas promotores de mudanças sociais;
da importância da reflexão e avaliação para uma efectiva melhoria e consequente valorização
pública do papel da biblioteca escolar na vida da comunidade, não apenas a escolar, em que se
insere. Dando-nos conta de todos estes
aspectos, estabelecem os referidos textos
O universo (a que outros chamam Biblioteca) as necessárias ligações do processo de
compõe-se de um número indefinido, e talvez infinito, auto-avaliação à escola, nomeadamente
de galerias hexagonais, com vastos poços de ventilação
no meio (…). De qualquer hexágono vêem-se os pisos através da exemplificação dos processos
inferiores e superiores, interminavelmente. (…) de gestão da informação e comunicação
Tal como todos os homens da Biblioteca, viajei na
minha juventude; peregrinei em busca de um livro, se nas escolas/agrupamentos, realçando o
calhar do catálogo dos catálogos; agora (…), preparo- crucial papel do professor bibliotecário.
me para morrer a poucas léguas do hexágono em que
nasci [e] afirmo que a Biblioteca é interminável. (…) As adequadas e precisas interrogações
[Um bibliotecário de génio, descobriu] a lei geradoras de movimento é que hão-de
fundamental da Biblioteca [:] todos os livros, por
muito diferentes que sejam, constam de elementos marcar a relevância da sua actuação, o
iguais: o espaço, o ponto, a vírgula, as vinte e duas significado das suas orientações e o valor
letras do alfabeto. Também acrescentou um facto que
todos os viajantes têm confirmado: «Não há, na vasta da sua visão.
Biblioteca, dois livros idênticos.»
[Uma superstição antiga fala] do Homem do Livro.
[Algures no hexágono] deve existir um livro que seja a COMENTÁRIO
chave e o resumo perfeito de todos os outros: deve
haver algum bibliotecário que o tenha estudado e seja
Uma Biblioteca Escolar é um
análogo a um deus. Na linguagem desta zona hão-de
microcosmos, inserido no cosmos maior
persistir ainda vestígios do culto desse funcionário
remoto. Fizeram-se muitas peregrinações à procura
da Escola, envolta por sua vez em
d`Ele. (…)
realidades cósmicas cada vez maiores: a
A certeza de que está tudo escrito anula-nos ou
envaidece-nos. Conheço distritos onde os jovens se
urbe e o orbe. O Modelo de Auto-
ajoelham diante dos livros e lhes beijam
barbaramente as páginas, mas não sabem decifrarAvaliação das Bibliotecas Escolares no
uma única letra. As epidemias, as discórdias heréticas,
contexto da Escola/Agrupamento,
as peregrinações, que inevitavelmente degeneram em
apresenta-nos um modelo de bibliotecário
banditismo, têm dizimado a população. [Suspeito de
que a espécie humana] está prestes a extinguir-se, e
e uma nova concepção do mundo onde
que a Biblioteca perdurará (…) ilimitada e periódica.
ele se move, a biblioteca. A partir de um
A Biblioteca de Babel
Jorge Luís Borges texto literário de enorme riqueza
simbólica, como a Biblioteca de Babel2,
Jorge Luís Borges apresenta-nos também
e primeiro, um modelo de bibliotecário e o mundo como uma biblioteca.
Um dos elementos caracterizadores do bibliotecário é-nos dado pelo que segundo o autor
1
O Modelo de Auto-Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento (MAAEA) – Texto da Sessão; Scott, Elspeth S. (2002) “How good is your
school library resource centre? An introduction to performance measurement” (PM), 68th IFLA Council and General Conference, August 18-24, 2002;
McNicol, Sarah (2004) “Incorporating library provision in school self-evaluation” (SSE). Educational Revue, 56 (3), 287-296; Johnson, Doug (2005)
“Getting the Most from Your School Library Media Program”(LMP), Principal. Jan/Feb 2005.
2
Jorge Luís Borges (1989) “A Biblioteca de Babel”, Obras Completas I, Editorial Teorema, Lisboa.
acontecia na antiguidade. Para cada três hexágonos havia um homem.3 Jorge Luís Borges afirma
melancolicamente já ter muitas noites, viajado pelos hexágonos sem encontrar um único
bibliotecário, isto é, sem encontrar um único homem que se interesse por descobrir o que dizem os
outros, por divulgar o que descobriu reflectindo sobre isso, e por aprender e ensinar os caminhos
que permitam vencer os entraves à descoberta.
O professor bibliotecário é por excelência, um mediador.
7
Scott, Elspeth S. (2002) “How good is your school library resource centre? An introduction to performance measurement”.
8
Elspeth S. Scott, apresenta muita informação sobre esta matéria, nomeadamente: as três categorias de evidências (informação que já existe;
informação que pode ser facilmente descoberta a partir da informação existente; informação que precisa de ser especificamente recolhida); as
estatísticas e os mais variados tipos de registos como as formas mais simples de recolha de evidências; as opiniões dos utilizadores; entrevistas e
debates, formais ou informais, individuais ou em grupo. “How good is your school library resource centre? An introduction to performance
measurement” pp. 3-5; cf. O Modelo de Auto-Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento.
9
Elspeth S. Scott, op. cit., pp. 5-6.; cf. O Modelo de Auto-Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento.
10
Elspeth S. Scott, op. cit., pp. 6-7.; cf. O Modelo de Auto-Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento; Sarah McNicol no texto citado
“Incorporating library provision in school self-evaluation” capítulo The uses of self evaluation, identifica inúmeros usos da auto-avaliação: melhoria
do ensino e da aprendizagem; melhoria das práticas de trabalho; escrita de relatórios; melhoria no planeamento; orçamento; apoios e financiamentos;
pessoal; publicidade; defesa do papel desempenhado pela biblioteca; cf. também sobre a implementação do processo de auto-avaliação no contexto da
escola, Rudd, P & Davies, D. (2000). Evaluating school self-evaluation. Paper presented at the British Research Association Conference, Cardiff
University, 7-10 September 2000.
11
Sobre informação relativa aos bons programas de media das bibliotecas escolares cf. Principal`s Manual for Your School Library Media Program
de http://www.ala.org/aasl/principalsmanual.html; David Loertscher`s Reinventing Your School`s Library in the Age of Technology: a Guide for
Principals and Superintendents, Hi-Willow Press; Planning Guide for Information Power; http://www.doug-johnson.com/wgml; A 13 Point Library
Media Program Checklist for School Principals; in Johnson, Doug (2005) “Getting the Most from Your School Library Media Program”(LMP),
Principal. Jan/Feb 2005.
12
cf. sobre uma ferramenta de avaliação do bibliotecário especialista em media, http://www.kde.state.ky.us/oet/customer/online2/lms_eval.asp., in
Johnson, Doug (2005) (LMP).
dos alunos? Há o desenvolvimento sistemático de formação e apoio individual ou em grupo no
âmbito das literacias críticas (professores e alunos)? Há a disponibilização de uma colecção de
Literatura rica e de programas de leitura que contribuam para o enriquecimento pessoal e para o
gosto pela leitura? Há o desenvolvimento de estratégias de cooperação com outras bibliotecas? Há
uma estrutura tecnológica integrada que suporta as actividades de ensino-aprendizagem?13
Infelizmente, tenho que responder à maioria das questões com um não. Aliás, à primeira questão
que quanto a mim determina a possibilidade de resposta pela positiva a algumas das outras, também
tenho que responder não. Há muito caminho para fazer. No caminho da confiança, há sempre que
ter em conta a confiança em nós e a confiança nos outros. A cisão nas relações de confiança, ou
melhor dizendo as desconfianças existentes creio que dificilmente serão saradas. Lá diz o povo, a
vida e a confiança só se perdem uma vez. Neste contexto, a coordenação da biblioteca escolar pode
ser por excelência o lugar de exercício da mediação. As funções que lhe estão atribuídas e as
finalidades que delas decorrem porque centradas no que mais importa – a ajuda na construção de
homens e mulheres autónomos, conscientes, responsáveis e criativos – podem, com a comunhão
numa visão suficientemente abrangente e unitiva e a dedicada colaboração do órgão directivo e
demais membros da comunidade educativa, transformar o rosto da escola.14
CONCLUSÃO
No excerto de A Biblioteca de Babel, o seu autor afirma: “Conheço distritos onde os jovens se
ajoelham diante dos livros e lhes beijam barbaramente as páginas, mas não sabem decifrar uma
única letra.”
O verdadeiro combate do bibliotecário é o de devolver ao mundo uma luz primeva. A luz que
não se encontra na bárbara idolatria nem no primarismo dos juízos. A informação está para o
conhecimento como o brilho para a luz. O mundo está cheio de homens brilhantes – os que beijam
barbaramente as páginas – mas raros são os homens luminosos – os que sabem decifrar as letras.
13
cf. O Modelo de Auto-Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento; cf. sobre pesquisa que sustenta que um bom programa de uma biblioteca
escolar afecta positivamente os resultados dos estudantes a American Library Association Resource Guides for School Library Media Program
Development: Achievment webpage http://www.ala.org/aasl/resources/achievement.html., in Johnson, Doug (2005) (LMP).
14
Sobre estilos de liderança cf. Ryan (2004) Information literacy: evidence that school libraries can lead the way., citado em O Modelo de Auto-
Avaliação no contexto da Escola/Agrupamento e Johnson, Doug (2005) (LMP), capítulo “Create, maintain and assess high expectations of the library
media specialist”.