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INTRODUCAO OLHAR PARA A HISTORIA: CAMINHO PARA A COMPREENSAO DA CIENCIA HOJE O homem é um ser natural, isto é, ele € um ser que faz parte integrante da natureza; no se poderia conceber 0 conjunto da natureza sem nela inserir a espécie humana. Ao mesmo tempo em que se constitui em ser natural, 0 homem diferencia-se da natureza, que 6, como diz Marx (1984), “‘o corpo inorganico do homem” (p. 111); para sobreviver ele precisa com ela se re- lacionar j4 que dela provém as condigGes que lhe permitem perpetuar-se en- quanto espécie. Nao se pode, portanto, conceber o homem sem a natureza ¢ nem a natureza sem o homem. Na busca das condigées para sua sobrevivéncia, 0 ser humano — assim como outros animais — atua sobre a natureza e, por meio dessa interagdo, satisfaz suas necessidades; no entanto, a relagao homem-natureza diferencia- se da interagSo animal-natureza. A atividade dos animais, em relacio 4 natureza, é biologicamente de- terminada. A sobrevivéncia da espécie se dd com base em sua adaptagdo ao meio. O animal limita-se 4 imediaticidade das situagdes, atuando de forma a permitir a sobrevivéncia de si préprio ¢ a de sua prole; isso se repete, com minimas alteragGes, em cada nova geracao. Por mais sofisticadas que possam ser as atividades animais — por exem- plo, a casa feita pelo jodo-de-barro ou a organizacio de um formigueiro -, elas ocorrem com pequenas modificagdes na espécie, j4 que a transmissio da “‘experiéncia” é feita quase exclusivamente pelo cédigo genético; o mesmo pode-se dizer em relago as modificagdes que provocam na natureza, por mais elaboradas que possam parecer. Assim, se a atuago do animal sobre a natureza permite a sobrevivéncia da espécie, isso se da em fungao de carac- teristicas biolégicas, o que estabelece os limites da possibilidade de modifi- cagies que a atuagdo do animal provoca seja na natureza, seja em si proprio. © homem também atua sobre a natureza em fungio de suas necessi- dades © o faz para sobreviver enquanto espécie. No entanto, diferentemente de outros animais, 0 homem nao sc limita 4 imediaticidade das situagies com que se depara; ultrapassa limites, j4 que produz universalmente (para além de sua sobrevivéncia pessoal e de sua prole), no se restringindo as necessidades que se revelam no aqui ¢ agora. A ag3o humana nao é apenas biologicamente determinada, mas se di principalmente pela incorporagao das experiéncias ¢ conhecimentos produzi- dos ¢ transmitidos de geragdo a gera¢io; a transmissao dessas experiéncias © conhecimentos — por meio da educagdo ¢ da cultura — permite que a nova Beraglio nfo volte ao ponto de partida da que a precedeu. A atuagio do homem diferencia-se da do animal porque, ao alterar @ natureza, por meio de sua agdo, torna-a humanizada; em outras pala- vras, a natureza adquire a marca da atividade humana. Ao mesmo tempo, o homem altera a si proprio por intermédio dessa interagio; ele vai se cons- truindo, vai se diferenciando cada vez mais das outras espécies animais, A interagho homem-natureza é um processo permanente de muitua transforma- Gao: essc ¢ o processo de produgao da existéncia humana. E o proceso de produgao da existéncia humana porque o ser humano vai se modificando, alterando aquilo que € necessdério 4 sua sobrevivéncia. Velhas necessidades adquirem caracteristicas diferentes; até mesmo as neces- sidades consideradas basicas — por exemplo, a alimentagao — refletem as moudangas ecorridas no homem; os habitos e necessidades alimentares sao hoje muito diferentes do que foram em outros momentos, A alteragio, no entanto, ndo se limita 4 transformardo de velhas necessidades: 0 homem cria novas necessidades que passam a ser (do fundamentais quanto as chamadas necessidades basicas 4 sua sobrevivéncia. E o processo de produgio da existéncia humana porque o homem nio 86 cria artefatos, instruamentos, como também desenvolve idéias (conheci- mentos, valores, crengas) e mecanismos para sua ¢laboracio (desenvolvimen- to do raciocinio, planejamento...). A criagdo de instrumentos, a formulagio de idéias e formas especificas de elabord-los - caracteristicas identificadas como eminentemente humanas = so fruto da interagio homem-natureza. Por mais sofisticadas que possam parecer, as id¢ias sio produtos de ¢ exprimem as relagGes que o homems estabelece com a natureza na qual se insere, Ho processo da produgao da exist@ncia humana porque cada nova in- teragdo reflete uma natureza modificada, pois nela se incorporam criagies antes inexistentes, € reflete, também, um homem ja modificado, pois suas 10 necessidades, condigdes e caminhos para satisfaz2-las sdo outros que foram sendo constnaidos pelo préprio homem, & nesse processo que o homem ad- quire consciéneia de que estd transformando a natureza para adapti-la a suas necessidades, caracteristica que vai diferencid-lo: a ago humana, ao contririo da de outros animais, é intencional ¢ planejada; em outras palavras, o homem sabe que sabe. © processo de produgio da existéncia humana é um processo social, © ser humano nio vive isoladamente, ao contririo, depende de outros para sobreviver. H& interdependéncia dos seres humanos em todas as formas da atividade humana; quaisquer que sejam suas necessidades — da produgio de bens a elaborago de conhecimentos, costumes, valores... —, clas sio criadas, atendidas e transformadas a partir da organizagio ¢ do estabelecimento de relagtes entre os homens. Na base de todas as relagdes humanas, determinando e condicionando a vida, est4 o trabalho — uma atividade humana intencional que envolve for- mas de organizacgdo, objetivando a produgdo dos bens necessdrios & vida humana. Essa organizagio implica uma dada maneira de dividir o trabalho necessirio A sociedade e ¢ determinada pelo nivel técnico ¢ pelos meios existentes para o trabalho, ao mesmo tempo em que os condiciona; a forma de organizar 0 trabalho determina também a relagdo entre os homens, inclu- sive quanto & propriedade dos instrumentos ¢ materiais utilizados ¢ & apro- priagao do produto do trabalho. As relagSes de trabalho — a forma de dividi-lo, organizi-lo — ao lado do nivel técnico dos instrumentos de trabalho, dos meios disponiveis para a producdo de bens materiais, compdem a base econGmica de uma dada socie- dade, E essa base econémica que determina as formas politicas, juridicas ¢ @ conjunto das idéias que existem em cada sociedade. E a transformagao dessa base econémica, a partir das contradig6es que ela mesma engendra, que leva a transformagao de toda a seciedade, implicando um novo modo de produgio e uma nova forma de organizagao politica e social. Por exemplo, nas sociedades tribais (comunais) © grupo social organizava-se por sexo ¢ idade para produzir os bens necessdrios 4 sua sobrevivéncia. As mulhe- res ¢ criangas cabiam determinadas tarefas ¢ aos homens, outras. Essa pri- meira divisio do trabalho, além de garantir a sobrevivéncia do grupo, gerou um conjunto de instrumentos, técnicas, valores, costumes, crengas, conheci- mentos, organizagao familiar, ete. A propriedade dos instramentos de traba- lho, bem como a propriedade do produto do trabalho (a caga, o peixe, etc.), era de toda a comunidade. A transmissio das técnicas, valores, conhecimen- tos, etc. era feita, basicamente, por meio da comunicagao oral e do contato pessoal, diferentemente do que ocorre atualmente. Ja, na Grécia Antiga, por volta de 800 a.C., o comércia, fundado na exponagio ¢ importagdo agricolas © artesanais, é a base da atividade econdmica, ¢ ha um nivel técnico de produgio desenvolvido ao lado de uma organizagdo politica na forma de cidades-Estado. Nessa sociedade, além da divisao do trabalho cidade-campo, ocorre uma divisio entre os produtores de bens e os donos da produgio; os produtores nao detém a propriedade da terra, nem os instrumentos de trabalho, nem o proprio produto de seu trabalho; s4o,.em sua maioria, eles mesmos, propriedade de outros homens. Nessa sociedade, as relagdes estabelecidas entre os homens sio desiguais: alguns vivem do produto do trabalho de ow- tros, e a produgiio de conhecimento é desenvolvida por aqueles que nao exe- cutam o trabalho manual. As idéias, como um dos produtos da existéncia humana, sofrem as mesmas determinagdes histéricas. As idéias sio a expressio das relagdes e atividades reais do homem, estabelecidas no processo de produgio de sua existéncia, Elas sdo a representagao daquilo que o homem faz, da sua maneira de viver, da forma como se relaciona com outros homens, do mundo que 0 circunda e das suas préprias necessidades. Marx ¢ Engels (1980) afimmam: A produgio de idéias, de representagies ¢ da conscitncia esté em primeiro lugar directa ¢ intimamente ligada A atividade material e ao comércio material dos homens; é a linguagem da vida real (...). Nao é a conscincia que determina a vida, mas sim a vida que determina a consciéncia, (pp, 25-26) Isso nao significa que o homem crie suas representapies mecanicamente: aquilo que o homem faz, acredita, conhece e pensa sofre interferéncia também das idéias (representagdes) anteriormente elaboradas; ao mesmo tempo, as novas representayOes geram transformagGes na produgho de sua existéncia. © desenvolvimento do homem e de sua histdria nao depende de um Gnico fator. Seu desenvolvimento ocorre a partir das necessidades materiais; estas, bem como a forma de satisfazé-las, a forma de se relacionar para tal, as préprias idéias, o proprio homem e a natureza que o circunda, sao inter- dependentes, formando uma rede de interferéncias reciprocas. Dai decorre set ess¢ um processo de transformagio infinito, em que o préprio homem se produz. Nesse processo do desenvolvimento humano multideterminado, que envolve inter-relag$es ¢ interfer€ncias reciprocas entre idéias e condigdes ma- teriais, a base econmica sera o determinante fundamental. Tais condigdes econdmicas em sociedades baseadas na propriedade privada resultam em pro Pos com interesses conflitantes, com possibilidades diferentes no interior da sociedade, ou seja, resultam num conflito entre classes. Em qualquer socie- dade onde existam relagGes que envolvam interesses antagdnicos, as idéias tefletem essas diferencas. E, embora acabem por predominar aquelas que 12

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