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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO


DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO

Igor Natusch Vieira

VÍDEO NA INTERNET: UMA ALTERNATIVA DE DISTRIBUIÇÃO


PARA O CINEMA BRASILEIRO?

Porto Alegre
2007
Igor Natusch Vieira

VÍDEO NA INTERNET: UMA ALTERNATIVA DE DISTRIBUIÇÃO


PARA O CINEMA BRASILEIRO?

Trabalho de conclusão de curso de graduação


apresentado ao Departamento de Comunicação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como
requisito parcial para a obtenção do grau de
Bacharel em Comunicação Social – Hab. Jornalismo.

Orientadora: Profa. Dra. Miriam de Souza Rossini

Porto Alegre
2007
DEDICATÓRIA

Aos meus pais, que me ensinaram a


ter humildade e persistência na
busca pelo conhecimento.
À minha orientadora, Miriam Rossini,
pela tranqüilidade e dedicação.
E aos amigos, que nos trazem as
lições mais valiosas.
RESUMO

Este trabalho apresenta um estudo das possibilidades de convergência


existentes entre as tecnologias virtuais (representadas pela Internet) e o processo de
distribuição da produção cinematográfica brasileira. O objetivo é identificar
características formais, narrativas e conceituais que melhor se identificam com o
modelo da Internet, e a partir daí apontar tendências que possam guiar o trabalho
dos realizadores que optarem por distribuir seus produtos pela Rede Mundial de
Computadores. Concentrando-se nas realizações em curta-metragem, o trabalho
analisa o conteúdo de três portais dedicados à exibição de material audiovisual pela
Internet: YouTube, Porta Curtas e Curta O Curta. De início, será elaborado um
referencial teórico que permita a compreensão de conceitos relacionados à
distribuição cinematográfica e às tecnologias virtuais. Após, os sites serão descritos
em relação a suas características históricas e funcionais. Determinaremos por meio
do número de acessos quais vídeos são os mais assistidos, utilizando os mesmos
como amostragem e procedendo a uma análise comparativa dos conteúdos que
apresentam.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................... 7
1 DISTRIBUIÇÃO: A BUSCA PERMANENTE PELO PÚBLICO.............. 12
1.1 DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA .................................................. 13
1.2 DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL .............................. 15
1.3 DISTRIBUIÇÃO ATRAVÉS DA WEB ..................................................... 20
2 INTERNET: UMA NOVA DIMENSÃO DO HUMANO............................. 27
2.1 PROCESSOS BÁSICOS ........................................................................ 28
2.2 A IMAGEM NA INTERNET .................................................................... 36
3 DESCRIÇÃO DOS SITES SELECIONADOS ........................................ 42
3.1 CRITÉRIOS DE ESCOLHA DOS SITES ............................................... 42
3.2 YOUTUBE .............................................................................................. 45
3.2.1 Histórico ................................................................................................ 45
3.2.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 47
3.3 PORTA CURTAS ................................................................................... 50
3.3.1 Histórico ................................................................................................ 50
3.3.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 52
3.4 CURTA O CURTA .................................................................................. 54
3.4.1 Histórico ................................................................................................ 54
3.4.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 56
4 ANÁLISE DOS SITES PESQUISADOS ................................................ 60
4.1 CRITÉRIOS E PROCESSOS DE AVALIAÇÃO ..................................... 60
4.2 DESCRIÇÃO DOS VÍDEOS ESCOLHIDOS COMO AMOSTRAGEM ... 64
4.2.1 Vídeos hospedados no YouTube ........................................................ 64
4.2.2 Vídeos hospedados no Porta Curtas ................................................. 66
4.2.3 Vídeos hospedados no Curta O Curta ............................................... 68
4.3 ANÁLISE COMPARATIVA DOS VÍDEOS PRESENTES NOS SITES ... 69
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 83
ANEXO A – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (I) .. 88
ANEXO B – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (II) 89
ANEXO C – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (III) 90
ANEXO D – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (IV) 91
ANEXO E – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (V) 92
ANEXO F – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (VI) 93
ANEXO G – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (I) ............. 94
ANEXO H – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (II) ............ 95
ANEXO I – VISUALIZAÇÃO DA JANELA DE EXIBIÇÃO DO SITE
PORTA CURTAS ................................................................................... 96
ANEXO J – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O
CURTA (I) .............................................................................................. 97
ANEXO K – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O
CURTA (II) ............................................................................................. 98
ANEXO L – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O
CURTA (III) ............................................................................................ 99
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INTRODUÇÃO

O cinema realizado fora de Hollywood e do controle das majors sempre


esteve de um modo ou de outro às voltas com dois problemas relativos à sua
viabilização prática. Um deles refere-se a sua produção, aos recursos instrumentais
e financeiros que necessitam ser mobilizados para que possa ocorrer a
materialização do roteiro através da captação de imagens, montagem e efeitos de
pós-produção. O outro é relativo à visibilidade do produto final, aos espaços e
mecanismos utilizados para que o filme possa ser exibido e para que seus
potenciais espectadores tenham acesso a sua exibição.
Na última década, a produção cinematográfica foi diretamente afetada pela
escalada da tecnologia digital, em um processo que trouxe possibilidades renovadas
para os realizadores. As tecnologias digitais de captação de vídeo e áudio
desenvolveram-se rapidamente, e logo passaram a ser utilizadas pelo cinema em
escalada crescente. No começo, por serem de custo muito alto, ficaram mais
restritas aos grandes estúdios e às empresas de cinema – mas, com o
barateamento de câmeras e demais artigos digitais, tornaram-se uma opção
tentadora para iniciantes e produtores independentes de modo geral. No Brasil,
mesmo diretores renomados como Eduardo Coutinho e Domingos de Oliveira
apostaram no formato digital para suas realizações, e concluíram produções
cinematográficas com valores muito inferiores aos que seriam investidos em
produções baseadas em película. Apesar das discussões conceituais sobre as
vantagens e desvantagens do vídeo em comparação com películas e latas de filme,
o fato é que o cinema em vídeo é uma realidade, que barateia a produção e aponta
para um processo cada vez mais ágil e aberto a um número maior de produtores e
realizadores.
No entanto, um segundo dilema permanece para boa parte desses
realizadores. Por mais que o cinema independente nacional esteja vivenciando um
salto no ritmo de produção, ele ainda não alcançou uma contrapartida no
escoamento de todo esse material, e esse nicho de mercado ainda é carente em
opções para a exibição de suas realizações. Praticamente excluídos de um circuito
comercial que privilegia o blockbuster norte-americano de custos e rendimentos
milionários, realizadores muitas vezes têm suas janelas de exibição limitadas a
8

festivais, pequenas mostras alternativas e, eventualmente, programas alternativos


na televisão, a maior parte deles promovidos por emissoras públicas. Vivencia-se,
hoje, uma realidade pouco animadora: produz-se muito mais rápido e com
acabamento mais cuidadoso, mas boa parte desta produção é condenada a ser
assistida por quase ninguém. Como ninguém faz cinema para si mesmo, o dilema se
impõe, e muito tem se pensado em busca de soluções para essa situação.
Uma alternativa que pode estar se consolidando para a solução de tal
problema encontra-se, como no primeiro caso, na exploração da tecnologia digital.
No entanto, ao invés de equipamentos físicos, refere-se ao suporte virtual oferecido
pela Rede Mundial de Computadores, ou World Wide Web (WWW). Com a evolução
das tecnologias de transmissão de dados, arquivos que antes necessitavam de
muitas horas para serem descarregados ou “baixados” tornam-se acessíveis de
modo muito mais rápido – realidade especialmente positiva para o material em
vídeo, quase sempre o de maior volume de dados e de transferência mais
dispendiosa. Assim, a praticidade em obter material audiovisual pela Internet é cada
vez maior – e não só através do download, muitas vezes não autorizado, dos
grandes filmes de Hollywood. Depois do sucesso obtido pelo YouTube, site
especializado na hospedagem livre de vídeos na Internet, disseminou-se a idéia de
que é possível assistir a vídeos diretamente pela rede, sem necessariamente copiá-
los para dentro de computadores pessoais – e nessa facilidade pode estar nascendo
uma nova cultura, com reflexos imediatos na realização audiovisual brasileira e
mundial.
Diante de tal panorama, nos vemos confrontados com uma série de questões.
Pode a Internet, de fato, ser um espaço para a veiculação e distribuição de cinema,
em especial de cinema realizado em nosso País? Em qual estágio se encontra essa
possível convergência? Que tipo de produto melhor se aplica a esta forma de
distribuição, qual gênero se adapta melhor a ser visto através da web? Qual é o
público potencial para o cinema na Internet, e quais são seus interesses e
motivações? Essas são questões que nos parecem pertinentes, e que nos instigam
a um esforço de compreensão em busca de possíveis respostas.
O trabalho aqui apresentado propõe-se a abordar essa relação nascente
entre a Internet e o cinema independente brasileiro, a partir de suas possibilidades
de exibição. Pretende-se lançar alguma luz sobre aqueles questionamentos; expor
experiências já existentes na exibição de realizações nacionais pela Internet, e
9

determinar pontos nos quais essas experiências possam ser úteis para guiar ações
futuras nesse sentido. Buscaremos igualmente perceber o uso que é feito da
linguagem cinematográfica nos trabalhos disponíveis na Rede, concentrando nossa
atenção em elementos formais e narrativos. Como a projeção de filmes em longa-
metragem via web ainda é inviabilizada por limitações técnicas, deteremos nosso
olhar sobre o universo dos produtos cinematográficos em curta-metragem, que
encontram em domínios da Internet um espaço aparentemente favorável para sua
exibição.
Para orientar essa apreciação, usaremos os estudos de Manuel Castells e
Pierre Lévy sobre a World Wide Web, explorando especialmente os conceitos de
sociedade em rede do primeiro e os estudos de intertextualidade do segundo.
Autores como Dominique Wolton e Lucia Santaella serão igualmente vistos por nós
no decorrer das observações sobre a Internet. A partir destes conceitos, buscaremos
atingir a realidade atual da tecnologia digital aplicada ao cinema, tendo como base o
trabalho de Luiz Gonzaga de Luca sobre o tema. Analisaremos igualmente os
estudos de Paulo Sérgio Almeida, Pedro Butcher e Aletéia Selonk sobre o panorama
cinematográfico brasileiro, concentrando nosso foco de análise em suas
considerações a respeito da distribuição e exibição. Paralelamente, traçaremos um
breve apanhado histórico a respeito da exibição de vídeo na Internet – uma
realidade que, se tomamos como ponto de partida o surgimento do pioneiro
YouTube, tem ao todo menos de três anos de existência.
Tendo estabelecido sobre essa bibliografia as bases de nossa análise,
abordaremos o problema da exibição via Internet por meio de três diferentes portais
dedicados a conteúdos em vídeo: YouTube <http://www.youtube.com>, Porta Curtas
<http://www.portacurtas.com.br/index.asp> e o site Curta O Curta <
http://www.curtaocurta.com.br/>. Utilizando os recursos de medição que cada um
dos domínios oferece, é possível saber quais vídeos obtêm maior repercussão, e a
partir daí determinar quais características dos filmes analisados melhor ou mais
eficientemente se ajustam à “janela” Internet. Cada um dos domínios tem critérios
diferentes para aceitação, exibição e medição qualitativa dos vídeos que
apresentam, e esses elementos serão igualmente descritos no presente trabalho.
Em termos de metodologia, a idéia inicial direcionava-se a um uso conjunto
da análise de conteúdo dos sites e de entrevistas com realizadores cujos produtos
estivessem disponíveis em um ou mais dos domínios escolhidos para o estudo. No
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entanto, dificuldades envolvidas na execução do projeto original nos levaram a optar


pela eliminação da segunda parte da análise, restringindo nossa ação ao conteúdo
disponível nos endereços eletrônicos em si. Assim sendo, vamos concentrar nossa
atenção sobre os sites, seus mecanismos de navegação, os conteúdos que
apresentam e as diferenças de formato e proposta apresentadas por cada um deles.
Comparando os dados coletados, buscaremos apontar tendências indicativas de que
tipo de realização encontra na Internet seu melhor espaço, e igualmente tentaremos
localizar as potencialidades da web na distribuição de vídeos ligados ao cenário
cinematográfico brasileiro.
No primeiro capítulo de nosso estudo, chamado “Distribuição”, falaremos
sobre as circunstâncias que envolvem esse tipo de atividade, descrevendo os
processos de seu funcionamento. Traçaremos também um breve panorama da
distribuição de cinema no Brasil, concluindo com uma apreciação das
potencialidades da Rede Mundial de Computadores no sentido de auxiliar o trabalho
de distribuição de conteúdos audiovisuais. No capítulo seguinte, chamado “Internet”,
discutiremos as tecnologias virtuais e seu impacto sobre a sociedade atual. Após
algumas considerações sobre os processos básicos da Internet, procederemos a
uma descrição da imagem aplicada à web e as revoluções que o progresso
tecnológico tem trazido para nossa compreensão a respeito dos próprios conceitos
imagéticos de modo geral. Buscaremos, assim, situar os dois universos que serão
objeto de análise neste trabalho. Em seguida, desenvolveremos o capítulo
“Descrição dos sites selecionados”, onde constará um levantamento de dados
históricos do YouTube, Porta Curtas e Curta O Curta, e posteriormente uma
descrição das possibilidades de navegação e conteúdo oferecidas por cada um
deles. O quarto capítulo, “Análise dos sites pesquisados”, apresentará os vídeos
escolhidos para amostragem, e a observação comparativa de seus conteúdos,
temáticas e recursos técnicos e narrativos. Considerações finais, bibliografia e
anexos, mostrando imagens dos sites pesquisados, completam nossa pesquisa.
Optamos, conscientemente, pelo desenvolvimento de um trabalho
exploratório, sem o estabelecimento prévio de hipóteses e sem a pretensão de
atingir conclusões pétreas sobre nosso objeto de estudo. Parece-nos importante ter,
nesse momento inicial, a humildade de tentar compreender uma realidade ainda
muito recente e em constante mutação. Estudos futuros certamente estarão em
melhor posição que a nossa para a formulação de hipóteses sobre o cinema em
11

conexão com a Internet – e é nossa esperança contribuir, ainda que parcialmente,


com dados que possam auxiliar esses esforços que estão por vir. O resultado de
nosso estudo poderá ser avaliado a partir de agora.
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1. DISTRIBUIÇÃO: A BUSCA PERMANENTE PELO PÚBLICO

É fato notório que todo o esforço envolvido na concretização de um produto


cinematográfico tem como objeto final o espectador. É um desafio permanente que é
imposto ao cinema de todos os tipos – convencer o maior número possível de
pessoas a abrirem mão de um grande número de opções oferecidas pela indústria
cultural e dedicarem parte do seu tempo e do seu dinheiro à apreciação de uma obra
cinematográfica. Trata-se de uma condição quase inerente a uma manifestação
artística dedicada desde seus momentos iniciais a conquistar a admiração e a
atenção das massas.
Embora o espectador tome real contato com o filme apenas no estágio final
de sua trajetória – quando toda a produção está já há tempos concluída e o
resultado está disponível para ser assistido – há um grande volume de trabalho
desenvolvido para que o material capturado e editado possa chegar às janelas de
exibição, atendendo tanto às necessidades financeiras dos estúdios quanto à
demanda dos consumidores.
Uma das dificuldades enfrentadas por quem se propõe a traçar um panorama
sobre a distribuição cinematográfica é a escassez dos estudos acadêmicos sobre o
tema. Especialmente no Brasil, o assunto é objeto de um número bastante reduzido
de pesquisas – o que cria a necessidade de construção de referenciais próprios para
que se possa avançar em direção ao problema que queremos analisar. No decorrer
do capítulo, tentaremos unir uma série de referências sobre o tema – a maior parte
delas indireta – para situar da maneira mais precisa possível a distribuição
cinematográfica, tanto em seus aspectos mais gerais quanto nas particularidades
que assume no nosso país. Posteriormente, descreveremos a Internet como
alternativa de distribuição, enumerando os avanços ocorridos nesse sentido dentro e
fora do Brasil.
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1.1. DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA

São duas as tarefas básicas de uma empresa distribuidora de cinema. Cabe


aos distribuidores a) comercializar o filme junto aos exibidores, garantindo do melhor
modo possível espaços para exibição, e b) informar o público da existência do filme
e da possibilidade, próxima ou imediata, de assisti-lo. Dizendo de outro modo, o
distribuidor trabalha com dois tipos de convencimento: o do exibidor, que veiculará o
material, e o do público consumidor de cinema, destinatário final dos esforços de
produção e cujo retorno garantirá ou não o sucesso comercial do filme.
O processo básico de distribuição é de estrutura simples, embora de
concretização complexa. A empresa distribuidora adquire os direitos de um filme,
negociando a partir daí os espaços nos quais o produto será exibido e,
paralelamente, trabalhando os mecanismos publicitários de modo a divulgar o filme
da maneira mais eficiente possível. Uma vez o filme estando nas salas de cinema, o
desafio passa a ser outro: mantê-lo em cartaz, atraindo público e lutando contra a
concorrência de muitos outros trabalhos pelos espaços de exibição existentes.
Antigamente, as possibilidades de exibição resumiam-se às salas de cinema,
mas com o progresso tecnológico novas alternativas se tornaram viáveis,
aumentando o público potencial e a vida comercial de um filme. Com o
estabelecimento da televisão como entretenimento doméstico, um novo mercado
surgiu e, com ele, um novo público, disposto a abrir mão das salas de cinema em
troca do conforto de assistir ao filme na comodidade do seu lar. Mais ainda, a
televisão tornou-se de certo modo um estímulo ao progresso tecnológico no próprio
cinema – afinal, coincide com a consolidação dos aparelhos de TV o
desenvolvimento de uma série de tecnologias cinematográficas, como o som estéreo
e o conceito de cinema a cores.
O surgimento posterior do VHS e, mais recentemente, do DVD abriu ainda
novas possibilidades de apreciação do cinema. Agora, além de não estar mais preso
ao ambiente da sala de cinema, o espectador ganha a perspectiva de assistir ao
conteúdo cinematográfico na hora em que desejar, não mais dependendo de
horários pré-estabelecidos para desfrutar de seu entretenimento. O VHS e o DVD
tornaram viável uma nova modalidade de comércio relacionada ao cinema: além da
exibição, via salas de cinema ou TV, passava a ser oferecido também o aluguel de
14

cópias dos filmes, o que permitiu o surgimento e disseminação das locadoras de


vídeo. Do mesmo modo, as cópias de filmes tornaram-se objeto passível de
aquisição definitiva em lojas comerciais e, graças às novas tecnologias de uso
doméstico, passaram mesmo a serem produzidas nas próprias residências, com
gravações feitas a partir da televisão com o uso de aparelhos de videocassete.
Atualmente, a televisão busca de certo modo reproduzir as comodidades oferecidas
pela tecnologia DVD, disponibilizando conteúdo especial por um valor pré-definido
através do sistema pay-per-view.
Para contornar eventuais problemas decorrentes da nova gama de opções –
que poderiam, por exemplo, acarretar a perda de público nos cinemas na medida em
que os espectadores optassem por assistir os filmes em casa – foi desenvolvida
uma política de “janelas” de exibição. Cada uma das mídias onde um filme pode ser
exibido é tratada como uma janela, e é criado um calendário de veiculação,
privilegiando as salas de cinema. Só depois de determinado tempo após a estréia no
circuito clássico de exibição é que o conteúdo cinematográfico é liberado para outras
mídias. Entre outras coisas, essa política consagra a sala de cinema como espaço
“nobre”, onde o filme atinge o público pela primeira vez e cujos resultados servem de
indicativo para seu desempenho nas outras mídias. No caso do Brasil, um filme é
lançado em DVD cerca de 180 dias depois da estréia no cinema, enquanto o
sistema pay-per-view aguarda 270 dias, e a televisão aberta espera quase dois anos
para ter autorizada a veiculação do filme (LUCA, 2004, p.197).
Segundo o estudo de Aletéia Selonk (2004), produtora cinematográfica e
Doutora em Comunicação Social pela PUC-RS, o espaço para iniciativas na área de
distribuição de cinema é concentrado, e as características atuais deste mercado,
sustentado na comercialização em escala e em grandes estoques de títulos,
dificultam a consolidação de novas empresas do ramo. Além disso, trata-se de um
mercado de alto risco para investidores, a) pela dificuldade de prever a reação do
público a produtos que muitas vezes primam pela inovação, e b) pela disputa de
espaços de exibição e lucros de bilheteria com um grande número de concorrentes
diretos e indiretos.
Tentando diminuir o mais possível essa margem de incerteza, as empresas
distribuidoras adotam uma série de estratagemas, a maior parte deles relacionado
com a publicidade de um filme junto ao público potencial do mesmo. Assessorias de
imprensa trabalham junto à imprensa para garantir comentários sobre o filme nos
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meios de comunicação, enquanto promoções são realizadas com a oferta de brindes


ou de entradas gratuitas para sessões. Em uma escala mais ampla, há um
direcionamento de produção, com a realização de filmes em série (como as
conhecidas trilogias), muitas vezes privilegiando gêneros de maior aceitação
popular, bem como a exploração das franquias dos filmes em outros produtos (livros,
CDs com trilhas sonoras, brinquedos, jogos de computador etc.). Todas essas
medidas são tomadas com motivações notadamente capitalistas, buscando
prolongar e potencializar a vida comercial de um determinado produto audiovisual e,
assim, compensar os gastos envolvidos na realização do mesmo.
Nos países ditos de terceiro mundo, as potencialidades comerciais do cinema
são geralmente pouco desenvolvidas, o que torna o investimento em filmes um
negócio ainda mais arriscado e de retorno muito mais incerto. Embora mesmo nos
países tidos como pólos de produção cinematográfica o apoio estatal seja
importante para concretização dos filmes, nos países periféricos a necessidade de
investimentos do Estado é bem mais acentuada – e as dificuldades de disputar
espaço com uma indústria forte e de tendências monopolistas como a dos Estados
Unidos complicam ainda mais uma atividade que já carrega em si mesma uma série
de empecilhos. Ao voltarmos nosso foco para as especificidades do cinema
brasileiro, muitas dessas questões apresentar-se-ão de maneira ainda mais
evidente.

1.2. DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL

Em seus estudos, Selonk (2004) propõe uma abordagem histórica da


distribuição de cinema no Brasil, dividindo-a em cinco fases:
a) a primeira (1896 – 1931) é marcada pela chegada de equipamento e idéias
cinematográficas ao País. Os distribuidores surgidos nesse estágio inicial trabalham
com filmes importados, produtos já acabados e de grande apelo junto ao público
devido a sua aura de novidade. O distribuidor é também responsável pela exibição,
e o contato com a filmografia estrangeira desperta em alguns brasileiros o desejo de
uma produção cinematográfica totalmente nacional;
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b) em seguida (1932 – 1946), surgem as primeiras leis dedicadas ao


audiovisual, e são criadas entidades como o Instituto Nacional de Cinema Educativo
(INCE) e o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que possuía um
Conselho dedicado ao cinema brasileiro. A distribuição do produto nacional ainda é
encarada de modo um tanto ingênuo – e é o estado que, por meio de medidas de
cumprimento obrigatório, fomenta a exibição dos filmes realizados no país;
c) na terceira fase (1947 – 1966), surge o Instituto Nacional de Cinema (INC),
com o objetivo de atender às necessidades de uma produção cinematográfica
crescente – e, teoricamente, regulamentar a entrada dos filmes estrangeiros no
Brasil. Começam a se sedimentar problemas que, infelizmente, subsistem ainda hoje
na distribuição do cinema nacional – como, por exemplo, a falta de interesse da
maior parte dos exibidores e a falta de impacto das estratégias de divulgação
anteriores e posteriores ao lançamento. Mesmo cineastas de repercussão
internacional, como Glauber Rocha e Walter Lima Júnior, conseguiam resultados
modestos nas bilheterias brasileiras, muito devido a esses problemas. É nesse
período que surge, finalmente, a noção da distribuição como grande problema do
cinema brasileiro, o que motiva as ações do período subseqüente;
d) a quarta fase descrita por Selonk (1967 – 1989) marca primeiramente um
comprometimento maior do INC na viabilização do cinema brasileiro, atuando com
atenção maior no nicho da distribuição. Surge a Embrafilme, primeiramente para
promover os filmes brasileiros no exterior, e mais tarde fomentando a produção e
distribuição do cinema brasileiro dentro do país. Muitas das maiores bilheterias da
história do cinema brasileiro ocorrem nesse período, o que pode ser visto como
indicativo de sucesso. Porém, a concorrência do produto estrangeiro é forte, e o
caráter muitas vezes paternalista do incentivo à produção acaba criando problemas
sérios de controle de qualidade e escoamento de recursos, que acabam corroendo o
modelo construído e provocando questionamentos a respeito de sua real eficácia;
e) O quinto e último período (que, para Selonk, vai de 1990 até 2002) é o que
mais interessa para os fins que buscamos atingir, de modo que nos deteremos mais
profundamente na análise do mesmo.
Em abril de 1990, um decreto do então presidente Fernando Collor de Mello
extingue a Embrafilme. A medida acaba sendo desastrosa para o cinema nacional,
uma vez que não há nenhuma espécie de transição e não são propostas alternativas
para o papel que a empresa desempenhava na realização e distribuição do cinema
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nacional. Muitas produções acabam tendo suas finalizações comprometidas pela


mudança repentina, e acabam restando inconclusas ou inéditas nos cinemas. Um
exemplo é o longa-metragem “Perfume de Gardênia”, que começou a ser rodado no
início dos anos 90, teve sua finalização interrompida quando da extinção da
Embrafilme e cujo projeto só seria retomado cerca de um ano depois, em co-
produção com a Argentina. O filme participou em 1992 de festivais como os de
Gramado (RS) e Brasília (DF), mas apenas em 1995 conseguiu chegar de fato aos
cinemas. Em um âmbito mais geral, podemos dizer que, em substituição aos
problemas causados pela falta de prestação de contas e pela formação de
“panelas”1, surgiram os problemas decorrentes da falta de apoio estatal e do total
abandono da produção cinematográfica brasileira à concorrência contra a indústria
estrangeira, muito melhor estruturada e com espaço garantido na imensa maioria
das salas de exibição.
O surgimento da Riofilme, em 1992, foi uma tentativa de achar um substituto
à Embrafilme no tocante a muitas de suas funções mais importantes. O órgão foi
criado por iniciativa da Câmara de Vereadores e da Prefeitura do Rio de Janeiro – e,
como explicam Almeida e Butcher (2003), dedicou-se em um primeiro momento a
uma espécie de “operação de salvamento” (p.38), trabalhando no sentido de
viabilizar a conclusão e o lançamento dos trabalhos interrompidos com o fechamento
da Embrafilme. No entanto, a Riofilme não pôde atuar diretamente nos mecanismos
de financiamento de novas produções, uma vez que seus recursos estavam ligados
à dotação orçamentária da Câmara de Vereadores e ao conseqüente trâmite
burocrático para a liberação dos valores em questão.
A partir da promulgação da Lei nº. 8.313 (que se tornou conhecida como Lei
Rouanet), o panorama começa a apresentar possibilidades de melhoria. A lei prevê
benefícios fiscais para pessoas físicas e jurídicas que façam investimentos em
atividades ligadas à cultura. Em 1993, já no governo de Itamar Franco, esse
mecanismo é reforçado com a Lei nº. 8.685 – a assim chamada Lei do Audiovisual.
Estabelecendo critérios para a escolha das produções que poderiam receber
incentivos e especificando os benefícios concedidos aos investidores que
1
Na realidade do cinema brasileiro da época, o termo refere-se ao favorecimento a determinados
realizadores quando da liberação de recursos para realização ou finalização de filmes. O
procedimento, além de obviamente dificultar a renovação e o estabelecimento de novos realizadores
audiovisuais, comprometia também a qualidade geral dos filmes, resultando mesmo em películas com
erros grosseiros de montagem ou falhas gritantes de direção – que acabavam depondo contra a
reputação do cinema nacional como um todo.
18

apostassem no audiovisual, a então nova lei potencializou os efeitos da anterior, e


ambas atenderam razoavelmente bem as necessidade do setor produtivo ligado ao
cinema.
A distribuição cinematográfica se beneficiou especialmente do artigo 3º da lei
do Audiovisual, que trata do abatimento de impostos para as empresas que invistam
na co-produção de materiais audiovisuais. Aos poucos, as majors estrangeiras
começaram a se envolver com a produção nacional, o que garantiu a vários filmes o
acesso a esquemas de divulgação e distribuição muito mais eficientes do que o
usual em nosso País. Paralelamente, um número crescente de empresas
independentes passou a se interessar pelos benefícios da Lei e a investir na
distribuição do cinema nacional.
Algumas medidas específicas para o formato de curta-metragem foram
experimentadas. Em 2006, o Ministério Público Federal sugeriu a regulamentação
do art. 13 da Lei nº 6281, de 1975, que obriga os exibidores a projetarem curtas-
metragens brasileiros antes de longas-metragens estrangeiros. Embora jamais tenha
sido revogada, a lei caiu em desuso, especialmente pela baixa aceitação do público
– como não eram previstos mecanismos de controle de qualidade, qualquer curta-
metragem era beneficiado pela lei, o que muitas vezes resultava em material de má
qualidade sendo exibido para um público que não tinha nenhum interesse inicial em
assisti-lo. Além disso, alguns dos próprios exibidores passaram a financiar filmes,
para não terem que pagar percentuais de arrecadação aos produtores
independentes, o que tornou a lei ainda mais ineficaz.
Se nos últimos anos não tivemos falta de interesse governamental na
melhoria de condições para a distribuição cinematográfica em território brasileiro, o
exemplo da Lei nº 6281 citado acima nos dá um indício das dificuldades envolvidas
em regulamentar um mercado dinâmico e imprevisível como o cinema. Faz parte do
trabalho do distribuidor lidar com esse percentual de incerteza – e, ao mesmo tempo
em que se faz necessário o uso das leis de incentivo, a busca de mercados
específicos e de produtos de maior potencial junto ao público acaba sendo parte
importante da atividade de um distribuidor.
Tomando como base os estudos de Octavio Getino, Aletéia Selonk propõe
uma divisão das empresas distribuidoras de cinema em atividade no Brasil em três
categorias. As empresas estrangeiras são filiais das majors norte-americanas, e se
concentram na distribuição nacional da cinematografia realizada especialmente nos
19

grandes centros de produção. Trabalham com divulgação em escala massiva, e


detém a maior parte dos espaços de exibição. As distribuidoras locais de filmes
estrangeiros, conhecidas como independentes, são formadas por capital local, e
trabalham basicamente com a aquisição de direitos de produções internacionais
realizadas fora dos grandes estúdios. Por fim, as empresas nacionais, que
trabalham especificamente com a produção realizada no Brasil. O trabalho de tais
empresas é difícil, especialmente pela falta de uma indústria cinematográfica forte
no país, e geralmente acaba restrita a iniciativas de cunho estatal, como as já
citadas Embrafilme e Riofilme (2004, p.20-22).
De qualquer modo, mesmo com a considerável melhoria no panorama
recente do cinema brasileiro, muitos realizadores – em especial os mais novos – não
encontram espaço adequado para o desenvolvimento de suas filmografias. As leis
de incentivo, embora sejam reconhecidas por seu papel na retomada do cinema
nacional, ainda recebem críticas por não preverem meios de fomentar mais
especificamente trabalhos de novos cineastas – afinal, como são as empresas que
decidem onde aplicarão os recursos que disponibilizam, acabam no mais das vezes
optando por realizadores consagrados ou por propostas mais conservadoras, que
supostamente têm maiores chances de sucesso de público e, consequentemente,
de projeção para o nome de seus patrocinadores. Por outro lado, as próprias salas
de exibição optam geralmente por filmes que tendem a receber maior aceitação do
público – e tudo isso acaba conspirando contra a renovação de cineastas e
produtores, tão necessária para a continuidade do cinema realizado no Brasil.
Constitui-se, portanto, uma grande quantidade de realizadores brasileiros sem
penetração no circuito tradicional de produção e exibição – e muitos deles, na busca
de alternativas que permitam a realização cinematográfica, acabam investindo em
tecnologias mais baratas ou de acesso mais livre do que o modelo clássico de
películas 35mm e salas de cinema. É nessa realidade que surgem e se
desenvolvem alternativas como a captação e edição de imagens em plataforma
digital e a divulgação ou distribuição de trabalhos via Rede Mundial de
Computadores – possibilidades não ignoradas pelo universo das majors, mas que
encontram utilização mais plena nas mãos de realizadores independentes de modo
geral.
20

1.3. DISTRIBUIÇÃO ATRAVÉS DA WEB

Em um primeiro momento, a Rede Mundial de Computadores não parece ter


impressionado a indústria do cinema, e só em tempos mais recentes a Internet
tornou-se de fato um foco de atenção do setor cinematográfico. Como
aprofundaremos logo adiante, a transmissão de dados via web é especialmente
problemática na questão de arquivos de vídeo, e disponibilizar filmes de longa
duração para exibição direta via Internet permanece ainda hoje uma possibilidade
remota e de difícil concretização. Além disso, assistir a um filme de quase duas
horas de duração através da tela de um computador pessoal parece ser uma opção
que desagrada à maioria dos usuários, sendo suportes como a televisão ou mesmo
o home theater opções bem mais comuns na hora de assistir a filmes.
É uma tendência da indústria de entretenimento a eliminação progressiva dos
suportes de conteúdo, como, por exemplo, na oferta de arquivos de áudio e
softwares para aquisição direta via Internet. Alguns grupos musicais de grande
expressão parecem aos poucos tentar adaptar suas atividades a essa situação –
como por exemplo o AC/DC, que incluiu em seus CDs um arquivo que permite
acessar o site da banda e obter conteúdo extra2, e o White Stripes, que
recentemente lançou seu novo trabalho também no formato pen drive3. Já a banda
de rock Radiohead lançou seu novo trabalho diretamente na Rede, e inova por
permitir que o próprio comprador decida o valor a pagar pelos arquivos referentes ao
lançamento. Quanto aos softwares, tornou-se procedimento comum das empresas
que o desenvolvem oferecer uma versão de avaliação para download gratuito na
Rede, passando depois a cobrar pela renovação ou pela ampliação das capacidades
do programa.
Estuda-se uma alternativa semelhante para o cinema digital. No momento, os
esforços estão voltados para a instalação de equipamentos capazes de receber
através de redes de transmissão o conteúdo para exibição nas salas de cinema. No
entanto, o consórcio batizado de Digital Cinema Initiative (DCI), organizado pelos
grandes estúdios para coordenar a eventual mudança do suporte película para o

2
Conforme visto no domínio <http://www.acdcrocks.com/>, 22 out. 2007.
3
Dispositivo móvel utilizado para o transporte de arquivos, que tem um princípio de funcionamento
semelhante ao hard disk (HD) de um computador.
21

digital, estabeleceu padrões de qualidade de imagem e de compressão de arquivos


muito além dos atualmente alcançados pela tecnologia disponível, travando
temporariamente a expansão do cinema digital. Luiz Gonzaga Assis de Luca, Doutor
em Ciências da Comunicação pela USP, interpreta essa ação do DCI como uma
atitude consciente das majors no sentido de ter mais controle sobre as inovações
tecnológicas aplicadas ao cinema e de postergar o quanto possível a exibição
cinematográfica digital (2004, p.256).
No entanto, se a transmissão direta é pouco provável em um futuro próximo, o
download de arquivos tornou-se uma ameaça preocupante para toda a indústria do
entretenimento – e o cinema tem sentido de modo crescente o impacto desta
realidade. Arquivos de vídeo de longa duração são disponibilizados por usuários em
programas de compartilhamento baseados nas tecnologias peer to peer (P2P) e
torrent, sendo de acesso relativamente simples e de controle muito difícil para os
detentores dos direitos legais das obras copiadas. Softwares de compressão de
vídeo como o DivX e o Microsoft Windows Video permitem a criação de arquivos
que, embora não alcancem padrões industriais de qualidade, ocupam menor número
de dados e mantêm qualidade de imagem e som suficientes para o consumo
doméstico, o que potencializa ainda mais a troca deste tipo de arquivos via Internet.
No entanto, e apesar de algumas visões pessimistas, é interessante apontar
que o mercado de filmes em DVD vive um momento de crescimento, tanto no Brasil
quanto em boa parte dos mercados internacionais. No território brasileiro, a
aquisição de cópias em DVD para consumo doméstico no ano de 2005 cresceu 60%
em comparação com o ano anterior, enquanto o comércio de cópias destinadas para
locação simplesmente dobrou no espaço de um ano. Esse bom momento encontra
respaldo em outros setores, como o de equipamentos de home vídeo, que
apresentou crescimento de vendas de 70% a 80% no ano de 2005.
Embora os dados pareçam ir de encontro ao cenário de perdas alarmantes
que muitas vezes é associado à pirataria digital e ao crescimento do
compartilhamento de arquivos via Internet, é importante analisarmos alguns detalhes
relacionados a essa conjuntura. Não podemos ignorar, por exemplo, a queda dos
preços dos eletrodomésticos em geral e dos aparelhos eletrônicos em particular, que
sofreram em 2005 uma deflação de 9%. Isso pode ser interpretado como um
indicativo do aumento de poder aquisitivo das camadas mais baixas da população
brasileira, que potencializa a compra de aparelhos eletrônicos e, por conseqüência,
22

de DVDs para uso doméstico ou locação. O quanto esse momento de crescimento


pode ser afetado pela disseminação dos computadores pessoais e do acesso à
Internet é uma incógnita. De qualquer modo, estudos divulgados através de sites de
notícias como o UOL afirmam que o crescimento do número de brasileiros com
acesso à web é sensível nos últimos anos, embora o percentual ainda seja inferior
ao de países como Suécia, Austrália e Estados Unidos.
Outro aspecto que nos parece não poder ser ignorado é a modificação dos
hábitos do consumidor de cinema de modo geral. A sala de cinema, antes uma
alternativa de lazer coletivo dotada até mesmo de certa nobreza, tornou-se uma
opção cara e parece cada vez menos atraente para os espectadores na hora de
assistir filmes. A locação de um DVD custa, comparativamente, muito menos do que
um ingresso para uma sala de projeção – e não somente em valores absolutos: os
custos de um DVD para assistir em casa podem ser divididos entre várias pessoas,
podendo todas elas assistir ao mesmo filme sem gastos adicionais, o que é
impossível no caso de entradas para uma sessão de cinema. Além disso, os gastos
de ir a uma sala de exibição vão além dos custos da entrada, envolvendo transporte
de ida e volta (incluindo-se possivelmente a necessidade de pagar por
estacionamento) e consumo de gêneros alimentícios (pipoca, refrigerantes, balas
etc.), gastos que podem ser amortizados com a opção de assistir ao filme em casa,
ao lado de familiares ou amigos. Os benefícios do espetáculo na sala de projeção
são quase todos de cunho técnico (imagem de alta definição, som estereofônico de
grande potência) e simplesmente não são capazes de atrair a maioria dos
consumidores de cinema, que se satisfaz com as comodidades de assistir a filmes
no ambiente doméstico, mesmo que com padrões técnicos de menor qualidade.
Podemos interpretar, então, o aumento constante nas locações de filmes, a
venda acentuada de equipamentos de home theater e, mesmo, o crescimento do
número de downloads não-autorizados de filmes pela Internet como indicativos
diferenciados de uma mesma realidade. Parece estar em curso uma mudança no
perfil do consumidor de cinema de modo geral – um consumidor que, embora
continue gostando de assistir a filmes, não se sente mais atraído pelas sensações
produzidas em uma sala de cinema, e opta sem remorsos por alternativas mais
práticas ou mais baratas na realização de tal atividade de lazer. Em apoio a essa
idéia, é interessante notar que são justamente os assim chamados blockbusters –
filmes de menor conteúdo intelectual e que utilizam mais intensamente os efeitos
23

sonoros e visuais realçados nas salas de exibição – os que ainda mobilizam maiores
fatias de público e que rendem lucros mais significativos aos exibidores. Atualmente,
são esses produtos os que garantem as maiores bilheterias nas salas de cinema –
compreensível, portanto, que sejam os que recebem investimentos mais vultosos
para sua realização e divulgação.
Ainda que não seja vista pelas grandes produtoras e distribuidoras como uma
“janela” nos mesmos moldes da televisão ou da indústria de DVDs, a Internet tem
sido utilizada nos grandes mercados especialmente como uma ferramenta de
divulgação das produções cinematográficas. Um grande número de sites adota o
cinema como seu tema principal, e acabam servindo como espaço para a divulgação
das produções recentes dos grandes estúdios, apresentando chamadas
publicitárias, notícias e fotos de bastidores e de sets de filmagem. Uma breve
procura através de ferramentas de busca listará literalmente centenas de sites
dedicados ao cinema, não só em suas realizações mais recentes como também no
resgate de antigas produções e até mesmo funcionando como bancos de dados. Um
dos mais conhecidos e acessados sites sobre cinema é o Internet Movie Database
(ou IMDb) – que, embora lide com notícias e informações sobre filmes recentes, tem
como principal chamariz a inclusão quase enciclopédica de fichas técnicas e outros
dados relativos a centenas de milhares de filmes, oriundos de todas as épocas e de
praticamente todos os países do globo.
Além disso, ocorre na Rede a divulgação de teasers (pequenas chamadas de
cerca de trinta segundos, com imagens de filmes ainda em produção) e de trailers,
antes restritos às salas de exibição e que agora são apresentados também na
Internet. Com isso, um número maior de pessoas é atingido do que seria possível
apenas com a veiculação na abertura das sessões tradicionais. O portal da empresa
Apple, especializada em produção de computadores e sistemas ligados à Internet,
possui uma extensa seção dedicada à exibição de trailers, enquanto domínios como
o ComingSoon.net o Movie-List.com especializaram-se na hospedagem de
conteúdos semelhantes, com boa aceitação dos usuários. No Brasil, o site Omelete
– que não se limita ao cinema, hospedando conteúdo ligado à cultura pop em geral –
oferece a visualização de trailers de produções ainda inéditas no País, enquanto
provedores de Internet como o Terra e o UOL oferecem em suas páginas variadas
opções para quem deseja assistir a esse tipo de conteúdo. Essa política segue de
certo modo a lógica dos trailers incluídos no início das fitas VHS, e lida mais
24

diretamente com o formato audiovisual do cinema, sendo atualmente uma das


grandes ferramentas das majors na divulgação de suas realizações4.
Paralelamente, novas associações de conteúdos surgem como mecanismos
de divulgação cinematográfica, aumentando ainda mais a abrangência da Internet
como meio de incentivo ao consumo de filmes, bem como ampliando
consideravelmente as possibilidades de lucro das realizações dos grandes estúdios
de cinema. Além dos já citados teasers – que, de certo modo, tomam emprestado o
formato dos comerciais de televisão, adaptando-o às especificidades tanto do
produto divulgado quanto do suporte utilizado na divulgação – surgem alternativas
talvez ainda mais engenhosas, como a associação do cinema ao universo dos jogos
de computador (games). Tal associação se dá em duas frentes. Por um lado, há
uma associação dos enredos e personagens de realizações cinematográficas a
jogos de computador, muitas vezes com os roteiros dos filmes já sendo planejados
no sentido de permitirem uma extensão dos mesmos em forma de games. Os jogos,
explorando tramas paralelas ou desenvolvendo histórias ligadas a personagens
carismáticos de realizações financiadas pelas majors, são não raro produzidos
juntos com os filmes dos quais são derivados, quando não lançados conjuntamente
com os mesmos. Uma segunda utilização, talvez menos impressiva, porém mais
diretamente ligada a nosso objeto de estudo, se dá por meio da inclusão de jogos
nas páginas de divulgação de filmes recém lançados ou de lançamento previsto para
um futuro próximo. São mais simples do que os games destinados a lançamento
comercial, mas funcionam de modo próximo aos trailers e teasers, antecipando
características dos roteiros ou dos personagens dos filmes que os inspiram. Além
disso, podem servir também para gerar meios diferenciados de interação com o
público – como, por exemplo, no site de divulgação do filme “Os Simpsons”, que
oferece uma ferramenta que permite a qualquer usuário criar um avatar de traços
semelhantes aos personagens do desenho animado5. Como parte da estratégia de

4
O papel dos trailers foi, sem dúvida, redefinido de forma profunda pelo advento das tecnologias
digitais e pela popularização da Internet, sofrendo praticamente uma reinvenção em suas atribuições
e funcionalidades. Atualmente, nos parece possível falar de uma estética dos trailers, bem como do
surgimento e gradativa consolidação de um público específico, que consome os trailers não apenas
como uma antecipação das salas de cinema, mas praticamente como um produto cultural encerrado
em si mesmo. Isso para não citarmos o surgimento e consolidação dos teasers, praticamente
impensável no tempo das salas de exibição e da locação de fitas VHS. É um panorama de grande
atualidade, que tem sido negligenciado pelos meios acadêmicos – e que, embora não seja alvo do
trabalho que ora desenvolvemos, é merecedor de uma apreciação mais detida pelos estudiosos de
cinema e de Internet.
5
Conforme visto no domínio <http://www.simpsonsmovie.com/main.html?cid=br> em 11 nov.2007.
25

divulgação, foi levantada inclusive a possibilidade de utilização dos avatares criados


pelos visitantes da página em futuros episódios do seriado de televisão.
Já os produtores independentes, que desenvolvem seus trabalhos fora do
domínio das grandes empresas, encontram na web novas alternativas para a
superação de dificuldades inerentes ao seu trabalho. Ao contrário das grandes
empresas de cinema, que parecem temer as aplicações diretas da Internet sobre
seus produtos e optam por fazer uso da Rede apenas como mecanismo de
divulgação, o cinema independente utiliza as potencialidades do mundo virtual de
maneira bem mais ativa, associando a web diretamente aos processos criativos e de
distribuição de seus produtos. A exibição de vídeos diretamente na Rede, principal
motivador de nosso estudo, nada mais é que uma manifestação crescente de tal
realidade – um verdadeiro nicho que surge quase sem alarde, mas que se mostra
cada vez mais atraente para diretores e produtores localizados do lado de fora dos
grandes estúdios.
Como as tecnologias de streaming6 são relativamente recentes e se
encontram em pleno desenvolvimento, a visualização direta de materiais
audiovisuais de longa duração ainda é pouco prática e de difícil aceitação para os
usuários de Internet. Além do mais, é amplamente associada ao ambiente virtual a
idéia de brevidade, de rapidez de acesso e de alta variedade de conteúdos –
conceitos que, à primeira vista, parecem distantes de um filme de longa-metragem,
que demanda muitos minutos de atenção direta e exclusiva de quem quer que se
disponha a assisti-lo. Por tudo isso, parece natural que a linguagem e o formato dos
curtas-metragens se adapte muito melhor às potencialidades da Internet, e que a
esmagadora maioria dos realizadores opte por produções simples e pouco extensas
na hora de associá-las a esse ambiente virtual. Do mesmo modo, pelo simples fato
de se tratar de um ambiente novo e diferenciado para a exibição de produtos
audiovisuais, não causa estranheza o fato de muitos desses vídeos serem
enquadrados dentro do que chamaríamos de gênero experimental, rompendo em
diferentes níveis com as linguagens e os padrões estéticos tidos como “típicos” no
cinema tradicional. Desnecessário dizer que tais características se mostram ainda
mais atraentes quando aplicadas a um mercado cinematográfico como o brasileiro,
que enfrenta desde sempre problemas estruturais e cujo acesso aos grandes meios

6
Tecnologia que permite o envio de dados multimídia através da Internet, muito utilizada em arquivos
envolvendo áudio e vídeo.
26

de produção e exibição é ainda mais restrito do que em territórios onde a indústria


do cinema se encontra mais consolidada.
Para avançarmos no sentido de compreender este novo ambiente de
realização e veiculação de conteúdo audiovisual, nos parece igualmente impreterível
um esforço de compreensão do suporte onde essas experimentações e inovações
tomam forma – a Internet propriamente dita. No capítulo seguinte, deteremos nosso
olhar sobre o mundo virtual, tentando abarcar pelo menos parte das incontáveis
características de um meio marcado pela multiplicidade de possibilidades que
oferece. Assim procedendo, esperamos clarear um pouco nossa visão não apenas
do espaço onde as novas alternativas de realização e distribuição se processam,
mas também daqueles que delas fazem uso – e, por que não dizer, nossa visão a
respeito daqueles que a esse espaço recorrem em busca de emoção, reflexão e
entretenimento.
27

2. INTERNET: UMA NOVA DIMENSÃO DO HUMANO

A Internet é um mercado em crescimento, e a sua presença está se tornando


realidade para um número cada vez maior de brasileiros. Dados de 2006, fornecidos
pelos provedores brasileiros de acesso à Internet, revelam que 32,8 milhões de
computadores utilizam serviços de rede no Brasil, sendo que 6,95 milhões são
usuários de conexões de banda larga, mais adequadas aos processos de exibição
de vídeo que nos propomos a estudar. Estimativas dão conta de que cerca de 30
milhões de usuários brasileiros podem acessar a Internet em suas próprias
residências, sem recorrerem a terminais públicos como os disponíveis em centros
comunitários e universidades. Ou seja, mesmo que pessoas de camadas mais
humildes da população sejam capazes de acessar a Internet, o fato é que a maioria
dos usuários pertence às classes média e alta – incluindo aí quase a totalidade dos
usuários de banda larga.
Embora as tecnologias em rede não sejam fruto de um acontecimento abrupto
e sim de décadas de pesquisa, a verdade é que a Internet ainda é capaz de
surpreender quando contemplada por um olhar crítico, e oferece dilemas
insuspeitados para quem busque analisá-la academicamente. Muito devido às
mudanças constantes que caracterizam a web, ainda é pouco volumosa a
bibliografia referente ao assunto, e a formação de um olhar teórico sobre a questão
acaba oferecendo algumas dificuldades. A abrangência da Internet segue em
expansão, e boa parte da população apenas agora começa a experimentar os
efeitos dos processos em rede. Não surpreende, portanto, que a reflexão acadêmica
sobre a Internet feita até aqui acabe refletindo essa contemporaneidade, focando-se
muito mais sobre aspectos gerais da tecnologia digital e da World Wide Web do que
exatamente nas implicações dessas tecnologias na sociedade atual.
De qualquer modo, é Manuel Castells (2004), sociólogo espanhol autor de
mais de vinte livros e respeitado por seus estudos sobre organizações sociais na
Internet, quem contribui com um conceito simples, mas fundamental: a Internet,
muito mais do que uma perspectiva de futuro, é uma realidade que atua diretamente
em nossa vida cotidiana.
28

Internet é o tecido de nossas vidas neste momento. Não é futuro. É


presente. Internet é um meio para tudo, que interage com o conjunto da
sociedade e, de fato, apesar de tão recente em sua forma societária [...]
não precisa de explicação, pois já sabemos o que é Internet (CASTELLS,
2004, p.255).

É uma visão que, a despeito de sua quase singeleza, influi profundamente no


desenvolvimento de análise aqui apresentada. Não é de nosso interesse descrever a
evolução das tecnologias digitais, traçar percursos históricos ou procurar prever os
desdobramentos futuros da web: acreditamos que muitos autores já o fizeram com
maior propriedade e que pouco teríamos o que acrescentar a tais estudos neste
momento. Optamos, então, por uma observação mais detida dos processos
envolvendo a Internet, das relações que a sociedade estabelece tanto
conjuntamente quanto em resposta a esses processos – o que, acreditamos, é muito
mais pertinente para a abordagem de nosso objeto de estudo. A partir daí,
teceremos considerações sobre o tratamento que a imagem recebe na era virtual,
tratando tanto de conceitos mais gerais quanto dos processos de vídeo
propriamente ditos.

2.1. PROCESSOS BÁSICOS

Uma característica marcante da Internet, e possivelmente uma das maiores


responsáveis pelo sucesso dos sites de vídeo, reside na possibilidade de interação
entre o usuário e o conteúdo acessado, muito mais ampla do que a dos meios de
comunicação anteriores. Há um processo intenso de construção, de conexão de um
conteúdo com vários outros conteúdos, uma reconstrução baseada em critérios
subjetivos e eternamente inacabada. Em muitas situações, o usuário torna-se ele
mesmo provedor de conteúdo e não apenas um mero espectador. É a esse
processo que Pierre Lévy, filósofo francês que há anos se dedica a estudar os
fenômenos sócio-culturais relativos à Internet, chama de hipertexto (1996, p.36).
O trabalho de Lévy aplica-se mais especificamente à problemática dos blogs
e da interatividade textual. No entanto, nos parece não só viável como oportuno
associar as considerações do autor aos nossos estudos sobre a distribuição de
vídeo via Internet. Segundo ele, a intertextualidade é uma característica que não
29

surgiu com a tecnologia digital, mas que existe desde o surgimento da linguagem –
afinal, a qualquer conteúdo que absorvemos se aplica nossa bagagem intelectual,
nossa capacidade interpretativa, e se estabelece uma série de ligações com
conhecimentos e conceitos que trazemos conosco desde antes deste contato inicial
(1996, p.36-37). O extraordinário da Internet estaria na capacidade de potencializar
essa relação, processo que só se torna efetivo na medida em que o elemento
subjetivo da interpretação humana é inserido no processo tecnológico que
disponibiliza os conteúdos. Seria, no caso, ler o que se quer ler, na ordem em que
se deseja e na lógica de conteúdo de nossa preferência – um processo, parece-nos
oportuno frisar, não inédito, mas potencializado pelos links e pelo websurfing7 de
maneira que nenhum outro aparato tecnológico havia conseguido anteriormente.
A aplicação da lógica do hipertexto no processo funcional dos domínios
dedicados à reprodução de vídeos é mais clara, talvez, do que parece a princípio.
Não mais é o espectador uma pessoa que apenas assiste a programas dentro de
uma grade de possibilidades e preso à disponibilidade de tempo: ele pode selecionar
o que deseja em um leque de opções muito mais amplo, na hora que for mais
propícia para si, e através de links pode entrar em contato com vários conteúdos que
não tencionava assistir, ou nem mesmo sabia que estavam à sua disposição. Além
disso, passa a ser oferecida a possibilidade de ele mesmo postar vídeos e criar
links, ligando esse material a outros conteúdos. Estabelece-se um processo
constante de escolha, de seleção ativa da informação com participação direta e
fundamental do usuário:

[...] a partir de um estoque de dados iniciais, de um modelo ou de um


metatexto, um programa pode calcular um número indefinido de diferentes
manifestações visíveis, audíveis e tangíveis, em função da situação em
curso ou da demanda dos usuários. Na verdade, é somente na tela, ou em
outros dispositivos interativos, que o leitor encontra a nova plasticidade do
texto ou da imagem [...] A tela informativa é uma nova “máquina de ler”, o
lugar onde uma reserva de informação possível vem se realizar por
seleção, aqui e agora, para um leitor particular. Toda leitura em
computador é uma edição, uma montagem singular (LÉVY, 1996, p.41).

A navegação por sites pode, à primeira vista, lembrar o movimento errático do


zapping na televisão, uma série alienada de troca de canais em que o espectador
não estabelece nenhum tipo de ligação com o conteúdo que passa diante de seus

7
Hábito de “navegar” pela Internet, acessando uma série de páginas em uma mesma sessão.
30

olhos. No entanto, compartilhamos da visão de Lévy, que atribui ao leitor do


hipertexto um papel muito mais participativo e decisivo. De fato, a navegação na
Internet sempre se inicia a partir do interesse específico do usuário, que escolhe
qual tipo de conteúdo (e-mail, notícias, entretenimento, salas de bate-papo etc.)
deseja acessar. A partir daí, uma série de novos conteúdos são oferecidos a cada
novo link escolhido, oferecendo uma gama de opções muitas vezes insuspeitada e
que muda permanentemente ao sabor das iniciativas do próprio usuário, que vai
decidindo por si mesmo o caminho a seguir. Eis, nos parece, uma diferença
importante para a simples troca de canais em uma TV: a mudança de um programa
de esportes para um seriado ou para um filme não se dá mecanicamente, e sim por
meio de escolhas, nas quais o papel do espectador deixa de ser passivo e passa a
ser fundamental.
A participação do usuário descrita acima encontra uma correspondência na
variedade cada vez maior de conteúdos disponíveis para acesso direto via web.
Dominique Wolton, cientista político francês e pesquisador do Centro Nacional de
Pesquisas Científicas da França, elabora em seu trabalho de 2003 uma divisão dos
conteúdos da Internet em quatro categorias:
a) serviços (divulgação de eventos, meteorologia, catálogos, sites de busca
etc.);
b) lazer (jogos interativos, sites que oferecem conteúdos em áudio e vídeo);
c) informação-notícia (em especial a fornecida por jornais e agências de
notícia on line);
d) informação-conhecimento (bancos de dados e sites de informação
enciclopédica como o Wikipedia).
Para efeitos de nossa análise, a segunda categoria (lazer) é a mais
significativa, embora, à época da publicação da sua obra, Wolton considerasse o
vídeo na Internet um processo que, “devido a problemas técnicos, continua em
estado embrionário” (2003, p.91). Retornaremos a Wolton e seus questionamentos
de todo o tipo muito em breve.
É essa diversidade de conteúdos e possibilidades que leva um número
considerável de teóricos a enxergar na Internet, mais do que uma nova mídia, um
novo meio de integração social. Manuel Castells é talvez o autor que mais longe foi
na questão, ao ponto de desenvolver o já consideravelmente conhecido conceito de
“sociedade em rede”, o que ele fez em ao menos dois textos (1999 e 2004). No
31

centro de tal conceito encontra-se a idéia de que a Internet é muito mais do que uma
tecnologia ou uma mídia, sendo na verdade um elemento capaz de concentrar em si
“os processos sociais, os interesses sociais, os valores sociais, as instituições
sociais” (2004, p.286). Trata-se de uma série de relações constituídas em círculos
virtuais, com dimensões e instituições que transcendem o tempo e o espaço (1999,
p.427), nas quais se baseia nada menos do que uma nova forma societária. De
modo mais claro, a Internet seria o suporte para uma série de relações sociais dos
mais variados tipos – pessoais, econômicas, políticas, culturais – protagonizando ou
potencializando modificações em todas essas áreas. Praticamente todas as esferas
da atividade humana seriam contempladas, em diferentes níveis, pela Internet, e é
tal abrangência que concederia à Rede o caráter de modelo organizacional de nossa
sociedade atual.
Em nível econômico, a Internet influencia em dois sentidos. Por um lado, o
centro da economia mundial está ligado aos mercados financeiros globalizados, nos
quais as conexões entre computadores exercem papel preponderante – uma relação
que, embora não necessariamente inserida na web, converge para ela (2004, p.269-
270). Por outro, a Rede acaba influenciando também os meios de valoração
econômica, através das transações baseadas em capital de risco – muitas vezes
sustentadas em idéias que usam a Internet como veículo ou suporte fundamental.
Podemos citar brevemente as empresas Google e Yahoo! como exemplos visíveis e
bem-sucedidos desta associação.
Em nível social, movimentos utilizam a World Wide Web como forma de ação
e organização, aproveitando as características da Rede para a criação e
sustentação de entidades que, ao mesmo tempo em que são estruturalmente
flexíveis, contém em si a organização e a mobilização necessárias para sua
manutenção. Apesar de admitir a idéia de que a Internet desenvolve modos
particulares de exclusão social (como, por exemplo, a divisão entre os “que têm” e
os “que não têm” acesso à Internet), Castells considera que a situação está em
processo de mudança – e atribui ao ambiente virtual a capacidade de articular
movimentos alternativos locais e a união de comunidades que usam de forma
correlata a sociabilidade real e a virtual. Da mesma forma, contesta Castells a noção
de que a Internet seria um ambiente superficial, onde se fala de qualquer coisa e se
permite a proliferação de todo o tipo de bobagem e mesquinharia. Para o autor, não
é a Internet que é tola em si mesma; é seu caráter absolutamente livre, capaz de
32

potencializar todos os tipos de relação social, que acaba permitindo que se


propaguem também as tolices e as atitudes mal intencionadas – ao lado de variados
tipos de utilização instrumental da Internet, tão ou mais presentes do que as
frivolidades, mas levados bem menos em consideração pelos críticos da Rede.
Deixemos claro que, na visão de Castells (2004), as relações sociais atingidas
pela web não surgem com as novas tecnologias, sendo reflexo de mudanças
históricas vivenciadas pela sociedade. Porém, o autor defende que essas
modificações só são possíveis a partir do advento da Internet, e que seriam
inimagináveis sem a sua existência. De fato, o autor chega a comparar o novo
paradigma ao surgimento de fábricas e grandes corporações no começo da era
industrial (2004, p.287).
Do mesmo modo, nos estudos de Castells a Internet pode potencializar
comportamentos, mas não os modifica, senão acaba sendo modificada por eles.
Relações de afinidade geradas por convergência de interesses sempre existiram; o
que a World Wide Web permite é um intensificação de tais laços, um aumento de
abrangência e uma série de possibilidades para sua manutenção. Castells associa a
isso o que ele chama de privatização da sociabilidade: diminui a importância do
relacionamento de bairro, das ligações geradas pela vizinhança física, e são cada
vez mais formadas redes pessoais, com pessoas que compartilham de interesses
particulares, mesmo que a distância física entre elas seja muito grande para permitir
a convivência diária. Do mesmo modo que se busca conteúdo na Rede, se busca
pessoas ou grupos de pessoas – e, tanto quanto no caso do hipertexto, essa busca
é não-alienada, movida por nada menos que os próprios interesses do usuário.
Lucia Santaella é outra autora a abordar, em pelo menos dois trabalhos
distintos (1997, 2003), o mundo virtual como responsável por uma nova ordem para
as sociedades humanas. No entanto, se Castells aborda a Internet como modelo de
organização social em todos os níveis, Santaella prefere lançar seu olhar
especificamente sobre as implicações da virtualidade e da multimídia sobre a própria
condição humana. Trabalhando com a idéia de modos culturais, a autora afirma
estarmos vivenciando um período de “cultura digital”, no qual a interação entre
homem e máquina é cada vez mais profunda e de conseqüências e desdobramentos
imprevisíveis. Trata-se, na verdade, de um processo iniciado ainda na época
denominada “cultura de massas”, tendo passado também pela “cultura de mídias”.
Enquanto a primeira se basearia na transmissão de um número limitado de
33

mensagens simultâneas a uma audiência idealmente massificada, a segunda


trabalharia no sentido de multiplicar as mensagens possíveis, segmentando públicos
e aumentando as possibilidades interativas do receptor. A cultura digital, no caso,
ampliaria decisivamente a participação do receptor no processo, não só
potencializando a segmentação como levando mesmo à imersão do humano dentro
da máquina. No centro dessa profunda mudança, o virtual, e sua capacidade de
aglutinar inúmeras manifestações em uma só: de fato, ao contrário da convivência
de mídias distintas e pouco intercambiáveis entre si que caracterizaria a cultura de
mídias, temos uma convergência de mídias ao mesmo ponto, um espaço onde todas
convivem e acabam por tornarem-se, no fundo, uma só (2003, p.17).
O processo de cultura digital que, segundo Santaella, estamos vivenciando
implica uma conseqüência talvez perturbadora em um primeiro momento: a de que a
imersão do humano dentro do virtual está não só modificando nossa relação com as
máquinas, como causando uma redefinição do próprio conceito de humano. Se
desde o início da era industrial utilizamos as máquinas como instrumento, aos
poucos fomos aplicando conceitos sensoriais sobre o funcionamento e utilização de
tais mecanismos, tornando-os até certo ponto extensões de nossos órgãos de
sentidos. Para a autora, estamos neste exato momento avançando para um estágio
além: a utilização de softwares, interfaces, conexões de rede e todos os tipos de
ferramentas interativas estão derrubando as fronteiras entre máquina e humano,
fazendo com que a primeira atue como extensão cognitiva e sensorial do segundo.
Santaella denomina estes mecanismos como “máquinas cerebrais”, que não mais
buscam ampliar capacidades motoras ou sensoriais, mas sim atuam como
extensões de processos mentais humanos, como o processamento de dados e a
memória (1997, p.41-42). A Internet, portanto, é uma das manifestações de um novo
estágio, onde as redes de dados potencializam o avanço em direção a um processo
de fusão entre o homem e a máquina – uma redefinição não só social, mas que
avança ainda além, em direção ao pós-humano.
Mas, e quanto ao contraditório? O que pode ser contraposto a tais
interpretações superlativas da web e de seu impacto sobre o homem? Na busca de
uma visão diferenciada da Rede e de suas potencialidades, nos reportaremos aos
estudos de Dominique Wolton (2003), autor que mantém uma posição de
questionamento quanto ao caráter revolucionário das tecnologias virtuais. Com
efeito, Wolton chega a questionar a própria natureza da Internet, ao afirmar que
34

“quanto ao que é essencial a Net não é uma mídia” (2003, p.101) e ao designá-la
como um sistema de transmissão de informações – talvez mais eficiente do que a
maioria dos outros, mas que não os tornaria obsoletos pelo simples fato de superá-
los de algum modo. ‘Mídia', segundo o autor, é um conceito que remete a uma
relação de emissor e público, o que não ocorreria necessariamente na Internet, cujo
maior potencial acaba sendo o de transmitir e permitir acesso a informações de todo
o tipo. Explicando de outra maneira, a Internet não definiria a priori um público -
posto que qualquer pessoa com acesso à rede, de qualquer cultura ou função social,
poderia em teoria acessar qualquer informação - enquanto um dos pontos
constituintes de uma mídia seria justamente a definição de um público.
Questão igualmente pertinente refere-se ao tipo de diferenciação social que a
Internet, na visão de Wolton, acaba por promover. Para o autor, a democracia no
acesso à informação é apenas aparente: embora teoricamente todo o conteúdo da
Internet possa ser acessado por todos os usuários, o uso das ferramentas para
localização da informação e a própria interpretação que se faz dela acabam sendo
tolhidos pela necessidade de especialização. Vistos por essa ótica, meios mais
“arcaicos” como o rádio e a televisão seriam até mais democráticos, pois pelo menos
ofereceriam o mesmo conteúdo a todos os usuários indistintamente (2003, p.96).
Segundo o autor, é real o risco de se criar uma nova e até mais perigosa forma de
segregação social através da Internet, causada:
a) pela capacidade financeira – em um sentido no qual o acesso ao conteúdo
informativo seria mais simples ou mais pleno para as pessoas que possuíssem o
maquinário mais avançado ou os recursos para pagar pela informação –;
b) pela segmentação social – apresentando informações de um modo que
apenas determinados estratos possam compreender plenamente;
c) pela dificuldade de acesso para determinadas regiões geográficas ou
classes sociais.
São preocupações constantemente presentes na argumentação do autor, e
que oferecem um claro contraste com a visão por vezes quase idílica oferecida por
outros teóricos.
Wolton questiona com firmeza a visão esperançosa muitas vezes aplicada
sobre a Internet. Embora admita o potencial da web na disseminação de
informações e atribua ao mundo virtual a capacidade para sediar novas formas de
solidariedade, é defendida em seus trabalhos a idéia de que o grande objetivo da
35

Internet é de natureza comercial. Isso se aplica tanto à renovação constante das


tecnologias digitais, que incentiva um consumo contínuo sem que o consumidor faça
qualquer reflexão sobre a utilidade real dos novos produtos, quanto ao próprio
conteúdo da Internet, direcionado ao comércio eletrônico e ao reforço dos
mecanismos da economia global. É uma visão notadamente diferente da de teóricos
como Castells (2004), que afirma que a Internet surge sem interesses comerciais e
não é vista por seus empreendedores como uma possibilidade de lucro. Para
Wolton, a idéia da web como um espaço quase utópico de relações sociais
desinteressadas é até mesmo maléfica, pois inibe as movimentações no sentido de
regulamentar o uso da Rede. Por ser um meio gerido por interesses financeiros, a
Internet teria necessariamente que ser submetida a mecanismos de controle – e a
visão atualmente aplicada sobre a Internet acabaria por tolher a discussão sobre tal
tipo de medida, favorecendo aos grupos econômicos que a utilizam para a obtenção
de lucros cada vez maiores.
Wolton não nega o potencial democrático da Internet, e admite mesmo que
ela se presta a várias utopias modernas, dizendo ser justo que as novas gerações
se abracem a elas e tentem através da Rede algum tipo de redenção em escala
mundial. Mas adverte:

A Web não cria nenhum conceito novo. Ela oferece, por outro lado, uma
extensão considerável tanto à informação narrativa quanto à informação
funcional (...) Simplesmente, na web está tudo misturado em proporção ao
extraordinário volume de informações e de comunicação que ela gera
(WOLTON, 2003: 102-103).

Em resumo, fica bastante clara a amplitude das discussões e a variedade de


opiniões que a Rede e seus mecanismos têm despertado no mundo das idéias.
Parte de seu fascínio está inclusive nisso mesmo: por ser um elemento em
constante mutação, modificam-se também os paradigmas, e multiplicam-se os
pontos de vista e as possibilidades de abordagem. Mesmo porque a Internet
abrange boa parte das manifestações humanas, promovendo modificações em
todas elas e reforçando ainda mais seu caráter multifacetado. Na área da produção
e reprodução de imagem (que, por motivos evidentes, é a que mais nos interessa no
presente trabalho), isso se manifesta em variados níveis, provocando efeitos muitas
vezes inesperados.
36

2.2. A IMAGEM NA INTERNET

Para caracterizar de maneira clara e não muito extensa o progresso da


imagem em sua apreciação pelo homem, citemos primeiramente Edmond Couchot
(1993) e seus estudos sobre o conceito de imagem aplicado às tecnologias virtuais.
Segundo o autor, desde a Renascença há um esforço continuado no sentido de
automatizar a produção de imagens, de decodificá-las até um elemento mínimo que
permita sua reprodução fiel e sua disseminação. Teria sido este objetivo o
responsável pela idéia de perspectiva de projeção central, fundamental para toda a
arte renascentista – que aponta, além da tendência à automatização, para a
utilização de recursos matemáticos para a sistematização da produção imagética. A
chegada do processo fotográfico, por seu turno, implicaria, pela primeira vez, na
produção de imagem sem uma intervenção manual sobre o suporte no qual ela
surge.
O cinema e, posteriormente, a televisão evoluíram no sentido da captura do
movimento – e, no caso do segundo, também na transmissão da imagem via a
redução da mesma a elementos cada vez menores. A televisão, por exemplo, torna
possível a reprodução da mesma imagem em lugares muito diferentes por meio do
ordenamento correto de feixes de luz no que Couchot descreve como “uma espécie
de mosaico luminoso” formado por pontos vermelhos, verdes e azuis ordenados por
síntese aditiva (1993, p.38). Em resumo, a imagem da televisão consiste
basicamente em um mesmo ponto de luz, que varia de cor e de intensidade no
decorrer de sua trajetória pelas linhas da tela do televisor, criando assim o registro
que nossos olhos compreendem como imagem. No entanto, são a era virtual e a
lógica dos computadores que, para o autor, efetuam a redução da imagem a seu
menor ponto constituinte, a sua partícula mais elementar: o número, o valor
representado em termos visuais pelo conceito de pixel.

O computador permitia não somente dominar totalmente o ponto de


imagem – pixel – como substituir, ao mesmo tempo, o automatismo
analógico das técnicas televisuais pelo automatismo calculado, resultante
de um tratamento numérico da informação relativa à imagem. A procura do
constituinte único da imagem concluía-se com o pixel – ponto de
convergência, se pode dizer isso, de duas linhas de investigação
tecnológica: uma que buscava o máximo de automatismo na constituição
da imagem; outra, o domínio completo de seu constituinte mínimo
(COUCHOT, 1993, p.38).
37

O pixel é, conceitualmente falando, o menor ponto de um suporte de


visualização ao qual seja possível atribuir uma informação visual – ou seja, uma cor
ou um conjunto de cores. Cada pixel carrega em si um valor numérico, e é a leitura
de tais valores que torna possível a visualização da imagem em diferentes suportes
eletrônicos. A fidelidade de reprodução de uma imagem passa, então, a ser medida
pela quantidade de pixels usados para constituir essa imagem e pela capacidade do
mecanismo de visualização de reproduzir esses pixels com precisão. Do mesmo
modo que uma imagem gerada a partir de uma grande quantidade de pixels ainda
assim parecerá imperfeita se reproduzida por um equipamento impressor de má
qualidade, uma tela ou monitor de altíssima definição pouca utilidade terá se a
imagem que deve ser visualizada for gerada por uma quantidade de pixels
inadequada para uma representação fiel de suas características.
Segundo Couchot, o pixel funciona como um “permutador invisível” (1993,
p.39), que uma vez determinado permite a qualquer imagem ser transferida do
mundo material para o virtual e, de lá, praticamente para qualquer lugar. Do mesmo
modo, a imagem pode ser “materializada” a qualquer momento, a partir das mesmas
seqüências numéricas às quais foi reduzida. É a automação levada a um grau de
exatidão nunca antes atingido: mais do que ser gerada com precisão e transportada
com facilidade, a imagem se torna (ou pretende se tornar) uma reprodução cada vez
mais exata do que busca representar – além de cada vez mais passível de
decodificação, uma representação que se pretende precisa onde quer que um
computador seja capaz de ler os dados e dispô-los de modo correto. Assim, a
Internet se torna um veículo para o deslocamento e reprodução incessantes das
imagens digitalizadas, transformando o espaço visível em dados numéricos e
aplicando à criação de imagens, antes direta ou indiretamente subordinada à
subjetividade humana, um valor de desempenho tecnológico e de precisão mecânica
nunca antes associado à produção imagética.
De qualquer modo, embora a lógica acima descrita se aplique à
representações imagéticas de todos os tipos, pertence ao senso comum a
compreensão de que, por exemplo, uma pintura e uma gravação em vídeo são
visualizações muito diferentes, ainda que eventualmente sejam referentes à mesma
coisa. Uma pintura encontra-se estática no tempo, enquanto um filme ou um vídeo é
capaz de nos transmitir a idéia de movimento, de deslocamento, de atividade
38

temporal e espacial. De fato, o cinema já foi descrito como a primeira forma artística
a de fato tratar o tempo como uma categoria significante, como parte integrante e
indissociável de sua representação. Arlindo Machado (1993, 1997), embora não
critique de todo essa visão, propõe questões que nos parecem dignas de menção.
Para o autor, a própria constituição do cinema como uma sucessão de fotogramas
estáticos reproduzidos de modo a gerar a ilusão de movimento é contrária a tal
concepção – afinal, não existe nos fotogramas em si a captura do movimento, e a
sucessão temporal entre eles só se torna clara quando são exibidos na ordem e na
velocidade corretas. Citando Bergson, Machado diz que, de certo modo, o
movimento não está no filme, e sim no aparelho utilizado para sua reprodução – e
que ele não está nas imagens, e sim que através dele somos capazes de imprimir
sentido a elas (1993, p.101-102). E, mesmo que o cinema brinque com
manipulações do tempo – editando cenas em ordem reversa, usando flashbacks,
acelerando ou diminuindo a velocidade dos movimentos – nenhuma dessas
trucagens atinge a imagem em si, que continua cristalizada no tempo, apesar dos
fotogramas serem ordenados ou apresentados de modo diferente do usual. Apenas
com o advento do digital a imagem passa a ser manipulável em suas características
constituintes – e, portanto, passível de infinitas modificações e reposicionamentos
espaciais e temporais.
Trata-se de uma diferença bastante importante para que se tornem
compreensíveis as modificações que a Internet trouxe ao acesso e visualização de
imagens. A imagem que uma pessoa vê em um livro ou em uma tela de cinema não
é nunca a mesma que está sendo vista em outro local qualquer, mesmo que esta
seja uma reprodução perfeita daquela. A imagem que vejo em um livro não é a
mesma que um eventual antípoda vê em outro livro igual, porque são livros
diferentes – do mesmo modo que a cópia de um filme sendo exibido em uma cidade
é diferente da cópia sendo assistida em uma sala de outro município. A menos que
estejamos todos na mesma sala, olhando para o mesmo livro ou a mesma tela de
projeção, estaremos vendo representações imagéticas diferentes, mesmo que
referentes à mesma imagem original. A Internet elimina esse conceito: afinal,
milhares de pessoas podem acessar no mesmo instante o mesmo endereço virtual,
e selecionarem para exibição a mesma foto ou o mesmo vídeo em streaming. O que,
à primeira vista, interpretamos como um suporte – no caso, o computador ligado à
Internet – na verdade não mais carrega em si a imagem como os meios anteriores:
39

ao invés disso, serve como modo de acesso ao endereço onde ela se encontra, este
sim o verdadeiro “suporte” do conteúdo acessado. Quando assisto a um vídeo a
partir de um site especializado nesse tipo de conteúdo, ele só está no meu
computador na medida em que o equipamento cria arquivos temporários que
permitem a decodificação de dados e, a partir daí, a visualização – na verdade, o
vídeo está hospedado no servidor que estou acessando, e pode ser assistido ao
mesmo tempo por quantas pessoas acessem o site até o limite de sua capacidade
de banda. Trata-se, por assim dizer, da eliminação do espaço físico entre a imagem
e o observador – conseqüência direta do hipertexto e da virtualidade, e uma
modificação profunda de nossas concepções a respeito do acesso a conteúdos.
Outro aspecto digno de consideração refere-se às cada vez mais amplas
possibilidades de manipulação de imagens, tornadas possíveis pela tecnologia
digital. Muito além da formação de fractais (manifestação de ordem matemática
tornada visível através do advento da computação), surge uma gama de softwares
destinados à edição de imagens móveis ou estáticas, permitindo não só o acréscimo
ou supressão de elementos visuais como a criação de imagens absolutamente
novas, geradas sem qualquer intervenção que não as envolvidas no próprio
ambiente virtual. Uma foto, por exemplo, pode ser modificada em praticamente todos
os seus elementos: suas cores podem ser trocadas por outras, pode-se aumentar ou
diminuir a iluminação, eliminar ou incluir elementos, corrigir todo tipo de
imperfeições. Tudo isso através de softwares acessíveis a qualquer usuário e
passíveis de serem instalados em qualquer computador pessoal. A indústria das
imagens em movimento, por sua vez, já há tempos passou a utilizar essas
tecnologias de manipulação digital, tornando possíveis inúmeros tipos de trucagens
e efeitos especiais que durante décadas eram praticamente inatingíveis.
Para Louise Poissant, Ph.D. em filosofia e professora da Universidade de
Quebec, Canadá, a manifestação mais completa desta possibilidade de criação de
imagens sintéticas encontra-se na animação. Segundo o trabalho de sua autoria
publicado em 1997, as ferramentas oferecidas pela virtualidade para desenhar ou
pintar ainda não conseguem substituir a gama de opções e as sensibilidades da
criação nos moldes tradicionais - enquanto na área da animação, ao contrário, as
possibilidades de criação de imagens sintéticas, de moldagem de figuras (morphing)
e de modificação quase ilimitada de modelos e características acabam abrindo um
leque criativo inimaginável até pouco tempo atrás. De fato, embora seja uma
40

manifestação surgida muito antes das tecnologias digitais, a animação encontra


nelas um enorme espaço para a experimentação e para o aperfeiçoamento. Isso
desperta interesse ainda maior se considerarmos que boa parte das produções que
serão analisadas no quarto capítulo são obras de animação, incluídas diretamente
na situação descrita por Poissant em seu artigo.
De qualquer modo, talvez uma das características mais impressionantes do
atual status da imagem no ambiente virtual esteja em sua aparente e quase absoluta
perenidade. Como bem nos aponta o professor francês Michel Bret (1997), a
imagem decodificada pelos processos numéricos não está sujeita aos efeitos de
desgaste do papel, do tecido ou de suportes fílmicos ou magnéticos: com efeito, a
imagem inserida na lógica virtual é “potencialmente inalterável (todas as cópias são
originais) e eterna (salvo algum acidente, a informação numérica não se deteriora
com o tempo)” (1997, p.104). Assim, podemos dizer que a Internet não só tornou a
imagem livre das limitações de espaço e das imperfeições de reprodução, mas
também garantiu uma existência potencialmente infinita – uma vez que o código
numérico envolvido pode, em tese, ser preservado indefinidamente e sem
alterações8. O que não se preserva inalterada, no entanto, é a impressão que a
imagem provoca sobre quem a observa – afinal, como coloca Bret, a intenção de
uma imagem não é permanente ou necessária, mas fruto da interpretação e da
bagagem cultural do receptor de sua mensagem. É, no fundo, o conceito mesmo da
interatividade, aplicado à representação imagética do mesmo modo que se aplica a
todas as outras manifestações humanas englobadas pela web. Ou seja, o mundo
virtual garante perenidade a uma imagem, mas não à sua intenção, antes o
contrário: ao dinamizar o acesso à sua visualização, multiplica as possibilidades
interpretativas aplicadas sobre ela, tanto na atualidade quanto no tempo futuro.
A apreciação de Bret se torna mais instigante na medida em que avança
sobre a representação imagética de ordem sintética enquanto relação entre o
homem e a máquina que gera a imagem e a preserva. Afinal, na visão do autor, o
homem passa a agir não sobre a imagem propriamente dita, mas sim sobre sua
simulação – e, embora potencialmente eterna dentro do universo virtual, ela existiria

8
Na verdade, sabemos que a idéia de eternidade do material contido na Internet é ilusória; de fato,
basta que uma página seja retirada do ar para que o conteúdo que ela apresentava seja apagado e
se torne a partir daí inacessível. A idéia, aqui, é de que o código pode ser salvo fora do ambiente
virtual – e, a partir daí, retornar à Internet um número ilimitado de vezes, podendo manter
indefinidamente suas características particulares.
41

para nós apenas na medida em que com ela interagimos. Embora ela não “exista”,
por não ser necessariamente materializada, ela é real; e, ainda que a interpretemos
com nossa consciência e nosso intelecto, a imagem só se torna interpretável na
medida em que projetamos nosso imaginário sobre a máquina que nos serve de
meio de interação.

A imagem das realidades virtuais, mais do que uma imagem, é uma


sensação (visual, auditiva, cinestética...), seu tempo é aquele da vida, mas
de uma vida simulada, isto é, de uma réplica simbólica do mundo real.
Longe de ser uma memória, ela se desenvolve numa duração que não é
mais aquela do momento, mas a da simulação (BRET, 1997, p.105).

Conforme procuramos mostrar nas páginas anteriores, a idéia mesma da


imagem aplicada à virtualidade e à Internet modifica profundamente vários dos
conceitos antes tão arraigados à visualização e mesmo à representação imagética
como um todo. Se no primeiro capítulo os aspectos ligados à realização audiovisual
em geral, e à sua distribuição em particular, mostraram-se em um processo de
mudança graças ao mundo virtual, neste segundo capítulo a Internet e seus
processos revelam-se capazes de modificar conceitos em todos os níveis da
experiência humana – e, em última análise, do próprio conceito de humano. Não se
modificam somente o vídeo e o cinema como manifestações humanas, modifica-se
também o próprio espectador, confrontado com um leque de possibilidades e
desafios capazes de redefinir sua interação e seus conceitos a respeito do mundo
que o cerca. Não apenas alternativas como assistir vídeos por sites ou fazer o
download deles pela Internet são novidades se comparadas aos meios clássicos de
exibição, como o próprio usuário que “baixa” vídeos ou visita portais especializados
é um espectador potencialmente diferente daquele que encarava a sala de cinema
como uma opção de lazer para si e para sua família e amigos.
Nos próximos capítulos, tentaremos encontrar elementos que nos permitam
indicar, em um âmbito restrito ao Brasil, até que ponto este novo espectador e esta
nova possibilidade de exibição estão integrados e atuando de modo convergente
neste ambiente, já não tão novo, que é a Internet.
42

3. DESCRIÇÃO DOS SITES SELECIONADOS

No presente capítulo, procederemos a uma descrição dos três sites


escolhidos para o presente trabalho. Depois de uma breve explicação sobre os
critérios que guiaram nossa decisão de utilizá-los, voltaremos nosso olhar de modo
mais específico a cada um deles, buscando compreender seus mecanismos e
particularidades. Faremos primeiramente um resgate histórico de cada um, partindo
a seguir para a descrição de suas ferramentas, conteúdos e elementos constituintes.

3.1. CRITÉRIOS DE ESCOLHA DOS SITES

Desde o começo, ainda no estágio de definição de tema e de recorte do


trabalho, parecia claro que um número de três sites de exibição de vídeos era o ideal
para o estudo que nos propusemos a realizar. Não apenas por estreitar
consideravelmente o campo de amostragem, mas por permitir que diferentes
propostas de exibição e de conteúdo fossem contempladas de maneira satisfatória.
Foi esse, portanto, o principal critério a guiar a escolha dos domínios que entrariam
no estudo – encontrar endereços eletrônicos que, mais do que diferenciados uns dos
outros, fossem complementares entre si, no sentido de formarem uma amostragem
capaz de dar conta dos vários aspectos passíveis de discussão em uma pesquisa
como a que nos propusemos a fazer9.
O YouTube era uma opção que se impunha, por mais de um motivo. É,
atualmente, o mais famoso site de exibição de vídeos da Internet, contando com
milhões de acessos diários, e sua fórmula serviu de inspiração para a maioria dos

9
Por certo não desconhecemos a quantidade cada vez maior de sites dedicados a exibir conteúdos
em vídeo, bem como a crescente especificidade de conteúdos e abordagens que muitos deles
apresentam. Parece-nos que há, a nível internacional, uma tendência à postagem de conteúdos
temáticos, visando públicos mais segmentados do que o atingido por YouTube e Google Video, os
mais bem sucedidos sites de vídeo até o momento. Como exemplos, podemos citar domínios com
vídeos violentos ou chocantes (NothingToxic e UselessJunk), conteúdo mais direcionado a subgrupos
específicos (Danerd e AnimeEpisodes) ou mesmo por vídeos de cunho sensual e/ou pornográfico
(como o PornoTube, que tem uma interface diretamente inspirada nos mecanismos do YouTube e até
imitando parte da sua identidade visual). É discussão bastante interessante e atual, que não cabe nos
limites do trabalho aqui apresentado, mas que acreditamos merecer atenção em estudos futuros
sobre o tema.
43

outros domínios que a ele se seguiram. Não possuindo critérios de pré-seleção, e


permitindo que qualquer pessoa faça um cadastro e carregue vídeos, o portal acaba
sendo o mais democrático dentre os sites incluídos na pesquisa, permitindo que
usuários do mundo todo disponibilizem e assistam a vídeos praticamente sem
restrições de qualidade ou temática. É uma linha de atuação bem-sucedida, que
elimina a maioria das barreiras entre quem produz conteúdo e quem o assiste, e que
simplesmente não poderia ser ignorada no estudo que ora apresentamos. Por outro
lado, estando o YouTube contemplado em nossa pesquisa, nos pareceu
desnecessária a inclusão de outros endereços comprometidos com a mesma
proposta – ainda que, em casos como o Google Video, estejam já bastante próximos
em termos de praticidade e abrangência.
A proposta do Porta Curtas, por sua vez, é consideravelmente diferente.
Trata-se de um portal financiado de forma majoritária por uma empresa estatal (a
Petrobras), que exibe em versão digital filmes produzidos através de leis de
incentivo fiscal, a maioria deles realizados total ou parcialmente através de
equipamentos analógicos. Ou seja, são em sua grande maioria trabalhos que foram
originalmente planejados para as mídias tradicionais (salas de cinema e, em menor
escala, televisão e home video), mas que acabaram descobrindo na Internet uma
nova possibilidade para sua distribuição e exibição. Além disso, é uma ferramenta
utilizada pela própria Petrobras para incentivar a produção cinematográfica,
atividade que tem na empresa a maior patrocinadora do País. No caso do Porta
Curtas, há uma curadoria que faz a análise dos trabalhos antes de autorizar a
inclusão dos mesmos no arquivo permanente do site – de modo que é perfeitamente
aceitável deduzirmos que os vídeos disponíveis no portal atendem a padrões de
qualidade e conteúdo, formando um conjunto muito mais seleto do que o que
podemos encontrar no YouTube, por exemplo. É uma opção que passa pelo Estado
e que, pela própria natureza do projeto, acaba por restringir o acesso aos recursos
do site a filmes já previamente aprovados quando da utilização de leis de incentivo.
Finalmente, o Curta O Curta trabalha com idéias que, de certo modo, unem os
dois extremos acima descritos, e acaba apontando para novas direções. Além de ter
sido o primeiro portal brasileiro a exibir curtas-metragens nacionais através da
Internet, acabou diversificando suas atividades com o decorrer do tempo, sendo hoje
uma empresa constituída que presta vários serviços ligados à realização
audiovisual. Não nos parece fora de propósito afirmar, com base na análise que
44

descreveremos daqui por diante, que o que antes era o centro da atividade do site (a
exibição de curtas nacionais) tornou-se apenas um de vários serviços oferecidos – e
que o caráter virtual da atividade do portal presta-se atualmente como chamariz para
atividades que, embora ligadas ao mundo digital, não convergem necessariamente à
Internet de onde surgiram. Boa parte dos trabalhos apresentados no Curta O Curta
foram realizados com os serviços prestados pela própria empresa que comanda o
portal, sendo bem menos numerosos os casos de curtas-metragens que se servem
do site apenas como meio de exibição. Temos, portanto, uma abordagem bastante
diferenciada das duas anteriormente citadas, o que nos parece justificar a inclusão
do Curta O Curta no presente estudo.
Um critério um tanto óbvio, mas que requer uma breve explicação, refere-se à
necessidade de exibir produções realizadas em território brasileiro, produzidas e
dirigidas por realizadores nacionais. Tanto o Porta Curtas quanto o Curta O Curta
restringem-se a conteúdo realizado no Brasil e por brasileiros – ao contrário do
YouTube, que por sua própria proposta aceita vídeos de todo o mundo. No entanto,
optamos por concentrar nossa apreciação do YouTube em conteúdos de origem e
realização claramente identificados com o Brasil, de modo que nossa idéia original
de contemplar o cinema independente brasileiro não resultasse comprometida.
Considerando as diferenças (e semelhanças) entre os três portais que
escolhemos para constituírem a amostragem do trabalho, nos parece que temos
bem representadas boa parte das características apresentadas pela exibição de
vídeos na Internet. Da mesma forma, já em uma comparação superficial dos três
sites investigados surgem questões interessantes, desenhadas brevemente acima e
que pretendemos aprofundar neste capítulo e no próximo. A seguir, faremos uma
descrição mais detida de cada um dos domínios escolhidos, apresentando um
histórico e analisando em detalhe os mecanismos de navegação e os conteúdos –
em vídeo ou não – oferecidos por cada um deles.
45

3.2. YOUTUBE

3.2.1. Histórico

O YouTube surgiu no início de 2005, da iniciativa de Steve Chen, Chad Hurley


e Jawed Karim. Os três eram funcionários do PayPal (sistema de pagamentos e
depósitos largamente utilizado para compras via Internet), e juntos desenvolveram a
idéia de um site simples, onde os usuários pudessem disponibilizar vídeos com
rapidez e sem maiores despesas. Alegadamente, a inspiração veio depois de uma
festa, na qual os amigos gravaram alguns vídeos e depois passaram a pensar em
um jeito de disponibilizá-los para os que não tinham ido à comemoração.
O domínio foi registrado em fevereiro de 2005, e em maio do mesmo ano foi
trazido a público pela primeira vez, ainda em caráter experimental. Apenas em
novembro de 2005, ele passaria a funcionar plenamente, oferecendo aos usuários a
possibilidade de assistir livremente uma grande quantidade de vídeos. Naquele
momento, o grande diferencial do site com relação a outras iniciativas semelhantes
foi permitir a postagem de vídeos pelo próprio usuário, através de um processo
simples e relativamente rápido, que será explicado em detalhe mais adiante.
Tratava-se de uma possibilidade até então inédita, e que parece ter sido decisiva
para o imenso sucesso do portal. Pouco depois, novos recursos foram
disponibilizados, permitindo a postagem de video responses (vídeos inspirados ou
diretamente ligados a outros, formando uma rede de links entre eles), sistemas mais
avançados de busca, e a possibilidade de “assinar” um determinado usuário ou
canal, recebendo avisos sempre que um novo vídeo é postado.
O conteúdo variado do YouTube é, certamente, uma das maiores explicações
para seu sucesso e ascensão. Inicialmente, tratava-se quase exclusivamente de
vídeos caseiros, postados pelos usuários a partir de gravações feitas por eles
mesmos em câmeras digitais de baixo custo. Logo, no entanto, uma série de
programas antigos de TV, gravações históricas e videoclips foram sendo
digitalizados por colecionadores e disponibilizados através do YouTube para quem
quisesse assistir. Na mesma medida em que esses conteúdos trouxeram um grande
público para o site, acabaram gerando igualmente a insatisfação das várias
46

companhias detentoras dos direitos de exibição do material disponibilizado sem


autorização prévia – e um grande número de processos foram abertos contra o
YouTube, exigindo pagamento de royalties e muitas vezes implicando na retirada de
vídeos do ar. Empresas tradicionais no ramo de vídeo como Viacom, Fox e
Columbia moveram ações contra o site, gerando discussões cada vez mais intensas
sobre as leis de direito autoral e sobre as implicações legais do livre acesso a
conteúdo, uma das pedras basilares de toda a Internet.
Em outro sentido, o surgimento do YouTube foi visto com entusiasmo por uma
grande quantidade de criadores independentes. A possibilidade de postar qualquer
material levou vários realizadores iniciantes a apostarem na nova plataforma, da
mesma maneira que muitas bandas e artistas independentes acharam na
possibilidade de postar videoclips e trechos de shows uma nova maneira de
divulgarem suas carreiras.
O crescimento do YouTube foi rápido e pegou de surpresa até mesmo os
responsáveis por sua idealização. Na metade de 2006, o site da Alexa,
especializado em estatísticas sobre navegação na Internet, declarou o YouTube o
quinto domínio mais popular na Rede – isso em menos de um ano de funcionamento
aberto ao público. Atualmente, o YouTube consta no Alexa como o terceiro domínio
mais visitado na Internet10. Logo depois da divulgação dos dados da Alexa, a revista
Time elegeu o YouTube a “Invenção do Ano” de 2006. Dados divulgados em junho
de 2006 dão conta de que quase 100 milhões de vídeos são assistidos diariamente
via YouTube, em uma média de 22 milhões de visitas por mês, e que cerca de 66 mil
novos arquivos são postados por dia no site.
O sucesso da idéia levou, compreensivelmente, ao surgimento de um grande
número de domínios com a mesma proposta básica – disponibilizar gratuitamente
conteúdo em vídeo via World Wide Web. Nomes como Metacafe, DailyMotion, iFilm
e Lulu TV passaram a atuar, com diferentes graus de sucesso, mas até o presente
momento sem terem conseguido alcançar repercussão semelhante a do pioneiro
que os inspirou. Por seu próprio pioneirismo e engenhosidade, o YouTube
segmentou-se não só como uma opção de entretenimento virtual, mas como uma
marca presente na mente dos usuários da Rede – e não demorou para que grandes

10
Conforme visto em <http://www.alexa.com/site/ds/top_500>, em 11 nov. 2007.
47

investidores passassem a planejar a compra da marca, cujo potencial econômico


crescia quase que diariamente.
Finalmente, depois de várias especulações, a companhia Google – que já
tinha criado o Google Video, o concorrente até então mais proeminente do YouTube
– anunciou a compra do site por nada menos de 1.65 bilhão de dólares, em uma das
maiores transações envolvendo tecnologia digital ocorridas até então. O acordo foi
selado oficialmente em novembro de 2006, gerando discussões e levantando
dúvidas sobre o futuro do YouTube como um domínio gratuito e de livre acesso. De
acordo com as regras do contrato, os 67 funcionários da empresa continuam ligados
ao site, e os fundadores continuam comandando o YouTube sem a necessidade de
prestarem contas ao Google.

3.2.2. Navegação e conteúdo

A interface básica do site é bastante simples e de fácil compreensão para o


visitante de primeira viagem, e pode ser vista com maiores detalhes nos Anexos A,
B, C e D. A janela de reprodução aparece na página principal, à esquerda, sem a
necessidade de abertura de janelas extras (pop-ups), e seus comandos são muito
semelhantes aos utilizados em aparelhos comuns de vídeo ou DVD: reprodução,
pausa, controle de volume etc. Entre os recursos disponíveis, há o de diminuir a
imagem (para que tenha a melhor definição possível) ou ampliá-la até o ponto de
assistir em tela inteira. À direita da janela de exibição, ficam as informações
disponibilizadas pelo responsável pela postagem, geralmente uma descrição
superficial ou jocosa do conteúdo do vídeo. Aparecem, igualmente, as tags
(palavras-chave usadas no mecanismo de busca), além dos links do vídeo e do
embed11 do mesmo (cuja utilidade será descrita em detalhes logo adiante).
Abaixo das informações sobre o vídeo, uma outra janela mostra vídeos que
de algum modo estão ligados ao que está sendo assistido. Os links surgem em
forma de pequenas imagens dos vídeos, e são organizados em três abas: related
(vídeos semelhantes em conteúdo e/ou estética), more from this user (lista dos

11
Codificação de arquivos de áudio ou vídeo em forma de texto. Permite a mescla de diferentes
arquivos, e o transporte rápido de arquivos que seriam muito mais volumosos. Os protocolos mais
conhecidos do tipo são o XML e o XSL.
48

vídeos já postados pelo usuário em questão) e playlists (que contém listas de


execução de outros usuários que de algum modo se relacionam com o vídeo que
está sendo assistido). Ao lado esquerdo dessa janela, abaixo da janela de exibição
propriamente dita, ficam expostos os comentários sobre o vídeo. Somente usuários
conectados ao site podem postar comentários, e o responsável pela postagem do
vídeo pode apagá-los ou mesmo desabilitar completamente a postagem dos
mesmos, caso julgue conveniente.
Junto aos comentários, existe um mecanismo que permite ao espectador
cadastrado avaliar o vídeo em uma escala de uma a cinco estrelas, bem como
adicioná-lo a sua lista de favoritos ou mesmo oferecer honrarias (honors) ao autor da
postagem que se está assistindo. Os favoritos podem ser acessados através da
página pessoal do usuário cadastrado, tornando mais fácil assistir repetidas vezes o
mesmo conteúdo. Como ferramenta de auto-controle, no mesmo espaço é possível
também denunciar o material postado como inadequado ou agressivo, tornando o
acesso a ele restrito ou fazendo com que seja retirado do ar.
A grande diferença do YouTube para a maioria dos demais sites de exibição
de vídeos está na liberdade que oferece aos próprios usuários para a postagem de
conteúdo audiovisual. Qualquer pessoa, mediante um cadastro breve e gratuito,
pode se tornar proprietária de uma conta no YouTube – e, uma vez fazendo o login,
o usuário está livre para desfrutar de uma série de recursos inacessíveis aos
visitantes ocasionais do domínio. Além da postagem de vídeos em si, cujo processo
descreveremos logo a seguir, o usuário cadastrado pode adicionar vídeos de outras
contas como favoritos, tornar-se assinante das contas de outros usuários (o que
garante avisos especiais sempre que os usuários assinados postarem novos vídeos)
e trocar mensagens e video responses com outros cadastrados.
No momento da inscrição, o usuário tem a opção de cadastrar-se como
usuário comum (standard) ou através de alguma das opções extras oferecidas:
musician (opção voltada para pessoas ligadas à área da produção musical),
comedian (artistas ligados à paródia, sátira, quadros do tipo stand-up e outras
manifestações cômicas do tipo), director (direcionado a realizadores audiovisuais) ou
guru (aberto para quem deseja usar o YouTube como meio para ensinar a realizar
trabalhos artísticos ou técnicos de todos os tipos). Cada uma delas oferece
vantagens como limite maior de tamanho ou duração dos arquivos para postagens,
49

além de evidenciar o usuário nos mecanismos de busca, aproximando-o de outras


pessoas com os mesmo interesses.
O processo de postagem de vídeos é igualmente simples, e uma visualização
pode ser encontrada nos Anexos E e F. Vídeos em vários formatos são aceitos,
desde que tenham no máximo dez minutos de duração e tamanho de 100mb (cem
megabytes) ou menos. Durante e logo após a postagem, o autor pode selecionar um
nome para o arquivo, bem como a descrição do conteúdo, quais tags serão
aplicadas a ele, as regras para acesso e para postagem de comentários e outros
detalhes do tipo. Ao serem carregados no site, os arquivos são convertidos para a
terminação “.flv” (formato Flash), e em cerca de quarenta e cinco minutos já podem
ser assistidos e localizados através das ferramentas de busca.
Um dos recursos que colaborou para a popularidade do YouTube é a inclusão
de vídeos disponíveis neste site em outros endereços da Internet, como blogs e
páginas pessoais. O embed de cada vídeo é fornecido na página onde o mesmo
está hospedado, e caso o responsável pelo mesmo não restrinja o acesso a ele,
qualquer um pode copiar esse código e aplicá-lo no código-fonte de outras páginas,
permitindo que o vídeo seja assistido sem a necessidade de acesso direto à página
original. Isso torna o acesso e a utilização dos recursos do site ainda mais ampla, já
que vídeos hospedados no YouTube podem ser assistidos em muitas outras páginas
sem relação direta com o mesmo. É um recurso que aos poucos foi sendo
incorporado por outros portais, mas que ainda representa uma vantagem do
YouTube com relação à maioria de seus concorrentes.
Quanto ao conteúdo presente no YouTube, as restrições são poucas, e na
maior parte das vezes de ordem legal. Materiais protegidos por leis de direitos
autorais ou de cunho considerado ofensivo costumam ser mantidos no ar até que
ocorra uma reclamação formal – segundo o representante do YouTube no Brasil,
seria impossível rastrear permanentemente os milhares de vídeos novos postados
por dia , de modo que a equipe do site precisaria receber avisos dos usuários para
tomar as atitudes necessárias em cada caso. Tais explicações, no entanto, não
convencem muitas empresas e órgãos jurídicos – em um evento já célebre, uma
ação judicial movida pela apresentadora Daniela Cicarelli fez com que os provedores
brasileiros de Internet bloqueassem por alguns dias o acesso de seus usuários ao
YouTube. A idéia era impedir que os usuários do portal assistissem a um vídeo feito
clandestinamente, que mostra Cicarelli mantendo relações com seu namorado em
50

um local público. A medida mostrou-se pouco eficiente e bastante impopular, mas


tornou ainda mais evidenciado o debate sobre a Internet e sobre as modificações
que ela acarreta à esfera da vida pública – e, em outro sentido, sobre a dificuldade
de controlar a disseminação de conteúdos colocados na Rede, evidenciando a
ineficácia das políticas atualmente existentes para lidar com essa questão.
É muito difícil fazer uma descrição do tipo de vídeo que está disponível no
YouTube, justamente porque quase todo tipo de conteúdo audiovisual pode ser
veiculado através dele. É possível encontrar desde vídeos caseiros de festas e
brincadeiras até produções bastante elaboradas, muitas já realizadas com o intuito
de serem exibidas através do site. O realizador Lev Yilmaz, por exemplo, faz
sucesso com sua série de animações “Tales Of Mere Existence”, feitas à mão em
papel jornal e exibidas contra a luz de uma lâmpada. Já o diretor norte americano
Mark Bunker utilizou o YouTube como veículo para sua série de documentários
contra a religião Cientologia, postando mais de cem vídeos na sua conta (chamada
XENUTV) e conseguindo considerável repercussão internacional. Em escala menor,
são incontáveis os exemplos de pessoas que editam vídeos em suas próprias casas,
usando programas simples, e os colocam no site para homenagear algum amigo ou
ídolo de adolescência. Isso sem citarmos todos os usuários que disponibilizam
seriados antigos, videoclips, trechos de shows raros, programas de TV há muito fora
do ar e toda uma série de materiais inacessíveis até há pouco tempo atrás. Existe,
portanto, toda uma gama de possibilidades, que permite a praticamente todos os
usuários encontrarem pontos de interesse e incentivos para colocarem seus próprios
arquivos para exibição no portal – algo que se diferencia consideravelmente do
modelo seguido pelo Porta Curtas, que descreveremos a seguir.

3.3 PORTA CURTAS

3.3.1. Histórico

O surgimento do Porta Curtas está associado de modo curioso a um dos


curtas-metragens mais conhecidos de nossa filmografia. Em 1988, os realizadores
51

Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado produziram “Barbosa”, que conta uma história
de ficção baseada na final da Copa do Mundo de futebol de 1950 – jogo graças ao
qual o goleiro que dá nome ao filme acabou tornando-se uma espécie de anti-herói
nacional. Quando do falecimento de Barbosa, em abril de 2000, surgiu a idéia de
incluir na notícia divulgada pela Internet um link que levasse a uma reprodução do
curta-metragem baseado na sua história. Um dos envolvidos – o realizador Julio
Worcman – tirou do incidente a inspiração para um projeto que permitisse a
distribuição de curtas-metragens através da Rede Mundial de Computadores. Em
2002, tal projeto se concretizaria na forma do Porta Curtas.
Desde sua idealização, o projeto responsável pelo Porta Curtas se destina a
duas finalidades paralelas. Por um lado, há a preocupação com a exibição de vídeos
propriamente dita; por outro, um interesse no desenvolvimento de uma catalografia
da produção nacional – que de início se restringe aos filmes de curta-metragem,
mas que em breve deve ser estendida a toda a realização cinematográfica brasileira.
Está presente desde um primeiro momento, portanto, uma preocupação documental
e de preservação da memória, gerada pela noção de que informações importantes
eram perdidas pela falta de um ambiente que as centralizasse – e que se manifesta,
ainda hoje, não só na existência do catálogo como na própria inclusão, em
streaming, de realizações não-recentes, muitas delas lançadas há cerca de vinte
anos ou mais.
O patrocínio da Petrobras foi e continua sendo fundamental para a
viabilização do portal e das atividades a ele ligadas. O aporte oferecido pela
empresa estatal de energia é majoritário, representando 57% da receita utilizada
pelo Porta Curtas em suas diversas atividades. A maior parte do valor restante é
obtida através das leis nacionais de incentivo à cultura. Embora possa parecer um
montante não tão significativo em uma análise superficial, o fato é que o patrocínio
oferecido pela Petrobras constitui-se na única fonte de receita não-variável,
mantendo a segurança necessária para que as atividades do projeto se mantenham
de forma constante e ininterrupta.
No momento de seu surgimento, o portal apresentava cem filmes para serem
assistidos. Em dez meses de atividades, a quantidade de reproduções dos filmes
disponíveis superava a marca de quinhentos mil acessos – um sucesso descrito
pelos administradores do site como inesperado. A evolução do domínio e
informações técnicas (como a quantidade de vídeos exibidos ou catalogados e o
52

número de acessos recebidos) estão disponíveis ao visitante via uma série de


relatórios, hospedados em uma das sessões do Porta Curtas. Pela análise de tais
documentos é possível observar aspectos significativos da evolução do site através
dos anos – como, por exemplo, a opção definitiva pela plataforma de exibição
Windows Media (wmv), em detrimento da Real Player, utilizada paralelamente com o
wmv nos primeiros meses de atividade do Porta Curtas.
A expansão do projeto se deu igualmente em atividades junto a festivais de
cinema brasileiro, através do Prêmio Porta Curtas Petrobras. Abrangendo as
produções participantes de grandes eventos – como o Festival de Brasília e o Mix
Brasil - Festival de Cinema e Vídeo da Diversidade Sexual –, o prêmio desenvolve-
se em duas fases. Após uma seleção entre as realizações inscritas no prêmio, elas
são incluídas em uma página especial, para serem alvo de avaliação do público. Os
mais votados a partir desta consulta recebem um prêmio-aquisição e passam a
integrar o acervo do portal.
Atualmente, o Porta Curtas conta com mais de quinhentos curtas-metragens
para exibição – superando amplamente a meta estabelecida para o ano 2007, que
previa um número de 119 trabalhos no acervo – e apresenta 4.140 fichas técnicas
disponíveis em catálogo para consulta e armazenamento. Os dados fornecidos pelos
relatórios igualmente dão conta de que 94% das fichas disponíveis motivaram
alguma interatividade pró-ativa até o momento – ou seja, não foram apenas
consultadas, mas também indicadas por e-mail para outros usuários ou
armazenadas em cinematecas individuais. Os números em questão são bastante
superiores aos inicialmente previstos, e servem como indicativos do sucesso da
fórmula adotada pelo portal.

3.3.2. Navegação e conteúdo

Por ser um domínio que apresenta uma série de conteúdos além da exibição
de filmes propriamente dita, o Porta Curtas pode parecer de início um pouco
confuso. É necessário alguma procura na página para encontrar as indicações que
garantam o acesso ao que se deseja, e um usuário iniciante pode ficar bastante
perdido em um primeiro momento. Basicamente, os conteúdos são divididos em três
53

colunas: a primeira com links diretos para os vídeos; a do meio com informações
sobre as atrações do site e notícias sobre o cinema nacional (“Curtinhas”), e a da
direita apresentando parte dos projetos paralelos ligados ao portal, bem como links
para sites semelhantes – o Curta O Curta está relacionado, inclusive. Uma visão
parcial da página inicial do Porta Curtas está presente nos Anexos G e H.
Os vídeos disponíveis no arquivo do Porta Curtas podem ser acessados
através de uma ferramenta de busca, ou por links diretos como os que aparecem
nas listas de mais acessados ou nas estréias do período. Abrem em uma nova
janela (pop-up) e são hospedados no formato Windows Media (.wmv). Antes da
exibição de todos eles, há uma vinheta de cerca de dez segundos mostrando a
marca da Petrobras – o que evidencia ainda mais a ligação do portal com a
instituição que o promove. Ao lado do espaço onde é exibido o vídeo, estão
dispostos pequenos ícones, indicativos dos prêmios recebidos pelo trabalho ou de
sua exibição em grandes festivais de cinema. A janela é relativamente pequena (240
x 180 pixels) e não está configurada para mudanças no tamanho ou definição da
imagem – o espaço de exibição é menor do que o disponível no YouTube, por
exemplo. No entanto, outros recursos comuns aos demais sites estão presentes,
como a possibilidade de postagem de comentários e atribuição de notas ao filme –
no caso, em uma escala de uma a cinco estrelas. Uma visão da janela de exibição
está apresentada no Anexo I.
Para os cadastrados no site, são oferecidos serviços especiais como a
Cinemateca, que consiste na seleção e rápido acesso aos filmes favoritos e a
informações contidas no catálogo de curtas-metragens. Os dados são guardados e
organizados pelo usuário em pastas, que podem ser acessadas rapidamente a
qualquer momento e enviadas por e-mail para outros usuários, multiplicando os
acessos a uma cinemateca particular. Ocorre igualmente o envio de boletins via e-
mail (newsletters) com notícias e informações sobre os vídeos incluídos mais
recentemente. É permitido igualmente aos cadastrados colocar vídeos em sites
pessoais e blogs, sem nenhum ônus. Há ainda uma ferramenta chamada Roleta,
que faz uma busca aleatória (random) no arquivo do site e exibe automaticamente o
curta-metragem selecionado no processo.
Um dos projetos desenvolvidos pela equipe Porta Curtas – e que recebe
posição de destaque no site – é o Curta Na Escola, que atua junto a escolas de
ensino fundamental de todo o País. Atuando desde 2006, o projeto tem como meta
54

estimular a utilização de curtas-metragens brasileiros como material pedagógico, e


oferece atualmente um DVD com oito títulos (considerados pelos coordenadores
como de alto valor didático) para os professores cadastrados na página. Através da
Internet, é possível ler a ficha técnica dos trabalhos selecionados e trocar idéias com
outros professores por meio da publicação de pareceres e da participação em fóruns
de discussão. A idéia, segundo a apresentação do site do Curta Na Escola, é reunir
um grande material sobre a experiência inicial, de modo a aperfeiçoar o projeto em
etapas futuras. O projeto tem um domínio próprio, que pode ser acessado por um
link disponível em todas as diferentes sessões do Porta Curtas.
Quanto aos trabalhos disponíveis no Porta Curtas, é feita por parte da
curadoria do portal uma avaliação de questões narrativas e conceituais para
escolher quais filmes serão exibidos no site. No entanto, o principal critério alegado
pela equipe do site é de cunho técnico: como a janela de exibição é pequena e o
áudio geralmente oferecido pelas caixas de som de um computador é de baixa
qualidade, há a necessidade de que o trabalho tenha imagens bastante nítidas e
uma boa qualidade de captação e edição de som. Para efeitos de arquivamento no
portal, os curtas-metragens são divididos em categorias relacionadas com seu
conteúdo – animação, documentário, experimental e ficção. Há também indicações
especiais para atrações que contenham conteúdo adulto ou que estejam
participando no momento de mostras competitivas em festivais dentro ou fora do
Brasil. Características distintas das apresentadas pelo portal Curta O Curta –o qual
tem um conceito de exibição de vídeos consideravelmente diferente dos outros sites
estudados até aqui.

3.4. CURTA O CURTA

3.4.1. Histórico

É disponibilizado no próprio site um histórico do surgimento do portal, escrito


em primeira pessoa por seu fundador, o jornalista e realizador Guilherme Whitaker.
Surgido em 2000, foi o primeiro portal no Brasil dedicado à exibição de curtas-
55

metragens nacionais, e desde o primeiro momento tinha como objetivos a exibição


de vídeos e a divulgação de notícias sobre o audiovisual brasileiro. As mesmas
diretrizes, embora mais elaboradas, continuam sendo seguidas pelo domínio ainda
hoje.
Quando da inauguração, em outubro de 2000, o Curta O Curta disponibilizava
um total de 30 vídeos para exibição em streaming no formato Real Player, além de
uma seção de notícias de atualização constante, coordenada pelos sócios Phillipe
Cortês e João Alfredo. Em pouco tempo, o portal alcançou o número de cem curtas
em exibição simultânea – o que era, conforme as alegações contidas no próprio site,
algo inédito na época. Paralelamente, passou a apoiar e a participar de eventos
ligados ao modelo clássico de exibição de filmes – como a mostra carioca Mostra O
Que Neguinho Tá Fazendo, realizada mensalmente durante três anos e focada em
curtas-metragens de cunho alternativo.
Com o gradual crescimento no número de acessos e de material
disponibilizado, os responsáveis pelo site começaram a buscar formas de diversificar
as atividades ligadas ao nome Curta O Curta. Notadamente, o portal envolve-se,
desde 2001, na organização da Mostra do Filme Livre, que exibe várias produções
independentes de cinema, além de divulgar uma série de outros eventos
semelhantes pelo País. Trata-se de uma mostra sem restrições de bitola, estilo ou
duração dos filmes, com inscrição gratuita e on-line. O site trabalha em parceria
também com o Ateliê da Imagem, escola de fotografia da cidade do Rio de Janeiro,
promovendo cursos ligados à realização cinematográfica.
O maior empreendimento de todos, no entanto, ocorreu em 2005, com a
formação da firma jurídica “Curta O Curta Distribuição e Comércio Ltda.”, que
transformou a marca em uma distribuidora e produtora de cinema independente. As
idéias nesse sentido surgiram logo depois da página entrar no ar, e foram se
intensificando na medida em que o caráter não-profissional do site foi se tornando
prejudicial ao crescimento do mesmo. As atualizações acabavam ocorrendo em um
ritmo mais lento do que o necessário, e a expansão do Curta O Curta tornou
inevitável um processo gradativo de profissionalização – que, depois de atingir o
domínio propriamente dito, expandiu-se sobre as atividades paralelas da equipe
responsável, que resultaram na oficialização da firma jurídica.
Atualmente, o Curta O Curta, enquanto domínio de Internet, tornou-se
parcialmente um veículo de distribuição da empresa constituída em 2005, além de
56

se prestar à divulgação dos serviços prestados pela firma – que englobam a


produção e distribuição de filmes de curta-metragem, além de serviços de aluguel de
equipamentos, autoração de DVD’s, tradução e legendagem. Paralelamente,
mantém a divulgação de vídeos não ligados diretamente a sua firma jurídica, além
de oferecer notícias sobre festivais e mostras de cinema brasileiro, com atualização
diária. Essas características são bastante evidenciadas quando analisamos mais
detidamente as características visuais e as opções de navegação oferecidas no site.

3.4.2. Navegação e conteúdo

De modo semelhante ao que encontramos no Porta Curtas, um visitante


interessado somente em assistir aos vídeos disponíveis no portal pode ficar confuso
ao entrar na página inicial do mesmo. Coerente com a direção tomada a partir da
transformação em empresa jurídica constituída, o Curta O Curta tornou-se muito
mais um domínio voltado à atividade da realização audiovisual em curta-metragem
como um todo do que um mero espaço para exibição de vídeos. O material em
vídeo, embora ainda apareça com destaque, disputa espaço com links de notícias,
serviços, cursos e outros conteúdos semelhantes, caracterizando-se cada vez mais
como um chamariz do que exatamente como a atividade principal do Curta O Curta.
Nos Anexos J e K, são visíveis algumas das principais características visuais do
portal.
Na abertura do site, há um painel no qual são mostradas pequenas imagens
(thumbnails) de filmes recentemente adicionados ao acervo, ao lado de pequenos
resumos de cada um. É possível também acessar o arquivo permanente do portal
por meio de um botão na parte superior da página, à direita. Trata-se de uma sessão
específica, onde os curtas-metragens são listados e são oferecidas ferramentas para
facilitar a busca de filmes em particular. Aparecem thumbnails de cada filme, ao lado
de pequenas sinopses e de links para acesso ao vídeo propriamente dito ou à ficha
técnica do mesmo. É oferecida também a possibilidade de fazer download dos
programas (players) necessários para assistir aos vídeos – os mais antigos podem
requerer o uso de Real Player, Flash Player ou Quicktime, enquanto a maioria dos
mais recentes já está padronizada no formato Windows Media (wmv).
57

A janela de exibição abre na própria página de navegação, sem necessidade


de pop-ups para visualização, e apresenta um visual que facilita a compreensão dos
comandos e recursos extras disponíveis. Um exemplo pode ser visto no Anexo L. O
tamanho de visualização padrão é pequeno, mas um duplo click sobre o vídeo faz
com ele possa ser visto também em tela inteira. É possível acessar, ao mesmo
tempo, os comentários sobre o vídeo que se está assistindo, bem como postar suas
próprias impressões sobre ele, sem a necessidade de abertura de janelas
adicionais. Está igualmente disponível um link que permite a visualização da ficha
técnica do vídeo – embora, no caso, a reprodução do streaming seja interrompida. A
exibição dos vídeos escolhidos pelo usuário é imediata, sem a inclusão de vídeos
introdutórios ou de institucionais do site.
A parte dedicada às notícias sobre audiovisual (chamada “Jornal do Curta”) é
tão valorizada quanto a seção de vídeos, e apresenta grande quantidade de
informação, com atualização diária. As notas publicadas abrangem diversos
aspectos da produção cinematográfica, noticiando lançamentos em curta e longa-
metragem, prazos de inscrição e realização de festivais, inaugurações de novas
salas de exibição e uma série de informações relacionadas direta ou indiretamente
com o tema. Há seções específicas para artigos e entrevistas, e os usuários podem
enviar notícias para possível publicação no site, por meio de um pequeno formulário.
Existe igualmente uma página de classificados, que permite separar os anúncios por
filtros e realizar buscas por Estado ou por categorias de serviço. Um outro diferencial
é a seção “Curta O Longa”, que apresenta críticas e pequenos ensaios sobre
realizações brasileiras em longa-metragem, privilegiando textos longos e de maior
densidade.
Há uma quantidade razoável de anúncios (banners) de apoiadores do Curta O
Curta, bem como de serviços ligados de modo direto ou indireto com a empresa que
controla o domínio. Em sua maioria, são cursos relacionados com fotografia,
captação e edição em vídeo, oferecidos pelo próprio Curta O Curta ou por empresas
atuando em parceria com o mesmo. Na verdade, o oferecimento de serviços merece
uma seção própria no site, com descrição cuidadosa das opções e até mesmo a
inclusão de uma tabela de preços para inclusão de banners e para os demais
serviços disponíveis através da empresa. Há ainda uma página específica para a
análise de audiência, voltada para empresas que estejam cogitando a inclusão de
anúncios em alguma das páginas (principal, internas e áreas interativas) do portal.
58

Nesta página, são exibidas informações sobre a firma jurídica Curta O Curta, além
de gráficos demonstrativos do crescimento de acessos e das áreas mais visitadas
pelos usuários do site.
Outra área coberta pela equipe da empresa está relacionada com a
distribuição de curtas-metragens propriamente dita. Através de um serviço especial,
o realizador interessado pode garantir a inscrição de seu trabalho em uma série de
festivais nacionais, ficando por conta da empresa contratada os custos de inscrição,
produção de cópias e envio de material. O contratante pode conferir sempre que
desejar a efetividade do serviço por meio de um painel de controle (disponibilizado
no site), e o contrato pode ter a duração de até dois anos. A inclusão da obra no
acervo do portal é apenas um opcional do contrato em questão, sendo perfeitamente
possível a aquisição do serviço de distribuição sem que o trabalho fique disponível
para visualização ou mesmo que seja listado no arquivo do Curta O Curta.
Quanto aos critérios para inclusão de vídeos, o Curta O Curta adota,
atualmente, uma postura mais comercial do que a seguida pelo Porta Curtas ou
mesmo pelo YouTube. Grande parte dos vídeos incluídos no acervo são realizações
envolvidas de modo total ou parcial com a empresa Curta O Curta, seja em
produção e direção propriamente ditas, ou na utilização de serviços de captação ou
edição de imagens. E o espaço no arquivo permanente do portal é alvo de transação
comercial: para hospedar o vídeo e financiar os trabalhos de conversão, o produtor
deve pagar uma taxa de cem reais (R$ 100,00) ao ano (que aumenta de valor caso
a duração do trabalho exceda os dez minutos) e assinar uma autorização em duas
vias com firma reconhecida em cartório. Embora ainda haja uma avaliação prévia
dos filmes enviados para que atendam a critérios específicos de qualidade e
conteúdo (por exemplo, não é aceita a inclusão de cenas de sexo ou de violência
explícita), a concessão de um espaço no site tornou-se mais um dos negócios da
empresa, que comercializa esse serviço em condições bastante claras com seu
cliente – o realizador de curtas-metragens. Parece-nos um ponto decisivo para
diferenciar o Curta O Curta dos outros portais aqui analisados: a utilização de seus
recursos de exibição em um contexto econômico – não como um serviço gratuito ou
uma espécie de prêmio para trabalhos de qualidade superior, mas sim como um
espaço comercial cedido por meio de contrato entre as partes. Contrato que é
regido, inclusive, por condições semelhantes às que orientam outras janelas de
59

exibição como a televisão, vídeos para locação, ou mesmo o modelo clássico das
salas de cinema.
Tendo sido estabelecidas as particularidades de cada um dos domínios
inclusos na pesquisa que aqui apresentamos, bem como explicitadas as diferenças
de abordagem no tocante ao recurso de exibição de vídeos pela Internet, chega o
momento de entrarmos na parte final de nosso estudo: a análise dos conteúdos
distribuídos através de cada um dos sites pesquisados. No capítulo a seguir,
trabalharemos com parte dos conteúdos mais acessados pelos visitantes de cada
portal, analisando suas particularidades e procurando identificar elementos capazes
de explicar sua aceitação nesse espaço de constante mudança que é a Internet.
60

4. ANÁLISE DOS SITES PESQUISADOS

O capítulo que se segue será dividido em três partes. Na primeira,


relataremos os critérios utilizados para a escolha dos vídeos analisados e para a
observação que será efetuada a partir dos mesmos. A seguir, listaremos os vídeos
escolhidos como amostragem, descrevendo brevemente seu conteúdo e as técnicas
utilizadas para a concretização de cada um. Finalmente, passaremos à análise
propriamente dita, comparando os vídeos e, a partir daí, buscando determinar
elementos convergentes e divergentes entre eles – o que nos levará também a
algumas considerações sobre os domínios que hospedam esses conteúdos.

4.1. CRITÉRIOS E PROCESSOS DE AVALIAÇÃO

A abordagem da pesquisa que aqui apresentamos sofreu considerável


modificação em relação a nossos planos iniciais. Era intenção de nosso projeto unir
a análise de conteúdo dos domínios pesquisados com entrevistas, conversando
tanto com realizadores que usam a Internet como meio de exibição quanto com
representantes dos sites estudados, que poderiam oferecer informação mais
personalizada do que a disponível em relatórios ou outros documentos encontráveis
nos próprios sites. Deste modo, tencionávamos atingir dois diferentes aspectos
desta nova realidade de exibição: um, digamos, ‘externo’ (referente aos aspectos
das realizações em si, que atingem diretamente todos os que assistem as mesmas),
e outro ‘interno’ ou de bastidores, relativo aos que fazem uso do novo recurso a fim
de saber o que consideram mais positivo ou produtivo na utilização deste tipo de
site. Uma vez que o trabalho aqui desenvolvido é de caráter exploratório, nos
parecia uma maneira bastante adequada de abordar nosso problema de pesquisa.
No entanto, como já tínhamos antecipado na introdução, não foi possível
seguir o caminho planejado no início do trabalho. A dificuldade de contatar
adequadamente os realizadores dos vídeos acabou sendo maior do que a
originalmente prevista, o que acabou provocando uma mudança de planos. Revelou-
se, no decorrer dos esforços para viabilizar a idéia original, um aspecto talvez pouco
61

considerado, mas bastante presente na Internet: a impessoalidade que caracteriza


boa parte dos contatos via Rede. Não está estabelecido, em muitos casos, um
espaço no qual uma pessoa possa ser alcançada por outras – mesmo que tenhamos
enviado um grande número de e-mails e deixado mensagens em vários fóruns de
discussão, a resposta recebida acabou sendo não menos do que desanimadora. Ao
mesmo tempo em que um conteúdo ou informação disponibilizado na Internet deixa
de pertencer a seu responsável e passa a ser acessível a todos os usuários da web,
o simples ato de não responder a um ou dois e-mails é suficiente para cortar a
comunicação de modo quase irremediável. No nosso caso, que envolvia o diálogo
com realizadores de vários lugares do País, tal dificuldade se mostrou ainda mais
opressiva – e, tendo o trabalho sido realizado em um espaço de tempo relativamente
curto, tornou-se inviável um período de insistência que talvez tivesse possibilitado a
coleta de mais depoimentos. Em resumo, a quantidade de dados efetivamente
disponível nos pareceu insuficiente para a concretização da idéia inicial – e
concluímos então que seria mais produtivo repensarmos nossa análise. Ao invés de
insistirmos na aplicação de um método que, por limitações físicas e temporais,
tornava-se cada vez mais difícil e temerário, decidimos analisar apenas o conteúdo
disponível nos sites – ou seja, os vídeos, que podem ser assistidos por qualquer
visitante a qualquer momento.
Desde o começo, tínhamos em mente a utilização do número de visitas ou
exibições como critério para a escolha dos trabalhos contemplados em nosso
estudo. A lógica que guia essa decisão é bastante simples: a partir de uma análise
dos vídeos mais assistidos, seria possível observar as características comuns entre
eles, e assim apontar tendências de estilo, linguagem, temática e formato que
funcionariam “melhor” no universo da Internet. Tal idéia foi mantida na concretização
do trabalho, e acabou se tornando o norte pelo qual foi guiada a nossa análise. A
partir da quantificação do número de acessos aos vídeos disponíveis em cada um
dos sites estudados (fornecida, de um modo ou de outro, por todos eles),
determinamos quais vídeos seriam mais adequados ao estudo que tencionávamos
efetuar, e a partir daí procedemos a uma análise comparativa entre eles –
levantando, da melhor forma possível, dados que nos permitam conjeturar sobre
quais potencialidades são, no presente momento, melhor atendidas pela distribuição
e exibição de produções brasileiras através da Rede Mundial de Computadores.
62

O período compreendido na nossa quantificação estende-se do dia 23 de


setembro de 2007 ao dia 03 de novembro de 2007 – pouco mais de um mês,
portanto. Durante o período, a modificação no ranking de visitas ou acessos de cada
site modificou-se muito pouco, de modo que antes mesmo de concluído o tempo
previsto para a contagem já nos parecia bastante claro quais vídeos seriam
selecionados. Tanto os vídeos presentes na seleção final, quanto muitos outros
presentes nos domínios estudados, foram assistidos no mínimo uma vez – em
muitos casos, até quatro ou cinco observações foram feitas, na tentativa de capturar
detalhes mais específicos de linguagem e estética.
Um diferencial entre os sites analisados, e que acabou se mostrando uma
dificuldade considerável na aplicação da metodologia prevista, está no caráter
descentralizado do YouTube em comparação ao modelo adotado por Porta Curtas e
Curta O Curta. Por ser um espaço internacional, e pelas dificuldades envolvidas em
quantificar acessos em um site aberto que recebe milhares de novos vídeos por
minuto, não existem dados sobre vídeos brasileiros no YouTube que possam ser
diretamente aplicados aos fornecidos pelos outros dois domínios abordados em
nosso estudo. As listas de vídeos mais assistidos (top views), de votação mais alta
(top rated) ou mais incluídos em listagens de favoritos (top favorites) são todas
internacionais, e ainda não são oferecidos recursos de busca que restrinjam as
estatísticas a postagens por país. Em resumo, não é possível selecionar os vídeos
brasileiros mais assistidos no YouTube com a mesma precisão do Porta Curtas e do
Curta O Curta, que oferecem listagens específicas neste sentido. Para contornar
essa dificuldade, optamos por escolher vídeos postados no YouTube que tenham
recebido menção em outros espaços não marcados pela exibição de vídeos, com
uma ligeira preferência pelos veículos não diretamente ligados ao mundo virtual. Na
falta de um método quantitativo mais específico, essa nos pareceu a alternativa mais
próxima em termos de repercussão junto ao público. Não há dúvida de que é um
critério sujeito a falhas – afinal, não devemos ignorar o fato de que a própria escolha
do objeto de uma notícia se dá por critérios não raro subjetivos – mas acreditamos
ser mais adequado do que a seleção de vídeos ao acaso, e mais prático do que
efetuar buscas demoradas através das ferramentas convencionais do site, sem
nenhuma garantia de sucesso.
Outra dificuldade específica do YouTube consiste na quase completa
ausência de filtros que controlem a entrada de conteúdo no site. Se nos outros dois
63

portais estudados a inclusão de vídeos obedece a critérios específicos de


adequação, no YouTube isso praticamente inexiste, de modo que muitas vezes se
torna difícil determinar o que é relevante ou não em termos de linguagem e
conteúdo. Dizendo de outro modo: não restam dúvidas de que a esmagadora
maioria das atrações hospedadas no Porta Curtas e no Curta O Curta podem ser
incluídas nos limites de nossa análise (afinal, são quase todas realizações
audiovisuais em curta-metragem), mas o mesmo não pode ser dito do YouTube,
onde praticamente tudo pode ser disponibilizado e é possível encontrar desde
produções cinematográficas premiadas até vídeos de família feitos por meio de
aparelhos celulares. Isso gera algumas áreas cinzentas onde conceitos se misturam,
e nos levou a fazer algumas escolhas. Assim, a maioria dos vídeos mais acessados
do YouTube simplesmente foi excluída de nossa análise – ou por serem demasiado
caseiras, ou por não apresentarem um roteiro definido, ou por não apresentarem
objetivos artísticos facilmente definíveis – e optamos por trabalhar com material
claramente identificável com o que o senso comum chama de “cinema” – ou seja,
escolhemos produções que poderiam ser exibidas sem maiores traumas em salas
de projeção, caso houvesse interesse por parte dos responsáveis pela programação
das mesmas. Admitimos que a escolha em questão acaba sendo guiada por critérios
subjetivos em maior ou menor grau – mas acreditamos que, na medida em que
forem sendo desenvolvidas nossas argumentações, essa aparente discrepância
mostre-se bem menos preocupante do que possa parecer em um primeiro momento.
Por ser um trabalho exploratório, não adotamos hipóteses anteriores à coleta
de dados e ao desenvolvimento da análise propriamente dita. Não nos interessa,
aqui, alcançar conclusões sólidas sobre o futuro do cinema na Internet ou receitar
algum tipo de “fórmula mágica” capaz de garantir o sucesso de vídeos destinados à
exibição via web. Na verdade, dado o próprio estágio inicial da exploração do vídeo
no mundo virtual, nos parece prematura e descabida qualquer tentativa de ser
categórico nesse sentido. É nosso objetivo, antes disso, encontrar elementos
comuns, estabelecer ligações entre os vídeos que maior repercussão têm alcançado
neste momento ainda inicial – e, a partir daí, apontar algumas possíveis tendências
para o segmento em um futuro não muito distante. Dizendo de outro modo, nos
interessa menos formular teorias, e muito mais fornecer – ainda que timidamente –
subsídios que possam guiar futuramente a elaboração de estudos mais
64

aprofundados sobre o tema. É essa opinião que observamos desde o início do


projeto, e cujos resultados passaremos a descrever a partir de agora.

4.2. DESCRIÇÃO DOS VÍDEOS ESCOLHIDOS COMO AMOSTRAGEM

Tendo explicitado os critérios que levaram à escolha da amostragem,


passemos a uma breve enumeração dos elementos que a constituem, descrevendo
rapidamente as características mais evidentes de cada um dos vídeos selecionados.
Embora tenhamos assistido a uma grande quantidade de realizações
apresentadas em cada um dos portais, nos pareceu que a escolha de cinco (05)
vídeos de cada site seria suficiente para embasar nossas observações, formando
um total de quinze (15) vídeos para amostragem. De modo geral, os escolhidos
estão entre os mais bem-sucedidos em cada um dos portais, mas eventualmente
optamos por vídeos que, embora não tão assistidos quanto alguns dos que não
foram escolhidos, explicitam de modo mais claro características que nos parecem
dignas de observação em nosso trabalho. A seguir, passamos a descrever
brevemente cada um dos quinze vídeos selecionados.

4.2.1. Vídeos hospedados no YouTube

- TAPA NA PANTERA12 (2006, cor, 4 minutos). Dirigido por Esmir Filho,


Mariana Bastos e Rafael Gomes (todos realizadores associados também a
produções em película cinematográfica), tornou-se uma atração emblemática devido
à grande repercussão atingida através da Internet. No momento, somando pelo
menos cinco páginas diferentes de hospedagem no YouTube, o vídeo se aproxima
dos 4 milhões de acessos – um número que dificilmente seria alcançado por meios
tradicionais de exibição. Trata-se de uma comédia apresentada em formato de falso
documentário, compilando as declarações de uma senhora de meia-idade que se diz

12
Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=6rMloiFmSbw>. Consultado em 02 out. 2007.
65

consumidora contumaz de maconha (personagem interpretada por Maria Alice


Vergueiro). O vídeo alcançou tanto sucesso que acabou obtendo considerável
repercussão nos grandes meios de comunicação, transformando a atriz do filme em
celebridade e gerando modismos como o uso das expressões “dar um tapa na
pantera” e “o que faz mal é o papelzinho”. É seguro afirmarmos que, no momento, é
o exemplo mais bem-sucedido da utilização da Internet como alternativa exibidora
para o cinema brasileiro – o momento mais próximo de uma exibição clássica que o
vídeo recebeu foi na 14ª edição do festival Gramado Cine Vídeo (2006),
especializado em produções digitais e que o incluiu na mostra independente de
ficção.

- O PARADOXO DA ESPERA DO ÔNIBUS13 (2007, cor, 3 minutos). Trata-se


de um exemplo curioso, uma vez que o vídeo em questão foi originalmente realizado
para exibição no Curta O Curta – apresentando inclusive os créditos da empresa no
início e no final da exibição. Mas, enquanto os acessos ao vídeo em seu espaço
original não chegavam a quatro mil visitas14, no YouTube ultrapassam o número de
230 mil exibições. Animação com um enredo baseado nos devaneios de um jovem
que espera a chegada do ônibus que o levará para casa, o vídeo já foi selecionado
para festivais de exibição de curtas-metragens, como o Goiânia Mostra Curtas e o
Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro.

- AFINAÇÃO DA INTERIORIDADE15 (2001, cor, 1 minuto). Vídeo dirigido por


Roberto Berliner que se tornou conhecido na Internet como “Efeitos da Maconha”.
Foi realizado na época em que o músico Gilberto Gil não havia se tornado Ministro
da Cultura, e trata-se de um documentário experimental que usa de modo
intencional a característica de Gil de fazer grandes intervalos entre as palavras. Ao
ser colocado no YouTube, o trabalho teve sua lógica de certo modo subvertida, e
passou a ser visto como um trabalho satírico que mostra as pausas como seqüelas
do uso excessivo de substâncias ilícitas. Embora suas várias hospedagens no
YouTube tenham sido efetivadas alegadamente sem o apoio do diretor, o vídeo já

13
Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=Ibow_K7fqF0>. Consultado em 02 out. 2007.
14
Dados revisados pela última vez em 04/11/2007, às 22h.
15
Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=ubO3taHEHig>. Consultado em 02 out. 2007.
66

ultrapassa as 500 mil exibições no site e já foi notícia até em revistas semanais de
informação, de modo que sua inclusão no presente trabalho acaba sendo inevitável.

- O DIA EM QUE O BRASIL FOI INVADIDO16 (2006, cor, 10 minutos). Dirigido


por Abel Filho, o vídeo é na verdade o trabalho de conclusão de curso de alguns
alunos de Publicidade e Propaganda das Faculdades Integradas Barros Melo (PE).
Trata-se de uma animação utilizando técnica de recortes, que relata em tom satírico
os acontecimentos de uma suposta invasão do Brasil pelos Estados Unidos. Após
sua inclusão no YouTube, o trabalho alcançou mais de um milhão de acessos, e
está entre as realizações brasileiras mais assistidas em todo o portal – o que ganha
em importância se considerarmos que o material teve pouca ou nenhuma cobertura
de mídia, alcançando seu sucesso principalmente na base dos comentários dos
espectadores.

- QUACK!17 (2007, cor, 4 minutos). Uma produção realizada pela produtora


Trapizonga Voadora, com a direção de Carlos Eduardo Sobral, Leandro Ibraim e
Bernardo Warman. É um curta-metragem de animação, que conta a história de um
patinho de borracha que sonha em voar junto com os patos de verdade. As
animações em computação gráfica do vídeo são de alta qualidade, semelhantes às
utilizadas por grandes estúdios de animação, e o vídeo inclusive participou de
festivais de animação como o Anima Mundi. Embora tenha sido disponibilizado no
YouTube há menos de cinco meses, já soma mais de 170 mil acessos, um número
respeitável levando em conta o pouco tempo de exibição online.

4.2.2 Vídeos hospedados no Porta Curtas

- A SAUNA18 (2003, cor, 15 minutos). Dirigido por Marco Abujamra, narra a


história de um cidadão comum que, ao envolver-se em uma aventura extraconjugal,
acaba provocando uma tragédia familiar e mudando completamente os rumos de

16
Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=JffmWtjxVq8>. Consultado em 02 out. 2007.
17
Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=aP2TnodSXoI>. Consultado em 02 out. 2007.
18
Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1484>. Consultado em 02 out. 2007.
67

sua vida. É, atualmente, o vídeo mais assistido de todo o acervo do Porta Curtas –
curiosamente, um filme que teve uma repercussão modesta em festivais e salas de
cinema, alcançando apenas na Internet sua repercussão mais plena.

- ALMAS EM CHAMAS19 (2000, cor, 11 minutos). Animação de forte conteúdo


erótico, dirigida por Arnaldo Galvão, que descreve a relação destrutiva que se
estabelece entre um bombeiro e a moça que salvou de um incêndio. Recebeu dois
prêmios no Festival de Gramado de 2000, além de ter sido selecionado para o
Festival Internacional de Curtas de São Paulo do mesmo ano. Conta com a
participação da atriz Marisa Orth, famosa por seus trabalhos na televisão, que faz a
voz feminina quando da leitura de uma carta.

- SEXO VIRTUAL TÁCTIL20 (2003, cor, 8 minutos). Vídeo experimental


realizado sob a direção de Marcius Barbieri, igualmente marcado por seu conteúdo
sexual. Lida com as circunstâncias que envolvem dois homens e a utilização por um
deles de uma boneca de borracha. Curta-metragem com uma longa lista de
premiações e seleções em festivais, está atualmente entre os vídeos mais visitados
do acervo do Porta Curtas.

- A BREVE ESTÓRIA DE CÂNDIDO SAMPAIO21 (2001, cor, 16 minutos).


Segundo as estatísticas fornecidas pelo site, trata-se do vídeo com melhor votação
do público dentre todos os incluídos no arquivo do Porta Curtas. Ficção dirigida por
Pedro Carvana, mostra o drama que surge quando uma emergente pouco inteligente
interfere na vida de uma mãe miserável para causar boa impressão em seu círculo
social. É uma realização de estética totalmente referente ao modelo clássico dos
curtas-metragens, sem maiores experimentações estéticas ou narrativas – embora
conte com um roteiro inventivo, que dispõe as surpresas de modo inteligente ao
longo do filme.

- A CASA22 (2004, cor, 3 minutos). Animação dirigida por Andrés Lieban, que
usa a clássica música de Vinícius de Moraes (era uma casa muito engraçada...)

19
Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=52>. Consultado em 02 out. 2007.
20
Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=2033>. Consultado em 02 out. 2007.
21
Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=200>. Consultado em 02 out. 2007.
22
Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=2038>. Consultado em 02 out. 2007.
68

como base para seu roteiro. Mostra um mímico que vai aos poucos construindo uma
casa, com elementos que pertencem ao reino da imaginação. Um dos poucos
curtas-metragens do Porta Curtas realizados diretamente em suporte digital, é um
trabalho visualmente bastante simples, mas singelo, e que foi exibido com destaque
também no festival Anima Mundi de 2004.

4.2.3. Vídeos hospedados no Curta O Curta

- TORTO23 (2006, cor, 13 minutos). O documentário dirigido por Samuel Alves


de Castro é o campeão de visitas no sistema do Curta O Curta, contando com mais
de 26 mil acessos em cerca de um ano de exibição online. O vídeo se propõe a
retratar a vida de pessoas que moram em alguns dos prédios ‘tortos’ da cidade de
Santos (SP), construídos em áreas impróprias para edifícios de grande porte.
Mesclando depoimentos dos moradores com a opinião de pessoas que nunca
entraram em prédios do tipo, vai sendo construído um mosaico da vida dentro
dessas residências, revelando aspectos cômicos ou surpreendentes do dia-a-dia de
quem nelas vive.

- SENHORES DA GUERRA24 (2004, cor, 5 minutos). Dirigido por Pedro


Lobito, o vídeo é basicamente uma dura crítica às políticas econômicas do governo
dos Estados Unidos, apresentando uma série de imagens obtidas em veículos de
imprensa com o fundo musical de uma canção de Bob Dylan. É talvez um dos
primeiros e mais bem sucedidos de uma série de trabalhos criados por inúmeros
realizadores, profissionais ou amadores, todos com um princípio semelhante: fazer
colagens de imagens estáticas exibidas em seqüência com uma música ao fundo.
No caso específico, a motivação é de natureza acusatória, e o vídeo está disponível
também em um domínio próprio25, com versões em português e inglês – no Curta O
Curta, ele aparece com legendas em português.

23
Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/258/>. Consultado em 02 out. 2007.
24
Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/28/>. Consultado em 02 out. 2007.
25
Disponível em <http://www.pedrolobito.com/exp_senhores_da_guerra.html>. Acessado em 11 nov.
2007.
69

- BAIESTORF – FILMES DE SANGUEIRA E MULHER PELADA26 (2005, cor,


20 minutos). Documentário que faz um resgate da carreira do realizador catarinense
Petter Baiestorf, que há décadas produz filmes de terror de baixo custo em formato
VHS. O trabalho é dirigido por Christian Caselli, e mescla entrevistas com imagens
de arquivo para contar a história de vida de Baiestorf, um produtor quase obsessivo
que acabou se tornando uma figura cultuada no circuito alternativo de terror.

- ANTES / DEPOIS27 (2005, cor, 9 minutos). Também dirigido por Christian


Caselli, esse curta-metragem de ficção aborda questões bem distintas das incluídas
no trabalho anterior. Realizado com os negativos recebidos como prêmio no Festival
de Taguatinga (2002), o curta-metragem conta uma história fragmentada que brinca
com elementos ligados à sexualidade e explora uma linha narrativa próxima do
absurdo. A ligar os diferentes recortes da trama, a utilização dos conceitos de
“antes” e “depois”, que vão guiando o espectador durante as reviravoltas do roteiro.

- TRIÂNGULO28 (2004, cor, 7 minutos). Produzido durante uma oficina


ministrada pelo Ateliê da Imagem, uma das empresas parceiras do Curta O Curta. O
vídeo tem sua direção assinada por Robson Lopes, e explora situações geradas
pelo desprezo de um marido às tentativas de aproximação de sua esposa. É um
trabalho mais linear, que explora elementos de subjetividade e mescla imagens
modificadas digitalmente com trechos captados através da técnica stop-motion29.

4.3. ANÁLISE COMPARATIVA DOS VÍDEOS PRESENTES NOS SITES

Já em uma análise superficial dos vídeos incluídos na fase final de nosso


estudo ficam bastante claras as várias diferenças visuais e conceituais que os
separam e os individualizam. Temos, entre outros, trabalhos que circulam pela
ficção, pelo documentário ou por ambos ao mesmo tempo; que apostam em
26
Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/122/>. Consultado em 02 out. 2007.
27
Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/123/>. Consultado em 02 out. 2007.
28
Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/58/>. Consultado em 02 out. 2007.
29
Técnica de utilização mais comum em filmes e vídeos de animação, que consiste na produção de
uma série de imagens paradas (stills), na qual a disposição dos objetos vai sendo modificada para
que, quando editadas em seqüência, produzam a ilusão de movimento.
70

histórias cômicas, dramáticas, poéticas ou de denúncia política; vídeos que se


constituem a partir da atuação de atores ou que fazem uso de variados tipos de
animação; produtos realizados diretamente para exibição na Internet ou que, por
variadas circunstâncias, acabaram incluídos na Rede em um momento posterior. A
uni-los, apenas o fato de terem, de um modo ou de outro, alcançado sucesso junto
ao público virtual. No entanto, onde em um primeiro momento se enxerga apenas
uma mistura pouco coerente de idéias e diferenças, nos parece possível encontrar
também consideráveis semelhanças – e a partir da localização de tais elementos
convergentes, revelam-se aspectos que indicam, se não respostas, ao menos
tendências para a realização audiovisual no terreno ainda quase inexplorado da
Internet.
Primeiramente, nos chama a atenção o fato de a maioria dos vídeos possuir
durações iguais ou inferiores a dez minutos. De fato, apenas quatro dos quinze
trabalhos ultrapassa com folga essa marca – “Almas em Chamas”, embora
apresente duração final de onze minutos, possui créditos finais extensos que
acabam alongando sua projeção, tendo cerca de nove minutos e meio de história
propriamente dita. E dos que passam largamente da duração “padrão”, dois são
documentários e dois são curtas-metragens planejados originalmente para salas de
cinema, que só em momento posterior encontraram espaço na web para sua
exibição. Certamente, parte dos demais trabalhos também foi originalmente
projetada para a distribuição tradicional (o próprio “Almas em Chamas” e “Quack!”
são dois exemplos), mas parece que se insinua aí um primeiro elemento de ligação,
uma primeira característica observável nos vídeos de maior demanda no mundo
virtual, e que se refere ao tempo que utilizam para contarem suas histórias. E que,
mais do que apontar uma função dos filmes, pode referir-se igualmente, ou de modo
ainda mais intenso, a uma função do público que os assiste.
Como já dito em momentos anteriores de nosso estudo, os recursos técnicos
envolvidos na projeção de vídeos pela Internet ainda estão em desenvolvimento, o
que acarreta dificuldades perceptíveis em sua utilização. Vídeos maiores demandam
mais tempo para que o streaming seja plenamente carregado, além de oferecerem
mais riscos de interrupção indesejada em sua reprodução. Em uma conexão de
Internet cuja velocidade de transferência não seja tão boa, o tempo necessário para
carregar plenamente um conteúdo de 13 ou 15 minutos pode ser simplesmente
longo demais, desestimulando o usuário a esperar e o levando para outras páginas
71

e outros conteúdos. Mais do que isso, o usuário da Rede pode simplesmente não
estar disposto a investir tanto tempo em um único conteúdo. Praticamente todos os
autores utilizados na construção dos conceitos teóricos de Internet concordam que o
multimídia prevê acesso instantâneo, multiplicidade de conteúdos e a navegação
rápida entre os diferentes pólos de informação (websurfing). De fato, já é
praticamente senso comum associarmos a Internet a esses conceitos. Vídeos de
duração menor não só seriam tecnicamente mais fáceis de assistir, como se
adequariam melhor aos interesses do próprio público consumidor da web –
oferecendo entretenimento rápido e que logo abre espaço para que o usuário
busque outros conteúdos, outras possibilidades de informação. Um trabalho de
quinze minutos pode ser breve para os padrões do cinema – mas não esqueçamos
que o ambiente da projeção cinematográfica prevê a imersão, o mergulho da
consciência em um mundo à parte onde nada deve distraí-lo do espetáculo oferecido
a seus olhos e ouvidos. Duas horas de filme é uma duração adequada para uma
sala de projeção, mas possivelmente jamais o seja para a tela de um computador –
de fato, talvez mesmo uma duração de vinte minutos já se mostre demasiado longa
neste caso. Em resumo, um trabalho mais extenso pode não só não ser adequado
ao formato da Internet, mas igualmente falhar em relação ao público da Internet –
razão pela qual as produções mais breves alcançariam maior êxito no presente
estágio de utilização da web.
A produção de histórias mais curtas e de trabalhos menos extensos é uma
prerrogativa que parece bastante adequada ao âmbito da animação – o que nos
conduz a outra característica perceptível na amostragem que analisamos. De fato, e
desde o seu surgimento, a animação apresenta um elo que a une aos formatos de
menor duração – basta lembrarmos que originalmente os desenhos animados eram
destinados a preencher espaço entre as sessões de cinema, oferecendo
entretenimento por alguns minutos enquanto o filme de longa-metragem não
iniciava. Cinco dos quinze trabalhos escolhidos são animações, realizadas com
diferentes graus de complexidade – e um sexto trabalho, “Senhores da Guerra”,
pode talvez ser incluído na conta, uma vez que apresenta uma série de imagens
estáticas (stills) que só ganham sentido quando dispostas em ordem e com o tema
musical ao fundo. De qualquer modo, é nada menos do que um terço dos vídeos
selecionados – uma porcentagem que nos parece significativa, e que encontra
72

consonância nos estudos de Louise Poissant sobre a animação e suas


possibilidades criativas dentro do universo virtual.
As possibilidades de trabalhar com animação libertam o realizador de uma
série de amarras. De fato, uma grande quantidade de histórias ou situações podem
se tornar inviáveis artisticamente sem a utilização de recursos animados: do
contrário, como contar a história de um pato de borracha que anseia voar (“Quack!”)
ou de um mímico que constrói sua casa no vazio, a partir de coisa nenhuma (“A
Casa”)? Uma vez que possam ser mobilizados os recursos necessários para
viabilizar a produção, a imaginação do realizador envolvido com a animação torna-
se seu único limite, e o tempo a ser dispensado à concretização de suas ambições
passa a ser o seu maior, talvez único, obstáculo. Já as técnicas utilizáveis não se
limitam aos processos caros e dispendiosos da computação gráfica ou dos
desenhos animados em duas dimensões: enquanto “O Paradoxo da Espera do
Ônibus” trabalha com ilustrações estáticas, cujo movimento advém somente de
efeitos simples de edição, “O Dia Em Que o Brasil Foi Invadido” utiliza imagens
recortadas como personagens e cenários para sua história – aproveitando inclusive
figuras emblemáticas da cultura pop americana como elementos cômicos em sua
sátira aos movimentos bélicos norte-americanos. São alternativas
consideravelmente mais baratas, que apresentam resultados estéticos apreciáveis –
e que podem até não terem potencializado, mas certamente não tolheram as
possibilidades de sucesso dos projetos que as utilizaram.
E, se a simplicidade guiou parte das animações brasileiras mais bem-
sucedidas na Internet, sem dúvida esta mesma simplicidade se manifesta na maioria
das demais produções vitoriosas dentro da nova janela de exibição. Podemos tomar
como exemplo “Tapa Na Pantera”, que de todas é a de maior público e de maior
repercussão no mundo virtual. Não há requintes de cenário, movimentos ousados de
câmera ou efeitos surpreendentes de pós-produção: há apenas uma senhora de
óculos escuros sentada em uma poltrona, falando de sua vivência com o uso de
maconha, e mais nada. O interessante para o espectador, o que prende sua atenção
e o faz assistir ao vídeo até o fim não está na imagem, intencionalmente simples e
despojada: está no texto, nas falas cômicas que se sucedem, na sucessão de
declarações absurdas de uma mulher que diz não ser viciada, mesmo que consuma
a droga há mais de trinta anos. A simplicidade do aspecto visual libera o espectador
para a cumplicidade; a partir daí é o riso, a entrega a uma breve e divertida
73

experiência no papel de ouvinte semelhante a que temos todos os dias, todas as


horas, entre nossos amigos ou familiares. Tamanho minimalismo possivelmente
falhasse se exibido em uma sala de cinema ou mesmo em um canal aberto de
televisão: no ambiente de Rede, já foi capaz de capturar a atenção das pessoas em
mais de quatro milhões de oportunidades.
“O Paradoxo da Espera do Ônibus” e “Afinação da Interioridade” lidam, em
outros termos, com essa mesma simplicidade. O primeiro, que já descrevemos como
simples em sua abordagem visual, se mostra igualmente descomplicado em seu
conteúdo. Durante pouco mais de três minutos, nos tornamos cúmplices dos
pensamentos de uma pessoa em uma parada de ônibus – ouvimos suas
reclamações pela demora da condução, suas dúvidas se o coletivo virá mesmo ou
não, seu dilema entre continuar esperando o mesmo ônibus ou pegar outro que não
o deixa perto de casa, mas que pode passar antes na parada. Mais uma vez, temos
a cumplicidade – o homem é qualquer pessoa que já tenha aguardado por um
ônibus, e seus pensamentos são os de qualquer um que tenha vivenciado situação
semelhante. Já “Afinação da Interioridade” é ainda mais minimalista: durante um
minuto, vemos pouco mais do que uma sucessão de longas pausas de uma pessoa
conhecida (Gilberto Gil) que procura a palavra certa para continuar uma sentença. É
praticamente um não-texto: a graça está no que não é dito, no raciocínio que não se
conclui, até que finalmente surja o conceito estranho e belo que se revela também
como o nome do filme. Por terem sido gravadas em momentos diferentes, as
imagens apresentam enquadramentos distintos, mas mesmo isso seria dispensável:
poderia ser como em “Tapa Na Pantera”, um mesmo campo visual mantido durante
toda a duração do vídeo, e ainda assim o efeito do mesmo restaria inalterado. São
duas simplicidades que andam lado a lado, portanto: a simplicidade estética e a
simplicidade de discurso. Um conteúdo que é breve não deve, em princípio, ser
muito complicado: a não-compreensão implica repetição, voltar ao começo, e no fim
das contas pode resultar tão desagradável para o usuário da Internet quanto a
demora para o encerramento de uma trama ou situação. Caminhamos, então, em
direção a vídeos que apostam no menos pujante, no mais rápido e no mais fácil de
entender – vídeos como os que estão entre os mais buscados e assistidos nos sites
que abraçamos em nosso estudo.
Concentrando nosso olhar sobre os enredos e temáticas dos vídeos, é
possível constatar que, mesmo que a disparidade de assuntos indique claras
74

diferenças, a maior parte deles trata de situações semelhantes quando observadas


de um ponto de vista mais geral. De certo modo, apontam para uma tendência já
presente em quase todas as produções cinematográficas independentes, de quase
todos os lugares: a busca por assuntos incomuns, “à margem”, distantes das linhas
de conteúdo geralmente seguidas no cinema consagrado pela grande indústria. De
fato, mesmo produções como “A Breve Estória de Cândido Sampaio” e “Sexo Virtual
Táctil”, que nasceram em películas de 35mm e foram concebidas para as salas de
cinema, carregam em seus enredos o uso mais ou menos explícito de temáticas que
fogem dos padrões geralmente associados a grandes bilheterias. O primeiro mistura
a elite insensível e alienada, que busca uma filantropia torta e distorcida para a mera
satisfação de seu círculo de amizades, com a pobreza quase absoluta da pedinte
que carrega o filho em suas peregrinações, e que come dos mesmos restos que
oferece para seu cachorro vira-lata de estimação. O segundo curta-metragem vai
mais longe, e de maneira mais chocante: bonecas infláveis (tema, aliás, de certo
modo dividido com “Antes / Depois”), pênis de borracha, voyeurismo e masturbação
– elementos que convergem para uma denúncia dura e sem consolos do
esvaziamento das relações contemporâneas. As cenas de sexo presentes no filme
chocam ainda mais por serem artificiais: a boca que pratica o sexo oral é de plástico,
e o pênis que participa do ato é feito de borracha. Até mesmo um documentário
como “Baiestorf – Filmes de Sangueira e Mulher Pelada” entra sem problemas em
tal conceito – afinal, o homem cuja história é relatada não encontrou sua fama nos
holofotes das mídias consagradas, e sim no submundo, no “lado de fora” do
cotidiano e, no caso específico, do próprio cinema. Não se pode dizer que qualquer
um desses temas seja inédito para a expressão cinematográfica – mas, a julgar pela
recepção recebida por esses filmes quando transpostos ao ambiente virtual, são
elementos que apelam diretamente ao público que busca vídeos na Internet.
Parece-nos importante deixar claro, nesse ponto, que a idéia de “à margem”
parece cobrir satisfatoriamente apenas parte das produções de melhor desempenho
nos sites brasileiros de vídeos para Internet. De fato, um mesmo assunto – por
exemplo, a atual situação de hegemonia política e militar dos Estados Unidos – pode
ser tratado tanto em uma perspectiva amarga e revoltada (“Senhores da Guerra”),
quanto em tons mais irônicos e até mesmo debochados (“O Dia em Que o Brasil Foi
Invadido”). Na verdade, parece que chegamos aqui em uma bifurcação: de um lado,
conteúdos que atendem a um público mais sério e em busca de algum tipo de
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desafio ou confrontação, e do outro vídeos mais leves, que tratem de questões


variadas com um toque de humor e desprendimento. A julgar pela amostragem aqui
analisada, há espaço para os dois extremos, embora com uma ligeira predileção do
público pelo segundo. No fundo, insistimos, não há tanta novidade nisso: é a mesma
equação que se aplica há décadas ao cinema tradicional, aqui apenas transportada
para um ambiente virtual e multimídia. Somos levados, então, a concordar com
Castells: a Internet não se mostra capaz de mudar os interesses de seus usuários,
mas sim de se moldar a eles, adaptando seus recursos no sentido de atender a
esses desejos e ambições. Um usuário que queira entretenimento leve e pouco
profundo encontrará o que deseja, do mesmo modo que alguém que busque
projeções audiovisuais de sua inconformidade com o status quo será igualmente
contemplado por conteúdos adequados aos seus interesses. O que muda não é
tanto o conteúdo, muito menos o interesse: é o formato, a ordenação dos elementos
usados na representação da parcela de realidade que se pretende mostrar. E nisso
o vídeo aplicado à Internet parece pouco diferir do efeito causado sobre outras
expressões humanas, como a escrita, a música e a ilustração – por mais que
pudéssemos, no início, pensar o contrário.
Por fim, o que poderia ser dito sobre o e para o realizador, aquele que no fim
das contas tem a oportunidade de usar criativamente os recursos e ferramentas da
exibição em streaming pela Rede Mundial de Computadores? De modo geral, somos
levados a deduzir que os melhores desempenhos são alcançados ou pelos vídeos
idealizados para a Internet, ou pelas produções que coincidentemente apresentavam
elementos de melhor funcionamento dentro das especificidades do meio. A luta de
um diretor ou roteirista segue inalterada: capturar a atenção do espectador, mantê-lo
atento ao vídeo ou filme do seu começo até o seu encerramento. E isso passa
necessariamente – e como, aliás, não poderia deixar de ser – por uma compreensão
do público a ser atingido e do espaço onde seu produto estará disponível. A simples
realização de um trabalho nos moldes tradicionais e sua aplicação posterior no
espaço virtual pode até funcionar em muitos casos, mas aparentemente não é o
melhor procedimento para quem deseja de fato usar a Internet como meio de
distribuição e exibição daqui por diante. Para realizações já concluídas, a Internet
parece uma alternativa de alcance simples e possibilidades reais de bons resultados
– temos aqui alguns exemplos claros que não nos permitem pensar de outro modo.
“A Sauna”, por exemplo, não é exibido em cinemas ou televisão há anos, mas no
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espaço oferecido pelo Porta Curtas usufrui de um público constante, renovável e


potencialmente inesgotável. O dilema proposto aqui não se aplica a essas
realizações: refere-se, isso sim, aos novos realizadores, aos novos distribuidores,
àqueles que têm em suas mãos a responsabilidade de trazer renovação ao cinema
brasileiro. Um diretor que queira atingir sucesso na web possivelmente terá que ter
um pouco de ousadia – do mesmo modo que um produtor que quiser usar a Internet
no máximo possível de suas potencialidades terá que buscar esse tanto de ousadia
nos diretores e roteiristas com os quais decida trabalhar. Tendo como base a análise
sem dúvida incompleta que aqui realizamos, consideramos lícito concluir que os
melhores resultados foram obtidos por quem teve sucesso em ser diferente, em
entender pelo menos parte das muitas mudanças que a virtualidade trouxe ao
mundo e usar essas mesmas características a favor de sua própria criatividade.
Talvez alguns tenham, por assim dizer, ido longe demais – é difícil imaginar, por
exemplo, “Tapa Na Pantera” sendo exibido em uma sala de cinema, logo antes de
algum blockbuster norte-americano. Mas, para um trabalho que custou muito pouco
e já foi assistido por milhões de pessoas, isso faz realmente diferença? Eis, talvez, a
real natureza da questão que a Internet levanta para realizadores e distribuidores: ou
adaptar a virtualidade a seus interesses, buscando obter o melhor de dois mundos,
ou abraçar de vez a Internet e tudo o que ela representa.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

De modo geral, acreditamos que nosso estudo foi produtivo e que


conseguimos atingir os objetivos propostos para o trabalho. As leituras realizadas
auxiliaram na construção de um referencial teórico importante para nossas
observações, permitindo compreender a complexidade envolvida na fusão de duas
realidades (Internet e cinema) que já são bastante complexas quando vistas
individualmente. Em especial a parte dedicada às tecnologias virtuais serviu para
revelar que, mesmo entre teóricos respeitados mundialmente, a incerteza e a
diversidade de opiniões impera – e que acertávamos em optar por um estudo de
caráter exploratório, que no fim das contas se mostrou mais produtivo do que
poderia ter sido se tivéssemos limitado nossa ação à tentativa de comprovar
algumas hipóteses pré-estabelecidas. Já a apreciação que fizemos dos sites
selecionados, mesmo que tenha se distanciado ligeiramente do modelo
originalmente imaginado para sua execução, resultou produtiva, gerando uma série
de reflexões interessantes.
Julgamos pertinente fazer, agora que nosso estudo se aproxima do final, uma
apreciação pessoal sobre os sites e os efeitos que cada um deles possui em termos
de distribuição dos vídeos neles hospedados. Primeiramente, nos parece oportuno
lembrar que, de modo geral, a exibição de filmes em streaming pela Internet não
produz lucro direto algum que não seja a visibilidade para um vídeo – mesmo porque
ninguém paga para assistir vídeos na maioria dos sites do tipo, de modo que a
exibição no caso não gera receita direta. Assim, o foco de atuação da distribuição
pela Internet se modifica: os dividendos obtidos com a exibição não são financeiros,
objetivos, e sim de caráter subjetivo – basicamente, visibilidade para os participantes
no projeto, que a partir daí podem buscar posicionamento em outras mídias ou, em
outro sentido, atrair atenção para outros aspectos de seu trabalho. Por exemplo, os
três diretores de “Tapa Na Pantera” obtiveram sucesso em atividades além da
Internet. Esmir Filho já recebeu várias premiações em festivais de cinema com suas
obras em 35mm, e atualmente está em processo de produção de seu primeiro
longa-metragem. Mariana Bastos também recebeu premiação em Gramado pelo
curta-metragem em película “Perto de Qualquer Lugar” (2007), e os três diretores de
“Tapa Na Pantera” seguem desenvolvendo uma série de vídeos especialmente para
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a Internet (batizada de “vídeos virais”), obtendo variados graus de sucesso. Tudo


isso nos leva a questionamentos que dizem respeito não somente aos méritos da
Internet como distribuição de cinema, mas também qual tipo de cinema se beneficia
com a sua abrangência – e, conseqüentemente, quais características visuais e
narrativas parecem mais adequadas à Internet e ao público que ela atinge.
Uma conclusão bastante óbvia refere-se ao público visitante de cada página –
a quantidade de espectadores atingida de cada portal, por assim dizer. Nesse
sentido, o sucesso do YouTube e sua primazia sobre os outros dois sites estudados
aqui é evidente. Enquanto os recordistas de acessos nos domínios Porta Curtas e
Curta o Curta oscilam na faixa das 25 mil visitas, o mais visitado dentre os que
selecionamos no YouTube ultrapassa os 4 milhões de acessos – uma diferença de
resultados impressionante. Na verdade, os próprios padrões de sucesso virtual se
modificam consideravelmente em um e nos outros: uma média de dez mil acessos
seria considerada excelente para os padrões do Curta O Curta, mas seria tida como
discreta, ou mesmo insuficiente, se o mesmo vídeo estivesse hospedado no
YouTube.
Algumas explicações podem ser consideradas em um esforço para
compreender essa situação. É evidente que o YouTube tem recebido maior atenção
das mídias clássicas, e que sua abrangência planetária transcende totalmente as
próprias diretrizes de atuação dos outros dois sites. No entanto, acreditamos que a
liberdade de acesso a seus recursos e a variedade de seus conteúdos são os
diferenciais mais significativos no caso em questão. O YouTube um lugar onde é
disponibilizado todo tipo de material em vídeo, o que acaba compreensivelmente
atraindo para o portal todo o tipo de usuário de Internet. A maioria dos conteúdos,
como já colocamos anteriormente, não podem ser diretamente associados com
cinema, por não apresentarem características que julgamos, já quase por senso
comum, referenciais de tal manifestação artística – a maior parte deles de cunho
estético e textual. Porém, tem sido esse material – que é audiovisual, embora não
cinematográfico – que tem atraído o maior número de visitas no YouTube, e não
surpreende que os reflexos dessa reunião de novas características reflita-se no
conteúdo mais próximo do cinema, também disponível no site. Em resumo, quem vai
ao Porta Curtas ou ao Curta O Curta já tem uma idéia concebida no sentido de
querer assistir a cinema em curta-metragem – ninguém procuraria vídeos de festas
ou trechos de shows de música nesses domínios, pois é evidente que tais conteúdos
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não seriam incluídos no acervo deles. Já quem visita o YouTube, na maior parte das
vezes, busca simplesmente entretenimento em vídeo – possivelmente entrando em
contato com os trabalhos de curta-metragem de maneira muito mais casual.
Há, portanto, uma divisão de público que se insinua nesse momento – e que
pode ser de interesse para quem invista na distribuição via Internet. No Porta Curtas
e no Curta O Curta, o público é mais específico, pessoas de fato interessadas em
produções de cunho cinematográfico e na linguagem estética e textual, geralmente
aplicada ao cinema. Já no YouTube, a fórmula é livre, quase anárquica – fórmula
que, de qualquer modo, produz os melhores resultados práticos em termos de
público. O que interessará mais ao distribuidor, a partir daí, é uma decisão dele –
que talvez não seja consoante com os interesses do diretor ou das demais pessoas
envolvidas com a produção de um material audiovisual, de qualquer modo.
Acreditamos ser igualmente digno de menção o tratamento dado por cada um
dos portais ao espaço de exibição dos vídeos – ou seja, à janela de exibição
propriamente dita. O Youtube é, dos três sites, o mais versátil – permitindo que o
usuário assista ao vídeo em dimensões tanto maiores quanto menores do que o
tamanho original. Do mesmo modo que o Curta O Curta, o YouTube oferece a opção
de tela inteira (full screen), de visualização mais agradável quando a imagem
apresenta boa definição. O Porta Curtas, infelizmente, está na contramão dos outros
dois portais, e oferece os vídeos em um tamanho fixo, bastante pequeno e que se
torna desconfortável após poucos minutos de exibição. Ou seja, o portal soma às
dificuldades inerentes ao ato de assistir a filmes no computador – tela pequena e de
luminosidade que agride à visão, assentos pouco confortáveis, som de baixa
fidelidade – um empecilho extra, que dificulta a imersão e acaba se tornando quase
um convite ao abandono do vídeo e à procura de outros sites de entretenimento.
Considerando o estudo que desenvolvemos até aqui, o problema mostra-se bem
mais grave do que poderia parecer em um primeiro momento – ainda mais por tratar-
se de vídeos que não foram feitos para a plataforma virtual, e que acabam sofrendo
ainda mais se exibidos em um espaço incapaz de realçar suas qualidades
imagéticas. Parece-nos importante que o Porta Curtas reveja o formato e as
dimensões da janela de exibição dos vídeos, sob pena de distanciar-se mais ainda
do público que assiste a filmes na web.
Outro ponto que se evidencia é a limitação que atinge o Porta Curtas e o
Curta O Curta devido ao idioma que utilizam para a navegação. São sites em
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português, focados no público brasileiro, e que não oferecem opções para usuários
de outras línguas. O YouTube, ao contrário, tem no inglês a sua língua matriz, e
oferece opções de navegação em outros idiomas – inclusive em português. Ou seja,
já se mostra de imediato mais aberto ao público da Internet do que os outros dois
portais estudados aqui – um público que, é importante frisar, não está contido pela
maior parte das barreiras nacionais na hora de escolher o que deseja acessar na
Internet. Uma das maiores potencialidades da Internet está justamente em suas
possibilidades interativas, na utopia que transforma todo conteúdo em material
acessível a qualquer um – e a utilização exclusiva do português é uma evidente
inadequação, especialmente se levarmos em conta que o material incluído nos sites
destina-se à apreciação do maior número possível de pessoas. Parece-nos que a
opção de navegação em inglês ou a inclusão de arquivos com legendas nesse
idioma – coisa que alguns realizadores já fazem no YouTube por conta própria –
poderia modificar consideravelmente os números obtidos por Porta Curtas e Curta O
Curta até o momento.
Seja como for, acreditamos serem naturais essas dificuldades de
compreensão da Internet enquanto suporte para cinema – especialmente por
refletirem uma indefinição muito maior e que, de diferentes maneiras, se manifestou
no decorrer de nosso estudo. Talvez inconscientemente, carregávamos no começo
de nosso trajeto a idéia de que o cinema, de algum modo, podia encontrar na
Internet um espaço para sua disseminação – e agora temos elementos que, embora
não exatamente a refutem, são capazes de abalar essa certeza. Àqueles que acham
que basta colocar um vídeo na Internet para atingir os benefícios de exposição em
um espaço sem fronteiras, somos levados a dizer que, a julgar pelo aqui exposto, as
coisas não são bem assim. O que dá certo na Rede, de certo modo, é o que não é
cinema – ou, pelo menos, o que reinventa o cinema a ponto de em certos casos
torná-lo quase irreconhecível. A linguagem que nos acostumamos a apreciar em
salas de projeção ou mesmo no conforto de nosso lar não é, na maior parte do
tempo, a mesma que encontramos em sites de vídeo, entre visitas a algum blog ou
conferindo as novas mensagens em nossa caixa de e-mails. O que será essa
linguagem, no fim das contas, é difícil dizer, e vai além dos objetivos que traçamos
para esse trabalho. Mas a idéia de distribuir cinema pela Internet, que foi a maior
motivadora do nosso esforço de compreensão, acaba posta sob suspeita: afinal, se
os conteúdos de maior sucesso são os que se distanciam do modelo
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cinematográfico padrão, pode ser que para um distribuidor acabe não sendo
interessante distribuir, no fim das contas, o que nos acostumamos a chamar de
cinema.
Nesse momento, sentimos-nos seguros para indagar: afinal de contas, o que
quer o público que assiste a vídeos pela Internet? Com base nos dados que
coletamos e analisamos, evidencia-se que a maioria não está diretamente
interessada em cinema, pelo menos não nos moldes clássicos que nos
acostumamos a associar a ele. Trata-se, como fica claro no decorrer do nosso
estudo, de um espaço diferente, que por vários motivos não pode ser diretamente
comparado ao que existia antes dele – e nada mais natural que o público atingido
por essa renovação seja, ele próprio, renovado também. Assim, não estamos
tratando a priori com o mesmo tipo de espectador que paga ingresso para ir a uma
sala de cinema ou que divide com a família o aluguel de um DVD para assistir em
casa – e, mesmo que sejam muitas vezes as mesmas pessoas, nada nos dá a
entender que elas busquem na web o mesmo que buscam no cinema ou nas
locadoras. Pelo contrário: os resultados de nosso estudo apontam em outro sentido.
Se as respostas obtidas pelos vídeos nos servem de referencial - e acreditamos que
sirvam – temos um público que prefere atrações de poucos minutos de duração,
com mensagens de fácil apreensão, e que não dá tanta atenção a requintes
narrativos ou de linguagem visual. Um público que quer, sim, rir ou se emocionar,
mas que não parece disposto a esperar muito tempo por isso – mesmo porque
existe muita informação em outros lugares da web, e ele deseja estar livre o mais
rápido possível para acessá-los. E, além disso, trata-se de um público que tende a
crescer, na medida em que se democratiza o acesso a conexões de banda larga e
vão se sofisticando os processos tecnológicos envolvidos na transmissão de vídeos
pela Rede Mundial de Computadores.
Ou seja, a realização cinematográfica só poderá usar a Internet a pleno na
medida em que compreender não só seus mecanismos, mas também o público que
nela navega – e, a partir de tal conhecimento, planejar suas ações no sentido de se
adequar à web, e não ficar esperando que aconteça o contrário. Acreditamos,
tomando como base a nossa pesquisa, que a fórmula até aqui utilizada pelas
empresas cinematográficas – ou seja, a liberação do mesmo filme para uso nas
demais janelas de exibição, no máximo com algum material extra no caso dos DVD’s
– tende a não reproduzir os mesmos resultados caso seja aplicada na Rede sem
82

adaptações. Seria, no fundo, sub aproveitar as potencialidades da Internet, e


acreditamos que quem desejar utilizar a Rede no máximo de suas capacidades deve
investir na busca de novas linguagens, de caminhos mais adequados a uma
realidade que está em todos os lugares e que pode atingir uma quantidade enorme
de usuários em questão de instantes. A web não é apenas mais um lugar para exibir
filmes, mesmo que eles sejam curtas-metragens – é um novo espaço, que engloba
os outros meios e os reinventa, e que assim deve ser visto e interpretado. Parece-
nos que só assim a Internet poderá, de fato, cumprir todas as suas promessas, e
representar um novo momento para a realização audiovisual brasileira e mundial.
83

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Livros:

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Dissertações de mestrado:

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MUNIZ, Diógenes. Diretor do curta “Tapa Na Pantera” vai estrear em longa-


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Fãs acham que novo CD do Radiohead vale entre R$10 e R$16. Disponível em:
<http://cifraclub.terra.com.br/noticias/6484-fas-acham-que-novo-cd-do-radiohead-
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Revista Time considera YouTube a melhor invenção do ano. Disponível em:


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SILVA, Daniel. O vídeo "O dia em que o Brasil foi Invadido" e o filme "Sede,
Invasão Gota a Gota". Disponível em: <
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Revistas e periódicos:

NAUGHTON, John. Os 15 reis do clique. Carta Capital, São Paulo, Ano XIII, nº 408,
p. 10-18, ago. 2006.

SANCHES, Pedro Alexandre. A marca da pantera. Carta Capital, São Paulo, Ano
XIII, nº 408, p. 06-07, ago. 2006.

SOUSA, Ana Paula. Já vi esse filme... Carta Capital, São Paulo, Ano XIII, nº 408, p.
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Entrevistas:

WORCMAN, Júlio. Sem censura. Entrevistadora: Leda Nagle. Rio de Janeiro: TVE /
Rede Brasil, 2003. Disponível em
<http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1534>. Acessado em: 14 out. 2007.
88

ANEXO A – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (I)


89

ANEXO B – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (II)


90

ANEXO C - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (III)


91

ANEXO D - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (IV)


92

ANEXO E - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (V)


93

ANEXO F - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (VI)


94

ANEXO G – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (I)


95

ANEXO H – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (II)


96

ANEXO I – VISUALIZAÇÃO DA JANELA DE EXIBIÇÃO DO SITE PORTA


CURTAS
97

ANEXO J – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (I)


98

ANEXO K - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (II)


99

ANEXO L - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (III)

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