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O Corpo Amordaçado:
Atos Perversos Como Tentativa de Autocura do Sujeito com Psicose Infantil
Ismael Pereira de Siqueira, UCB - Universidade Católica de Brasília
Rodrigo Otávio Fonseca, Unilavras

Resumo
O objetivo do presente estudo é discutir o sentido dos atos perversos dirigidos ao corpo das
crianças com Psicose Infantil. Parte-se de uma reflexão sobre o lugar do corpo na constituição do
sujeito e os descaminhos que implicam na Psicose Infantil e na Perversão, evidenciando que o
corpo da criança psicótica, encontra-se num estado de indiferenciação em relação ao corpo
materno, impedindo a criança de se constituir como sujeito. Os atos perversos das crianças
psicóticas podem ser aqui considerados como uma primeira e parcialmente mal-sucedida
tentativa de diferenciação, pois, impedem a criança de se haver com a angústia de castração e se
constituir como sujeito. Sabendo-se que as Psicoses Infantis são não-decididas, conclui-se
propondo caminhos para que a intervenção terapêutica com essas crianças possa permitir à
criança, tomar posse de seu corpo e concluir o seu processo de estruturação.
Palavras-Chave: Corpo, Perversão, Psicose infantil, Constituição Subjetiva.

1. Introdução: As Psicoses Não-Decididas na Infância


A Psicose Infantil se estrutura a partir de uma falha na função paterna, ou como relata
Kupfer (2000), a partir da já conhecida afirmação lacaniana sobre o mecanismo da forclusão do
Nome-do-Pai. Assim, pode-se pensar que na origem de toda psicose infantil existe uma mãe
onipotente que, ao não abrir espaço à operação da função paterna, através da castração, impede
instalação do significante primordial, constituindo uma forma particular de discurso, onde nada
falta, que não possui quaisquer roturas, espaços ou pontos de articulação. Tal estado constitutivo
se estabelece a partir dessa posição na qual a mãe se torna o objeto fálico por excelência.
Dinâmica que impede o bebê a ascender frente a seus próprios anseios pulsionais. Essa “mãe
fálica” como bem cita Aulagnier, se torna uma mãe cuja onipotência lança o bebê nesse condição
alienante; fragmentação que se rlvela em importantes sinais e sintomas psicopatológicos
presentes na psicose infantil.
Os delírios, as alucinações, as estereotipias verbais e toda a série de vicissitudes que
marcam o discurso psicótico, podem ser entendidas como uma tentativa de produzir essa falta
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subjetivante no discurso ou, como uma tentativa de abandonar o lugar de objeto parcial do desejo
dos pais, ao qual, acha-se alienado.
Calligaris (1989) evidencia que, não existe estruturação subjetiva antes da saída na
puberdade. Dessa maneira, pode-se pensar com Jerusalinsky (1993), citado por Kupfer (2000)
que as psicoses infantis precoces devem ser consideradas como não-decididas, havendo ainda
diversas saídas para a constituição subjetiva dessas crianças. Aliás, essas saídas marcam a
diferença entre a psicose infantil e a eclosão da psicose no adulto.
Ao se considerar a Psicose como uma falha na instalação da matriz significante: Nome-
do-Pai, enodando o sujeito num estado de objeto do desejo materno, pode-se questionar sobre
quais os efeitos da Psicose Infantil no corpo da criança. Tal questionamento se torna ainda mais
importante quando consideramos as Psicoses infantis, como não-decidas, pois, essa perspectiva
nos leva a pensar em qual o lugar ocupado pelo corpo em desenvolvimento, no processo de
subjetivação da criança psicótica, bem como, tentar compreender quais mecanismos operam
sobre esse corpo ao longo dessas tentativas de subjetivação.
Uma dessas possíveis saídas corporais passa pela perversão, principalmente, pelos atos
perversos em relação ao próprio corpo ou ao corpo de outrem. McDougall (1992) afirma que a
mãe da criança psicótica, ao não permitir nenhuma antecipação ao introjetar à imagem precoce da
imagem dela, acaba oferecendo o seu corpo como objeto substituto à satisfação autoerótica da
criança, impedindo-a de encontrar um espaço de diferenciação, através do investimento narcísico
em sua autoimagem corporal. No intuito de tomar posse de seu corpo, a criança colada a esse
materno corpo perverso, inventa diversos jogos com o seu corpo, tais como, coceiras incessantes,
jogos fecais, retenção de urina e, mecanismos de autolesão e procura da dor. Portanto, essa
tentativa diferenciação é parcial e perversa, pois, na medida em que tenta produzir essa
diferenciação, a criança psicótica, precisa negar visceralmente a angústia de castração, visto que,
a mesma não pode ser significada em seu psiquismo.
Dessa forma, poderíamos compreender nesses atos perversos em relação ao corpo, uma
tentativa mal-sucedida de autocura do sujeito, para a sua psicose? O objetivo do presente estudo é
tentar construir uma hipótese que venha a responder essa pergunta.

2. Corpo e Constituição Subjetiva na Psicose Infantil e na Perversão


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Paralelamamente ao processo de constituição do sujeito, há um processo de


desenvolvimento ou instituição de um corpo na criança. A esse respeito, Kupfer (2000) mostra
que para a Psicanálise, o corpo só pode ser compreendido enquanto construção significante de um
corpo erógeno. Citando Lévin (1996), Kupfer (2000) considera que a infância é justamente um
período marcado pelo trânsito entre o desenvolvimento desse corpo e a constituição subjetiva.
Vorcaro (2003) ao falar sobre o corpo na psicose, relata que a mãe da criança psicótica foi
incapaz de lhe deixar um espaço de antecipação à satisfação de suas necessidades, pois, não
consegue renunciar ao seu lugar narcísico de fonte de satisfação para as necessidades da criança.
Tal impossibilidade de renúncia obriga a criança psicótica a permanecer nesse lugar objetal,
ficando impedida de constituir e operar uma matriz simbólica de seu corpo.
A autora considera que a mãe quem toma o organismo vivo enquanto corpo, antecipando-
lhe um funcionamento. O corpo do bebê é, essencialmente, um corpo marcado (invadido?) pelo
Outro materno. Para que desse corpo possa avir um sujeito, faz-se necessário que entre ele e a
mãe, se instale um hiato, em decorrência de um descompasso entre a necessidade do bebê e a
satisfação oferecida pelo Outro materno.
O corpo do bebê, suposto pela mãe é aquele no qual se estabelece a correlação entre cada
parte a uma unidade global, através do preenchimento imaginário de quaisquer brechas que
possam surgir no corpo do bebê, sendo que, para isso, a mãe utiliza seu próprio corpo para fazer
suplência às aberturas presentes no corpo do bebê, acabando por fornecer-lhe um contorno, que
permite à esse bebê encorpar-se, na medida em que o torna um corpo erógeno.
“ O seio provê o furo da boca ao mesmo tempo em que os braços maternos acolhem o
corpo, o olhar promove a gestalt do corpo envolvendo-o ao articulá-lo aos cuidados que
regulam o que entra e sai do organismo, a vos que contempla essa unidade corpórea e tonifica a
embalagem desta, supondo um sujeito, interrogando-o, supondo-lhe um saber e estabelecendo o
próprio turno dialógico que lhe corresponderia, em cada manifestação de abertura ou de
congestão das aberturas da superfície do organismo. A análise de todos os excessos eliminados
por esse corpo testemunha as condições de seu funcionamento”.(VORCARO, 2003, p. 210)

A imagem corporal da criança, segundo Vorcaro (2003), é constituída na identificação


especular com esse Outro materno, o que acaba por permitir a eclosão do narcisismo primário na
criança, fazendo-a descolar gradativamente desse olhar da mãe. Na medida em que percebe que a
criança, através de seu narcisismo, antecipa uma imagem corporal, acaba por constatar que a
criança, já não é mais um prolongamento de seu corpo, passando a existir enquanto eu.
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Essa constatação gera um descompasso na relação especular, pois, agora, mãe supõe um
saber ao filho, sobre algo que a ela escapa. A mãe, nesse momento, percebe que o corpo da
criança também lhe satisfaz as necessidades, porém, há algo nesse corpo que o diferencia dela.
Podemos pensar que a constatação dessa diferença é a constatação de sua própria falta, restando à
mãe viver o luto pelo objeto perdido e consequentemente o luto de sua própria história como mãe
tipicamente presa nas teias da castração. A restauração de seu estado primitivo de onipotência
pode ser restituída pela condição de objeto que a mãe coloca o bebê frente a seu Ideal
narcísico.“Tudo o que mãe pode fazer é nomeá-la: é você”.(VORCARO, 2003, p.212)
Em contrapartida, essa diferenciação é simbolizante para a criança, na medida em que
possui o valor de castração simbólica. Nesse momento, a criança é obrigada a novamente, voltar
o seu olhar para o Outro materno, pois, mantém a certeza de que é a mãe quem detém o saber
acerca da satisfação de suas necessidades, porém, o descompasso entre a demanda da criança e a
satisfação da necessidade pela mãe, já está instalada, impedindo um retorno ao lugar de objeto.
Portanto, o que está em jogo na constituição subjetiva da criança é a tomada de posse de seu
corpo, visto que, inicialmente, esse corpo é território do desejo materno.
Na Psicose, Vorcaro (2003) afirma haver uma imersão da criança no Outro materno.
Enquanto na neurose, há uma diacronia, ou seja, uma diferenciação, um hiato entre a criança e o
Outro da mãe; na Psicose, estabelece-se uma relação de sincronia e simetria em relação ao Outro,
ocupando um lugar de equivalência ao significante, estando, portanto, tomado pelo Real da
linguagem.
Essa ausência de resíduos da linguagem, de um Real que insiste em escapar, mantém o
discurso do Psicótico como uma colagem, onde não há espaços, quebras, pontos finais. Na
psicose, tudo é contínuo e indiferenciado. Há uma relação simétrica entre Real e Significante, que
resulta em gozo e mata o Simbólico.
3. Corpo, Perversão e Tentativa de Autocura na Psicose Infantil
Dor (1993) relata que, enquanto na neurose, a questão está em Ter ou não o falo paterno,
nas Perversões, a questão se situa na dialética de ser ou não, o falo. Ao ser o falo, o perverso só
pode reconhecer o seu desejo como possível, eclipsando a presença do desejo de um outro como
mediador do desejo do sujeito. Esse processo é descrito em Psicanálise como a negação
(Verneinung??? Ou Verleugnung? Véio... nesse caso acredito ser uma mecanismo de recusa! A
posse do falo eivencia a recusa da percepção da falta... O que vc acha?) da castração,
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evidenciando que a Lei ou o desejo mediador do outro, é sempre colocado como um limite a ser
ultrapassado.
Esse negação só é possível à partir de uma relação de cumplicidade, com uma mãe fálica e
uma complacência e, porque não, aquiescência do pai em relação à essa cumplicidade. A mãe
fálica, excessivamente (e não suficientemente) boa do Perverso, manifesta-se através de respostas
aos apelos eróticos da criança, sendo recebidas por esta, como testemunhos de reconhecimento e
encorajamento.
Em paralelo, Dor (1993) relata haver por parte da mãe uma tendência a silenciar o desejo
paterno, porém, o Nome-do-Pai (percebo aqui a presença da Verleugnung... silenciar o desejo
paterno seria ocultar uma percepção já ocorrida), aqui se faz presente na forma de uma intrusão.
Na medida em que o significante paterno fica fora do discurso da mãe, ela também duvida dessa
total ausência, permitindo, nessa dúvida, a subsistência do Nome-do-Pai. O pai, por sua vez,
aquiesce ao lugar em que é colocado, observando complacentemente essa relação fálica entre
mãe e filho, delegando à mãe o poder simbolizante de sua palavra (a mãe simboliza para ela a
linguagem a fim de evitar a simbolização do filho).
McDougall (1995) citada por Ferraz (2000) afirma que a diferença entre psicose e
perversão reside no fato de que aquilo que foi recusado, não retorna ao sujeito sob a forma de
delírio, obrigando-o a montar infinitas encenações de uma mesma cena para a constante obtenção
do prazer sexual. Dessa maneira, podemos compreender a Perversão como o positivo da Psicose,
guardando com ela, a similaridade da indiferenciação entre o corpo da criança e a mãe.
Calligaris (1989) também afirma que os dois traços fundamentais que marcam a distinção
entre perversão e psicose são justamente a cumplicidade com a mãe e desafio à Lei. Na psicose
não há desafio ou tentativa de usurpação à Lei, simplesmente porque, como vimos anteriormente,
não há qualquer quebra que permita advir um espaço para que o Nome-do-Pai apareça sequer
como intruso.
O corpo perverso seria então, um corpo parcialmente diferenciado, pois, apesar de ainda
ocupar o lugar de objeto do desejo materno, já possui certa antecipação gerada pela dúvida da
mãe em relação à eficácia da oferta desse gozo. O Nome-do-Pai aparece aqui na forma da dúvida
que, a todo tempo ameaça se intrometer nessa relação objetal entre a criança e mãe.
A criança psicótica que manifesta atos perversos, carregados de agressividade e
ritualização em relação ao seu corpo ou ao corpo do outro, tais como: morder, arranhar, cuspir,
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urinar e defecar, parece estar buscando justamente essa diferenciação, porém, tal processo acaba
sendo realizado parcialmente, pois, a criança precisa, a todo tempo, se preservar da angústia de
castração.
As agressões marcam dolorosamente o corpo, numa desesperada tentativa de antecipação,
porém, justamente por marcarem o Real desse corpo ainda não-desenhado, da criança com
psicose infantil não são suficientes para torná-lo um corpo simbolizado, pois, juntamente com a
dor e as marcas no real do corpo, advém a angústia de castração também vivida no Real,
implicando na possibilidade de um iminente colapso da subjetividade da criança, levando-a à
fixar-se em períodos ainda mais arcaicos de sua constituição subjetiva, permitindo até mesmo o
surgimento de sintomas autísticos, conforme a criança falhe em ressignificar o corpo materno e o
seu próprio corpo, por conta da dor da castração.
As intervenções terapêuticas e educacionais junto à criança, devem ajudá-la a realizar essa
diferenciação, tomando posse de seu corpo e se constituindo como sujeito.
Essas intervenções precisam sempre oscilar entre uma série maternagens e castrações, de
modo a permitir ao sujeito elaborar gradativamente essa angústia de castração, e conseguir
alguma diferenciação entre o seu corpo e a mãe. Cabe ainda lembrar que as psicoses na infância
podem ser consideradas como não resolvidas, abrindo espaço a novas possibilidades de
estruturação desse sujeito, ao longo de sua vida.

Referências Bibliográficas:

CALLIGARIS, Contardo. Introdução a uma Clínica Diferencial das Psicoses. Porto Alegre:
Editora Artes Médicas. 1989.
DOR, Joel. Estruturas e Clínica Psicanalítica. Rio de Janeiro: Editora Taurus. 1993.
FERRAZ, Flávio de Carvalho. Perversão. São Paulo: Ed. Casa do Psicólogo. 2000.
KUPFER, Maria Cristina Machado. Notas Sobre o Diagnóstico Diferencial do Autismo e da
Psicose na Infância. Rev. Psicologia USP. Vol. 11. Nº 01. São Paulo. 2000.
MACDOUGALL, Joyce. Teatros do Corpo. Teatros do Eu. Rio de Janeiro: Francisco Alves
editora. 1992.
VORCARO, Angela Maria Resende. O corpo na Psicose. In: LEITE, Maria Virgínia de Araújo.
Corpolinguagem: Gestos e Afeto. Campinas - SP: Ed. Mercado das Letras. 2003.
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Ismael Pereira de Siqueira: Psicólogo Clínico. Psicólogo da APAE de Santa Rita do Sapucaí.
Professor Universitário. Pós-Graduando em Filosofia e Existência pela Universidade Católica de
Brasília.
Email: associação_livre@yahoo.com.br

Rodrigo Otávio Fonseca: Psicólogo Clínico. Professor do Curso de Psicologia do Centro


Universitário de Lavras (UNILAVRAS). Mestre em Psicologia Clínica.
Email: rodrigofonseca@unilavras.edu.br

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