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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA


SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
SEGUNDA VARA FEDERAL

Processo: 2004.82.00.012307-1
Natureza: Ação penal pública
Autor: MPF
Réus: Edmilson Marcondes dos Santos e Antônio José de Farias

S E N T E N Ç A1

DIREITO PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA (CP, art. 333, parágrafo


único) E USO DE DOCUMENTO IDEOLOGICAMENTE FALSO (CP,
art. 304 c/c art. 299). CONCURSO REAL DE CRIMES (CP, art. 69) E
CONCURSO DE AGENTES (CP, art. 29). Oferecimento de vantagem
indevida a procuradores e servidores públicos para a prática de atos
consistentes no cancelamento irregular de débitos tributários juntos à
PFN/PB para fins de expedição de certidões negativas
ideologicamente falsas. Concurso de agentes não comprovado.
Autoria comprovada em relação ao proprietário administrador da
empresa beneficiária. Materialidade comprovada à vista da prova
documental e testemunhal. Procedência parcial do pedido.

PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE. SUBSTITUIÇÃO E


SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE.
No concurso de crimes, a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos ou a suspensão condicional da pena só é
possível se o resultado (soma ou exasperação) não ultrapassar o
limite de quatro anos previsto no CP, art. 44. Precedentes do Superior
Tribunal de Justiça. A condenação por outro crime doloso é causa
obrigatória de revogação do sursis, ex vi do CP, art. 81, I.

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de AÇÃO PENAL PÚBLICA promovida pelo


MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS e
ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS, já devidamente qualificados, dando-os a denúncia como
incursos nos arts. 304 e 333, parágrafo único, ambos c/c os arts. 69 e 29, todos do Código
Penal brasileiro.

Consta da denúncia (f. 02-19) que o inquérito policial anexo à peça vestibular
constituiria parte de oitenta e oito procedimentos investigatórios instaurados para a
apuração da ocorrência de delitos no âmbito da PFN/PB. Diz o MPF que as principais
condutas praticadas pelos responsáveis – sempre mediante o recebimento de alguma
vantagem indevida como contraprestação – teriam sido as seguintes:

1 Sentença tipo D, cf. Res. CJF n. 535/2006.


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a) Cancelamento irregular de débitos inscritos em dívida ativa, sem qualquer


motivação ou com motivação indevida;

b) Emissão de certidões negativas falsas;

c) Redução de débitos para valores correspondentes a 10% (dez por cento),


1,0% (um por cento) e até 0,1% (zero vírgula um por cento) dos valores originais, os quais
eram pagos com os valores reduzidos e, em seguida, extintos;

d) Aquiescência de cessão de títulos públicos inexistentes, para quitação de


débitos tributários e extinção de execuções fiscais;

e) Extinção de execuções fiscais sob falsos fundamentos (existência de


pagamento ou parcelamento, ambos improcedentes).

Apurada a autoria e a materialidade dessas práticas, diz o MPF que foram


denunciados os procuradores da Fazenda Nacional Antônio Tavares de Carvalho e Antônio
Carlos da Costa Moreira (respectivamente procurador-chefe e procurador-chefe substituto
da PFN/PB, os quais atuariam como líderes do grupo), os ex-servidores Edson de
Mendonça Rocha e Ricardo Cezar Ferreira de Lima (que executavam determinações dos
líderes) e, finalmente, o comerciante José Ronaldo Alves Teixeira (o qual teria a tarefa de
aliciar empresários devedores: os corruptores). A denúncia, pelo conjunto dos fatos,
imputou-lhes os crimes de corrupção passiva, falsidade ideológica, associação em
quadrilha, além de crimes contra a ordem tributária.

Descrevendo o modus operandi do grupo, disse o MPF que, além das


irregularidades praticadas em execuções fiscais, e sempre mediante o recebimento de
vantagens indevidas, os procuradores denunciados se utilizavam das prerrogativas
inerentes à função e determinavam aos servidores Edson Rocha e Ricardo Lima que
procedessem ao cancelamento ou redução dos débitos em dívida ativa no sistema de
informática da PFN/PB. Após as alterações no sistema, “quase sempre” eram expedidas
certidões negativas de dívida ativa, encobrindo-se a verdade sobre os contribuintes
inadimplentes. Os “serviços” do grupo eram algumas vezes intermediados por José Ronaldo
Teixeira.

Salienta o MPF que o processo judicial instaurado para a apuração desse fato
(trata-se da ação penal n. 2003.82.00.010554-4, constando dos presentes autos, a f. 652-
749, cópia da denúncia) – considerado o “processo-mãe” – não contemplou a conduta de
todos os empresários beneficiados, que teriam fornecido vantagens indevidas em troca da
prática de (pelo menos) uma daquelas condutas irregulares acima noticiadas, dentre as
quais (destaca-se) a redução dos débitos tributários inscritos em dívida ativa para até um

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décimo dos valores originais, viabilizando o pagamento e a extinção, com a posterior


emissão de certidão de dívida ativa.

Dessa forma, as condutas delituosas praticadas pelos empresários


beneficiários dos serviços do grupo, aqueles que (segundo o MPF) ofereceram vantagens
indevidas para a prática de tais atos, os chamados “corruptores”, deveriam ser apuradas
judicialmente em processos distintos.

Segundo o MPF, seria este o caso do presente processo.

Tratando do que seria o FATO 01, diz o Ministério Público em sua denúncia
que os débitos tributários inscritos em Dívida Ativa da União sob os números 42 2 97
001949-86, 42 2 98 000170-24 e 42 2 98 000171-05, todos em nome da empresa EPI –
EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO, “foram fraudulentamente cancelados pelo ex-
servidor da Procuradoria da Fazenda Nacional, Ricardo Cezar Ferreira de Lima, matrícula n.
16503, conforme documentos de fls. 30/33”. Salienta que, conforme dados extraídos do
SERPRO, as citadas inscrições abrangem créditos de IRPJ relativos aos anos de 1989 a
1992, os quais teriam sido, por duas vezes, indevidamente cancelados pelo ex-servidor
Ricardo Cezar Ferreira de Lima, conforme tabela que apresenta na denúncia.

O MPF ainda faz referência a documentos que comprovariam requerimentos


formulados à PFN para cancelamento de inscrições, os quais teriam sido imediatamente
deferidos e mesmo sem fundamentação adequada. Em certa passagem, diz que embora as
inscrições tenham sido extintas sob a justificativa de “dirimir dúvidas quanto ao litígio do
débito junto à DRF/PB”, os respectivos procedimentos administrativos jamais teriam sido
encaminhados ao mencionado órgão, conforme comprovariam relatórios de movimentação
do COMPROT, o que demonstraria a falsidade do fundamento utilizado.

Destaca ainda a denúncia que, na mesma data (19/12/97) em que cancelada


a inscrição n. 42 2 97 001949-86 foi expedida a Certidão Negativa quanto à Dívida Ativa da
União n. 06155/97, subscrita por Antônio Tavares de Carvalho. Da mesma forma, na mesma
data (23/04/99) em que canceladas as inscrições n. 42 2 98 000170-24 e 42 2 98 000171-05
foi emitida a CND n. 1660/99, subscrita por Antônio Carlos da Costa Moreira.

Conclui o MPF dizendo que, em razão disso, as Certidões Negativas


expedidas tinham, na verdade, conteúdo falso, uma vez que foram expedidas no mesmo dia
em que as respectivas “inscrições em Dívida Ativa da União, em nome da EPI EMPRESA
PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO LTDA., tinham sido fraudulentamente canceladas pela
quadrilha de ex-servidores da PFN/PB” (f. 07). A CND n. 06155/97 teria ocultado um débito
de R$ 161.447,17 e a CND n. 1660/99, um débito de R$ 1.996.732,75.

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Prossegue o MPF dizendo que, além das CND’s n. 06155/97 (19/12/97) e


1660/99 (23/04/99), a EPI EMPRESA PARAÍBA DE IRRIGAÇÃO LTDA. também obteve a
“Certidão Positiva com Efeitos de Negativa n. 00597/98”, subscrita por Antônio Tavares de
Carvalho, atestando que o contribuinte teria parcelado seu débito perante a PFN, estando
em dia com os pagamentos. Ocorre que, conforme o Ofício n. 280/GAB/PFN/PB (f. 163-4
inquérito), a empresa contribuinte não havia feito qualquer parcelamento, o que revelaria a
falsidade da certidão.

Acrescenta que os ex-servidores da PFN sempre agiam motivados pela


percepção de vantagens indevidas, afirmando que a empresa EPI teria, assim, se valido dos
“serviços” prestados por eles mediante contraprestação. Destaca que no mês de
dezembro/1997, quando foi cancelada a inscrição n. 42 2 97 001949-86 e emitida a CND n.
6155/97 em favor da empresa EPI, Antônio Tavares de Carvalho recebeu R$ 4.050,00 sem
origem lícita comprovada, bem como Ricardo Cezar Ferreira de Lima, em valor de R$
1.715,00 (cf. planilha na denúncia).

Da mesma forma, em agosto/1998, mês em que foram canceladas as


inscrições n. 42 2 98 000170-24 e n. 42 2 98 000171-05 em nome da empresa EPI, Antônio
Tavares de Carvalho recebeu R$ 7.874,83 sem origem lícita comprovada (cf. planilha na
denúncia). Reativadas as inscrições, foram novamente extintas de forma irregular por
Ricardo Cezar Ferreira de Lima, sendo na mesma data emitida a CND n. 1660/99, subscrita
por Antônio Carlos da Costa Moreira, que recebeu em sua bancária, naquele mês, valores
que importavam R$ 8.500,00 sem origem lícita comprovada.

Individualizando as condutas, disse o MPF que o acusado Edmilson


Marcondes dos Santos, sócio-proprietário da empresa, teria se utilizado do respectivo
contador, Antônio José de Farias, como forma de obter os indevidos cancelamentos das
inscrições em nome da EPI EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO LTDA., bem como a
emissão das respectivas Certidões Negativas de Débito, tudo através da utilização,
mediante contraprestação, do “serviço” prestado pelo grupo de ex-servidores que deflagrou
o que se tornou conhecido como “o escândalo da PFN/PB”.

Referindo-se agora ao que chama de FATO 02, diz o MPF que as certidões
obtidas pelo denunciado Edmilson Marcondes dos Santos em nome da empresa EPI
EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO LTDA. (CND’s n. 06155/97 e 01660/99) seriam
certidões de conteúdo falso, obtidas mediante fraude, conforme declaram os Ofícios n. 230
e 280/GAB/PFN/PB (f. 163 – inquérito). Além disso, o denunciado teria obtido a certidão n.
00597/98, subscrita por Antônio Tavares de Carvalho, em que se declarava a existência de
parcelamento em nome da empresa e a regularidade na respectiva quitação, o que se
revelou inverídico (cf. Ofício n. 280/GAB/PFN/PB – f. 163 – inquérito).

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Prossegue dizendo o MPF que a certidão n. 06155/97 (19/12/97) foi usada


pelo representante da EPI EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO junto ao governo do
Estado da Paraíba (f. 99-100 – inquérito). Tal certidão, juntamente com a certidão n.
01660/99, foram usadas perante a Delegacia Federal de Agricultura da Paraíba (f. 116, 120
e 121 – inquérito) e junto à Companhia Hidroelétrica do São Francisco – CHESF (f. 175, 177
e 179 – inquérito). Por fim, diz o MPF constatar-se que as certidões n. 00597/98 e n.
06155/97 foram apresentadas pelo denunciado em licitações realizadas pela Companhia de
Água e Esgotos da Paraíba – CAGEPA (f. 129, 130 e 133 – inquérito).

A denúncia indicou cinco testemunhas/declarantes para oitiva em juízo.

Denúncia recebida em 16/06/2005 (f. 782-5).

Citação (f. 856v.) e interrogatório (f. 992-5) de Antônio José de Farias.

Citação (f. 1043v.) e interrogatório (f.1044-6) de Edmilson Marcondes dos


Santos.

Antônio José de Farias apresentou defesa prévia (f. 1056-8), negando a


veracidade dos fatos contra si alegados e indicando duas testemunhas.

Edmilson Marcondes dos Santos apresentou sua defesa prévia (f. 1071-2),
negando a veracidade das acusações e indicando três testemunhas.

O MPF desistiu da oitiva de Edson de Mendonça Rocha (f. 1098-9).

Inquirição das testemunhas indicadas pelo MPF: Ricardo Cezar Ferreira de


Lima (f. 1106-8), João José Ramos da Silva (f. 1109-10) e Paulo Fernandes Dantas (f. 1111-
2). Por carta precatória: Tércius Gondim Maia (f. 1167-8).

Inquirição de testemunhas indicadas pela defesa: João Bosco Vieira Marinho


(f. 1184-5), Mário Soares Borges (f. 1186-7) e José Martins da Costa (f. 1188).

A testemunha Antônio Tavares de Carvalho foi dispensada pelo juízo (f. 1809)
após prorrogação do prazo requerido pela defesa para indicar-lhe o endereço sem que
houvesse qualquer manifestação.

Em diligências, o MPF (f. 1212) requereu a apresentação das folhas de


antecedentes criminais atualizadas nos acusados, bem como certidões dos cartórios
distribuidores criminais, sendo deferido o pleito (f. 1213). Os acusados nada requereram (f.
1235 e 1242).

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Em alegações finais:

1) O MPF (f. 1246-53) pugnou pelo julgamento de procedência da denúncia


com a condenação dos acusados.

2) Edmilson Marcondes dos Santos apresentou peça (f. 1257-68)


acompanhada de documentos (f. 1269-1315) alegando: a) em preliminar, a incompetência
da justiça federal para julgar a imputação pelo crime de uso de documento falso (CP, 304),
uma vez que não se teria alegado a apresentação das CND’s a entidades federais; b) no
mérito, sustentou não ter sido provada a ocorrência dos fatos narrados na denúncia,
pugnando pelo julgamento de improcedência da denúncia.

3) Antônio José de Farias, por intermédio da mesma advogada que o primeiro


acusado, alegou: a) em preliminar, a incompetência da justiça federal para julgar a
imputação pelo crime de uso de documento falso (CP, 304), uma vez que não se teria
alegado a apresentação das CND’s a entidades federais; b) no mérito, sustentou não ter
sido provada a ocorrência dos fatos narrados na denúncia, pugnando, assim como o
primeiro acusado, pelo julgamento de improcedência da denúncia.

Chamei o feito à ordem para determinar a realização de audiência para oitiva


da testemunha Genildo de Sousa Costa (f. 1328), o que findou por ocorrer (f. 1337-40).

O MPF ratificou as alegações finais já apresentadas (f. 1343-4), como


também os acusados (f. 1349-60, 1361-71 e 1375-86).

Autos conclusos para julgamento.

É o breve relato.

DECIDO.

FUNDAMENTAÇÃO

Em primeiro lugar, passo ao exame da preliminar suscitada pela defesa.

A defesa dos acusados alega preliminar de incompetência da justiça federal


para conhecer da imputação contida na denúncia com base no art. 304 do Código Penal, ou
seja, do crime de uso de documento falso, alegando que dito documento não teria sido
utilizado perante entidade pública federal.

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Assim como as condições da ação, a competência jurisdicional deve ser


definida de acordo com a formulação da pretensão judicializada. No caso dos autos, o MPF
afirma que o apontado uso de documento falso apareceria como objetivo (e, portanto, como
consectário) das demais imputações criminosas: a corrupção ativa e a falsidade ideológica.

Desse modo, considero que ambos os delitos imputados aos réus sejam
conexos, vez que os últimos teriam sido praticados para garantir a execução do primeiro (o
que chamamos de conexão teleológica). A conexão, nesse caso, determina a modificação
da competência em favor do juízo federal, vez que a corrupção ativa teria sido praticada em
face de funcionário público federal (procuradores e servidores da Fazenda Nacional).

Além disso, consta dos autos que as certidões n. 1660/99 e n. 6155/97 foram
usadas perante a Delegacia Federal de Agricultura na Paraíba (f.162-7).

Em razão disso, rejeito a preliminar.

Não havendo outras preliminares, passo ao exame do mérito.

FATO 1 – CORRUPÇÃO ATIVA (CP, art. 333, parágrafo único)

Diz o MPF que a EPI – EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO fora uma


das várias beneficiárias do “esquema” existente no âmbito da Procuradoria da Fazenda
Nacional comandado pelos PFN’s Antônio Tavares de Carvalho e Antônio Carlos da Costa
Moreira.

Segundo a denúncia, o réu EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS, sócio-


proprietário administrador da empresa, teria logrado obter certidões negativas em nome da
EPI – EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO, utilizando-se para isso do “esquema” que
ficou conhecido como “escândalo da PFN”, consistente no pagamento de vantagens
indevidas aos procuradores e servidores envolvidos em troca de cancelamentos ou
reduções (a 10%, 1% e até 0,1% do valor original) fraudulentas. No caso da EPI, teriam sido
obtidos (como já narrado supra) dois cancelamentos sucessivos de três inscrições de débito
perante a PFN/PB.

O segundo réu, contador ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS, teria sido o


responsável por manter contato pessoalmente com os PFN’s envolvimentos para a
obtenção dos benefícios fraudulentos em benefício da empresa EPI. Teria ele, portanto, sido
o autor das negociações na própria Procuradoria da Fazenda Nacional.

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Em seu interrogatório, ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS negou peremptoriamente


a acusação, afirmando que não tomou conhecimento dos cancelamentos de débitos
tributários em nome da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO e da expedição de
certidões negativas na época em que ocorreram, mas apenas posteriormente, bem como
que não foi à Procuradoria da Fazenda Nacional para negociar com Antônio Tavares de
Carvalho os cancelamentos irregulares de débitos da empresa. Afirma que não conhecia o
procurador Antônio Moreira e, a única vez que teve contato com o procurador Antônio
Tavares foi para consultá-lo sobre o procedimento a adotar com relação a débitos
contestados pela empresa.

EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS, da mesma forma, negou as


acusações, especialmente negando que tenha oferecido vantagem indevida a servidores da
Procuradoria da Fazenda Nacional em troca da extinção fraudulenta de débitos da empresa.
Em seu entender, as certidões negativas, de que sempre precisava, nunca foram falsas,
bem como os débitos tributários eram indevidos.

Como relatei acima, a atividade delitiva daqueles que integravam o grupo de


procuradores e servidores da Fazenda Nacional que protagonizaram o chamado “escândalo
da PFN/PB” era bem característica em relação a seu procedimento, de forma que se me
aparece possível fragmentar (para melhor examinar) o respectivo modus operandi em três
aspectos bem visíveis: a) a indevida realização de cancelamentos ou reduções de débitos;
b) a sucessiva expedição de certidões negativas; c) o recebimento (por parte dos
servidores) de vantagens indevidas.

MODUS OPERANDI: cancelamentos


e reduções indevidas.

Observo que, como diz o MPF, as inscrições da EPI – EMPRESA PARAIBA


DE IRRIGAÇÃO foram duas vezes extintas de forma indevida. Houve, no caso, a indevida
extinção, o reativamente e uma nova extinção, também indevida. Tal fato fora devidamente
comprovado nos autos do inquérito quanto a cada uma das inscrições que havia em nome
da empresa, bastando para isso apontar os documentos contidos a f. 53 (numeração da
JFPB) e seguintes.

A inscrição n. 42297 001949-86 (04/11/1997) fora extinta em 19/12/1997,


reativada em 03/03/1999 e novamente extinta em 23/04/1989. A inscrição n. 42298 000170-
24 (07/05/1998) fora extinta em 14/08/1998, reativada em 30/03/1999 e novamente extinta
em 23/04/1999. Por fim, a inscrição n. 42298 000171-05 (07/05/1998) fora extinta em
14/08/1998, reativada em 30/03/1999 e novamente extinta em 23/04/1999.

Segundo os documentos referentes à pesquisa realizada no SERPRO, o


servidor público que realizou o comando de cancelamento dos débitos da EPI – EMPRESA

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PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO foi RICARDO CEZAR FERREIRA DE LIMA (mat. 16503), um


dos integrantes do grupo que atuava na PFN/PB, responsável pelo que se convencionou
chamar de “escândalo da PFN”.

MODUS OPERANDI: expedição


sucessiva de certidões negativas.

Outro aspecto que, a meu juízo, torna bastante característico o procedimento


adotado no “escândalo da PFN”, foi a circunstância de que, quase sempre, os
cancelamentos e extinções indevidas de débitos tributários pela PFN/PB – no contexto do
“esquema” – se dava tendo em vista a emissão de certidões negativas de débitos (para a
imensa gama de finalidades para as quais elas são exigidas no mundo empresarial), de
modo que essas certidões eram emitidas praticamente logo após o cancelamento
fraudulento do débito.

No caso da EPI – EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO, consta dos autos


que após o cancelamento indevido da inscrição n. 42297 001949-86 (R$ 161.447,17),
realizado em 19/12/1997, fora no mesmo dia expedida em nome da empresa certidão
negativa quanto à Dívida Ativa da União (certidão n. 06155/97), subscrita pelo PFN
ANTÔNIO TAVARES DE CARVALHO. Da mesma forma, após o indevido cancelamento
(pela segunda vez) das inscrições n. 42298 000170-24 e n. 42298 000171-05 (R$
1.996.732,75), em 23/04/1999, no mesmo dia, fora emitida em nome da empresa certidão
negativa quanto à Dívida Ativa da União (n. 1660/99), assinada por ANTÔNIO CARLOS DA
COSTA MOREIRA.

O MPF relata ainda em sua denúncia que houve a expedição de certidão


positiva com efeitos de negativa (n. 00597/98), supostamente em razão da ocorrência de um
parcelamento em nome da EPI – EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO. Ocorre que dito
parcelamento – fato devidamente comprovado pelo documento contido a f. 209-10
(numeração da JFPB) – jamais existiu, comprovando que também essa certidão tinha
conteúdo ideologicamente falso.

MODUS OPERANDI: o recebimento


de vantagem indevida.

Outro aspecto bastante característico da atuação do grupo responsável pelo


“escândalo da PFN” e, particularmente, de seu modus operandi padrão, era o recebimento
de vantagens indevidas para a prática dos cancelamentos ou reduções fraudulentas e da
correspondente emissão de certidões negativas ideologicamente falsas (fato apurado na
ação penal n. 2003.82.00.010554-4).

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Em vista disso, afirmou o MPF em sua denúncia que, exatamente no mês de


dezembro/1997, quando fora indevidamente cancelado o débito n. 42297 001949-86 e
emitida a certidão negativa n. 6155/97 em nome da EPI – EMPRESA PARAIBANA DE
IRRIGAÇÃO, o PFN Antônio Tavares de Carvalho teria recebido depósitos que totalizavam
R$ 4.050,00 (quatro mil e cinqüenta reais) sem origem lícita comprovada, ao passo que o
servidor Ricardo Cezar Ferreira de Lima teria recebido depósitos no valor total de R$
1.715,00 (mil setecentos e quinze reais).

Diz ainda o MPF que, no mês de agosto/1998, quando foram indevidamente


canceladas as inscrições n. 42298 000170-24 e 42298 000171-05, o PFN Antônio Tavares
de Carvalho recebeu depósitos que totalizavam R$ 7.874,83 (sete mil oitocentos e setenta e
quatro reais e oitenta e três centavos) sem origem lícita comprovada.

Prossegue dizendo que, com a reativação das inscrições, em abril/1999 foram


novamente canceladas de forma indevida pelo servidor Ricardo Cezar Ferreira de Lima,
emitindo-se, na mesma data, a certidão negativa n. 1660/99, assinada pelo PFN Antônio
Carlos da Costa Moreira. Nesse mês, o referido PFN teria recebido depósitos que
totalizavam R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais) sem origem lícita comprovada.

Em verdade, observo que toda essa linha descritiva dos fatos,


especificamente quanto ao modus operandi em todos os seus aspectos, fora corroborada
contundentemente pela prova oral produzida em audiência.

RICARDO CEZAR FERREIRA DE LIMA, ouvido na qualidade de declarante,


disse que os fatos que compunham o “escândalo da PFN” tiveram lugar entre 1995 e
novembro de 1999, esclarecendo que o procedimento envolvia a determinação pelos PFN’s
de cancelamento de débitos, sem qualquer fundamentação, e a posterior reativação, algo
em torno de trinta dias depois. Registrou estar seguro do fato de que a EPI – EMPRESA
PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO foi uma das beneficiárias do “escândalo da PFN”, recordando-
se de que a empresa tinha mais de um débito junto à PFN. Embora não tivesse certeza
sobre quem administrava a empresa, disse recordar-se de que ANTÔNIO FARIAS era o
respectivo contador. Disse ter conhecimento que de ANTÔNIO FARIAS tinha contato
freqüente com os PFN’s Antônio Tavares e Antônio Moreira. Registrou que o procedimento
utilizado para os cancelamentos de débitos da empresa EPI foi similar ao procedimento para
outras empresas beneficiárias. Tem conhecimento de que, nesse período, houve a
expedição de certidão negativa em nome da empresa EPI.

A testemunha JOÃO JOSÉ RAMOS DA SILVA, procurador da fazenda


nacional que integrou a comissão de processo administrativo disciplinar para apuração
desses fatos e que, em seguida, se tornou o procurador-chefe da PFN/PB, descreveu o
modus operandi do grupo responsável pelo “escândalo da PFN”, fazendo expressa menção
ao que seriam sucessivos cancelamentos e reativações com vistas ao fornecimento de

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certidões fraudulentas. Disse recordar-se de que a EPI – EMPRESA PARAIBANA DE


IRRIGAÇÃO estava relacionada como uma das que se teriam valido do “esquema” por ele
descrito, e registra que se lembra disso porque não eram muitas as empresas envolvidas,
tendo absoluta certeza de que um dos procedimentos do grupo do “escândalo da PFN” foi
usado em relação à empresa EPI.

As testemunhas indicadas pela defesa concordaram em que jamais


presenciaram qualquer dos réus oferecendo vantagem ilícita aos membros do grupo do
“escândalo da PFN” e, afora isso, nada acrescentaram2.

Desse modo, vejo que o conjunto probatório documental e testemunhal é


extremamente contundente e coeso no sentido de que a EMPRESA PARAIBANA DE
IRRIGAÇÃO – EPI, presidida e administrada pelo réu EDMILSON MARCONDES DOS
SANTOS fora uma das beneficiárias do “escândalo da PFN”, atravessando todas as etapas
de seu modus operandi, que envolvia, como descrevi acima, o cancelamento indevido dos
débitos da empresa por duas vezes, a expedição de certidão negativa de débito
ideologicamente falsa e o oferecimento de vantagem indevida.

A defesa se baseia fortemente nos depoimentos testemunhais segundo os


quais não se teria conhecimento de haver qualquer dos réus oferecido vantagem ilícita aos
PFN’s Antônio Tavares de Carvalho e Antônio Carlos da Costa Moreira para a efetivação
dos cancelamentos indevidos e expedições de certidões negativas ideologicamente falsas.
Pede, inclusive, julgamento de improcedência por aplicação do princípio in dubio pro reo.

Nesse ponto, reporto-me à fundamentação que utilizei na sentença


condenatória proferida nos autos da Ação Penal n. 2004.82.00.010796-0 (MPF x WALTER
CUNHA):

2 JOÃO BOSCO VIEIRA MARINHO afirmou que tinha conhecimento dos fatos exclusivamente pelo
que vira na imprensa. Trabalhou na empresa EPI do final dos anos 80 até o ano de 2001 mas não
tinha contato com as questões tributárias da empresa.
MÁRIO SOARES BORGES afirmou que não tinha conhecimento dos fatos narrados na denúncia, não
chegando sequer a tomar conhecimento do que teria sido o chamado “escândalo da PFN”. Trabalhou
no escritório de contabilidade de ANTÔNIO FARIAS, mas nunca teve acesso a dados tributários da
empresa EPI.
JOSÉ MARTINS DA COSTA disse não ter tido conhecimento dos fatos narrados na denúncia sequer
pela imprensa. Fora auxiliar administrativo da EPI e, embora fizesse pagamentos de DARF’s, afirmou
que não tinha conhecimento das questões tributárias da empresa.
GENILDO DE SOUSA COSTA, afirmou que tinha conhecimento do que tratava a imputação contida
na denúncia. Disse que o débito da empresa EPI estava sendo discutido judicialmente. Era diretor
administrativo-financeiro da EPI, afirmando que o responsável pela empresa era seu proprietário, o
réu EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS. ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS era o único contador da
empresa.
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Diante das provas colhidas e comentadas nas linhas acima, não


tenho dúvida de que os débitos tributários da empresa GEORGE CUNHA
FERRAGENS LTDA. tenham sido indevidamente reduzidos, bem como que os
valores reduzidos tenham sido pagos poucos dias após cada uma das reduções, fato
que determinou a extinção de cada um deles por motivo de pagamento.

Também não tenho qualquer dúvida de que o modus operandi


adotado pelos autores do “escândalo da PFN” envolvia sempre o recebimento de
vantagens indevidas dos contribuintes beneficiados como retribuição pelas reduções
e cancelamentos fraudulentos, realizados pelos servidores sob determinação dos
procuradores da fazenda envolvidos.

Em suas alegações finais, o acusado sustenta que não há provas nos


autos de que ele tenha oferecido qualquer vantagem aos PFN’s do “escândalo” para
que os mesmos determinassem as reduções dos débitos tributários da empresa
GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA., comprovadamente realizadas. Igualmente,
procura suscitar dúvidas de que tenha realmente havido o pagamento ou oferta de
vantagem indevida.

É certo que nenhuma das testemunhas arroladas pelas partes


afirmou ter “visto” o acusado oferecendo vantagem indevida aos procuradores da
fazenda responsáveis pelas reduções e cancelamentos fraudulentos. Nesse contexto,
a primeira pergunta que se deve fazer é a seguinte: uma prova assim “visual” é
realmente indispensável para a condenação do acusado? Tal pergunta suscita outra:
é possível, no caso dos autos, produzir uma prova assim?

Entendo que as duas perguntas comportam resposta negativa.

É preciso registrar que, consideradas as circunstâncias em que se


desenvolveu o evento, o chamado “escândalo da PFN” teve uma enorme repercussão
no seio da sociedade paraibana, inclusive nos meios empresarial, jurídico e social. A
reputação da Procuradoria da Fazenda Nacional, como um dos mais importantes
setores da Administração Pública federal, ficou sensivelmente manchada. Por tal
motivo, a administração superior do órgão determinou a realização de uma
percuciente apuração administrativa.

O trabalho de investigação administrativa realizado internamente pela


Procuradoria da Fazenda Nacional – cuja comissão contou com a participação do
PFN João José Ramos da Silva – detectou cada um dos cancelamentos e reduções
irregularmente realizados pelos então servidores da PFN. Em vista disso, todas as
inscrições foram devidamente reativadas e os servidores receberam punição
funcional. Os subsídios que resultaram do trabalho de investigação da comissão
processante tiveram fundamental importância na apuração posteriormente
desempenhada pela Polícia Federal.

A partir do exame dos autos viu-se que o “esquema” conhecido como


“escândalo da PFN” agia da seguinte maneira, bem descrita pelo MPF em sua
denúncia: alguns contribuintes, devedores de significativas somas à Receita Federal,
espontaneamente ou mediante a intermediação de um terceiro (Ronaldo), ofereciam
ou entregavam vantagens indevidas aos PFN’s Antônio Tavares e/ou Antônio Carlos
Moreira para que estes, utilizando-se das prerrogativas inerentes ao cargo,
providenciassem o cancelamento ou a drástica redução dos débitos tributários, os
quais eram posteriormente extintos.

Durante o tempo em que o “esquema” funcionou, comprovou-se a


realização de vários depósitos em dinheiro nas contas bancárias dos PFN’s e
servidores responsáveis. Tudo se cercava de muito cuidado, de modo que os
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depósitos não eram feitos por meios que facilitassem a identificação dos
depositantes. Outrossim, poucos dias após as reduções fraudulentas (sempre para
10%, 1,0% ou 0,1% do valor original), os débitos eram pagos pelo contribuinte e as
inscrições extintas em razão de pagamento – o que indicava a plena ciência dos
empresários beneficiados quanto ao exato momento das reduções fraudulentas.

A apuração realizada pela comissão processante da PFN e as


conclusões apresentadas, os elementos colhidos na fase do inquérito policial em
razão da investigação realizada pela Polícia Federal e, finalmente, as provas colhidas
ao longo da instrução processual penal conduzem ao indubitável entendimento de
que a empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA. foi uma das beneficiárias do
grupo de procuradores e servidores responsáveis pelo “escândalo da PFN”.

Nesse contexto, cabe relembrar que o acusado Walter Cunha era o


administrador da pessoa jurídica e o principal responsável pelas decisões. Segundo o
relato de Jonildo de Almeida Cerqueira, o acusado era o diretor-presidente da
empresa, a quem competia a supervisão financeira e contábil, frisando que as
questões tributárias eram inicialmente submetidas ao acusado (para decisão) e
posteriormente ao depoente (para fiscalização).

A ausência de um testemunho “ocular” ou de um documento nominal


que indique a realização de um pagamento direto feito pelo acusado Walter Cunha
aos PFN’s Antônio Tavares ou Antônio Moreira como contraprestação pelas três
reduções fraudulentas nos débitos tributários da empresa GEORGE CUNHA
FERRAGENS LTDA. não pode ser alegada como forma de afastar a materialidade e
a autoria do delito. Não no caso em apreço.

Para aceitar dito argumento defensivo, seria preciso fechar


completamente os olhos para todo o cabedal probatório que descreve a) o modus
operandi do “esquema da PFN”, b) a similitude com todos os casos (de redução e
cancelamento fraudulentos) detectados pela comissão processante na PFN/PB, c) as
provas relacionadas ao recebimento das vantagens indevidas pelos PFN’s e
servidores envolvidos, d) as três reduções fraudulentas nos débitos tributários da
empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA., que se amoldam com extrema
perfeição ao modelo de conduta exaustivamente demonstrado como sendo aquele
adotado pelos membros do “esquema”, e) a evidência de que, com a reativação dos
débitos fraudulentamente reduzidos e extintos, segundo o atual chefe da PFN/PB,
não houve qualquer contestação administrativa ou judicial por parte do acusado ou de
qualquer representante jurídico da empresa, aceitando-se aquela reativação
pacificamente e, inclusive, solicitando-se o parcelamento do débito reativado. [grifo
inexistente no original].

Finalmente, seria preciso admitir e aceitar passivamente que – a par


de todas as evidências acima apresentadas, além de outras não relacionadas no
parágrafo anterior mas indiscutivelmente apresentadas nos parágrafos precedentes –
apenas no caso da empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA., ao contrário
das demais, não teria havido oferecimento ou pagamento de vantagem indevida,
mesmo tendo sido TRÊS as reduções operadas, em datas distintas, sem
requerimento administrativo prévio e sem exposição de motivos ou comunicação
posterior, e sempre com extinção pelo pagamento poucos dias após a redução
indevida. Será que, no caso dessa empresa, apenas esse item (o pagamento da
vantagem indevida) seria diferente em relação a todas as demais? Seria realmente
fechar os olhos para uma série contundente de evidências. [grifo inexistente no
original].

Em meu sentir, não é possível fechar os olhos para essa plêiade de


indícios e evidências. Nessa linha de pensamento, entendo ter sido suficientemente
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demonstrada a autoria e a materialidade do delito a que se refere o Ministério Público


Federal em sua peça vestibular.

A AUTORIA está devidamente comprovada através da documentação


que comprova (sem possibilidade de contestação) a realização de reduções
fraudulentas (em três momentos distintos) em débitos tributários da empresa
GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA., sendo o acusado Walter Cunha, conforme
documentos e depoimentos constantes dos autos, seu diretor-presidente e
responsável pelas decisões em matéria financeira, administrativa e tributária.

A MATERIALIDADE resta comprovada também pelos documentos e


depoimentos constantes dos autos, os quais demonstram (a) as reduções
fraudulentas, sem requerimento administrativo prévio, sem exposição de motivos etc.,
(b) a adoção do modus operandi já exaustivamente descrito e comprovado daquele
que ficou conhecido como o “esquema da PFN”, onde as reduções irregulares de
débitos eram feitas sempre em vista do oferecimento e pagamento de vantagens
patrimoniais indevidas (foram comprovados diversos depósitos em dinheiro nas
contas-correntes dos membros do “esquema”), e sempre para 10% (dez por cento),
1% (um por cento) e 0,1% (zero vírgula um por cento) do valor original, exatamente
como ocorreu no caso da empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA.,
administrada pelo acusado Walter Cunha. [grifo inexistente no original].

O MPF destaca em sua denúncia (fls. 15/16) que foram detectados


diversos depósitos em dinheiro nas contas de Antônio Tavares de Carvalho e de
Edson de Mendonça Rocha em datas próximas às reduções tributárias fraudulentas
operadas nos débitos da empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA.
“realizadas nos dias 27.08.1998, 18.11.1998 e 14 e 18.05.1999”. Tais dados foram
colhidos a partir do Laudo de Exame Contábil (Laudo n. 1.882/02-INC) de fls.
410/576.

Ainda sobre a materialidade do delito, entendo oportuno referir o


depoimento transcrito pelo MPF na denúncia, prestado por Ricardo Cézar Ferreira de
Lima (um dos envolvidos diretos no fato), no sentido que:

“(...) pelo cancelamento o interrogado recebia valores


variados em dinheiro, do próprio Dr. ANTÔNIO
TAVARES; que variavam entre duzentos, trezentos e
quinhentos reais, no entanto o interrogado já chegou
a receber do Dr. ANTÔNIO TAVARES até R$
1.000,00 (mil reais)...”.

O enquadramento da conduta praticada pelo acusado em benefício


da empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS LTDA. naquilo que se denominou de
“esquema da PFN” ou “escândalo da PFN” é muito bem evidenciado pelo teor do
depoimento prestado pelo PFN João José Ramos da Silva (fls. 28/39). A partir dele
pode-se ver claramente o modus operandi do grupo de procuradores e servidores da
PFN, constatando-se que em tudo e por tudo o procedimento foi seguido em relação
ao fato apurado no presente processo. [grifo inexistência no original].

Tal prática, descrita pelo MPF em sua denúncia e devidamente


comprovada ao longo da instrução, se subsume no tipo penal descrito no art. 333,
parágrafo único, do CP brasileiro (corrupção ativa), assim redigido:

Corrupção ativa

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Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a


funcionário público, para determiná-lo a praticar,
omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa. (Redação dada pela Lei n. 10.763, de
12.11.2003).

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço,


se, em razão da vantagem ou promessa, o
funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica
infringindo dever funcional.

Registro, por fim, que o fato de haver três distintas reduções


irregulares nos débitos tributários da empresa GEORGE CUNHA FERRAGENS
LTDA. não significa (inexoravelmente) que tenha havido a reiteração da conduta
prevista no dispositivo acima transcrito (oferecimento da vantagem indevida). Por
esse motivo, entendo não haver espaço para aplicação de quaisquer dos artigos que
prevêem a exasperação da pena pelo concurso de crimes.

A passagem acima transcrita corresponde à fundamentação por mim utilizada


em sentença condenatória proferida em situação absolutamente congênere, também
referente à utilização dos “serviços” prestados pelos procuradores e servidores da
Procuradoria da Fazenda Nacional que titularizaram o “escândalo da PFN”.

Se, de fato, não há documento ou testemunha nos autos que confirme o


oferecimento ou entrega de vantagem indevida para a obtenção dos cancelamentos
indevidos e expedição de certidões negativas ideologicamente falsas, por outro lado, pode-
se observar que o referido esquema seguia seu modus operandi regularmente, o qual
envolvia comprovadamente a contraprestação pecuniária pelo “serviço” – o que se
comprovou exaustivamente a partir dos demonstrativos de depósitos de valores sem origem
lícita conhecida nas contas dos procuradores e servidores envolvidos, todos na época dos
cancelamentos irregulares, inclusive da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO – EPI.

Em vista de tudo isso, entendo como plenamente comprovada a


materialidade do fato narrado na denúncia, tipicamente adequado ao art. 333 do Código
Penal brasileiro (corrupção ativa).

Ainda sobre a materialidade, observo que os dois cancelamentos fraudulentos


de cada um dos débitos da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO – EPI e a emissão das
certidões negativas de débito se fizeram como resultado da vantagem indevida oferecida.
Pode-se afirmar, portanto, que a corrupção ativa praticada determinou a prática de ato de
ofício “infringindo dever funcional”. Aplica-se aqui, pois, o parágrafo único do art. 333 do CP,
em razão de que deverá a pena ser elevada em 1/3 (um terço).

Quanto à autoria, se, por um lado, ficou claramente delineada em relação a


EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS, dada sua condição de proprietário, administrador
e representante legal da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO – EPI (bastando, para
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isso, examinar as provas documental e testemunhal), não se pode afirmar o mesmo em


relação ao réu ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS. Quanto ao último, a meu juízo, as provas
contidas nos autos não embasam um juízo positivo sobre a autoria.

De fato, várias pessoas viram ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS nas


dependências da Procuradoria da Fazenda Nacional, mas quase sempre ressaltando que
ele representava várias empresas, não se podendo dizer com exatidão a qual delas diria
respeito o assunto naquele momento tratado. O réu nega que tenha se dirigido à PFN para
oferecer vantagem indevida em troca dos cancelamentos fraudulentos e emissões de
certidões negativas ideologicamente falsas.

Ao contrário do meu raciocínio acima descrito sobre o oferecimento de


vantagem indevida para a prática dos cancelamentos e reduções fraudulentas, bem como
para as emissões de certidões negativas – que compunham solidamente o modus operandi
do grupo do “escândalo da PFN” – não se pode afirmar que o modus operandi abrangia o
envolvimento dos contadores das empresas nas negociações para a prática da corrupção
ativa. Quanto a isso, se ocorreu, terá sido meramente eventual e não existe prova nos autos
nesse sentido.

Portanto, a base probatória que vincula o réu ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS


aos fatos narrados na denúncia e comprovados nos autos é fraca ou inexistente, não
fundamentando adequadamente um decreto condenatório. Há, nesse caso, deficiência
probatória que inviabiliza a condenação e determina a improcedência da pretensão punitiva
especificamente em relação a ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS.

Diante de todo o exposto, considero plenamente comprovadas autoria e


materialidade do delito previsto no art. 333, parágrafo único, do Código Penal brasileiro em
relação a EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS, ficando afastada a autoria, por
insuficiência de provas, em relação a ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS.

FATO 2 – USO DE DOCUMENTO FALSO (CP, art. 304)

Segundo o MPF, as certidões fraudulentamente obtidas teriam sido utilizadas


pelo réu EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS (o que consistiriam em crime de uso de
documento falso, previsto no art. 304 do Código Penal brasileiro) da seguinte maneira:

1) A certidão n. 6155/97 foi usada junto ao governo do Estado da Paraíba


(conforme f. 145-6, numeração da JPFB);

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2) As certidões n. 1660/99 e n. 6155/97 foram utilizadas perante a Delegacia


Federal de Agricultura na Paraíba (f.162-7, numeração da JFPB) e a Companhia Hidro
Elétrica do São Francisco – CHESF (f. 221, 223 e 225, numeração da JFPB);

3) As certidões n. 0597/89 e n. 6155/97 foram utilizadas pelo denunciado


(como representante legal da empresa EPI) em licitações realizadas pela CAGEPA –
Companhia de Água e Esgoto da Paraíba (f. 175-9, numeração da JFPB).

De fato, os documentos contidos nos autos (cujas respectivas folhas são


referidas entre os parênteses) representam manifestações, por meio de ofício subscrito pela
autoridade competente, acerca da ciência sobre os respectivos fatos: a utilização das
apontadas certidões em nome da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO – EPI perante
os órgãos ou entidades em questão. Reforçando a comprovação da veracidade desses
fatos, os ofícios se fizeram acompanhar de cópias de cada uma das certidões apresentadas,
afastando qualquer possibilidade de erro na indicação das certidões a que se referem.

Além disso, a última testemunha ouvida, GENILDO DE SOUSA COSTA, que


afirmou ter sido um dos diretores da EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO – EPI,
asseverou que a empresa participava com grande freqüência de licitações. Essa
circunstância tornava indispensável a obtenção de certidões negativas que permitissem à
empresa ultrapassar a fase de habilitação nos certames licitatórios.

Dessa forma, tenho que a utilização dessas certidões ideologicamente falsas


pela EPI – EMPRESA PARAIBANA DE IRRIGAÇÃO perante o governo do Estado da
Paraíba, a Delegacia Federal de Agricultura na Paraíba, a CAGEPA e a CHESF é fato
incontestável de acordo com as provas contidas nos autos. Uma vez que as certidões,
produto da corrupção ativa praticada anteriormente, faziam constar informação
ideologicamente falsa (a ausência de débitos tributários da empresa EPI), fica assim
perfeitamente demonstrada a materialidade do delito previsto no art. 304 do Código Penal,
combinado com o art. 299 da mesma lei.

A autoria, de sua parte, está totalmente comprovada em relação ao réu


EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS, uma vez que era o sócio proprietário,
administrador e representante legal da empresa. O MPF não imputou tal conduta a
ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS.

De acordo com o exposto, entendo comprovadas autoria e materialidade do


delito tipificado nos artigos 304 c/c 299, ambos do CP, em relação a EDMILSON
MARCONDES DOS SANTOS.

Passo à fixação das penas a serem aplicadas a EDMILSON MARCONDES


DOS SANTOS.

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FIXAÇÃO DAS PENAS

1) CORRUPÇÃO ATIVA (CP, art. 333, parágrafo único).

Examinando as circunstâncias judiciais do CP, art. 59, constatei o seguinte:

A) A culpabilidade, como juízo de reprovabilidade da conduta em face do fato


praticado, mostrou-se bastante exacerbada. O réu se serviu de um “esquema” de corrupção
passiva de procuradores e servidores da Fazenda Nacional que perdurou por cerca de
quatro anos, envolvendo diversos empresários. Obteve certidões ideologicamente falsas à
custa do vilipêndio da integridade da função exercida pelos agentes públicos envolvidos. E
serviu-se de tudo isso para ver seus débitos serem indevidamente cancelados por duas
vezes, expedindo-se duas certidões negativas e uma positiva com efeito de negativa
ideologicamente falsas.

B) O réu não possui antecedentes criminais negativos.

C) A personalidade e a conduta social, segundo venho sustentando, são


dados que não dizem respeito, sequer indiretamente, ao fato e que, portanto, fundamentam
a exacerbação da pena com base em um direito penal da culpabilidade do autor, o que não
é compatível com o princípio da dignidade da pessoa humana.

D) Os motivos para a prática do crime dizem respeito à possibilidade de obter


certidões negativas ideologicamente falsas, a partir da corrupção de agentes públicos, para
viabilizar a indução em erro de órgãos e entidades públicas em licitações.

E) O crime não foi praticado em circunstâncias excepcionais que determinem


exasperação da pena.

F) As conseqüências do crime podem ser traduzidas no universo de bens e


serviços que foram negados à sociedade, sobretudo à população mais pobre e necessidade,
tendo em vista que o réu se furtou ao pagamento dos débitos tributários de sua empresa (os
quais importariam em cifra superior a um milhão de reais já na época dos fatos), fato que
não poderia ocorrer se não se houvesse utilizado do multicitado “esquema” conhecido como
“escândalo da PFN”.

G) Por fim, a vítima não colaborou para o crime com o seu comportamento.

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Considerando a fundamentação acima e tomando como parâmetro de cálculo


os limites previstos no preceito secundário do art. 333 do CP brasileiro (dois a doze anos de
reclusão), fixo a pena-base em 4 (quatro) anos de reclusão.

Não encontrei circunstâncias agravantes ou atenuantes aplicáveis ao caso.

Aplica-se, contudo, a causa especial de aumento de pena prevista no


parágrafo único do art. 333 do Código Penal, uma vez que o ato objetivado pelo réu com a
corrupção ativa – o cancelamento indevido de débito e a emissão de certidão negativa
ideologicamente falsa – se consumou, tendo sido praticado com infração de dever funcional.

Assim, nos termos do CP, art. 333, parágrafo único, aumento a reprimenda
em 1/3 (um terço) e, desse modo, fixo a pena privativa de liberdade em 5 (cinco) anos e 4
(quatro) meses de reclusão, para cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP, art. 33,
§2º, “b”).

Adotando os mesmos termos da fundamentação acima e considerando os


parâmetros previstos no art. 49 do Código Penal, fixo a pena de multa em 120 (cento e
vinte) dias-multa. Considerando as condições econômicas do réu (§1º), fixo o valor do dia
multa em 1/2 (um meio) do salário mínimo vigente na época dos fatos (1999), devendo ser
atualizado até a data do pagamento (§2º).

Considerando a pena privativa de liberdade, fica excluída a possibilidade de


substituição (CP, art. 44) e de suspensão condicional da pena (CP, art. 77) por ausência de
um requisito objetivo.

Considerando que o réu não apresenta antecedentes criminais negativos e


que respondeu adequadamente ao processo em liberdade, não vejo motivo para decretar-
lhe, nesse momento, a prisão preventiva. Assim sendo, concedo-lhe o direito de apelar em
liberdade.

2) USO DE DOCUMENTO FALSO (CP, arts. 304 c/c 299).

Examinando as circunstâncias judiciais do CP, art. 59, constatei o seguinte:

A) A culpabilidade, como juízo sobre a reprovabilidade da conduta, mostrou-


se sumamente relevante. O réu era administrador presidente de uma empresa que
participava frequentemente de certames licitatórios e, em razão disso, deveria zelar por sua
regularidade fiscal e pela lisura do processo seletivo. Em vez disso, buscou a utilização de
expedientes ilegais para, furtando-se ao cumprimento de suas obrigações tributárias (em
franca concorrência desleal), competir pela contratação com o poder público. Contratação

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essa a que se aplicam os princípios da Administração, dentre os quais a moralidade


administrativa.

B) O réu não possui antecedentes criminais negativos.

C) A personalidade e a conduta social, segundo venho sustentando, são


dados que não dizem respeito, sequer indiretamente, ao fato e que, portanto, fundamentam
a exacerbação da pena com base em um direito penal da culpabilidade do autor, o que não
é compatível com o princípio da dignidade da pessoa humana.

D) Os motivos para a prática do crime dizem respeito à possibilidade de


participarem de licitações públicas, sem o preenchimento do requisito específico da
regularidade fiscal (o que é certificado pela CND).

E) O crime não foi praticado em circunstâncias excepcionais que determinem


exasperação da pena.

F) As conseqüências do crime, nesse caso, não se revelaram gravosas a


ponto de permitir a exasperação da pena.

G) Por fim, a vítima não colaborou para o crime com o seu comportamento.

Considerando a fundamentação acima e tomando como parâmetro de cálculo


os limites previstos no preceito secundário dos artigos 304 c/c 299, ambos do CP brasileiro
(um a cinco anos de reclusão – CND – documento público), fixo a pena-base em 1 (um) ano
e 8 (oito) meses de reclusão.

Não encontrei circunstâncias agravantes ou atenuantes, nem tampouco


causas gerais ou especiais de aumento ou redução da pena aplicáveis ao caso.

Assim sendo, fixo a pena privativa de liberdade em 1 (um) ano e 8 (oito)


meses de reclusão, para cumprimento em regime inicial aberto (CP, art. 33, §2º, “c”).

Adotando os mesmos termos da fundamentação acima e considerando os


parâmetros previstos no art. 49 do Código Penal, fixo a pena de multa em 80 (oitenta) dias-
multa. Considerando as condições econômicas do réu (§1º), fixo o valor do dia multa em 1/2
(um meio) do salário mínimo vigente na época dos fatos (1999), devendo ser atualizado até
a data do pagamento (§2º).

A substituição da pena privativa de liberdade aplicada por restritiva de direitos


e a suspensão condicional da pena, no caso presente, se mostram impossíveis em
decorrência de a soma das penas ultrapassar o limite de quatro anos previsto no art. 44 e de

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dois anos previsto no art. 77 do Código Penal. Nessa linha, trago os seguintes precedentes
do Superior Tribunal de Justiça:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 12, CAPUT, DA LEI Nº


6.368/76 (ANTIGA LEI DE TÓXICOS), ART. 333 DO CÓDIGO PENAL E ART. 14 DA
LEI Nº 10.826/03. ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. ALEGAÇÃO DE QUE SE
TRATA DE LEI PENAL MAIS BENIGNA. SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO.
JUÍZO DA EXECUÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CRIME EQUIPARADO A
HEDIONDO. REGIME PRISIONAL SEMI-ABERTO. INCONSTITUCIONALIDADE DO
§ 1º DO ART. 2º DA LEI Nº 8.072/90 DECLARADA PELO STF. SUBSTITUIÇÃO DA
PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA RESTRITIVA DE DIREITO.
IMPOSSIBILIDADE.

I - Tendo em vista o trânsito em julgado da condenação, faz-se necessária a prévia


submissão da matéria referente à aplicabilidade da minorante prevista no art. 33, § 4º,
da Lei nº 11.343/2006 (alegada novatio legis in mellius) ao Juízo da Execução. A
apreciação direta da questão por esta Corte implicaria indevida supressão de
instância (Súmula nº 611-STF).

II - O Pretório Excelso, nos termos da decisão Plenária proferida por ocasião do


julgamento do HC 82.959/SP, concluiu que o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 é
inconstitucional.

III - Embora já esteja em vigor o dispositivo legal que determina a progressão de


regime após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário,
e de 3/5 (três quintos), se reincidente (art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90, com a redação
dada pela Lei nº 11.464/07), ele não se aplica à hipótese dos autos, uma vez que se
trata de lex gravior, incidindo, portanto, somente aos casos ocorridos após a sua
vigência (Precedentes).

IV - Uma vez atendidos os requisitos constantes do art. 33, § 2º, "b", e § 3º, c/c o art.
59 do CP, quais sejam, a ausência de reincidência, a condenação por um período
superior a 4 (quatro) anos e não excedente a 8 (oito) e a existência de circunstâncias
judiciais totalmente favoráveis, deve o paciente cumprir a pena privativa de liberdade
no regime inicial semi-aberto (Precedentes).

V - Para que o réu seja beneficiado com a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos, é indispensável o preenchimento dos requisitos objetivos e
subjetivos constantes do art. 44 do Código Penal, o que não ocorreu no caso
(Precedentes).

VI - Tratando-se de concurso de crimes, a substituição da pena privativa de liberdade


por restritiva de direitos somente será possível quando o total das reprimendas não
ultrapasse o limite de quatro anos previsto no art. 44, I, do CP (Precedentes).

Ordem parcialmente conhecida e, nesta parte, parcialmente concedida. (HC


90631/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 21/02/2008,
DJe 31/03/2008) (grifado).

HABEAS CORPUS. PENAL. CONCURSO DE CRIMES. PORTE ILEGAL DE ARMA E


RECEPTAÇÃO NA FORMA SIMPLES. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE
LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. QUANTUM UNIFICADO INFERIOR
A QUATRO ANOS. CONDIÇÕES LEGAIS FAVORÁVEIS. POSSIBILIDADE.

ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU


Juiz Federal
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
SEGUNDA VARA FEDERAL Página 22 de 23

1. Havendo concurso de crimes, a substituição da pena privativa de liberdade por


restritiva de direitos é possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite
de quatro anos, disposto no art. 44, inc. I, do Código Penal.

2. Não sendo o apenado reincidente, bem como reconhecidas em seu favor as


condições judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, e fixado a pena a ele
imposta, em ambos os delitos, no mínimo legal, faz jus à substituição da pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos.

3. Ordem concedida. (HC 21681/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA,
julgado em 17/06/2003, DJ 18/08/2003 p. 215) (grifado).

Ademais, no particular caso da suspensão condicional da pena, a


condenação criminal por crime doloso é causa obrigatória de revogação, ex vi do art. 81,
inciso I, do Código Penal.

Pelos mesmos motivos já declinados no item 1, concedo ao réu o direito de


apelar em liberdade.

3) CONCURSO MATERIAL DE CRIMES (CP, art. 69).

Observo que os crimes de corrupção ativa (CP, art. 333, parágrafo único) e
uso de documento ideologicamente falsificado (CP, arts. 304 c/c 299) foram praticados em
concurso material ou real de crimes e, dessa maneira, nos termos do que dispõe o art. 69 do
Código Penal, devem ser somadas as penas privativas de liberdade e as penas de multa
aplicadas.

Em vista disso, torno consolidada a pena privativa de liberdade aplicada ao


réu EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS em 7 (sete) anos de reclusão, para
cumprimento em regime inicial semi-aberto (CP, art. 33, §2º, “b”). Uma vez que, no concurso
de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente (CP, art. 72), consolido
a pena de multa em 200 (duzentos) dias-multa, mantida a fixação do valor do dia multa em
1/2 (um meio) do salário mínimo vigente em 1999, devidamente corrigido até o pagamento.

DISPOSITIVO

Diante de todo o exposto, com fundamento nos artigos 387 e seguintes do


Código de Processo Penal brasileiro, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva
estatal para:

I) Absolver ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS (CPP, art. 386, V);

ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU


Juiz Federal
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
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II) Condenar EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS como incurso nos


artigos 333, parágrafo único, e 304 c/c 299, tudo combinado com o artigo 69, todos do
Código Penal brasileiro.

Em razão disso, nos exatos termos da fundamentação acima apresentada


(ver FIXAÇÃO DA PENA), fixo para EDMILSON MARCONDES DOS SANTOS as seguintes
reprimendas:

a) Uma pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de


reclusão pela prática do crime previsto no art. 333, parágrafo único, do CP (corrupção ativa)
e uma pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão pela prática
do crime previsto no art. 304 c/c o art. 299 do CP (uso de documento ideologicamente falso).
Aplicada a regra do concurso real de crimes (CP, art. 69), consolido a pena privativa de
liberdade em 7 (sete) anos de reclusão para cumprimento em regime inicial semi-aberto.
Poderá o réu apelar em liberdade.

b) Uma pena de multa de 120 (cento e vinte) dias-multa pela prática do crime
previsto no art. 333, parágrafo único, do CP (corrupção ativa) e uma pena de multa de 80
(oitenta) dias-multa pela prática do crime previsto no art. 304 c/c o art. 299 do CP (uso de
documento ideologicamente falso). Uma vez que, no concurso de crimes, as penas de multa
são aplicadas distinta e integralmente (CP, art. 72), consolido a pena de multa em 200
(duzentos) dias-multa, ficando estabelecido o valor do dia-multa em 1/2 (um meio) do salário
mínimo vigente na data do fato (1999), devidamente corrigido até o pagamento.

Custas ex lege.

Transitada em julgado a presente sentença, após a devida certificação nos


autos, determino à secretaria da vara: a) preencher e encaminhar ao IBGE os boletins
individuais dos réus; b) oficiar o TRE/PB para os fins do art. 15, III, da CF/88; c) lançar no rol
dos culpados o nome do réu condenado; d) remeter os autos ao juízo das execuções penais
para cumprimento das penas.

Sentença publicada em mãos do diretor de secretaria. Registre-se no sistema


informatizado. Intimem-se os réus e seus defensores. Cientifique-se o MPF.

João Pessoa, 22 de setembro de 2009.

Juiz federal ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU


Substituto da segunda vara (SJPB)

ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU


Juiz Federal

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