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Apoio Judiciário
ÂMBITO DA CONSULTA
A Exma. Senhora Juiz … do ... Juízo do ... veio solicitar ao Conselho Distrital de Lisboa a
emissão de parecer sobre duas questões muito específicas em matéria de Escalas de
Prevenção.
I
Começaremos por nos debruçar sobre a primeira questão, cuja resposta logramos obter na
lei.
Vejamos.
A lei fundamental condensa no seu artigo 32º os mais importantes princípios materiais do
processo criminal, constituindo estes a chamada “constituição processual criminal”.
O arguido é sujeito do processo, com direito a organizar a sua própria defesa e como tal,
tem direito à escolha de defensor (ou defensores) e à assistência de defensor.
Esta garantia constitucional consagrada no n.º 3 do artigo 32º da CRP comporta uma dupla
vertente: por um lado, assegura aos arguidos o direito a serem assistidos por um defensor
de sua escolha em todos os actos do processo; por outro lado, impõe essa assistência como
obrigatória em certos casos, ou seja, em certas fases e diligências do processo, a serem
definidas pelo legislador.
Estipula o artigo 41º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Junho, com as alterações introduzidas
pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto que, para a nomeação de defensor para assistência
ao primeiro interrogatório de arguido detido, para audiência em processo sumário ou para
outras diligências urgentes previstas no Código de Processo Penal, devem ser organizadas
escalas de prevenção.
A escala para actos urgentes é a forma de organização dos advogados que permite
corresponder à necessidade de assegurar as diligências urgentes em que seja obrigatória a
presença de um defensor. E é precisamente, no âmbito das diligências urgentes, em que é
obrigatório que o arguido seja assistido por defensor, que se coloca a questão de saber se,
quando haja vários arguidos no mesmo processo, o mesmo Advogado/Defensor escalado
pode ser nomeado para todos os arguidos.
Precisa-se, desde já, que a Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais actualmente em vigor
nada refere quanto a esta situação.
Aí se estatui que, sendo vários os arguidos no mesmo processo, podem eles ser assistidos
por um único defensor, se isso não contrariar a função da defesa.
O CPP estabelece que pode ser nomeado um só defensor para todos os arguidos.
Mas há mais.
A unicidade do sistema jurídico impõe que se articule a regra estatuída no artigo 65º do
CPP com as demais normas jurídicas e, nomeadamente, as constantes do Estatuto da
Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro.
É neste último Capítulo e, mais especificamente no seu artigo 94º, que se encontra
regulado o denominado “Conflito de Interesses”.
Aí estão plasmadas várias situações em que existe uma situação de incompatibilidade para
o exercício do patrocínio.
1
Cfr. Processo de Consulta do C.D.L. n.º 6/02, aprovado em 16.10.2002, e no qual foi relator o Dr. João Espanha.
Assim, verificando-se qualquer das situações previstas no artigo 94º do EOA 2 , também
nestes casos, será legítimo ao Advogado/Defensor Oficioso que integra uma escala recusar a
nomeação para assegurar a defesa de vários arguidos no mesmo processo (ou até mesmo,
de qualquer deles). Mas, em tese e em abstracto, nada impede que um advogado defenda
um ou mais do que um arguido num processo de natureza criminal.
II
Quanto à segunda questão, deixamos aqui uma pequena nota prévia.
2
Sob a epígrafe “Conflito de Interesses”, estipula o artigo 94º do EOA o seguinte:
“1 – O advogado deve recusar o patrocínio de uma questão em que já tenha intervindo em qualquer outra qualidade
ou seja conexa com outra em que represente, ou tenha representado, a parte contrária.
2 – O advogado deve recusar o patrocínio contra quem, noutra causa pendente, seja por si patrocinado.
3 – O advogado não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou mais clientes, no mesmo assunto ou em
assunto conexo, se existir conflito entre os interesses desses clientes
(…)
5- O advogado deve abster-se de aceitar um novo cliente se tal puser em risco o cumprimento do dever de guardar
sigilo profissional relativamente aos assuntos de um anterior cliente, ou se do conhecimento destes assuntos
resultarem vantagens ilegítimas ou injustificadas par ao novo cliente”.
Ora, se isso é verdade, também não podemos esquecer que a organização e a elaboração
das escalas de prevenção é matéria da competência da Ordem dos Advogados – cf. n.º 1 do
artigo 3º e n.º 1 do artigo 4º da Portaria n.º 10/2008, de 3 de Janeiro, com as alterações
introduzidas pela Portaria n.º 210/2008, de 29 de Fevereiro.
E, dentro da orgânica da Ordem dos Advogados, e tal como decorre do disposto nas alíneas
d) e dd) do n.º 1 do artigo 45º do EOA, em articulação com o disposto no artigo 4º da
Portaria n.º 10/2008, de 3 de Janeiro, a matéria atinente à regulamentação da organização
e elaboração das escalas é matéria da competência do Conselho Geral da Ordem dos
Advogados e não do Conselho Distrital.
Sem prejuízo do exposto, não deixaremos de dar aqui nota do nosso entendimento sobre a
questão que nos foi colocada e, quanto a nós, de grande alcance prático.
Mas, o certo é que a figura da substituição nas escalas de prevenção não tem, actualmente,
enquadramento legal.
E, não o tendo, tem sido prática usual, os advogados substabelecerem com reserva noutro
Colega, por recurso à figura prevista no artigo 35º da LADT.
Mas o recurso à figura do substabelecimento com reserva, previsto no artigo 35º da LADT
afigura-se-nos desajustado.
Vejamos porquê.
E dizemos paradigma, porque não esqueçamos que, no quadro das nomeações oficiosas, é
o acto de nomeação da Ordem dos Advogados, da autoridade judiciária ou do órgão de
polícia criminal que constitui e subjaz à relação representativa.
Por outras palavras, pressupõe a prévia existência de um acto de nomeação da Ordem dos
Advogados, da autoridade judiciária ou do órgão de polícia criminal.
Só assim se percebe que o Advogado possa substabelecer, isto é, possa transferir para outro
Colega, os poderes de representação de que está investido
Não atribui ao advogado escalado quaisquer poderes de representação, tal como pressupõe
o artigo 35º da LADT.
Não esqueçamos que o Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais actualmente em vigor,
foi arquitectado para funcionar com recurso a aplicações informáticas.
São estas e outras questões em matéria de escalas de prevenção que, do nosso ponto de
vista, carecem de regulamentação legal.
Assim, estando em causa matéria de grande alcance prático e deveras importante, em geral,
para todos os profissionais forenses que participam no Sistema de Acesso ao Direito e aos
Tribunais, justifica-se, a nosso ver, a urgente intervenção e tomada de posição do Conselho
Geral da Ordem dos Advogados nesta matéria, no sentido de, a nosso ver, e no âmbito das
competências que lhe estão atribuídas pelas alíneas d), h) e dd) do n.º 1 do artigo 45º do
Estatuto da Ordem dos Advogados, em articulação com o disposto no artigo 4º da Portaria
n.º 10/2008, de 3 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 210/2008, ,
de 29 de Fevereiro, elaborar um Regulamento de Funcionamento das Escalas de
Prevenção.
CONCLUSÕES:
II
1. A substituição nas escalas de prevenção não pode, a nosso ver, ser feita por recurso
à figura do substabelecimento com reserva, previsto no artigo 35º da Lei do Acesso
ao Direito e aos Tribunais.
2. Contudo, estando em causa matéria de grande alcance prático e deveras
importante, em geral, para todos os profissionais forenses que participam no
Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais, decide-se remeter cópia do presente
parecer, bem como do expediente a ele anexo, ao Conselho Geral da Ordem dos
Advogados, para que este, no âmbito das competências que lhe estão atribuídas
pelas alíneas d), h) e dd) do n.º 1 do artigo 45º do Estatuto da Ordem dos
Advogados, aprecie e delibere quanto à questão suscitada pelo Tribunal de
Instrução Criminal de modo a regulamentar especificamente a questão.
Notifique-se.