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Por amor deixaram de ser padres, mas não abandonaram a Igreja

por Rosa Ramos, Publicado em 18 de Dezembro de 2009

http://www.ionline.pt/conteudo/38179-por-amor-deixaram-ser-padres-mas-nao-abandonaram-igreja

Escolheram ser padres, mas desistiram ao fim de algum tempo. Por amor
ou por decepção com as "coisas" da Igreja

Amor Na noite antes de ser baptizado a mãe teve uma revelação. Sonhou que o
oitavo filho, Fernando, ia ser padre. A pequena aldeia de Seixo Mira, que agora tem
pouco mais de mil habitantes, era, na década de 1940, a que mais padres dava à
diocese de Coimbra. "Era uma espécie de vocação colectiva", recorda Fernando
Neves, agora com 64 anos. A aldeia era tão pequenina que todos os caminhos iam
dar à igreja. Por isso cresceu habituado ao convívio com as dezenas de
seminaristas da terra e, "fruto do ambiente religioso que se vivia na paróquia, o
encaminhamento para a vida religiosa foi quase natural".

Em 1957 entrou no Seminário de Coimbra. Lembra-se dos corredores intermináveis


e frios do gigantesco edifício. "Tanta rigidez e disciplina eram demasiado duras para
uma criança de 11 anos, acabada de sair de casa." Ciente do sacrifício que os pais,
"gente simples do campo", faziam para o pôr a estudar, foi ordenado padre em
1969. O choque só aconteceu quando saiu do seminário - "uma redoma de vidro"-,
para ser ajudante de um outro padre. Ganhava, na altura, 500 escudos por mês
com as refeições incluídas. "Foi chocante chegar à vida real e perceber que tudo era
diferente", conta. O choque seguinte não demorou muito a chegar, quando a Igreja
decidiu aumentar o preço das missas e "via gente pobre que não conseguia pagar".

O terceiro choque? O inevitável contacto com as raparigas - coisa rara no


seminário. "Até porque a nossa formação era muito orientada para uma visão
pessimista da mulher." Por azar, Fernando era bonito. "Muitas mulheres diziam-me,
apesar de ser padre, que tinha uns olhos bonitos e a mim, que nunca tinha pensado
em mulheres, fazia-me confusão", confessa. Além disso era dado ao teatro, à
música e ao canto e "dava nas vistas junto das raparigas". Entretanto reparou que
alguns professores e sacerdotes que o educaram tinham casado. Também ele
acabou por ser tocado por outro amor que não o de Deus. O de Maria Isabel, uma
professora primária "cheia de pretendentes", natural de Palhaça, uma freguesia
vizinha. Sentiu que tinha de desistir do sacerdócio. Do que tinha mais medo era da
reacção da mãe: "previa um desfecho trágico". Porém, quando contou a verdade
"ninguém se importou". Por esses dias, um bispo que conhecia pediu-lhe "que
esperasse dois ou três anos, porque o celibato estaria prestes a acabar".

O celibato manteve-se e Fernando Neves também não quis esperar. Mudou-se para
a paróquia de Maria Isabel e começaram de imediato a construir casa, numa
propriedade dos pais dela. Casaram quando Fernando tinha a idade de Cristo: 33
anos. Voltou à universidade, para tirar o curso de Línguas e Literaturas Modernas,
e, mais de 30 anos depois, continuam juntos. "E felizes." Têm dois filhos e dois
netos. Fernando tem 64 anos, ajuda na igreja de Palhaça, lidera o coro e trata das
reuniões de preparação para o baptismo dos fiéis.

Obediência Um livro de banda-desenhada com o testemunho de um missionário


comboniano mudou-lhe o destino. Aos 15 anos, Fernando Félix decidiu entrar para
o Seminário de Vila Nova de Famalicão. Sabia que queria ser padre missionário,
"partir para outros países, evangelizar, fazer trabalho humanitário". Dois anos
depois mudou-se para o Seminário de Coimbra, para continuar os estudos. Foi aí
que experimentou a primeira crise vocacional. Mesmo assim, continuou e preferiu
mudar-se para Santarém, a 20 quilómetros de casa dos pais, onde completou os
estudos. Dois anos depois estava a estudar Teologia no Peru. Os anos de 1991 a
1994 foram "de desafio", na companhia de 21 aspirantes a padres, de 12 países e
três continentes. "Estudávamos e tínhamos a componente pastoral em bairros
pobres, num país na altura muito violento", recorda.

Voltou para a Portugal e foi ordenado padre em 1995. "A minha ordenação não era
muito consensual porque se dizia que o meu estilo de opinião e a minha atitude não
se adequavam à comunidade. Lutava pelas minhas convicções e era um patinho
feio", confessa. Foi mandado para o Seminário de Viseu, quando o que sonhava era
partir para o México ou para as Filipinas em missão. "Mas havia uma hierarquia e
um voto de obediência a respeitar." Por esta razão teve mesmo de ficar em Viseu,
onde trabalhava sobretudo com jovens.

Em 1996 tornou-se jornalista nas revistas "Além-Mar" e "Audácia", editadas pelos


Missionários Combonianos, em Lisboa. Ao mesmo tempo, envolveu-se em vários
projectos de ajuda a famílias carenciadas, jovens em risco e sem-abrigo - o que
entrou em choque com o estilo da comunidade, cuja disciplina férrea impunha
horas para as refeições e oração. "Pedia ajuda aos meus colegas para esses
projectos, mas diziam-me que não era nossa função e que não havia tempo."
Fernando ia sozinho, até que deixou de aguentar o ritmo. Eram demasiados
afazeres. Em 2001 deitou o sonho dos pais por terra e abandonou o sacerdócio.

Conseguiu emprego num lar de idosos e voltou a cruzar-se com uma amizade que
manteve por correspondência durante vários anos: Maria José, uma estudante
universitária que conhecera em Viseu, anos antes, através do trabalho que fazia
com grupos de jovens. Não teve medo quando percebeu que estava apaixonado.
"Casaram em Maio de 2006 e há dois anos partiram juntos em missão para África.
Entretanto, Fernando Félix retomou a ligação à Igreja: é jornalista a tempo inteiro
nas revistas "Além-Mar" e "Audácia".

Desilusão Na primeira noite chorou sozinho, no escuro. Francisco Monteiro tinha


12 anos quando entrou para o seminário menor dos Jesuítas, levado "por um
conjunto de circunstâncias". A família estava muito ligada à Companhia de Jesus e
isso proporcionou-lhe um "contacto profundo" com vários jesuítas. Apesar de
admitir ter havido alguma "sugestão" por parte dos que lhe eram próximos,
Francisco garante que a escolha foi consciente. "Só não esperava encontrar tanta
dureza em Macieira de Cambra." Entrou para o noviciado aos 15 anos e garante
que sentiu, mesmo, o chamamento. "Escrevia muito, sozinho, em oração."

Seguiram-se seis anos de estudo de Humanidades e Filosofia em Braga. Em 1958


foi parar a Moçambique. Bastaram dois anos em África para se aperceber de que
existia "uma forte clivagem" entre o que pensava, o funcionamento das missões, as
normas de orientação da Igreja e as orientações do governo português. Chegou a
escrever ao responsável geral dos Jesuítas no Vaticano, a expor a sua posição em
relação ao problema de independência de África, em que falava "de uma certa
distorção na maneira de encarar o problema".

Pensou em desistir, mas ainda esteve em Espanha, a estudar Teologia. Em 1964


tirou um curso de Pedagogia em Chicago. Dois anos depois foi ordenado padre em
Lisboa. Rumou de seguida à Colômbia, onde contactou com um projecto especial -
uma rede de escolas radiofónicas que fazia a alfabetização de camponeses nas
montanhas mais remotas.

Sonhou lançar um projecto igual em Moçambique. "Mendiguei apoios financeiros e


só consegui ajuda na Alemanha", recorda. Um ministro português da altura chegou
a perguntar-lhe, surpreendido: "Mas os africanos são capazes de aprender alguma
coisa?" As portas foram-se fechando e as ajudas não chegaram. Um ano depois
desistiu. "Houve uma ruptura total, senti uma enorme desilusão. Estava a lutar
contra um sistema injusto, que não conseguia ultrapassar. Havia toda uma
estrutura que me impedia de trabalhar em prol das pessoas que tinha a anuência
da igreja local", justifica. Ainda em Moçambique, na Beira, conheceu aquela que
viria a ser a sua mulher. "Mas não foi por isso que abandonei", garante. "Nessa
altura já estava em desespero, não era feliz."

Voltou para Portugal, procurou emprego nos anúncios e arranjou um lugar na


banca. Casou logo a seguir. Hoje tem 71 anos e nunca se arrependeu. Dedica-se de
corpo e alma a um projecto social de apoio a famílias ciganas, em Lisboa. É
reformado e vai passar o Natal na companhia dos dois filhos e dos cinco netos.
"Coisa que nunca imaginei quando era jovem", admite.

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