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Como organizar nossos pensamentos

Por Eugenio Mussak


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O que diferencia os homens dos animais é o pensamento. Que diferencia os homens entre si
é a qualidade desse pensamento. E, para melhorar essa qualidade, inventamos a educação, a
psicologia, a literatura, a poesia.

Sim, temos essas ferramentas para melhorar nossa faculdade de pensar, mas, por outro lado, algo
nos atrapalha: os excessos. As mídias variadas que disputam nosso interesse, as notícias frescas e
requentadas que se acumulam em nosso buffer mental esperando a análise mais cuidadosa que
nunca virá e as informações de múltiplas faces que esperam ser analisadas e absorvidas, têm o
poder de provocar o curto-circuito que quase nos transforma em paralíticos mentais, claudicantes
nos pensamentos, vacilantes nas respostas e inseguros nas decisões.

Nessas horas de exageros, o certo é tirar o pé do acelerador mental, raspar os excesso e


focar. Os cientistas chamam essa prática de isolar e pinçar. Isolamos o assunto que nos
interessa e o pinçamos do meio poluído, então conseguimos vê-lo com mais clareza. A isso
chamamos de pensar bem.

Quando, no meio de uma confusão, alguém semicerra os olhos, olha para baixo em um pequeno
ângulo e diz “pensando bem...”, acredite, ele isolou o assunto que o interessa e se livrou dos
excessos. Nesse momento, sua capacidade de análise aumentou consideravelmente e é bom
escutar o que ele tem a dizer.

Pensar é fácil, comum e rotineiro. Pensar é biológico. Pensar bem exige consciência, serenidade,
preparo. Pensar bem é mental. Todo mundo pensa, nem todos pensam bem. Pensar bem é vestir
o escafandro do interesse e ir fundo em uma questão que até então era tratada superficialmente. E
quando mergulhamos vemos outro mundo.

Um mergulho na realidade

A metáfora do mergulho é apropriada neste caso. Lembro-me que quando me deixei, pela primeira
vez, engolir pelo mar, após freqüentar o curso de mergulho autônomo. Senti que estava entrando um
novo mundo, uma dimensão diferente, fascinante, com uma lógica própria e até então desconhecida
para mim. Ao voltar para o barco, o instrutor quis conhecer meu sentimento, e eu lhe disse: “quando
vi aquele mundo lá em baixo, tive a impressão que estive com os olhos fechados até então”. Era o
que eu estava sentindo, de verdade.

Pensar bem é parecido com isso. É abrir os olhos para uma realidade que não enxergávamos
direito porque não olhávamos só para ela. Muitas vezes teimamos em tentar entender a vida
transformando nossa atenção em um calidoscópio cujas peças formam imagens diferentes a cada
instante e não temos à nossa frente uma realidade, temos várias, e não sabemos qual escolher.
Nessa hora, pense bem.

A Razão e a Sandice

Que Machado de Assis foi um gênio ninguém duvida. Com sua obra colocou a literatura brasileira
em um novo patamar. Em 1881 publicou Memórias póstumas de Brás Cubas. O personagem central
é um homem comum que estudou direito em Coimbra, teve um cargo público, tentou ser ministro
sem sucesso, investiu tempo e dinheiro na criação de um emplasto que não deu certo, nunca se
casou, não teve filhos e morreu angustiado. Brás Cubas tinha um amigo chamado Quincas Borba,
uma namorada chamada Eugênia e uma amante chamada Virgília, morreu aos 64 anos e só
entendeu a vida depois da morte. Foi quando ele parou para pensar bem.
Com Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis inaugurou o Realismo Psicológico. O
foco central desse romance não é a vida da sociedade, a descrição da cidade, das paisagens ou das
pessoas. Não interessa quem são os personagens e sim a forma como eles sentem e como se
relacionam com suas circunstâncias. O foco de Machado de Assis, nesse livro, é o interior das
pessoas, seus dilemas existenciais, suas contradições emocionais. Não interessa o fato mundano, e
sim a vida interior, a alma humana. A marca registrada desse enredo, é que ele é contado por um
defunto. Brás Cubas dedica a obra ao primeiro verme que comeu sua carne.

Em um dos capítulos o defunto autor (e não autor defunto, esclarece) cria dois personagens
antagônicos que, segundo ele, costumam nos transformar em suas moradas: a Razão e a Sandice.
Só depois de morto Cubas consegue dar força à Razão para que esta expulse a Sandice de casa.
Disse a Razão à Sandice, quando esta lhe pede apenas um espaço no sótão da casa (um cantinho
em nossa consciência):

- Estou cansada de lhe ceder sótãos, cansada e experimentada. O que você quer é passar
mansamente do sótão à sala de jantar, daí à de visitas e ao lesto.

- Está bem, mas deixe-me ficar um tempo mais, estou na pista de um mistério...

- Que mistério?

- O da vida e da morte. Peço-lhe só uns dez minutinhos.

A razão pôs-se a rir.

- Hás de ser sempre a mesma cousa... sempre a mesma cousa... sempre a mesma cousa...
E dizendo isto, travou-lhe dos pulsos e arrastou-a para fora; depois entrou e fechou-se. A Sandice
ainda gemeu algumas súplicas, grunhiu algumas zangas; mas desenganou-se depressa, deitou a
língua de fora, em ar de surriada, e foi andando...
Dentro de Brás Cubas, a Razão já tinha cedido espaço à Sandice outras vezes. Desta vez, foi como
se ela tivesse dito: “Pensando bem, chega de lhe dar guarida. Pensando bem, estou cansada de
você. Pensando bem, nossa relação termina aqui”.

Pensando bem...

O mundo moderno valoriza as pessoas que pensam melhor. A lógica aplicada à tomada de
decisões, a velocidade do raciocínio para resolver problemas intrincados e uma memória
capaz de recuperar fatos e nomes com rapidez são qualidades admiradas e até cultuadas. As
emoções são importantes, desde que estejam sob controle do pensamento – a famosa
inteligência emocional. “A vida é uma comédia para os que pensam, e uma tragédia para os que
sentem”, disse o escritor inglês Horace Walpole. Será?

Será que pensar bem significa que a razão deve escravizar a emoção, o pensamento acorrentar o
sentimento? Não, não se trata de uma disputa entre a razão e a emoção e sim entre a razão e a não
razão, que Machado chamou de Sandice. Eu prefiro Machado de Assis.

Pensar bem quer dizer organizar o pensamento. Não significa apenas pensar e não sentir. Até
porque o sentimento é o gatilho do pensamento. Pensamos nossa vida prática porque sentimos
nossa vida interior, pensamos a engenharia porque ela facilita a vida e sentimos a poesia porque ela
justifica a vida, pensamos a agenda para evitar a ira do tempo e apenas sentir as suas benesses.

Pensar bem significa ampliar a consciência e a capacidade de análise. Significa aprofundar a


visão, como o mergulhador que parecia estar de olhos fechados até então. Significa aumentar o
interesse pelos sinais da vida, usando uma lupa para concentrar a energia e acender o fogo do
conhecimento. Significa perceber que as ciências, as artes, as filosofias, são companheiras
interdependentes que, só em equipe, conseguem, de fato, dar clareza ao mundo.

Pare um pouco, apeie do bonde do motorneiro louco contratado pela mídia que define o sucesso, e
pense bem. Pense nos valores reais, na amizade, na verdade, na justiça. Pense no trabalho
porque ele dá dignidade e alegria, além de pagamento. Pense na felicidade construída pela razão a
pedido da emoção. Pense na finitude da existência e na infinitude da vida. Pense nos sentimentos
daqueles que você ama, e que amam você. Pense no amor. Pense bem...

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