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Há pouco mais de cem anos, na França, a escolarização se tornou obrigatória. No Brasil, isso
aconteceu há cerca de 70, mas, só para o ensino primário, pois, somente na década de 1990 é que
fomos ter a universalização do ensino. É relevante pensar nesses fatos para entender quando a
transição do jovem estudante para o jovem trabalhador começou a acontecer. Considerando a
vastidão de nossa história, podemos afirmar que é relativamente jovem o sentido social desse
processo. E é nesse jovem aspecto da juventude que encontramos a justificativa para que a
transição para a vida adulta ainda esteja tão “em transição”.
Ainda nesse conjunto, podemos destacar os eventos que normalmente marcam a transição do “ser
jovem” para o “ser adulto”, como a inserção no mercado de trabalho, o casamento e a conseqüente
constituição de família e/ou de um domicílio próprio. Mas, esses marcos transitivos não têm
acontecido de maneira linear, e, em alguns casos, não têm sequer acontecido.
Exemplos disso, são os jovens que casam e/ou têm filhos, mas não saem da casa dos pais, ou
mesmo aqueles que lá permanecem porque estão adiando a entrada para o mercado de trabalho.
Um emblema mais desanimador dessa alinearidade é o do jovem, que morre ainda nessa condição,
na maioria das vezes violentamente. Jovens, cujas trajetórias de transição “viraram hipótese”, de
acordo com a paráfrase de Monteiro Lobato, citada no livro “Transição para a vida adulta ou vida
adulta em transição?” (Camarano, 2006: 320). É possível, então, pensar essas transições para e da
vida adulta à luz de um olhar que foge ao tradicional, buscando entender os fatores geradores
dessa ausência de uma linearidade concretada, como o aumento do número de mulheres no
mercado de trabalho, o aumento da freqüência à escola, o prolongamento dos estudos (na casa
dos pais), a gravidez precoce, entre outros.
O que, de fato, faz um jovem vir a ser adulto? Quando é que se deixa de ser jovem? A resposta
para essas perguntas não é única, nem absoluta. Não é poética, nem científica. Pode ser que nem
exista. Mas, em tempos produtivos como os nossos, há que se levar fortemente em consideração,
no amadurecimento dos jovens, a independência financeira, por mais frágil e incerta que possa
ser, tanto no início da vida profissional, quanto rumo à aposentadoria.
A sociedade só se preocupa com o indivíduo na medida em que ele produz.
Sabem-no muito bem os jovens. Sua ansiedade no momento de abordar a
vida social é simétrica à angústia dos velhos na hora de serem dela
excluídos. No ínterim, a rotina se encarrega de mascarar os problemas. O
jovem teme a máquina que o vai abocanhar e procura, de quando em
quando, defender-se a golpes de paralelepípedos; ao velho, por ela repelido,
esgotado e nu, só lhe restam os olhos para chorar. (Simone de Beauvoir,
A velhice, 1970)
Ora, incerteza, fragilidade e insegurança têm sido, frequentemente, palavras expressadas para
caracterizar traços juvenis. Mas, num contexto de alto desemprego e subemprego, tanto para os
jovens quanto para os adultos, como poderemos caracterizar o mercado de trabalho e a, quase
sempre, inexorável inserção do indivíduo nesse mercado?
Mas, nossos tempos são marcados pela fragilidade e individualização. É assim na inserção familiar.
É assim na laboral. É também dessa forma que fluem nossos processos. Casamentos não são mais
tão sólidos e inquebráveis como antigamente. Empregos não são mais para toda a vida. A fluidez
das relações pós-modernas não iria faltar às etapas do ciclo de vida do cidadão desse tempos.
Mas, a certeza reside justamente no incerto. Sabemos que há diferentes transições, de diferentes
maneiras, mas, mais importante, reconhecemos que a própria vida é pautada pela transição.
Resumindo e em concordância com a conclusão do livro³, enquanto há vida, há transição. A própria
vida é uma transição, não importa a idade que temos.
2. Este capítulo foi escrito com base na pesquisa de Nadya Guimarães, junto ao Centro de Estudos
da Metrópole (CEM). A pesquisa envolveu o maior mercado metropolitano de trabalho no Brasil, o
de São Paulo.
3. Transição para a vida adulta ou vida adulta em transição? / Organizadora Ana Amélia Camarano
– Rio de Janeiro: Ipea, 2006.