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Foi com surpresa que eu fiquei sabendo que a Garimpo Editorial1 lançaria no Brasil o livro do
debate entre o ateu Christopher Hitchens e o pastor Douglas Wilson. Surpresa pois, apesar de ser uma
prática bastante comum fora do Brasil (o lançamento de livros com o conteúdo de um debate sobre a
existência de Deus), aqui em nosso país não é. Com exceção do livro do debate entre Joseph Ratzinger
(Papa Bento XVI) e o filósofo ateu Paolo d’Arcais (sob o título de Deus Existe?, lançado pela editora
Planeta do Brasil), não me lembro de nenhum outro que tenha sido lançado por aqui.
Sobre o conteúdo do livro em si, trata-se, como já deixei transparecer no primeiro parágrafo, de
um debate entre o escritor ateu Christopher Hitchens (que no Brasil escreve para a revista Época) e o
pastor americano Douglas Wilson. Eis as minhas considerações gerais sobre o debate:
O debate é de curta duração e foi focado em apenas um tema específico dentre todas as
controvérsias possíveis de serem exploradas – o que é uma pena. Tanto Christopher quanto Wilson
levantaram questões bastante interessantes; questões que muitas vezes remetiam a pressupostos que
poderiam ser questionados e debatidos. Se o debate englobasse uma gama maior de assuntos, com
mais oportunidades de diálogo entre os debatedores, teria sido excelente.
Houve um equilíbrio entre os debatedores. Em alguns momentos pensa-se “puxa, o Wilson não
conseguir sair dessa”, então ele responde à provocação de Christopher à altura e ainda apresenta um
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<www.garimpoeditorial.com.br>.
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questionamento intrigante, então pensamos “quero ver o Hitchens sair dessa”. O debate apresentou
este equilíbrio e é impossível dizer quem foi o vencedor – se é que podemos dizer que houve algum.
Talvez se o debate fosse maior, envolvendo uma gama maior de assuntos, a balança pesasse para
algum dos lados.
O debate seguiu a seguinte ordem: Hitchens dá a primeira palavra, Wilson responde. Tal
seqüência conferiu a Wilson uma pequena vantagem estratégica, pois além de ter sido Hitchens a ter
de começar o assunto e fazer movimentar a máquina do debate, foi Wilson que teve a última palavra
na discussão – e como ele aproveitou bem esta última palavra! O argumento que Wilson levantou em
seu último discurso foi bastante perspicaz, e foi o mais forte de todo o livro.
O que podemos dizer de Christopher Hitchens no debate é que seu jeito de articular as frases,
de forma a garanti-las um peso retórico forte, fez bastante diferença e lhe garantiu vários pontos. A
“circuncisão” (que nada mais era do que “fimose” dos dias atuais) foi espertamente chamada pelo
jornalista por várias vezes de “mutilação sexual infantil” – convenhamos que “mutilação sexual
infantil” possui um peso retórico muito mais forte do que “circuncisão” ou mesmo “fimose”. Hitchens
realmente sabe arrancar aplausos de uma platéia com suas palavras provocadoras. À parte de sua
retórica, contudo, sinceramente não vi muita coisa nele neste debate. Hitchens praticamente não
apresentou argumento algum; apenas apresentou supostas falsificações que constituíam, segundo ele,
contradições à teoria de que os valores morais que temos possuem alguma fundamentação
sobrenatural. O único argumento que Hitchens apresentou (em seu último discurso) para apresentar
qual seria a fundamentação objetiva para a moralidade – nosso senso de moralidade é “inato” e evoluiu
junto com o processo de Seleção Natural – foi mui inteligentemente refutado por Wilson (em seu
último discurso), logo, sem possibilidade de respostas para Hitchens. Além do mais, Hitchens
claramente se negou a responder a Wilson sobre qual era a fundamentação que garantia ao nosso senso
de moralidade um caráter objetivo (Hitchens argumentou que esta pergunta não fazia sentido, apelando
para a “navalha de Occam” – o que é estranho, pois Occam era um teólogo do período escolástico,
período em que a apologética como a conhecemos tomou forma), o que eu acho ser uma pergunta
justa.
Sobre a participação de Wilson, ele se portou bem ante aos ataques retóricos de Hitchens, e por
vezes soube não apenas responder, mas inverter vários ônus de argumentação de volta para Hitchens.
Como eu disse, a seqüência do debate (Hitchens primeiro, Wilson segundo) garantiu a Wilson uma
pequena vantagem estratégica, que ele soube aproveitar no fim, levantando uma questão matadora a
um argumento de Hitchens. Faltou a Wilson, porém, ser mais ousado em sua estratégica. Ele
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simplesmente se defendeu e passou a maioria do debate respondendo as perguntas de Hitchens, como
um time de futebol que joga na retranca. Wilson concentrou em apenas uma pergunta no debate
inteiro (Qual é o fundamento objetivo do senso de moralidade?), e foi aí, penso, que ele perdeu a
oportunidade de se destacar mais. Se Hitchens pôde levantar dezenas de perguntas (algumas até sem
sentido), por que Wilson também não?
Enfim, se você se interessa por esta controvérsia “Cristianismo x Ateísmo”, seja você cristão,
ateu ou agnóstico, O Cristianismo é bom para o mundo? vai lhe agradar. Certamente é um livro para
se pegar de vez em quando na prateleira e reler esporadicamente.
www.ElielVieira.org
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