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I II III IV
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Não pode deixar de ser mencionada a circunstância de existirem alguns direitos consagrados na Parte Iª,
mas fora do catálogo. Vejam-se os artigos 20º (direito de acesso à Justiça e à tutela jurisdicional efectiva),
21º (direito de resistência), 22º (direito a reparação por danos provocados por acções ou omissões do
Estado e demais entidades públicas) e 23º (direito de queixa ao Provedor de Justiça).
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9.4.2.3. Direitos fundamentais só materialmente constitucionais ou fundamentais
(por alguns também denominados de extraconstitucionais) - (art. 16º, nº 1, CRP)
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Em termos históricos, esta técnica da ‘cláusula aberta’ ou ‘lista aberta’ foi utilizada pela primeira vez na
9ª emenda da Constituição Federal norte-americana, a qual dispõe que "a enumeração, na Constituição, de
certos direitos não será interpretada como negando ou restringindo outros direitos consagrados pelo
povo". Sobre as vicissitudes interpretativas associadas a esta emenda, vide amplius, VIEIRA DE
ANDRADE, ob. cit., p. 72, nota 6.
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Não foi esta a primeira vez em que o legislador constituinte português admitiu este princípio da cláusula
aberta. Efectivamente, o mesmo princípio estava igualmente contido nas constituições republicanas
portuguesas de 1911 e 1933.
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Ou seja, no artigo 16º, nº 1, CRP, está consagrado, de forma implícita, o princípio da cláusula aberta.
Para designar esta mesma realidade jurídica poder-se-á dizer que o artigo 16º, nº 1, CRP, é uma norma
que tem pressuposto o princípio da não identificação (Gomes Canotilho e Vieira de Andrade) ou da não
tipicidade (Vieira de Andrade e Jorge Miranda) dos direitos fundamentais. Uma outra possibilidade é
dizer-se que se trata de uma norma de fattispecie aberta. Segundo parece resultar das palavras de Gomes
Canotilho, esta última fórmula significa sobretudo que a Constituição está aberta não apenas às
"positivações concretas" mas, outrossim, a "todas as possibilidades de «direitos» que se propõem no
horizonte da acção humana". Ver J.J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da
Constituição (6ª ed.), Coimbra, 2002, p. 403; VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., p. 71 e JORGE MIRANDA,
Manual de Direito Constitucional, …
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"Os direitos fundamentais consagrados na Constituição não excluem quaisquer outros
constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional"
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Há quem mencione a possibilidade inversa, ou seja, a da existência de direitos só formalmente
constitucionais. Serão direitos fundamentais do ponto de vista formal porque consagrados como tais no
texto constitucional mas, do ponto de vista material (i. é, do seu conteúdo ou matéria), dificilmente
podem ser considerados verdadeiros direitos fundamentais. Ou porque não podem ser considerados
direitos propriamente ditos ou, porque sendo-o, não são tão importantes que mereçam a dignidade
constitucional formal (i. é, serem incluídos na constituição).
Entre nós, Vieira de Andrade tem vindo a sustentar a existência na Constituição de 1976 de
alguns direitos fundamentais só formalmente constitucionais. A título exemplificativo refere, desde logo,
os direitos de antena (art. 40º, nº 1) e de resposta e de réplica política (art. 40º, nº 2), os quais, em sua
opinião, não configuram qualquer posição jurídica subjectiva individual, não se destinam directamente a
garantir bens jurídicos pessoais e nem sequer se referem à pessoa humana e à sua dignidade — por outras
palavras, não possuem nenhum dos ‘requisitos’ que permitiriam a sua qualificação como direitos. Indo
mais longe, o autor afirma que os preceitos que consagram os ‘direitos fundamentais’ em apreço nem
sequer fazem parte da matéria dos direitos fundamentais. Eles limitam-se a "estabelecer normas de
organização política democrática". Já quanto ao direito de participação nas assembleias de moradores (art.
264º, nº 2), o mesmo autor, embora reconheça a sua qualificação como um verdadeiro direito, levanta
dúvidas quanto à oportunidade da sua constitucionalização e consequente fundamentalidade, "(…) até
porque a matéria das organizações populares de base não tem (…) dignidade constitucional no quadro do
sistema político (e administrativo) que acabou por ser estabelecido". Ver VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit.,
pp. 86 e ss. Em sentido contrário, defendendo que todos os direitos fundamentais formais (consagrados,
portanto, na Constituição) são simultaneamente direitos fundamentais materiais, J.J. GOMES
CANOTILHO, Direito, cit., pp. 406-7 e JORGE MIRANDA, Manual, cit., p. …
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Canotilho e Vital Moreira 6, Jorge Miranda 7) seja favorável à segunda hipótese, outros
autores condenam-na abertamente (Henrique Mota) ou não parecem sustentá-la, pelo
menos de iure condito (Vieira de Andrade) 8.
Deixando de lado esta questão prévia, confrontamo-nos com um segundo
problema que é o de saber onde se podem encontrar os direitos fundamentais só
materialmente constitucionais ou fundamentais?
Nos termos do artigo 16º, nº 1, CRP, tais direitos encontram-se nas "leis" e nas
"regras aplicáveis de direito internacional".
Segundo a opinião da maior parte da doutrina portuguesa, a palavra "lei" deve
ser entendida aqui num sentido amplo, como acto legislativo. De acordo com o artigo
112º, nº 1, CRP, actos legislativos são a lei, o decreto-lei e o decreto legislativo
regional. Isto significa que poderão ser encontrados direitos fundamentais só
materialmente constitucionais ou fundamentais não apenas nas leis da Assembleia da
República mas também nos decretos-leis do Governo e nos decretos legislativos
regionais das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.
Já quanto às "regras aplicáveis de direito internacional", entende-se que os
direitos fundamentais sem assento constitucional poderão encontrar-se tanto em
instrumentos convencionais (em especial, tratados internacionais) ou pactícios como
ainda nas normas do direito internacional geral ou comum.
Um terceiro problema é o da sua identificação. Quais os direitos humanos, de
entre os consagrados em leis e regras de direito internacional, que devem ser
considerados direitos só materialmente constitucionais ou fundamentais?
O artigo 16º, nº 1, não estabelece qualquer critério de identificação dos direitos
em apreço. Assim sendo, terão que ser a doutrina e a jurisprudência a formular critérios
válidos. No que concerne a primeira, ideias como "analogia de substância" (Vieira de
Andrade), "direitos equiparáveis pelo seu objecto e importância aos diversos tipos de
direitos formalmente fundamentais" (Gomes Canotilho e Vital Moreira) ou "aqueles
que, pela sua finalidade, pela sua conjugação com direitos fundamentais formais, pela
sua natureza análoga (…), ou pela sua decorrência imediata de princípios
constitucionais, se situem a nível da Constituição material" (Jorge Miranda), são
avançadas com o intuito de facilitar a delimitação dos contornos desta categoria
dogmática. Independentemente da maior ou menor elaboração de cada uma das
propostas de trabalho acabadas de mencionar, não pode deixar de assinalar-se a
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Cfr. J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição, cit., p. 117 e, dos mesmos autores,
Fundamentos da Constituição, cit., p. 116 e J.J. GOMES CANOTILHO, Direito, cit., pp. 403-4.
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Vide JORGE MIRANDA, Manual, cit., p. …
8
Em sentido contrário, HENRIQUE MOTA citado por JORGE MIRANDA, Manual, cit., p. …
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omnipresença da ideia de equiparação de conteúdo e de importância ou valor aos
direitos fundamentais previstos na Constituição. Será esta a orientação a seguir, embora
sempre com a consciência do seu carácter meramente tendencial ou aproximativo.
Assim sendo, são habitualmente considerados como direitos só materialmente
fundamentais de fonte legal o direito ao nome e o direito a ser ressarcido por danos,
consagrados respectivamente nos artigos 72º e 483º do Código Civil — quanto ao
primeiro, devido à sua analogia substancial e valorativa com os direitos ao bom nome e
à identidade pessoal, ambos consagrados no artigo 26º, nº 1, CRP; e, quanto ao segundo,
devido à sua analogia substancial e valorativa com o artigo 22º, que prevê a
responsabilidade das entidades públicas.
Poderão ser considerados como direitos só materialmente fundamentais de fonte
internacional o direito a mudar de cidadania previsto no artigo 15º, nº 2, da Declaração
Universal dos Direitos do Homem (1948) e o direito do arguido a um intérprete em
processo penal previsto nos artigos 5º, nº 2 e 6º, nº 3, als a) e e) da Convenção Europeia
dos Direitos do Homem (1950). O primeiro, porque semelhante em termos substanciais
e valorativos ao direito à cidadania previsto no artigo 26º, nº 1, CRP. O segundo, porque
semelhante em termos substanciais e valorativos a todas aquelas garantias de processo
criminal previstas nos artigos 27º e 32º, CRP.
Finalmente, é preciso que alguns dos direitos novos ainda são susceptíveis de ser
enquadrados no texto constitucional. Se isso for possível, tais direitos serão
formalmente constitucionais e gozam da protecção especial que é dada aos direitos
consagrados na constituição. Como exemplo, veja-se o direito do embrião à implantação
uterina, o qual pode ser visto como mais uma dimensão do direito à vida (art. 24.º CRP).
"O regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos enunciados no título II e aos
direitos fundamentais de natureza análoga".
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deveres económicos, sociais e culturais) ou podem estar dispersos ao longo do texto da
Constituição 9.
A importância da identificação destes direitos análogos é óbvia, uma vez que
eles vão beneficiar, para além do regime geral dos direitos fundamentais, também do
regime específico dos direitos, liberdades e garantias — o qual comporta um acréscimo
de protecção jurídica para os direitos.
Menos óbvia e fácil se torna a tarefa de identificar com rigor esses direitos
análogos. Em todo o caso, terão que ser direitos semelhantes aos direitos, liberdades e
garantias (como se verá de seguida, alguns deles são meras concretizações dos
mesmos); para além disso, não se pode invocar uma analogia genérica com a categoria
dos direitos, liberdades e garantias (v.g., não será suficiente afirmar que o direito a ser
eleito como Presidente da República (art. 122º) é análogo aos direitos, liberdades e
garantias), antes a analogia deverá ser verificada direito a direito (o direito a ser eleito
como Presidente da República (art. 122º) é análogo ao direito de voto (art. 49.º) ou
direito a ser eleito (art. 50.º)); finalmente, o direito análogo terá que apresentar uma
natureza idêntica ao direito, liberdade ou garantia. A título meramente ilustrativo, veja-
se que os direitos de iniciativa privada e de propriedade privada (arts 61º e 62º CRP),
tendo em consideração a sua afinidade substancial com o direito à liberdade (art, 27º, nº
1, CRP), podem ser considerados direitos pessoais de natureza análoga. O direito a ser
eleito como Presidente da República (art. 122º), dada a sua afinidade substancial com o
direito de sufrágio (art. 49º) e com o direito de acesso a cargos públicos (art. 50º), pode
ser considerado um direito de participação política de natureza análoga. A garantia de
tutela jurisdicional efectiva dos administrados (art. 268º, nº 4), dada a sua afinidade
substancial com as garantias de processo criminal (em particular art. 32º), pode ser
considerada uma garantia pessoal de natureza análoga.
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No texto originário da Constituição determinava-se a aplicação do regime dos direitos, liberdades e
garantias, entre outros, "a direitos de natureza análoga, previstos na Constituição e na lei" (itálico nosso).
Esta última secção do texto foi eliminada com a primeira revisão constitucional (1982).