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Valdex de Jesus Santos

Simulações Computacionais em Sistemas


Presa-Predador

Jequié-BA
Julho de 2009
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Departamento de Quı́mica e Exatas

Valdex de Jesus Santos

Simulações Computacionais em Sistemas


Presa-Predador

Monografia apresentada ao Departamento de


Quı́mica e Exatas da Universidade Estadual
do Sudoeste da Bahia como requisito par-
cial para obtenção do tı́tulo de Licenciado em
Matemática com Enfoque em Informática.

Orientador
Prof. Márcio Antônio de Andrade Bortoloti

Jequié-BA
Julho de 2009
i

Monografia apresentada ao Departamento de Quı́mica e Exatas da Universidade Es-


tadual do Sudoeste da Bahia como requisito parcial para obtenção do tı́tulo de Licenciado
em Matemática com Enfoque em Informática.

Aprovada por:

Prof. Márcio Antônio de Andrade Bortoloti, DSc.


Orientador

Profa. Cleusiane Vieira Silva, MSc.

Prof. Flaulles Boone Bergamaschi, MSc.

Prof. Nemésio Matos de Oliveira Neto, DSc.

Jequié-BA
Julho de 2009
ii

Agradecimentos

- A Deus por me fazer capaz de superar desafios e olhar além das limitações humanas.

- À Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, ao Departamento de Quı́mica e Exatas


e ao Colegiado do Curso de Matemática com Enfoque em Informática na pessoa da
professora Márcia Graci de Oliveira Matos.

- Aos membros da banca examinadora que se dispuseram a avaliar este trabalho.

- À minha famı́lia, em especial à minha tia Ana pelo apoio incondicional e minhas tias
Dade e Diva pela afetividade.

- Ao meu orientador Márcio Antônio de Andrade Bortoloti pelo aval, correções e sugestões
sempre muito pertinentes e à sua esposa Roberta D’Angela Menduni Bortoloti pelo
incentivo.

- Ao professor Eduardo Mariano pelas sugestões.

- Aos colegas da UESB pelos momentos de descontração.

- Aos demais professores do Curso de Matemática com Enfoque em Informática da Uni-


versidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Campus de Jequié), principalmente aos
professores Edson Ramos, Fernando dos Santos, Janice Lando, José Eduardo, Maria
Nilza e Cleusiane Vieira.

- A todas as demais pessoas que colaboraram direto ou indiretamente para a concretização


deste trabalho e para minha formação profissional.
iii

Resumo

Neste trabalho apresentamos simulações computacionais em sistemas presa-predador.


Estudamos o sistema clássico de Lotka-Volterra e baseado neste apresentamos variações
para duas e três espécies. Em sistemas com duas espécies a coexistência é, teoricamente,
sempre possı́vel. Já no caso de três espécies, sendo duas presas e um predador, uma
das presas sempre vai à extinção. Nesse caso, apresentamos uma estratégia de controle
chamada switching, que representa o deslocamento de preferência do predador mediante
a escassez de alimento, visando estabilizar o sistema e consequentemente garantir a so-
brevivência das espécies.
iv

Abstract

In this work we present computational simulations in predator-prey systems. We have


studied the classical Lotka-Volterra system and present changes based on it for two and
three species. In systems with two species co-existence is, theoretically, always possible.
In the case of three species, with two preys and one predator, one of the preys always to
extinction. In this case, we present a control strategy called switching, which represents
the changging of the predator’s preference by the scarcity of food, aiming to stabilize the
system and thus ensure the survival of species.
v

Sumário

Lista de Figuras vii

Lista de Tabelas x

INTRODUÇÃO 1

1 Dinâmica de uma Espécie Isolada 5

1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.2 Modelo de Malthus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

1.3 Modelo de Verhulst . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

1.4 Comparação Experimental entre os Modelos de Malthus e Verhulst . . . . 12

1.5 Modelo de Montroll . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

2 Modelos Presa-Predador para duas Espécies 16

2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

2.2 Modelo de Lotka-Volterra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

2.2.1 Estabilidade e Pontos de Equilı́brio do Modelo Lotka-Volterra . . . 20

2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar . . . . . . . . . . . . . . . 23

2.3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

2.3.2 Construção do Modelo: Vespa X Broca . . . . . . . . . . . . . . . . 24

2.3.3 Análise do Modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

2.4 Modelos Presa-Predador Modificados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

2.4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Sumário vi

2.4.2 Modelo Presa-Predador com Auto-Regulação no Crescimento das


Presas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

2.4.3 Modelo Presa-Predador com Auto-Regulação no Crescimento das


Presas e dos Predadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

2.5 Outros Modelos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

3 Modelos Presa-Predador para três Espécies 44

3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44

3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 45

3.2.1 Estabilidade e Pontos de Equilı́brio . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

3.2.2 Análise Através de Funções de Liapunov . . . . . . . . . . . . . . . 51

3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Logı́stico para as


Presas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

Conclusão 58

Referências 60

Apêndice A Sistema Linear Autônomo 63

Apêndice B Sistemas Quase Lineares e Ciclos Limites 65

B.1 Sistemas Quase Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65

B.1.1 Classificação de Pontos Crı́ticos e Estabilidade de Sistemas Quase


Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

B.2 Ciclos Limites . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68

Apêndice C Funções de Liapunov e Critério de Routh-Hurwitz 69

C.1 Funções de Liapunov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

C.2 Critério de Routh-Hurwitz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70

Apêndice D Método Numérico de Runge-Kutta 72


vii

Lista de Figuras

1 Modelo Malthusiano (1.2) para a = 0.5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

2 Modelo Malthusiano (1.2) para a = −0.5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

3 Modelo de Verhulst: curva logı́stica (1.5) para a = 0.5 e K = 3.0. . . . . . . . . . . . 10

4 Variação de x(t) para K = 3.0 e a = 0.5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

5 Modelo de Montroll para b = 2.0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

6 Modelo de Montroll para b = 0.5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

7 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.5), com


a = 1.0, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.0). . . . . . . . 19

8 Plano de fase do sistema (2.5) com os mesmos parâmetros usados na figura anterior e
condições iniciais indicadas no gráfico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

9 Variação da densidade de brocas e vespas ao longo do tempo, sistema (2.19), para


a = 0.027749, α = 0.000015, b = 1.198293, β = 0.000689 e condição inicial (x0 , y0 ) =
(2000, 5000). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

10 Plano de fase, sistema (2.19), para os mesmos parâmetros e condição inicial da figura
anterior. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

11 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para


a = 1, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25, K = 4.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2, 3). . . . . . 30

12 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para


K = 8.0. Os outros parâmetros e a condição inicial são os mesmos da figura anterior. . 31

13 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para


a = 1.0, α = 0.5, b = 1.5, β = 0.25 e K = 4.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2, 3). . . . . . 32

14 Retrato de fase do sistema (2.24) para a = 1.0, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0. . . 33

15 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com condição inicial


(x0 , y0 ) = (1.5, 2.5). Em (a) a = 0.8 α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0 e em (b)
a = 1.5, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
Lista de Figuras viii

16 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com condição inicial


(x0 , y0 ) = (1.5, 2.5). Em (a) a = 1.0 α = 0.5, b = 0.2, β = 0.25 e K = 8.0 e em (b)
a = 1.0, α = 0.5, b = 0.9, β = 0.25 e K = 8.0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

17 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.28), para


a = 0.5 α = 0.8, b = 0.4, β = 0.25 e K = 100.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2.5, 3.5). . . 35

18 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.28), para


a = 0.5 α = 0.8, b = 0.5, β = 0.25 e K = 100.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2.5, 3.5) . . 36

19 Plano de fase do sistema (2.28) com os mesmos parâmetros da figura anterior. . . . . . 36

20 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo para a = 0.5, b = 0.5,


α = 0.8, K = 100.0, condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.5) e variando o parâmetro β: em
(a), β = 0.2 e em (b), β = 0.5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

21 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo para a = 0.5, b = 0.5,


β = 0.3, K = 100.0, condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.5) e variando o parâmetro α: em
(a), α = 0.5 e em (b), α = 0.8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

22 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.32),


para a = 10.0 α = 0.6, b = 0.09, λ = 0.02 e K = 100.0, m = 0.01 e condição inicial
(x0 , y0 ) = (10, 20). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40

23 Plano de fase do sistema (2.32) com os mesmos parâmetros e condição inicial da figura
anterior. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40

24 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.33), para


a = 0.6 α = 0.6, b = 0.75, λ = 0.25 e K = 100.0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

25 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.34), para


a = 0.5 α = 0.5, b = 0.5, λ = 0.25 e K = 100.0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

26 Plano de fase do sistema (2.33). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

27 Plano de fase do sistema (2.34). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

28 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.1), para


b1 = 1.0, b2 = 2.0, b3 = 1.0, δ1 = 0.4, δ2 = 0.5, a1 = 0.5, a2 = 0.5 e condição inicial
(1.0, 1.2, 2.0). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

29 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.1), para


b1 = 2.0, b2 = 2.0, b3 = 1.0, δ1 = 0.4, δ2 = 0.5, a1 = 0.5, a2 = 0.5 e mesma condição
inicial da figura anterior. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
Lista de Figuras ix

30 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.4), para


b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.0, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = 0.2 e a2 = 0.2, n = 1 e condição
inicial (x0 , y0 , z0 ) = (2.0, 2.0, 1.5). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47

31 Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com os mesmos


parâmetros e condição inicial da figura anterior. Em (a) n = 5 e em (b) n = 10. . . . . 48

32 Retrato de fase do sistema (3.4) com os mesmos parâmetros e condição inicial da figura
30. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

33 Planos de fase do sistema (3.4). Em (a) plano de fase xz e em (b) plano de fase yz. . . 49

34 Trajetórias do sistema (3.5): (a) caso estável para b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.5, ǫ1 =
0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2. Nesse caso o ponto de equilı́brio é (x0 , y0 , z0 ) = (31.5, 18.9, 8.0);
(b) Caso periódico com os mesmos parâmetros, mas com b1 = b2 = 1.0 e, nesse caso, o
ponto de equilı́brio é (x0 , y0 , z0 ) = (37.5, 15.0, 7.0). . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52

35 Trajetórias do sistema (3.14) com b = 1.0, ǫ1 = 1.0, ǫ2 = 1.0, b3 = 1.0. Nesse caso, temos
√ 
o ponto de equilı́brio (s0 , z0 ) = 2, 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

36 Trajetórias do sistema (3.4) com condição inicial (2.0, 2.0, 1.5) e n = 20: (a) caso estável
para b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.5, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2; (b) caso periódico
b1 = b2 = 1.0, b3 = 1.5, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2. . . . . . . . . . . . . . . . . 53

37 Modelo sem switching com r1 = 0.9, r2 = 1.5, r3 = 1.0, K1 = K2 = 5000, ǫ1 = 0.2, ǫ2 =


0.5, a1 = a2 = 0.5: a) Densidade das populações de presas e predadores como uma
função do tempo; b) Retrato de fase; c) Plano de fase das espécies x e z e o seu ciclo
limite; d) Plano de fase das espécies y e z, mostrando a instabilidade. . . . . . . . . . 55

38 Modelo com switching (n = 1) com os mesmos parâmetros da figura anterior: a)


Evolução da trajetória de cada espécie no tempo; b) Retrato de fase; c) e d) Os planos
de fase e estabilidade assintótica. Ponto de coexistência: x = 7.90; y = 5.27; z = 7.51. . 56
x

Lista de Tabelas

1 Propriedades de Estabilidade de Sistemas Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

2 Propriedades de Estabilidade de Sistemas Quase Lineares . . . . . . . . . . . . . . 67


1

INTRODUÇÃO

A necessidade de se obter informações precisas a respeito de fenômenos biológicos, que


são em sua maioria bastante complexos, faz aumentar o emprego de ferramentas matemáti-
cas e até mesmo estimular o desenvolvimento de vários campos dentro da matemática pura
e aplicada. Assim, surgiu a Biomatemática, que congrega pesquisadores de diversas áreas
do conhecimento, na busca de modelos matemáticos que possibilitem a análise e simulação
dos vários fenômenos que surjam na Biologia, Medicina, entre outras áreas. Vale ressaltar,
porém, que estes não reproduzem fielmente a realidade, são apenas modelos limitados por
simplificações matemáticas e/ou computacionais. Mas podem subsidiar significativamente
na melhor compreensão de definições e no entendimento como determinados fatores ope-
ram em situações naturais complexas.

Construir e estudar modelos matemáticos para populações de plantas e animais está


ligado à necessidade de entender os diferentes tipos de interações fı́sicas e biológicas que
afetam a dinâmica dessas espécies. A grande importância dessa tarefa é clara, pois é
preciso entendê-las para controlar tais dinâmicas e intervir quando necessário.

Desde o século XIX até os dias de hoje houve um avanço formidável no entendimento
da dinâmica de sistemas ecológicos. Lotka (1920), motivado pela descoberta do compor-
tamento periódico em concentrações quı́micas e Volterra (1926) que propôs um modelo
simples para uma espécie na tentativa de explicar a flutuação populacional de um certo
peixe predador, pescado no Mar Adriático, contribuı́ram para a formulação do modelo
conhecido hoje como modelo de Lotka-Volterra, [1]. O modelo peca em admitir que na
ausência de predadores a população de presas cresce ilimitadamente, o que não é possı́vel
na prática. Verhulst, em 1836, propôs que um processo limite uniforme deveria operar
quando uma população torna-se grande demais, ele sugeriu o que é chamado de cresci-
mento logı́stico de uma população. Portanto, se um termo logı́stico for incorporado ao
modelo de Lotka-Volterra, este se tornará mais realista, [2], é o que fazemos nas seção 2.4
do capı́tulo 2.

Os Modelos de Malthus e Verhulst modelam o crescimento populacional considerando


as espécies isoladamente num ambiente com suficiência alimentar. Sabemos, porém, que
nenhuma população existe isoladamente, exceto, talvez, em condições laboratoriais muito
INTRODUÇÃO 2

particulares. As populações interagem de várias formas e, não é possı́vel compreender


muitos fenômenos populacionais sem considerar estas interações. Existem vários tipos de
interações entre espécies, entre as quais podemos citar, [3]:

i) Neutralismo, em que nenhuma espécie é afetada pela interação.

ii) Competição, em que cada espécie afeta negativamente a outra na luta por espaço
fı́sico, água, comida, ou outros meios de subsistência;

iii) Amensalismo, em que uma espécie A é afetada negativamente por uma espécie B, e
esta não se afeta.

iv) Comensalismo, em que uma espécie A (comensal ou hóspede) necessita de uma espécie
B (hospedeira), mas não se afetam pela interação. Um exemplo dessa situação é o
das árvores de uma floresta tropical e as orquı́deas que habitam em seus galhos.

v) Protocooperação, em que a interação é benéfica, mas não necessária para as espécies.


Um exemplo dessa situação é a dos caranguejos que hospedam celenterados em
seus dorsos os quais servem de camuflagem para o caranguejo e, por outro lado, os
celenterados são transportados e obtêm partı́culas de alimento quando o caranguejo
captura outros animais.

vi) Mutualismo ou Simbiose, em que a interação é benéfica e necessária para ambas as


espécies. Um exemplo dessa situação é o das bactérias que digerem a madeira, e os
cupins que albergam estas bactérias no intestino.

Vii) Parasitismo, e

Viii) Predação, em que uma espécie afeta negativamente a outra através de um ataque
direto, dependendo, entretanto, da outra para sobreviver.

A predação é a mais comum das interações entre espécies, ocorrendo naturalmente


devido a própria natureza e necessidades dos agentes envolvidos e resulta em efeitos nega-
tivos no crescimento e sobrevivência de uma espécie, a qual chamamos de presa, e positivos
ou benéficos para a outra, predador.

Exemplos de predação são bem comuns na natureza, como por exemplo: um leão que
persegue sua presa nas planı́cies africanas, cobras que se alimentam de sapos, raposas
e coelhos em uma floresta fechada (as raposas se alimentam dos coelhos que vivem da
vegetação), vespas e aranhas, aranhas com suas teias e insetos voadores, etc.
INTRODUÇÃO 3

Do ponto de vista ecológico a predação não é considerada um tipo de interação danoso,


pois pode ser necessária para a estabilidade do ecossistema e, assim, impedir um grande
crescimento das populações que não se auto regulam, o que as poderia levar a autodes-
truição.

Neste contexto, modelos presa-predador são apresentados neste trabalho. Vale ressaltar
que em todos os modelos que estudamos, estamos assumindo que as dinâmicas de cresci-
mento ou mortalidade das espécies estão isentas de fatores abióticos (temperatura, vento,
umidade, etc.) e fatores de auto-regulação (espaço, alimento, idade, guerras, etc.), exceto
quando dito explicitamente, como é o caso dos modelos de auto-regulação apresentados
nas seções 2.4 e 2.5 do capı́tulo 2. Além disso, estamos considerando modelos determinı́s-
ticos, baseados em equações diferenciais ordinárias. Uma alternativa mais recente para
modelagem de tais fenômenos é empregar modelos variacionais fuzzy, como feito em [4],
[5] e [6], onde as variáveis e parâmetros são considerados como conjuntos que exibem o
grau de pertinência de seus elementos.

Optamos em estruturar este trabalho por capı́tulos, da seguinte maneira:

No primeiro capı́tulo, vamos rever alguns dos principais modelos determinı́sticos para
dinâmica populacional de espécies isoladas. Na seção 1.2 estudamos o modelo de Malthus,
na seção 1.3 o modelo de Verhulst e, na seção 1.5, apresentamos o modelo de Montroll.

No segundo capı́tulo, abordamos sistemas presa-predador com duas espécies, analisando-


os numérica e analiticamente. Estudamos os pontos de equilı́brio e trajetórias de cada
um. Na seção 2.2 estudamos o modelo clássico de Lotka-Volterra, tendo uma aplicação
deste ao controle biológico da Broca da Cana-de-açúcar na seção 2.3. Modificações desse
modelo são apresentadas em seções posteriores, sendo que na seção 2.4 apresentamos dois
modelos com regulação de crescimento para presas e regulação de crescimento para presas
e predadores, nas subseções 2.4.2 e 2.4.3, respectivamente. Nas seção 2.5, deste mesmo
capı́tulo, estudamos alguns outros modelos presentes na literatura.

O terceiro capı́tulo é dedicado a sistemas presa-predador para três espécies, sendo


duas presas e um predador. Na seção 3.2 estudamos modelos em que as espécies de presa
crescem linearmente e na seção 3.3 modelos de crescimento logı́stico para as presas.

Ao longo deste trabalho precisamos usar alguns resultados que são explicados me-
lhor nos apêndices: no apêndice A fazemos uma breve abordagem de sistemas lineares
autônomos; no apêndice B abordamos os sistemas quase lineares e ciclos limites; no
apêndice C são abordadas as funções de Liapunov e o critério de Routh-Hurwitz, que
utilizamos no capı́tulo 3 para estudar a estabilidade de sistemas presa-predador para três
INTRODUÇÃO 4

espécies; finalmente, no apêndice D, abordamos o método numérico de Runge-Kutta de


quarta ordem, o qual utilizamos para resolver numericamente os sistemas de equações
não-lineares presa-predador abordados neste trabalho.

Para estudar o comportamento das soluções dos sistemas apresentados nos capı́tulos
2 e 3, nós encontramos seus pontos de equilı́brio não-triviais. Depois, usando a matriz
do sistema linearizado, analisamos a estabilidade dos pontos de equilı́brio obtidos. E,
finalmente, escolhendo a condição inicial (tomando o ponto de equilı́brio como referência)
encontramos a solução do sistema através do método numérico de Runge-Kutta de quarta
ordem.
5

1 Dinâmica de uma Espécie


Isolada

1.1 Introdução

A dinâmica de populações trata das variações, no tempo e no espaço, das densidades


e tamanhos destas populações. Seu estudo visa a melhor compreensão da variação do
número de indivı́duos de uma determinada população e também dos fatores que influen-
ciam tais variações.

Nas seções seguintes discutiremos alguns dos modelos simples para a dinâmica de
populações que servem de base para o estudo de problemas ecológicos complexos tais
como teias tróficas, metapopulações, formação de comunidades, etc.

Historicamente, o primeiro modelo de dinâmica de populações humanas surgiu em


1798 com a publicação do o artigo “An Essay on the Principle of Population as it Affects
the Future Improvement of Society” do economista britânico Thomas Robert Malthus,
[7]. Seu trabalho previa um crescimento exponencial para a população e crescimento
aritmético para os meios de sobrevivência. Malthus não considerou, porém, a capacidade
de adaptação do ser humano e não pensou que mais cedo ou mais tarde a população
encontraria limitação de recursos e que mediante esta, encontraria meios de manter-se
estável em um limite de sobrevivência.

Por volta de 1838 o matemático belga Pierre F. Verhulst apresentou um modelo


levando em conta a capacidade do meio ambiente de suportar até um limite máximo
de indivı́duos da mesma população, em outras palavras, pressupõe que toda população é
predisposta a sofrer limitações naturais em seu crescimento, devendo tender a um limite
máximo constante. Essa constante funciona como um fator inibidor para o crescimento
populacional. Por isso tal modelo é considerado biologicamente mais adequado para des-
crever tal crescimento.

Os modelos de Malthus e Verhulst, apesar de serem considerados simples, serviram de


1.2 Modelo de Malthus 6

base para muitos outros estudos, tanto de crescimento populacional como de competição
entre espécies, inspirando modelos cada vez mais realı́sticos.

Uma análise de tais modelos é feita em seções posteriores. A escolha destes deve-
se a indubitável relevância histórica em termos de contribuição para o desenvolvimento
de técnicas de modelagem populacional. Na seção 1.2 é feita uma análise do modelo de
Malthus, na seção 1.3 estudamos o modelo de Verhulst e, um generalização deste é feita na
seção 1.5 com um modelo chamado de “Modelo de Montroll”. Nós os analisamos analı́tica
e numericamente levando em consideração as respectivas peculiaridades de cada um.

1.2 Modelo de Malthus

Consideramos x = ϕ(t) como número de indivı́duos em uma certa área geográfica,


no instante t > 0. Suponhamos que esta é uma “espécie isolada”, isto é, não sofre in-
terferência de outras espécies e as taxas de natalidade e mortalidade são proporcionais à
própria população: “a variação relativa da população (natalidade menos mortalidade)” é
proporcional à própria população. Assim temos,

dx(t)
= (m − n)x(t), (1.1)
dt
onde m > 0 é o coeficiente de crescimento da população devido aos nascimentos (taxa de
natalidade) e n > 0 é o coeficiente de decrescimento da população devido às mortes (taxa
de mortalidade). Fazendo a = m − n na equação (1.1) obtemos

dx(t)
= ax(t), (1.2)
dt
que é a equação do crescimento Malthusiano. A idéia de Malthus era simples: quanto
mais indivı́duos existirem, mais rapidamente a população vai aumentar. Mas, que tipo de
crescimento esse modelo gera?

Como ilustrado nas figuras 1 e 2, segundo o modelo de Malthus para a > 0, a população
cresce sem restrições e, a < 0, a população vai à extinção para diferentes condições iniciais.
Tal fato ratificaremos mais adiante mediante a análise da solução da equação (1.2).

Integrando a equação (1.2), com x(0) = x0 , encontramos

x(t) = x0 eat . (1.3)


1.2 Modelo de Malthus 7

De acordo com a equação (1.3):

Figura 1: Modelo Malthusiano (1.2) para a = 0.5.

Figura 2: Modelo Malthusiano (1.2) para a = −0.5.

i) se a > 0 (nasce mais do que morre) então lim x(t) = +∞, a população cresce in-
t−→∞
definidamente;

ii) se a < 0 (morre mais do que nasce) então lim x(t) = 0, a população decresce até à
t−→∞
extinção;
1.3 Modelo de Verhulst 8

iii) se a = 0 (quantidade de mortes igual a quantidade de nascimentos) então x(t) = x0 ,


a população permanece constante durante todo o tempo.

Assim, para a > 0, o crescimento populacional previsto pelo modelo é, demografica-
mente falando, “explosivo”. Em outras palavras, queremos dizer que segundo esse modelo
a população cresceria indefinidamente.

Estudos posteriores mostram discrepâncias no crescimento populacional dado pelo


modelo de Malthus, ou seja, mostram que a taxa de crescimento populacional não é
constante como ele supôs. Tal modelo descreve situações que podem ocorrer em sistemas
reais por um curto perı́odo de tempo. Como exemplo temos a própria população humana,
bactérias em meios de cultura ricos em nutrientes ou em alguns insetos devido à ausência
de predadores naturais, [8]. Apesar disso, o modelo é largamente utilizado como uma
primeira aproximação para a dinâmica populacional.

1.3 Modelo de Verhulst

Como vimos na seção anterior, segundo o modelo de Malthus, para a > 0, a popu-
lação cresceria indefinidamente, mas isso obviamente não pode acontecer pois, mais cedo
ou mais tarde, o esgotamento dos recursos disponı́veis (os suprimentos de água, comida,
etc) imporá limites a esse crescimento. Assim, em 1838, o matemático Pierre Verhulst
propôs uma generalização do modelo de Malthus que leva em conta essas restrições “am-
bientais”. Tal modelo considera o fato de os recursos serem limitados e admite que a taxa
de crescimento da população seja proporcional à própria população em cada instante.

O modelo de Verhulst considera a constante a do modelo de Malthus como uma função


g(x) que depende da própria população. Assim, da equação (1.2), temos a expressão

dx(t)
= g(x)x(t). (1.4)
dt

A função g(x) é escolhida de forma que g(x) ≈ a > 0 quando x for suficientemente
pequeno, g(x) decresça quando x crescer e g(x) < 0 quando x for suficientemente grade.
Uma função simples que satisfaz estas hipóteses é dada por g(x) = m − nx. Usando esta
função na equação (1.4) e fazendo K = m/n obtemos

dx(t)
 
x(t)
=a 1− x(t). (1.5)
dt K
1.3 Modelo de Verhulst 9

A novidade introduzida na equação (1.5) é a taxa de crescimento efetiva a (1 − x(t)/K)


dependente da densidade populacional. Se x < K, a taxa de crescimento é positiva e se
x > K, a taxa de crescimento é negativa, o que leva a um equilı́brio estável em x∗ = K .
A constante K representa a população limite estabelecida pela disponibilidade de recursos
naturais como espaço, comida, efeito de predadores, etc. Ela é chamada de capacidade de
suporte do meio, [8].

Comparando as equações (1.2) e (1.5) podemos perceber que a equação de Malthus


corresponde a K → ∞. Na equação (1.5) o coeficiente a é chamado de taxa de crescimento
intrı́nseco, isto é, a taxa de crescimento na ausência de qualquer fator limitador.

Fazendo a(1 − x/K)x = 0 encontramos as soluções de equilı́brio x = 0 e x = K


de (1.5). A solução x = K é assintoticamente estável, como veremos mais adiante. Já
a solução de equilı́brio x = 0 é instável, pois todas as outras soluções, mesmo as que
começam bem próximas de zero, divergem dela. Isso significa que se a população inicial
for maior que zero a espécie considerada nunca vai à extinção.

Fazendo x(0) = x0 obtemos, por integração, a solução de (1.5):

Kx0
x(t) = . (1.6)
x0 + (K − x0 ) e−at

A figura 3 mostra o gráfico da equação (1.6), com a = 0.5 e K = 3.0, para diferentes
condições iniciais. Podemos perceber que todas as curvas mostradas no gráfico tendem a
solução de equilı́brio x = K, quando t −→ ∞, mas nunca atingem esse valor em nenhum
tempo finito. Assim K é uma cota superior nunca atingida para populações crescentes
em que x0 < K, o que ratifica as observações feitas no inı́cio desta seção.

Comparando as figuras 1 e 3, observamos que as soluções de (1.5) tendem a um


valor finito enquanto as soluções de (1.2) crescem exponencialmente sem limites, quando
t −→ ∞.

Pela equação (1.6) podemos comprovar todas conclusões qualitativas a que chegamos
anteriormente. Em particular,

i) se a = 0 então temos que x(t) = x0 para todo t, ou seja, a população permanece


constante;

ii) se a < 0 então lim x(t) = 0, ou seja, a população é extinta;


t−→∞
1.3 Modelo de Verhulst 10

Figura 3: Modelo de Verhulst: curva logı́stica (1.5) para a = 0.5 e K = 3.0.

Kx0
iii) se a > 0 então lim x(t) = lim = K, ou seja, a solução tende
t−→∞ t−→∞x0 + (K − x0 ) e−at
assintoticamente à solução de equilı́brio x = K. Assim podemos dizer que x = K
é uma solução assintoticamente estável da equação (1.5). Com isso, concluı́mos que
após um longo tempo, a população fica próxima ao nı́vel de saturação independente
do tamanho da população inicial, desde que seja positivo. Além disso, se x0 < K a
população cresce se aproximando assintoticamente de K com t −→ ∞, se x0 > K a
população decresce, novamente se aproximando assintoticamente de K com t −→ ∞,
se x0 = K a população permanece constante no tempo.

Da equação (1.5) temos que


ax2
ẋ = ax − (1.7)
K
ou seja, ẋ, como uma função de x, apresenta comportamento de uma parábola com con-
cavidade voltada para baixo (veja figura 4) e cujas raı́zes x = 0 e x = K são os pontos de
equilı́brio ou soluções de equilı́brio da equação diferencial (1.5), pois ẋ = 0 nestes pontos.

Derivando a equação (1.7) em relação a x, igualando a zero e resolvendo-a para x,


K
encontramos o ponto de inflexão x(t) = . Tal ponto de inflexão corresponde ao ponto
2
de máximo da curva de (1.7), como pode ser facilmente visualizado na figura 4. Assim,
a variação populacional atinge seu valor máximo quando a população atinge a metade da
capacidade suporte K.
1.3 Modelo de Verhulst 11

0.3

0.2

0.1

0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5


x
–0.1

–0.2

–0.3

Figura 4: Variação de x(t) para K = 3.0 e a = 0.5.

Fazendo em (1.6), x(t) = K/2, podemos determinar o instante t∗ em que a população


atinge a variação máxima:

K Kx0 K − x0 1 K − x0
= ⇒ eat = ⇒ t∗ = ln , com a 6= 0 e x0 < K.
2 x0 + (K − x0 ) e−at x0 a x0

Por conveniência, utilizaremos x em lugar de x(t) e a notação ẋ em substituição a


dx
nas próximas equações deste e dos próximos capı́tulos. Portanto, fica subtendido que
dt
estamos considerando a variação das espécies em função do tempo e trabalhando com
derivadas de x em relação t, exceto quando dito contrário.

O modelo de Verhulst, assim como o de Malthus, tem suas limitações. Por exemplo,
ele não leva em conta que a taxa de produção de novos membros da espécie depende
da idade dos pais, ou seja, que os novos membros não contribuem de imediato para o
aumento da espécie. Além disso, o ponto de inflexão (ou crescimento máximo) da curva
está sempre localizado no ponto K/2, o que nem sempre acontece na maioria das variáveis
relacionadas a fenômenos com tendência assintótica, [9].

Levando em consideração a exposição acima, apresentamos na seção (1.5) um modelo


que considera o comportamento assintótico de uma variável, assumindo que o posiciona-
mento da variação máxima pode ocorrer em qualquer valor entre x0 e K.
1.4 Comparação Experimental entre os Modelos de Malthus e Verhulst 12

1.4 Comparação Experimental entre os Modelos de


Malthus e Verhulst

Professores do Iceg/UPF (Instituto de Ciências Exatas e Geociências da Universidade


de Passo Fundo) aplicaram em 1999 os modelos de Malthus e Verhulst para estudar a
população de Passo Fundo-RS, [10]. Para tanto, com a colaboração de alunos, foram
coletados dados relativos a nascimentos e óbitos junto ao Cartório de Registro Civil,
IBGE e hospitais da cidade, que representam a população real nos anos de 1981 a 1991.

Os cálculos dos parâmetros m e n da equação (1.1) foram determinados pela média


aritmética das taxas anuais de natalidade e mortalidade, respectivamente, relativas ao
mesmo perı́odo.

A constante logı́stica K foi determinada pela comparação entre a linearização do


modelo de Verhulst e o ajuste linear dos dados reais pelo método dos mı́nimos quadrados.

Analisando os resultados obtidos, percebeu-se que os modelos descreveram satisfato-


riamente o processo real da dinâmica populacional urbana de Passo Fundo no perı́odo em
questão, apresentando erro máximo de 2, 9% acima do real (o IBGE considera aceitável a
margem de erro de 5%).

Dessa forma, determinados os parâmetros dos modelos que melhor descreveram a


dinâmica da população da cidade no perı́odo considerado, realizaram-se simulações de
projeções segundo os modelos de Malthus e Verhuslt para o perı́odo de 1992 a 1995. A
comparação entre os resultados obtidos e os dados reais do perı́odo de 1992 a 1995 aponta
um erro máximo de 3, 4%, considerado satisfatório.

Assim, podemos constatar pelo exposto que, a dinâmica da população urbana de Passo
Fundo ficou bem descrita pelos modelos de Malthus e Verhulst nos perı́odos considerados.
Os dados obtidos em tal estudo ainda constataram que os resultados obtidos pelo modelo
de Verhulst foram os que mais se aproximaram do crescimento populacional real.

1.5 Modelo de Montroll

Como vimos, o modelo de Verhulst possui ponto de inflexão constante, independen-


temente dos parâmetros utilizados. Nesta seção apresentaremos uma generalização de tal
modelo que torna o ponto de inflexão um valor qualquer no intervalo [x0 , K], dependendo
de um parâmetro em especial. Nesse modelo, conhecido como modelo de Montroll, a
equação de crescimento relativo é decrescente com relação a x(t), porém não necessaria-
1.5 Modelo de Montroll 13

mente de forma linear como no modelo de Verhulst, [5]. A formulação matemática para
o modelo de Montroll é   x b 
ẋ = a 1 − x, (1.8)
K
onde K > 0 é a capacidade suporte, a e b são constantes reais.

O modelo de Verhulst corresponde a b = 1 na equação (1.8). O valor do parâmetro


b é o indicador da posição do ponto de inflexão da curva que representa tal modelo. As
figuras 5 e 6 mostram gráficos de tal equação para os mesmos parâmetros da figura 3. Na
figura 5 escolhemos b = 2.0 e na figura 6, b = 0.5. Na primeira, as curvas se aproximam
da capacidade de suporte K de maneira muito mais rápida que na figura 3, isso se explica
pelo fato de o valor de b ser o dobro do valor correspondente ao modelo de Verhulst. Em
contrapartida, na figura 6 as trajetórias se aproximam de K muito mais lentamente, pois
o valor de b corresponde a metade do valor assumido na equação (1.5).

Figura 5: Modelo de Montroll para b = 2.0.

Procedendo analogamente à seção anterior, encontramos o ponto de inflexão de (1.8),


  1b
1
xinflexão = K . (1.9)
b+1

A principal diferença entre os modelos de Verhulst e Montroll está na posição do ponto


de variação máxima, enquanto no primeiro tal ponto corresponde a K/2, no segundo é
dado por (1.9). Assim o ponto de inflexão pode ser alterado de acordo com a necessidade
do problema.
1.5 Modelo de Montroll 14

Figura 6: Modelo de Montroll para b = 0.5.

O ponto de equilı́brio não nulo da equação (1.8) é x∗ = K e sua solução é dada por
Kx0
x(t) =   1 . (1.10)
xbo + K b − xb0 e−bat b

A análise da equação (1.10) é semelhante a que fizemos com a equação (1.6):

i) se a = 0 e b 6= 0 então temos que x(t) = x0 para todo t, ou seja, a população permanece


constante;

ii) se a > 0 e b < 0 ou a < 0 e b > 0 então lim x(t) = 0, ou seja, a população vai à
t−→∞
extinção;

iii) se a, b > 0 ou a, b < 0 então lim x(t) = K, ou seja, a solução tende assintoticamente
t−→∞
à solução de equilı́brio x = K.

Os modelos acima expostos foram formulados para tempo contı́nuo, onde se supõe
que os indivı́duos se reproduzem a todo instante, o que é raro em populações biológicas,
[9]. Modelos discretos são considerados mais realı́sticos, por contemplar a reprodução de
indivı́duos sazonalmente. Porém tais modelos só vieram a ser estudados a partir de 1975
com o ecólogo austrı́aco Robert M. May, [11].

Apesar das crı́ticas aos modelos aqui expostos, estes são indubitavelmente impor-
tantes no estudo da dinâmica populacional, pois serviram de base para muitos outros
1.5 Modelo de Montroll 15

matematicamente mais “robustos”. Além disso, por serem modelos relativamente simples,
permitem-nos avaliar criticamente as várias suposições (hipóteses) e suas conseqüências.

Entre os modelos provenientes destes estão: Modelo de Gompertz (1825), Modelo


de Smith (1963), Modelo de Ayala, Enhrenfeld, Gilpin (1973), cujos detalhes podem ser
obtidos em [2] e [11].

Frisamos que modelos mais realı́sticos exigem alto grau de sofisticação matemática
e devem usar equações diferenciais parciais considerando idade, fecundidade, taxas de
mortalidade que variam com o tempo, dentre outros fatores intrı́nsecos às populações em
estudo. Entretanto, os modelos mais sofisticados são, invariavelmente, aperfeiçoados dos
modelos simples, o que ratifica a importância destes.
16

2 Modelos Presa-Predador para


duas Espécies

2.1 Introdução

A dinâmica entre presas e predadores tem sido um dos principais assuntos do estudo
da Ecologia de população animal. A partir do modelo clássico de Lotka-Volterra, muitas
contribuições foram acumuladas a fim de obter aproximações mais realı́sticas e efeitos
estabilizadores.

De um modo geral, quando tratamos de um sistema presa-predador, o processo com-


preende a sobrevivência de uma espécie, chamada predador, que se alimenta de outra, a
presa.

As dinâmicas de interação entre duas espécies são muito complexas para serem ana-
lisadas no meio em que se processam, devido a fatores ambientais diversos. Sendo assim,
é necessário assumirmos algumas hipóteses para construção de modelos matemáticos ra-
zoáveis. É necessário assumirmos, por exemplo, que tanto as espécies de presas quanto
as de predadores não são afetadas por catástrofes naturais ou outros fenômenos fortuitos
que possam ocorrer no meio em que habitam. Assumimos também que os predadores
estão distribuı́dos uniformemente no habitat, ou seja, que todos têm a mesma chance de
encontrar e consumir as presas e que não há competição entre eles.

Estudando a dinâmica de duas espécies vivendo num mesmo habitat, onde uma preda
a outra, surgi-nos alguns questionamentos: o quanto a predação reduz o número de presas?
É possı́vel a coexistência de predadores e presas e, em caso afirmativo, sob quais condições?
Neste e no próximo capı́tulo estaremos revendo estas e outras questões em detalhes.

A interação entre duas espécies foi modelada matematicamente pela primeira vez por
Alfred J. Lotka (1925) e Vito Volterra (1926) através de um sistema de equações diferen-
ciais não-lineares conhecidas como Modelo presa-predador ou Modelo de Lotka-Volterra,
[12]. Tais equações são úteis não só para modelar interações entre presas e predadores
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 17

como também, interações entre parasitas e hospedeiros, competição entre espécies, dentre
outros “fenômenos”.

Na seção 2.2 fazemos uma abordagem do Modelo de Lotka-Volterra, estudando esta-


bilidade e fazendo análise numérica. Uma aplicação de tal modelo ao controle Biológico
da Broca da Cana-de-Açúcar é apresentada na seção 2.3. Na seção 2.4 estaremos apre-
sentando modificações ao modelo de Lotka-Volterra visando obter outros mais realı́sticos.

2.2 Modelo de Lotka-Volterra

Sejam x(t) e y(t) as populações de presas e predadores, respectivamente. Suponha


que os meios de subsistência para as presas são ilimitados e que seu crescimento não
teria nenhum fator inibidor, não fosse a presença dos predadores. Logo se não houvesse
predadores, a população de presas cresceria de acordo com a lei de crescimento exponencial

ẋ = ax, (2.1)

onde a > 0 é a taxa de crescimento para as presas na ausência de predadores. Mas a


presença dos predadores afeta esse crescimento: supõe-se que a taxa de crescimento da
população x de presas decresce linearmente quando a população y de predadores aumenta,
ou seja, tal taxa é diminuı́da de um termo −αyx, onde α > 0 é uma constante. Assim, a
equação (2.1) se torna
ẋ = (a − αy)x. (2.2)

Analogamente, suponhamos que os predadores se alimentam exclusivamente das pre-


sas, e que sem elas, a espécie vai para extinção. Então, sem presas, a população y de
predadores decresceria de acordo com a lei exponencial

ẏ = −by, (2.3)

onde b > 0 é uma constante. Entretanto, a presença de presas modifica essa situação:
supõe-se que a taxa de crescimento da população y aumente linearmente quando a popu-
lação x aumenta, ou seja, é acrescida de um termo βxy, onde β > 0 é constante. Assim,
segue de (2.3) que,
ẏ = (−b + βx)y. (2.4)

A introdução dos termos −αxy e βxy nas equações (2.2) e (2.4) leva em consideração
que cada um dos encontros tende a inibir o crescimento da população de presas e a
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 18

promover o crescimento da população de predadores, respectivamente. Dessa maneira,


temos o sistema de equações diferenciais
(
ẋ = (a − αy)x
(2.5)
ẏ = (−b + βx)y,

onde a representa a taxa de crescimento das presas na ausência de predadores, b a taxa de


mortalidade natural dos predadores, α a taxa de predação ou reposta funcional e β repre-
senta a resposta numérica do predador ou “taxa de conversão” de presas em predadores,
ou seja, β indica a “velocidade” com que os predadores transformam as presas consumidas
em novos predadores. Observamos que o termo ax na primeira equação corresponde a um
crescimento malthusiano das presas: na ausência de predadores, as presas multiplicam-se
indefinidamente. O termo −αxy limita essa expansão, ou seja, quanto maior o número
y de predadores, menor será a taxa de crescimento das presas. Na segunda equação, o
termo negativo −by produz uma extinção exponencial do número de predadores (decresci-
mento malthusiano): na ausência de presas, o número de predadores diminui. O termo
positivo βxy compensa essa tendência, ou seja, quanto mais presas existem para serem
consumidas, maior será a taxa de crescimento dos predadores.

Analisando as equações do sistema (2.5) podemos inferir que: quando a densidade de


predadores é inferior a a/α, a taxa de crescimento da presa é positiva, logo a população
de presas tende a crescer; quando a densidade de predadores é maior que a/α, a taxa
de crescimento das presas é negativa, consequentemente elas tendem a decrescer. Não
obstante, quando a densidade de presas é superior a b/β, a taxa de crescimento ẏ é
positiva, logo a densidade populacional dos predadores tende a crescer, caso contrário
decresce.

As figuras 7 e 8 mostram gráficos para o sistema (2.5). Na primeira figura temos


o gráfico relacionando as densidades de presas e predadores com o tempo. Na segunda,
temos um plano de fases com diferentes condições iniciais.

Observando a figura 7 percebemos que um crescimento na população de presas é


seguido, com um certo retardo, por um crescimento na população de predadores. Analoga-
mente, um decréscimo na população de presas é seguido, com um certo retardo, por um
decréscimo na população de predadores. Observamos que há primeiro um aumento na
população de presas em virtude da densidade populacional dos predadores ser menor.
Mas com o aumento da população de presas, os predadores tendem a aumentar pois há
alimento em abundância; consequentemente a população de presas tende a diminuir pois
há grande quantidade de inimigos a consumı́-las, mas este fato acarreta na diminuição dos
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 19

Figura 7: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.5), com a = 1.0,
α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.0).

Figura 8: Plano de fase do sistema (2.5) com os mesmos parâmetros usados na figura anterior e condições
iniciais indicadas no gráfico.

predadores novamente por haver menos comida e, o sistema volta a seu estado original.
Essa dinâmica continuará num ciclo de crescimento e declı́nio contı́nuo.

A análise das equações do sistema (2.5) mostra ainda que o mesmo oscila com perı́odo
determinado pelos parâmetros das equações para o ponto de coexistência e possui uma
amplitude dependente apenas das condições iniciais. Este é um aspecto interessante que
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 20

devemos frisar: aquilo que determina se a densidade de uma das populações aumenta ou
diminui é a densidade da outra população.

Observamos na figura 8 que trajetórias de x(t) e y(t) no plano xy são fechadas, sendo
as funções x(t) e y(t) periódicas 
e que aamplitude aumenta conforme a condição inicial
b a
afasta-se do estado de equilı́brio , = (3, 2).
α β
O padrão nas variações dos tamanhos das populações pode se repetir quando as
condições permanecem constantes. O processo continua em ciclos, denominados ciclos
limites. Esta análise qualitativa é baseada, essencialmente, na variação dos sinais das
derivadas do sistema (2.5) e consequentemente no estudo dos pontos de equilı́brio. Esses
pontos de equilı́brio serão estudados a seguir.

2.2.1 Estabilidade e Pontos de Equilı́brio do Modelo Lotka-Volterra

Igualando a zero cada uma das equações do sistema (2.5), encontramos as soluções de
equilı́brio do sistema que são

{x = 0, y = 0} (2.6)

e  
b a
x = ,y = . (2.7)
β α

A primeira solução, obviamente, representa a extinção de ambas as espécies, indepen-


dente dos parâmetros escolhidos. Já a segunda depende dos parâmetros utilizados.

A seguir, vamos examinar o comportamento local das soluções próximas a cada ponto
crı́tico. Como as funções F (x, y) = (a−αy)x e G(x, y) = (−b+βx)y são tão diferenciáveis
quanto o necessário então o sistema (2.5) é quase linear, [13]. Entendemos como sistema
quase linear aquele que pode ser aproximado por um sistema linear apropriado (veja
apêndice B). Assim, utilizando Fx e Gx para indicar, respectivamente, as derivadas de
F (x, y) e G(x, y) em relação a x e Fy e Gy para indicar, respectivamente, as derivadas de
F (x, y) e G(x, y) em relação a y, podemos obter um sistema linear correspondente. Para
tanto vamos usar o procedimento descrito no apêndice B, isto é,
!
F (x
x 0 0, y ) Fy (x ,
0 0y )
(u̇, v̇)T = (u, v)T . (2.8)
Gx (x0 , y0 ) Gy (x0 , y0 )
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 21

Para o ponto crı́tico x∗ = (x0 , y0 ) = (0, 0) o sistema linear correspondente é


!
a 0
(ẋ, ẏ)T = (x, y)T . (2.9)
0 −b

Os autovalores e autovetores associados são

λ1 = a, ǫ1 = (1, 0)T , (2.10)

λ2 = −b, ǫ2 = (0, 1)T , (2.11)

consequentemente a solução geral do sistema é

(x, y)T = c1 (1, 0)T eat + c2 (0, 1)T e−bt . (2.12)

Assim, como os autovalores são reais com sinais contrários, a origem é um ponto de
sela e, portanto, instável. A única trajetória que se aproxima do ponto crı́tico (0, 0) é a
que parte do ponto inicial (0, y0 ), isso quer dizer que na ausência de presa, a população
de predadores é extinta.
b a
Consideremos, agora, o ponto crı́tico (b/β, a/α). Fazendo x = +u e y = +v
β α
obtemos o sistema linear correspondente

!
0 −αb/β
(u̇, v̇)T = (u, v)T . (2.13)
βa/α 0

Os autovalores correspondentes são



λ1,2 = ±i ab. (2.14)

Como os autovalores do sistema são imaginários puros, o ponto crı́tico (b/β, a/α) é
um centro (estável) para sistema linear (2.13). Dividimos a segunda do sistema (2.13)
pela primeira para obter
aβ 2 udu + bα2 vdv = 0. (2.15)

Integrando esta última equação obtemos

aβ 2 u2 + bα2 v 2 = c, (2.16)
2.2 Modelo de Lotka-Volterra 22

onde c > 0 é a constante de integração. Agora, dividindo a equação (2.16) por c encon-
tramos
u2 v2
c + c = 1. (2.17)
αβ 2 bα2

Assim, pela equação (2.17) ratificamos que as trajetórias do sistema são elı́pticas,
fechadas em torno do seu ponto crı́tico, convenientemente chamado de ciclo ecológico, [9].

Variações cı́clicas nas populações de predadores e de presas, como previsto pelas


equações do sistema (2.5) foram observadas na natureza. Um exemplo é descrito em
[3]: a abundância de linces e lebres, como indicado pelo número de casacos comprados no
perı́odo de 1845-1935, mostra uma clara variação periódica com perı́odo de 9 a 10 anos.
Os picos de abundância são seguidos por declı́nios rápidos, e os picos das populações de
linces e de lebres estão defasados, com os das lebres antecedendo os das linces por um ano
ou mais.

Uma das crı́ticas ao modelo Lotka-Volterra é o fato de pressupor que na ausência de


predadores a população de presas aumenta sem limites. Isso é corrigido no modelo que
apresentamos na seção 2.4 (subseção 2.4.2) no qual a taxa de crescimento das presas tem
um fator inibidor, denominada capacidade suporte, que representa a disponibilidade de
recursos para a sobrevivências das mesmas.

Outra crı́tica ao modelo Lotka-Volterra deve-se ao fato de ser conservativo, o que


o torna pouco realı́stico, [14]. Embora as oscilações sejam inerentes à populações em
processos interativos do tipo presa-predador, o modelo de Lotka-Volterra, no entanto,
não é apropriado para descrever o comportamento da dinâmica destas interações. Pois,
sendo conservativo, a amplitude das oscilações estão sujeitas às condições iniciais, o que é
raramente observável na natureza para longos perı́odos, [11]. Assim, pequenas “flutuações”
na condição inicial do sistema, provocam alterações conservadas ao longo do tempo.

Com o intuito de tornar o modelo de Lotka-Volterra mais realı́stico e, assim, contornar


“os problemas” acima expostos, diversas alterações têm sido propostas para o modelo, a
exemplo das abordagens de [15], [16], [17] e [18]. Baseando-nos nessas abordagens e nas
sugestões de Murray, [2] e Ricklefs, [8], apresentamos na seção 2.4 alguns modelos que são
variações do modelo dado pelo sistema (2.5).

Na próxima seção apresentaremos um exemplo do modelo presa-predador de Lotka-


Volterra aplicado ao controle biológico de pragas.
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 23

2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar

2.3.1 Introdução

Uma aplicação do modelo de Lotka-Volterra é dada por um grupo de professores em


um curso de especialização ministrado na UNIMEP em Piracicaba, [19].

A modelagem foi a predação da broca Diatraea Saccharalis, que ataca a cana-de-


açúcar, pela vespa Apanteles Flavipes, cujas larvas parasitam a broca.

O adulto da Diatraea Saccharalis (a broca) é uma mariposa que após o acasala-


mento faz a postura de ovos na face dorsal da folhas da cana-de-açúcar, depositando de
5 a 50 ovos. Decorridos 4 a 9 dias estes ovos eclodem, surgindo larvas que inicialmente
alimentam-se do Parênquima das folhas, dirigindo-se posteriormente para a bainha, pe-
netrando na parte mais mole do colmo, que é a gema. Ali permanecem alimentando-se
por cerca de 40 dias, até atingir seu desenvolvimento completo. Ao final deste perı́odo as
lagartas abrem um orifı́cio para o exterior e imediatamente o fecham com seda e restos
de bagaço, passando então para a fase crisálida. Nesta fase elas permanecem por mais 9
a 14 dias, metamorfoseiam-se em mariposas, que saem do interior do colmo, pelo buraco
feito anteriormente, para completar o ciclo, que dura de 53 a 63 dias, [20].

Quando as lagartas atacam as canas novas causam a morte da gema apical, cujo
sintoma é conhecido por “olho morto” (pequenas porções dos nós do colmo, visivelmente
prejudicadas), ocasionando falhas na germinação.

Na cana adulta, além dos danos descritos anteriormente, ocorre perda de peso, bro-
tação lateral, enraizamento aéreo, colmos quebrados e entrenós atrofiados. Além disto,
pelos buracos deixados pelas lagartas da broca penetram fungos que ocasionam a “po-
dridão vermelha”. Durante a germinação do tolete infectado por estes fungos ocorrem a
morte da gema e a redução da germinação. Quando as plantas crescem surgem lesões nas
folhas, que culminam com a morte prematura das mesmas.

Com a formação dos colmos, os fungos se desenvolvem neste órgão de reserva de


açúcar, causando a inversão de cerca de 50 a 70% da sacarose destes colmos, levando
a perdas industriais consideráveis. Além do que os fungos produzem invertases nestes
colmos que, se industrializados, irão inverter a sacarose do caldo normal nos processos
iniciais de fermentação.

No Brasil, as perdas estão associadas a intensidade de infestação da broca, com esti-


mativas de 4,1% de perdas de sacarose para uma taxa de 22,2% de infestação.
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 24

Como a broca passa a maior parte da vida “dentro” da cana, torna-se difı́cil o com-
bate por meio de agentes quı́micos. A forma mais eficiente de combate tem sido através
do controle biológico, utilizando espécies de insetos que predam a broca, os quais são
disseminados no canavial.

O controle biológico no Brasil já vem sendo praticado utilizando-se, principalmente, a


vespa indiana. Apesar de existirem outras espécies que predam a broca, a mais utilizada é
esta vespa, pois além de ser o predador especı́fico da broca, tem seu ı́ndice de multiplicação
maior que os outros e pode ser facilmente produzido em laboratório, como argumentado
em [19].

O parasitismo começa quando a fêmea da vespa adulta entra no colmo pelo orifı́cio
praticado pela broca e encontra a lagarta (da broca). Então, através de uma picada,
deposita no interior do corpo do hospedeiro (a lagarta) cerca de 50 ovos. Estes ovos se
desenvolvem no interior do corpo do hospedeiro, alimentando-se de seus tecidos por cerca
de 10 a 12 dias. Ao final deste perı́odo as larvas do Apanteles migram para fora do corpo
da lagarta, que exaurida morre, e forma casulos (pupas), ficando neste estado de 3 a 5
dias quando tornam-se vespas adultas, completando o seu ciclo vital.

Com esta descrição podemos modelar um sistema presa (hospedeiro)-predador (para-


sita). Faremos aqui um análise simplista, supondo que a quantidade de alimento (cana-de-
açúcar) disponı́vel para as presas, a broca, é muito grande, não existindo auto-regulação
no seu crescimento especı́fico, ou seja, para a população de brocas isoladas o modelo que
determina seu crescimento é o de Malthus (capı́tulo 1, seção 1.2), tal crescimento é afetado
unicamente pelo ataque da vespa indiana, sendo esta seu único predador.

A variação da população de vespas é diretamente proporcional a um fator resultante


da devoração de brocas, menos uma constante que representa a taxa de mortalidade das
mesmas, caso não tenha “alimento”.

2.3.2 Construção do Modelo: Vespa X Broca

Sejam x(t) e y(t) as populações de brocas e vespas, respectivamente, num determinado


instante t. Com as considerações feitas temos o modelo de Lotka-Volterra
(
ẋ = (a − αy)x
(2.18)
ẏ = (−b + βx)y,

onde a, α, b e β são constantes positivas a serem determinadas e, para determinar tais


coeficientes consideramos o perı́odo de um ano para plantio e colheita da cana.
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 25

Vimos que o ciclo da broca varia de 53 a 63 dias (desprezando a última geração,


consideramos 4 gerações em um ano) e o ciclo das vespas é de 13 a 17 dias.

Para as brocas, consideremos que cada adulto dá origem a 5 indivı́duos adultos, ou
seja, a razão de crescimento para a brocas é r = 5/1 a cada geração. Sendo t1 o número
médio de dias do ciclo, então
53 + 63
t1 = = 58 dias.
2

Supondo que na ausência das vespas a população de brocas aumenta sem inibição,
temos:
ln r
x(t1 ) = x0 eat1 ⇒ rx0 = x0 eat1 ⇒ a =
t1
ln 5
Assim, a = ≈ 0.027749.
58
O coeficiente α representa o ı́ndice de interação entre as duas espécies e é calculado
através da taxa de eficiência do controle das brocas pelas vespas. Mas, como apenas as
fêmeas atacam as brocas, e no ataque às brocas liberam indistintamente machos e fêmeas,
podemos admitir uma taxa de controle de 50%, isto é, x(t2 ) = 0.5x0 , onde t2 = 15 dias é
o perı́odo médio do ciclo da vespa.

Recomenda-se a liberação de 5.000 vespas quando forem encontradas pelo menos 10


lagartas da broca, por uma pessoa em 1 hora, em 1 hectare. Neste caso para o cálculo de
α temos:
ẋ = (0.027749 − 5000α)x,

o que nos dá


x(t) = x0 e(0.027749−5000α)t .

x
Agora, substituindo = 0.5, t = t2 = 15 dias, temos
x0
ln 0.5 = 0.416235 − 75000α

e encontramos α aproximadamente 0.000015.

O coeficiente b representa a taxa de mortalidade das vespas caso não encontrem “ali-
mento”. Como vimos, a fêmea da vespa procura a broca para a postura dos ovos, e as
larvas é que se alimentam dela. Entretanto, as vespas após a liberação dos ovos duram
de 48 a 72 horas. Suponhamos, a partir destes dados, que a população de vespas esteja
reduzida a 5% em cerca de 60 horas.
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 26

Então podemos escrever

y(t) = y0 e−bt

Tomando 60 horas=2.5 dias, obtemos

0.05y0 = y0 e−2.5b

portanto, b é aproximadamente 1.198293.

O coeficiente β representa a taxa de natalidade das vespas, que obviamente depende


da quantidade de hospedeiros (brocas) durante a postura de ovos. Sabemos que cada
vespa dá origem a 50 outras, das quais apenas 15 completam o ciclo de vida, então para
uma população de 2000 brocas temos:

ẏ = −by + βxy ⇒

ẏ = (2000β − 1.98293) y ⇒

y(t) = y0 e(2000β−1.198293)t .

Usando os valores y0 = 5000, t = t2 = 15, y(t2 ) = 5000 × 15 = 75000, temos


 
75000
ln = 30000β − 17.974395,
5000

logo β deve ser aproximadamente 0.000689.

Substituindo as contantes encontradas nas equações do sistema (2.18), temos


(
ẋ = (0.027749 − 0.000015y)x
(2.19)
ẏ = (−1.198293 + 0.000689x)y.

A figura 9 mostra um gráfico para a solução o sistema (2.19) evidenciando a dinâmica


entre o parasita (predador), a vespa, e o hospedeiro (presa), a broca. Observamos, na
referida figura, que a população de vespas se mantém superior à população de brocas,
controlando o crescimento destas, o que ratifica a importância do controle biológico. O
plano de fase desse sistema é dado pela figura 10.
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 27

Figura 9: Variação da densidade de brocas e vespas ao longo do tempo, sistema (2.19), para a =
0.027749, α = 0.000015, b = 1.198293, β = 0.000689 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2000, 5000).

Figura 10: Plano de fase, sistema (2.19), para os mesmos parâmetros e condição inicial da figura
anterior.

2.3.3 Análise do Modelo

Procedendo de maneria análoga à seção 2.2 deste capı́tulo, dividimos a primeira


equação de (2.18) pela segunda e obtemos
2.3 Controle Biológico da Broca da Cana-de-Açúcar 28

ẋ x (a − αy)
= .
ẏ y (−b + βx)

Separando as variáveis e integrando encontramos a solução geral do sistema:

βx − b ln(x) = a ln(y) − αy + C,

onde C é uma constante de integração a ser determinada com as condições inciais x0 =


2000 e y0 = 5000.

Utilizando os valores estimados dos parâmetros, obtemos

C = −7.891451805.

Fazendo ẋ = 0, ẏ = 0, calculamos o ponto de equilı́brio não-trivial do sistema:

b ∼ a
x∗ = = 1739 brocas e y ∗ = ∼= 1850 vespas.
β α

Sabemos que, para o modelo de Lotka-Volterra, as trajetórias são curvas fechadas no


plano xy e portanto existe um perı́odo t = T > 0, onde x(T ) = x0 e y(T ) = y0 .

O sistema (2.18) pode ser escrito na forma

1

 ẋ = a − αy


x
(2.20)
1
 ẏ = −b + βx.


y

Integrando as equações do sistema (2.20) entre 0 e T , obtemos


Z T
ln x(T ) − ln x(0) = (a − αy) dt
0
Z T
ln y(T ) − ln y(0) = (−b + βx) dt (2.21)
0

como x(T ) = x0 e y(T ) = y0 , obtemos


Z T Z T
aT = α y dt e bT = β x dt
0 0

Segue que,
T
a 1
Z
• = y dt é o valor médio da população das vespas ao longo do perı́odo T ;
α T 0
T
b 1
Z
• = x dt é o valor médio da população das brocas ao longo de T .
β T 0
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 29

Este resultado indica que, para este modelo, se queremos diminuir a quantidade de
brocas não adianta aumentarmos a quantidade de vespas, pois tal fato somente alteraria
a magnitude da oscilação do ciclo.

Além disso, concluı́mos que as brocas com a predação são limitadas superiormente
(pelas vespas), figura 9, o que não ocorre para a população de brocas isoladas em um
canavial (teoricamente). Portanto, mesmo não aniquilando as brocas, a prática deste
método natural de controle dessa praga leva a uma grande redução da população da
mesma.

2.4 Modelos Presa-Predador Modificados

2.4.1 Introdução

Agora, visamos obter modelos mais realı́sticos baseando-nos no modelo de Lotka-


Volterra. Para tanto, reescrevemos tal modelo como
(
ẋ = f (x) − g(x, y)
(2.22)
ẏ = p(x, y) − by,

onde f (x) representa a taxa de crescimento das presas na ausência de predadores, g(x, y)
é a taxa de mortalidade das presas devido à predação ou resposta funcional, p(x, y) é o que
chamamos de resposta numérica que representa a eficiência do predador em transformar
as presas capturadas em novos descendentes e b é a taxa de mortalidade dos predadores.

Aproveitando as sugestões de Murray, [2], e Ricklefs, [8], apresentamos nas próximas


subseções modelos presa-predador de crescimento logı́stico para as espécies. Na subseção
2.4.2 apresentamos um modelo com inibição do crescimento das presas por conta da limi-
tação de recursos, isto é, assumimos que as presas estão condicionadas por uma capacidade
de suporte do meio, que corresponde a limitação de recursos naturais disponı́veis como
água, comida, etc. Na subseção 2.4.3 apresentamos um modelo com auto-regulação no
crescimento das presas e dos predadores.

2.4.2 Modelo Presa-Predador com Auto-Regulação no Cresci-


mento das Presas

Primeiramente, vamos admitir que as presas não crescem indefinidamente na ausência


de predadores. Assim f (x) é a função que determina a capacidade de suporte do meio para
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 30

as presas e deve ser tal que: existe um número K > 0 tal que f (x) > 0 para 0 < x < K;
f (K) = 0; f (x) < 0 para x > K. Uma função que caracteriza bem estas hipóteses é a
função que usamos no capı́tulo 1 (seção 1.3) dada por
 x
f (x) = a 1 − . (2.23)
K
Assim, substituindo tal função no sistema (2.22), temos

 ẋ = a − a x − αy x
  
K (2.24)
 ẏ = (−b + βx)y,

onde as constantes são as mesmas dos modelos anteriores. Este modelo representa um
sistema presa-predador um pouco mais rico e realista que o Lotka-Volterra dado pelo
sistema (2.5), pois, diferentemente das equações de Lotka-Volterra, o termo de crescimento
das presas é logı́stico e não exponencial. Isto significa que existe uma população máxima
de presas que o meio pode comportar.

As figuras 11 e 12 mostram os gráficos das soluções do sistema (2.24) para K = 4.0 e


K = 8.0, respectivamente, em função do tempo.

Figura 11: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para
a = 1, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25, K = 4.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2, 3).

O pontos de equilı́brio do sistema (2.24) são

{x∗ = 0, y ∗ = 0} (2.25)
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 31

Figura 12: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para
K = 8.0. Os outros parâmetros e a condição inicial são os mesmos da figura anterior.

e   
b ∗ a b
x = ,y =

1− . (2.26)
β α βK

Como estamos admitindo ẏ > 0, para todo t, então encontramos a seguinte condição
para K:
b
K> ,
β
ou seja, existem certos valores dos parâmetros biológicos que impossibilitam a coexistência
das espécies. Quando uma taxa de mortalidade b do predador elevada não é compensada
por um K suficientemente elevado da presa, o predador extingue-se (veja figura 13), ao
contrário do modelo de Lotka-Volterra em que a coexistência era, teoricamente, sempre
possı́vel, independentemente dos parâmetros utilizados.

O gráfico da figura 13 retrata bem a situação descrita acima. Escolhemos b = 1.5,


β = 0.25 e K = 4.0, o que nos dá b/β = 1.5/0.25 = 6.0 > 4.0, portanto contradizendo a
condição que estabelecemos anteriormente para K. Neste caso, como havı́amos comentado
anteriormente, o predador vai à extinção enquanto a presa cresce até atingir a capacidade
suporte K = 4.0.

Os pontos de equilı́brio do sistema (2.24) são idênticos à do modelo Lotka-Volterra,


diferenciando-se do mesmo pelo termo (1 − x∗ /K) na ordenada do segundo ponto fixo por
conta da regulação da população das presas pela função de crescimento logı́stico (2.23).
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 32

Figura 13: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.24), para
a = 1.0, α = 0.5, b = 1.5, β = 0.25 e K = 4.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2, 3).

Observamos, em nossas simulações, que independentemente das condições iniciais, as


duas populações se estabilizam nos pontos de equilı́brio não nulos que são, respectiva-
mente, para K = 4.0 e K = 8.0, iguais a:

{x∗ = 3.0, y ∗ = 0.5}

e
{x∗ = 3.0, y ∗ = 1.25.}

A figura 14 mostra como o sistema (2.24) atinge o equilı́brio em uma trajetória espiral
em torno do seu ponto de equilı́brio. Nesse caso, ao contrário do sistema Lotka-Volterra,
a trajetória do sistema (2.24) é curvilı́nea, mas não fechada. As figuras 11 e 12 mostram
que o sistema não forma oscilações permanentes, como no sistema Lotka-Volterra, mas
pode formar oscilações amortecidas. A ocorrência ou não destas oscilações amortecidas
depende da relação entre K e os parâmetros do modelo.

Quanto maior o valor de K maior o número (frequência) das oscilações, figuras 11 e


12. O aumento de K, portanto, tem consequências desestabilizadoras para o sistema, pois
induz oscilações, que pelo menos inicialmente, podem ter amplitudes elevadas.

Além disso, quando x∗ está próximo de K a presa cresce lentamente, ou seja, as presas
“capturadas” são substituı́das lentamente. Podemos observar nas figuras 11 e 12 que a
população de presas, inicialmente, tem uma pequena queda em virtude da superioridade
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 33

Figura 14: Retrato de fase do sistema (2.24) para a = 1.0, α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0.

quantitativa dos predadores; isto é suficiente para haver uma queda brusca na população
de predadores, por haver pouco alimento disponı́vel; novamente, em virtude da diminuição
dos predadores, as presas voltam a aumentar e consequentemente os predadores também.
Este processo vai sendo amortecido pela função f (x) que limita o crescimento das presas
em virtude da capacidade do meio, o que conduz o sistema ao equilı́brio.

Percebemos ainda que, quanto menor os parâmetros a e b que representam as taxas


de crescimento e mortalidade das presas e predadores, respectivamente, mais lentamente
dá se o equilı́brio, para um mesmo valor de K. Nos gráficos das figuras 15 e 16 podemos
observar facilmente isso. Na figura 15(a) e 15(b) variamos apenas o parâmetro a que
representa a taxa de crescimento para as presas. Já na figura 16(a) e 16(b) variamos
apenas o parâmetro b que representa a taxa de mortalidade dos predadores.

Assim, concluı́mos que a densidade das presas ainda é influenciada por caracterı́sticas
do predador e a densidade do predador por caracterı́sticas da presa. Como as presas
crescem logisticamente, elas tendem a seu ponto de atração (capacidade suporte) K; a
presença dos predadores impede que a densidade de presas alcance este ponto, mantendo
seus nı́veis sempre abaixo do mesmo.

Portanto, quando a taxa de crescimento das presas depende de sua própria densidade,
equação (2.24), a interação presa-predador torna-se estável.
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 34

(a) (b)

Figura 15: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com condição inicial
(x0 , y0 ) = (1.5, 2.5). Em (a) a = 0.8 α = 0.5, b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0 e em (b) a = 1.5, α = 0.5,
b = 0.75, β = 0.25 e K = 8.0.

(a) (b)

Figura 16: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com condição inicial
(x0 , y0 ) = (1.5, 2.5). Em (a) a = 1.0 α = 0.5, b = 0.2, β = 0.25 e K = 8.0 e em (b) a = 1.0, α = 0.5,
b = 0.9, β = 0.25 e K = 8.0.

2.4.3 Modelo Presa-Predador com Auto-Regulação no Cresci-


mento das Presas e dos Predadores

O modelo dado pelo sistema (2.24) elimina a periodicidade do modelo de Lotka-


Volterra e o crescimento das presas é controlado não somente pela predação mas também
pela capacidade de suporte do meio, o que significa que mesmo os predadores estando a
nı́veis tróficos baixos, as presas não crescem indefinidamente. Mas tal modelo ainda admite
que a resposta numérica do predador, que representa basicamente sua taxa de crescimento
por conta do consumo de presas, é linear. O crescimento dos predadores, porém, depende
da “quantidade de presas”, então nos parece razoável considerar que tal crescimento é
limitado pela quantidade destas, em outras palavras, quanto maior o número de presas
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 35

mais rapidamente os predadores crescem, pois há mais alimentos a serem consumidos, em
contrapartida, quanto menor o número de presas menor possibilidade de crescimento para
os predadores por haver insuficiência de alimento.

Nesse sentido, o número de presas atua como um fator regulador do crescimento dos
predadores. Estas colocações nos inspiram a buscar uma função para a resposta numérica
do predador que dependa diretamente da densidade das presas e que seja uma adaptação
da função de Verhulst.

Assim, usamos a seguinte função como resposta numérica do predador:

 y
p(x, y) = β 1 − . (2.27)
x
 x
Substituindo a função (2.27) e f (x) = a 1 − nas equações do sistema (2.22)
K
temos
 ẋ = a − a x − αy x
  
K (2.28)
 ẏ = (−b + βx − βy) y.

As figuras 17 e 18 mostram gráficos da solução do sistema (2.28) em que podemos


observar a dinâmica das presas e predadores ao longo do tempo e a figura 19 mostra seu
plano de fase, evidenciando a estabilidade em torno do ponto crı́tico não-trivial.

Figura 17: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.28), para
a = 0.5 α = 0.8, b = 0.4, β = 0.25 e K = 100.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2.5, 3.5).
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 36

Figura 18: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.28), para
a = 0.5 α = 0.8, b = 0.5, β = 0.25 e K = 100.0 e condição inicial (x0 , y0 ) = (2.5, 3.5)
.

Figura 19: Plano de fase do sistema (2.28) com os mesmos parâmetros da figura anterior.

O ponto de equilı́brio não-trivial para o sistema (2.28) (com y > 0) é


  
K a Kβ − b
x =

(a − αy) , y =

a β Kα + a
2.4 Modelos Presa-Predador Modificados 37

e, supondo y ∗ > 0, temos a seguinte condição para K:


b
K> .
β

Fizemos simulações para diferentes parâmetros e verificamos que: a taxa de mortali-


dade dos predadores influencia diretamente na proximidade dos nı́veis populacionais das
duas espécies, conforme podemos verificar analisando as figuras 17 e 18. Um pequeno
aumento na taxa de mortalidade dos predadores influencia significativamente para um
aumento na densidade de presas. Observamos, por exemplo, nos gráficos das figuras 17
e 18 que, ao alterar apenas a taxa de mortalidade dos predadores de 0.4 para 0.5, a
população de presas teve um aumento significativo, como argumentado anteriormente.

(a) (b)

Figura 20: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo para a = 0.5, b = 0.5,
α = 0.8, K = 100.0, condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.5) e variando o parâmetro β: em (a), β = 0.2 e em
(b), β = 0.5.

(a) (b)

Figura 21: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo para a = 0.5, b = 0.5,
β = 0.3, K = 100.0, condição inicial (x0 , y0 ) = (1.5, 2.5) e variando o parâmetro α: em (a), α = 0.5 e em
(b), α = 0.8.
2.5 Outros Modelos 38

Os parâmetros α e β , que representam respectivamente as taxas de predação (resposta


numérica) e conversão de presas capturadas (resposta funcional ) em novos predadores,
influenciam na rapidez com que as espécies se estabilizam: quanto maior o valor de β mais
rapidamente ocorre o equilı́brio e mais próximas as espécies permanecem (veja figura 20).
Isso parece bem razoável, já que quanto maior β maior a densidade de predadores, o que
diminui a densidade de presas, mas estas controlam o crescimento dos predadores, assim,
esta diminuição influencia diretamente numa diminuição cada vez maior da variação de
crescimento dos predadores, aproximando, desta maneira, as duas populações. Já em
relação ao parâmetro α, ocorre o contrário, quanto maior, mais lentamente as espécies
alcançam o equilı́brio (veja figura 21).

Do ponto de vista ecológico esse modelo parece mais conveniente para representar a
dinâmica de interação entre espécies em sistemas presa-predador por considerar, além da
inibição do crescimento das presas pelo limite de recursos naturais, que os predadores
estão limitados pela quantidade de presas, o que é consideravelmente verdadeiro já que
estes se alimentam unicamente delas.

2.5 Outros Modelos

Os dois modelos descritos anteriormente nos parece, do ponto de vista biológico,


mais compatı́veis com as dinâmicas do processo de interação presa-predador. No caso
do primeiro modelo, seção 2.4.2, as presas são limitadas pelos recursos do meio ambi-
ente, no segundo, seção 2.4.3, além da limitação das presas pelo meio, os predadores são
limitados pela quantidade de presas. Porém, tais modelos ainda admitem que a resposta
funcional (taxa de predação) seja linear e os predadores não apresentam qualquer forma
de interação entre si, nem durante o processo de captura das presas e nem durante o
consumo delas.

Parece-nos razoável, também, que a resposta funcional e numérica (capacidade do


predador converter as presas consumidas em novos membros) representadas pelas funções
g(x, y) e p(x, y), respectivamente, em (2.22), sejam dadas em função da disponibilidade
de presas e considere a interação entre predadores. Implementamos diversos modelos de
resposta funcional propostos na literatura. Vamos comentar sucintamente sobre alguns
deles, os que achamos mais interessantes e que contemplam nossas suposições. Esse será
o nosso próximo objetivo: definir formas biologicamente razoáveis para as componentes
da predação.
2.5 Outros Modelos 39

Como a resposta funcional corresponde ao consumo de presas pelos predadores e


a resposta numérica a taxa de conversão das presas capturadas, podemos supor que a
resposta numérica seja função da resposta funcional, em particular, proporcional a esta,
ou seja, p(x, y) = λg(x, y), onde λ é a constante de proporcionalidade. A função g(x, y)
deve ser tal que g(x, y) −→ ∞ quando x −→ ∞ e g(x, y) −→ 0 quando x −→ 0, para y
constante, ou seja, a resposta funcional do predador deve aumentar com o aumento do
número de presas e diminuir com a diminuição das mesmas. O mesmo acontece com a
resposta numérica do predador, por ser proporcional à resposta funcional.

Observamos que a resposta funcional, com as caracterı́sticas acima, controla o cresci-


mento das presas, mesmo que elas cresçam exponencialmente como no sistema de Lotka-
Volterra (2.5), pois caracteriza o ataque do predador.

A seguir apresentamos algumas das funções de resposta funcional, presentes na lite-


ratura, [5], [18] e [21], que satisfazem as hipóteses colocadas acima.

Função I:
α
g(x) = (2.29)
1 + mx

Função II:
α
g(x, y) = y (2.30)
1+ x

Função III:
α
g(x, y) = y (2.31)
1 + ex

Levando em consideração que a resposta numérica é proporcional a resposta funcional,


os modelos correspondentes às funções I, II e III são, respectivamente:
   
x  αy
 ẋ = a 1− − x


K 1 + mx

  (2.32)
 λαx
 ẏ = −b + y,


1 + mx

  
x αy

 ẋ = a 1− − x

1 + xy

K

  (2.33)
 λαx
 ẏ = −b + y,


1 + xy
2.5 Outros Modelos 40

Figura 22: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.32), para
a = 10.0 α = 0.6, b = 0.09, λ = 0.02 e K = 100.0, m = 0.01 e condição inicial (x0 , y0 ) = (10, 20).

   
x  αy
 ẋ = a 1− − x

y

K 1 + ex

  (2.34)
 λαx
 ẏ = −b + y.

 y
1 + ex

Figura 23: Plano de fase do sistema (2.32) com os mesmos parâmetros e condição inicial da figura
anterior.

Vamos agora analisar sucintamente o sistema (2.32), seus pontos de equilı́brio e uni-
2.5 Outros Modelos 41

Figura 24: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.33), para
a = 0.6 α = 0.6, b = 0.75, λ = 0.25 e K = 100.0.

cidade das soluções. A figura 22 mostra o gráfico da solução de tal sistema. Abaixo
expomos as possibilidades para seus pontos de equilı́brio:

i) O ponto de equilı́brio trivial P0 (0, 0);

ii) O equilı́brio na ausência de predadores (y = 0) P1 (K, 0);

iii) O equilı́brio interior (positivo) P2 (x∗ , y ∗ ), onde


   
b a b λα
x =

,y =

1− .
λα − bm α K (λα − bm) λα − bm

Para o ponto de equilı́brio P2 (x∗ , y ∗ ) é necessário que

b λα
x∗ = > 0, ou seja, m <
λα − bm b

e   
a b λα
y =

1− > 0,
α K (λα − bm) λα − bm
o que nos dá a seguinte condição:
b
K> .
λα − bm
2.5 Outros Modelos 42

Figura 25: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (2.34), para
a = 0.5 α = 0.5, b = 0.5, λ = 0.25 e K = 100.0.

Figura 26: Plano de fase do sistema (2.33).

Para o exemplo ilustrado no gráfico da figura 22 temos o ponto de equilı́brio

{x∗ ≈ 8.11, y ∗ ≈ 16.6}

e as condições 0 < m < 0.13 e K > 8.11. A figura 23 mostra o plano de fase para o
sistema (2.32). Observando-o ratificamos a estabilidade do sistema em torno do ponto
2.5 Outros Modelos 43

Figura 27: Plano de fase do sistema (2.34).

crı́tico não-trivial.

Análises análogas podem ser feitas aos sistemas (2.33) e (2.34), como apresentadas
em [17], cujos gráficos densidade versus tempo podem ser visualizados, respectivamente,
nas figuras 24 e 25. Nas figuras 26 e 27 estão os respectivos retratos de fase para esses
sistemas.

O sistema presa-predador de Lotka-Volterra e suas variações inspiraram novas técnicas


e teorias matemáticas, o que proporciona a formulação de modelos mais gerais, como é
o caso dos modelos de Gause, Kolmogorov e Holling-Tanner, [16] e [18], cujo tratamento
foge do escopo deste trabalho.
44

3 Modelos Presa-Predador para


três Espécies

3.1 Introdução

Neste capı́tulo estudamos modelos presa-predador para três espécies, com duas pre-
sas e um predador. Primeiramente consideramos modelos com as espécies interagindo
livremente e posteriormente incorporamos uma estratégia de controle chamada switching,
que representa o deslocamento da preferência do predador para um determinado tipo de
presa.

As propriedades switching em sistemas presa-predador foram estudados por Khan


[22], Moniem [23], Saleem [24], Tansky [25], dentre outros autores. Khan, [22], estuda
sistemas presa-predador com switching incorporando estratégias de defesa de grupo em
que as presas migram entre dois habitats diferentes, tal mudança é controlada por termos
que indicam a probabilidade de sucesso dessas transições. Saleem, [24], propõe um mo-
delo de competição com duas espécies de predador e uma espécie de presa, utilizando o
efeito switching como estratégia de defesa de grupo para as presas, garantindo, assim, a
sobrevivência das espécies.

Diferentemente dos autores citados no parágrafo anterior, na taxa de variação do


predador, consideramos a resposta numérica deste, ao consumir suas presas, pois enten-
demos que nem todas as presas consumidas são efetivamente transformadas em novos
predadores.

Na seção 3.2 consideramos um modelo em que as presas crescem linearmente e estu-


damos a estabilidade do sistema usando o critério de Routh-Hurwitz (subseção 3.2.1) e
funções do tipo Liapunov (subseção 3.2.2).

Na seção 3.3 além do efeito switching levamos em consideração que as presas crescem
logisticamente.
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 45

Partimos do suposto que não há competição entre as presas e que elas não interagem
com presas de outras espécies.

A comparação dos resultados obtidos nas simulações numéricas mostram que toda vez
que é considerado o efeito switching o sistema se estabiliza, mantendo assim a coexistência
das espécies.

3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Cresci-


mento Linear para as Presas

De maneira análoga ao capı́tulo 2 apresentamos um modelo presa-predador para três


espécies, sendo duas presas e um predador, dado por:

 ẋ = (b1 − δ1 z) x


ẏ = (b2 − δ2 z) y (3.1)


 ż = (−b + a δ x + a δ y) z,
3 1 1 2 2

onde x, y e z são as densidade dos dois tipos de presa e do predador, respectivamente;


b1 , b2 e b3 são, respectivamente, as taxas de crescimento intrı́nseco das presas e a taxa de
mortalidade do predador; δ1 e δ2 são os respectivos coeficientes da eficiência de procura
do predador em relação às presas x e y; a1 e a2 são as respostas numéricas (taxas de
reprodução) do predador ao consumir as presas x e y, respectivamente. Consideramos
b1 , b2 , b3 , a1 , a2 , δ1 e δ2 como constantes positivas.

O sistema (3.1) leva à extinção uma das espécies de presas, a que tem menor valor de
bi /δi , (i = 1, 2), enquanto a outra espécie de presa e o predador permanecem coexistindo
com oscilações tı́picas do sistema de Lotka-Volterra, como pode se facilmente visualizado
nas figuras 28 e 29. Na figura 28 observamos que a presa 1 vai à extinção pois b1 /δ1 < b2 /δ2
já na figura 29, a presa 2 vai à extinção pois b2 /δ2 < b1 /δ1 . Além disso, quanto menor for
bi /δi , (i = 1, 2), mais rapidamente a presa i vai à extinção.

Num ambiente presa-predador, o predador prefere manter-se num habitat por algum
tempo antes de mudar para outro. Esta mudança de habitat é chamada de switching.
Pode haver várias razões para o switching do predador. Por exemplo, um predador prefere
capturar espécies de presas num habitat onde elas estão em abundância, mas após algum
perı́odo de pesada predação, quando a população das espécies de presa começa a declinar,
o predador muda sua preferência para outro habitat, [26].

Nesse contexto, utilizaremos duas funções que caracterizam o efeito switching do


3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 46

Figura 28: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.1), para
b1 = 1.0, b2 = 2.0, b3 = 1.0, δ1 = 0.4, δ2 = 0.5, a1 = 0.5, a2 = 0.5 e condição inicial (1.0, 1.2, 2.0).

Figura 29: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.1), para
b1 = 2.0, b2 = 2.0, b3 = 1.0, δ1 = 0.4, δ2 = 0.5, a1 = 0.5, a2 = 0.5 e mesma condição inicial da figura
anterior.

predador, chamadas de ⁀funções de Tansky, [25], com o intuito de estabilizar o sistema


(3.1). O modelo com switching é obtido substituindo as constantes δ1 e δ2 pelas funções
de Tansky, dadas por:
ǫ1
χ1 (x, y) = y n,
 (3.2)
1+ x
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 47

ǫ2
χ2 (x, y) =  n , (3.3)
x
1+ y

onde ǫ1 e ǫ2 são constantes positivas e n ∈ N representa a intensidade do switching. Estas


duas funções representam as interações não constantes entre o predador e suas presas,
variando conforme o valor de n.

Analisando as funções de Tansky, podemos perceber facilmente que a taxa de predação


do predador, ao consumir uma determinada presa, decresce quando esta se torna rara,
comparada com a outra espécie de presa. Esta propriedade é ampliada para grandes
valores de n. Com isso evitamos que ambas as espécies sejam extintas, como veremos mais
adiante, pois quando uma espécie de presa se torna rara o predador muda sua preferência
de predação para a outra.

Figura 30: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo, sistema (3.4), para
b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.0, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = 0.2 e a2 = 0.2, n = 1 e condição inicial
(x0 , y0 , z0 ) = (2.0, 2.0, 1.5).

Considerando as funções de Tansky (3.2) e (3.3), temos o modelo presa-predador com


switching, dado por

ǫ1 x n z
  

 ẋ = b1 − n x
x + yn





ǫ2 y n z

  
ẏ = b2 − n y (3.4)

 x + yn


a1 ǫ1 xn+1 a2 ǫ2 y n+1

  
 ż = −b3 + n + n z.


x + yn x + yn
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 48

(a) (b)

Figura 31: Variação da densidade de presas e predadores em relação ao tempo com os mesmos parâ-
metros e condição inicial da figura anterior. Em (a) n = 5 e em (b) n = 10.

A figura 30 mostra o gráfico da solução do sistema (3.4) para a forma mais simples
das funções de Tansky, ou seja para n = 1. Fazendo simulações para diversos valores de
n e o mesmo conjunto de parâmetros observamos a influência estabilizadora do switching
do predador. Quanto maior o valor de n mais próximas as densidades das duas presas
permanecem (veja gráficos da figura 31). Biologicamente significa que o predador muda
de preferência com maior frequência, o que faz com que ambas as presas sobrevivam em
nı́veis de densidade cada vez mais próximos, [23].

Figura 32: Retrato de fase do sistema (3.4) com os mesmos parâmetros e condição inicial da figura 30.

O sistema (3.4), ao contrário do sistema (3.1), tem um ponto de equilı́brio estável, o


que comprova a influência estabilizadora do efeito switching do predador devido a densi-
dade das espécies depender da seleção de presas pelos predadores.
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 49

(a) (b)

Figura 33: Planos de fase do sistema (3.4). Em (a) plano de fase xz e em (b) plano de fase yz.

Na figura 32 apresentamos o retrato de fase do sistema (3.4) mostrando a estabilidade


em torno do seu ponto crı́tico não-trivial, o qual estudaremos mais adiante. Nos gráficos
da figura 33 exibimos os planos de fase do sistema.

A seguir analisaremos o ponto de equilı́brio não-trivial para o sistema presa-predador


com switching.

3.2.1 Estabilidade e Pontos de Equilı́brio

Nesta seção analisaremos os pontos crı́ticos do sistema (3.4) para n = 1 que é dador
por  
ǫ1 xz


 ẋ = b1 − x
x + y





  
 ǫ2 yz
ẏ = b2 − y (3.5)

 x+y


a1 ǫ 1 x 2 + a2 ǫ 2 y 2

  
 ż = −b3 + z.


x+y

Os pontos crı́ticos do sistema acima são:

(0, 0, 0), (0, b3 /a2 ǫ2 , b2 /ǫ2 ) , (b3 /a1 ǫ1 , 0, b1 /ǫ1 )

e o ponto de coexistência das três espécies:


 
b1 b3 (b1 ǫ2 + b2 ǫ1 ) b2 b3 (b1 ǫ2 + b2 ǫ1 ) b 1 ǫ2 + b 2 ǫ1
 x0 = , y0 = , z0 = . (3.6)
2 2 2 2
ǫ1 (a1 b1 ǫ2 + a2 b2 ǫ1 ) ǫ2 (a1 b1 ǫ2 + a2 b2 ǫ1 ) ǫ1 ǫ2

Nosso interesse é estudar a estabilidade do ponto de coexistência das três espécies


3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 50

(3.6). Para tanto, afim de simplificar os cálculos, supomos a1 = a2 = 1 e examinamos os


autovalores dados pela equação:

x0 y0 z0 x20 z0 x20

−ǫ1 2 −λ ǫ1 −ǫ1

2

(x0 + y0 ) (x0 + y0 ) x0 + y0
y02 z0 y02

x0 y0 z0
ǫ 2 2 −ǫ 2 2 − λ −ǫ 2
= 0.

(x0 + y0 ) (x0 + y0 ) x0 + y0
2ǫ1 x0 (x0 + y0 ) − (ǫ1 x2 + ǫ2 y 2 ) 2ǫ2 y0 (x0 + y0 ) − (ǫ1 x20 + ǫ2 y02 )
0 0
z0 z0 −λ
(x0 + y0 )2 (x0 + y0 )2

Mais simplificadamente, a equação acima corresponde a:

λ3 + A1 λ2 + A2 λ + A3 = 0, (3.7)

onde
(ǫ1 + ǫ2 )x0 y0 z0
A1 = ,
(x0 + y0 )2

z0 2 4 2 3 2 2 2 3 2 4

A2 = 3 ǫ1 x0 + 2ǫ1 x0 y0 − 2ǫ1 ǫ2 x0 y0 + 2ǫ2 x0 y0 + ǫ2 y0 ,
(x0 + y0 )

ǫ1 ǫ2 x0 y0 z02 2 2

A3 = ǫ 1 x 0 + ǫ 2 y 0 .
(x0 + y0 )3

Para que o ponto crı́tico (3.6) seja assintoticamente estável é suficiente que a parte
real dos autovetores de (3.7) seja negativa, [13]. Segundo o critério de Routh-Hurwitz
(veja apêndice C.2) isso ocorre se, e somente se, os coeficientes da equação polinomial
(3.7) satisfazem as relações

A A 0

A A
1 3
1 3
A1 > 0, > 0, 1 A2 0 > 0,
1 A2


0 A1 A3

ou equivalentemente,
A1 > 0, A1 A2 − A3 > 0, A3 > 0.

Obviamente A1 e A3 são positivos, pois dependem de ǫ1 , ǫ2 > 0 e x0 , y0 , z0 > 0. Além


disso A1 A2 − A3 pode ser escrito como:

x0 y0 z02 2 2 2

A1 A2 − A3 = (ǫ 1 x 0 − ǫ 2 y 0 ) ǫ 1 x 0 + 2ǫ 1 x 0 y 0 + 2ǫ 2 x 0 y 0 + ǫ 2 y 0 ≥ 0. (3.8)
(x0 + y0 )5

Assim, provamos que o sistema (3.5) geralmente tem um ponto de equilı́brio estável
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 51

(x0 , y0 , z0 ), exceto no caso especial quando ǫ1 x0 − ǫ2 y0 = 0 na equação (3.8) ou equivalen-


temente b1 = b2 .

Como vimos anteriormente o sistema (3.5) tem um ponto de coexistência estável,


exceto quando as duas presas têm taxas de crescimento iguais. Para este caso o critério
de Routh-Hurwitz falha. Sendo assim, na próxima subseção, tentaremos encontrar uma
função de Liapunov para analisarmos este caso.

3.2.2 Análise Através de Funções de Liapunov

Considere a função definida por:


     
x y z
H(x, y, z) = x − x0 − x0 ln + y − y0 − y0 ln + z − z0 − z0 ln ≥ 0, (3.9)
x0 y0 z0

onde a igualdade ocorre somente no ponto crı́tico (x0 , y0 , z0 ).

Derivando (3.9) em relação ao tempo, temos


 
 x0  y0  z0 
Ḣ = 1 − ẋ + 1 − ẏ + 1 − ż. (3.10)
x y z

Usando as equações (3.5) com a1 = a2 = 1.0, o ponto crı́tico (3.6) e b1 = b2 = b (caso


que nos interessa nessa abordagem), em (3.10), encontramos

b (ǫ1 x − ǫ2 y)2
Ḣ = − ≤ 0. (3.11)
ǫ1 ǫ2 (x + y)

Considerando X = ǫ1 x e Y = ǫ2 y, na inequação anterior, temos

b (X − Y )2
Ḣ = − ≤ 0, (3.12)
ǫ2 X + ǫ 1 Y
onde a igualdade ocorre se, e somente se, X = Y . Nesse caso especial, nós temos o
plano X = Y que contém o ponto de coexistência (x0 , y0 , z0 ) e a relação (3.12) sugere
que qualquer trajetória aproxima assintoticamente o plano X = Y e estabelece oscilações
tı́picas do sistema Lotka-Volterra com um valor constante de H.

De maneira mais geral, consideremos uma nova variável r = Y /X = ǫ2 y/ǫ1 x, e então


usando as equações do sistema (3.5) com b1 = b2 = b, obtemos
ǫ1 ǫ2 rz
ṙ = (1 − r) , (3.13)
ǫ2 + ǫ1 r
o que mostra que o valor de r = Y /X sempre aproxima r = 1, ou seja, qualquer trajetória
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 52

de (3.5) se aproxima do plano X = Y . Uma vez que uma trajetória chega ao plano X = Y ,

o sistema permanece neste plano, [24]. Fazendo uma mudança de variáveis, s = 2X e z
para este plano, a trajetória assintoticamente adquirida pode se descrita pelas equações
Lotka-Volterra:   
ǫ1 ǫ2 z
 ṡ = b− s


ǫ1 + ǫ2

  (3.14)
 s
 ż = −b3 + √ z.


2

Portanto, concluı́mos que, nesse caso especial, a trajetória do sistema (3.5) sempre
aproxima uma solução periódica das equações de Lotka-Volterra dadas por (3.14) no plano
ǫ1
y = x.
ǫ2
Analogamente, como fizemos no segundo capı́tulo deste trabalho, encontramos o ponto
de equilı́brio não-trivial do sistema (3.14), que é

 
b (ǫ1 + ǫ2 )
s0 = b3 2, z0 = . (3.15)
ǫ1 ǫ2

(a) (b)

Figura 34: Trajetórias do sistema (3.5): (a) caso estável para b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.5, ǫ1 =
0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2. Nesse caso o ponto de equilı́brio é (x0 , y0 , z0 ) = (31.5, 18.9, 8.0); (b) Caso
periódico com os mesmos parâmetros, mas com b1 = b2 = 1.0 e, nesse caso, o ponto de equilı́brio é
(x0 , y0 , z0 ) = (37.5, 15.0, 7.0).

Para ilustrar os resultados desta seção, nós apresentamos nas figuras 34, 35 e 36 os
resultados de nossas simulações computacionais. Nos gráficos da figura 34 mostramos
duas situações distintas: no primeiro apresentamos a trajetória para o caso b1 6= b2 , ou
seja, quando as taxas de crescimento das presas são diferentes e, nesse caso, temos a
coexistência estável; no segundo, temos o caso em que as taxas de crescimento das duas
presas são iguais (b1 = b2 ) o que descreve uma solução periódica, tı́pica dos modelos
3.2 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Linear para as Presas 53

Lotka-Volterra.

(a) (b)

Figura 35: Trajetórias do sistema (3.14) com b = 1.0, ǫ1 = 1.0, ǫ2 = 1.0, b3 = 1.0. Nesse caso, temos o
 √
ponto de equilı́brio (s0 , z0 ) = 2, 1 .

(a) (b)

Figura 36: Trajetórias do sistema (3.4) com condição inicial (2.0, 2.0, 1.5) e n = 20: (a) caso estável
para b1 = 1.0, b2 = 1.5, b3 = 1.5, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2; (b) caso periódico b1 = b2 = 1.0, b3 =
1.5, ǫ1 = 0.2, ǫ2 = 0.5, a1 = a2 = 0.2.

Gráficos da solução do sistema (3.14) podem ser visualizados na figura 35: em (a)
apresentamos a densidade de presas ao longo do tempo e em (b) podemos visualizar um
plano de fase mostrando a curva descrita pelo sistema. Podemos perceber a semelhança
destes com os gráficos apresentados no capı́tulo 2 (seção 2.2) para as equações Lotka-
Volterra, o comportamento oscilatório visualizado neles ratifica as conclusões algébricas
apresentadas anteriormente.

Vale ressaltar que, para estudar o comportamento da solução do sistema (3.4), nós
o integramos numericamente, utilizando o método numérico de Runge-Kutta de quarta
ordem com passo h = 0.1, para diferentes valores de n enquanto fixamos os outros parâ-
3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Logı́stico para as Presas 54

metros. Observamos que o caso estável (b1 6= b2 , n = 1, figura 34 (a)) e o caso periódico
( b1 = b2 , n = 1, figura 34 (b)) permanecem estáveis e periódicos, respectivamente, para
outros valores de n (veja figura 36 (a) e (b)).

Na próxima seção estudamos modelos presa-predador para três espécies análogos aos
representados pelos sistemas (3.1) e (3.4), mas considerando o crescimento das presas
como logı́stico.

3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Cresci-


mento Logı́stico para as Presas

Agora, baseado em abordagens feitas em [26], estudamos modelos presa-predador para


três espécies, sendo duas presas e um predador, considerando um crescimento logı́stico
para a população de presas. Para tanto consideramos a função de Verhulst dada por
 x
g(x) = rx 1 − , (3.16)
K
onde r e K são constantes positivas que representam a taxa de reprodução da espécie x
e capacidade suporte para esta espécie, respectivamente.

Nesta seção apresentamos primeiramente um modelo presa-predador sem efeito switching


que é obtido substituindo as constantes b1 e b2 no sistema (3.4) por funções caracterizadas
por (3.16). Posteriormente incluiremos a este modelo as funções de Tansky que caracte-
rizam o efeito switching do predador, como feito na seção 3.2.

Assim, o modelo sem switching é dado por


  
 ẋ = r 1
r1 − x − δ1 z x

K1





  
r2 (3.17)
ẏ = r2 − y − δ2 z y



 K 2



 ż = (−r + a δ x + a δ y) z,
3 1 1 2 2

onde x, y e z representam as densidades dos dois tipos de presas e do predador, respec-


tivamente; r1 , r2 e r3 são as taxas de crescimento intrı́nseco das presas e do predador,
respectivamente; K1 e K2 são as capacidades de suporte do meio para as presas x e y,
respectivamente; δ1 e δ2 são respectivamente os coeficientes da eficiência de procura do
predador em relação a presas x e y; a1 e a2 representam as respostas numéricas (taxas de
reprodução) do predador ao consumir as respectivas presas x e y.
3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Logı́stico para as Presas 55

Já o modelo com switching é dado pelo sistema

xn
 
r1

 ẋ =
 r1 − x − ǫ1 n z x
K1 x + yn





yn
  
 r2
ẏ = r2 − y − ǫ2 n z y (3.18)

 K2 x + yn


a1 ǫ1 xn+1 a2 ǫ2 y n+1

  
 ż = −r3 + n + n z,


x + yn x + yn

onde os parâmetros neste sistema são definidos como em (3.17).

(a) (b)

(c) (d)

Figura 37: Modelo sem switching com r1 = 0.9, r2 = 1.5, r3 = 1.0, K1 = K2 = 5000, ǫ1 = 0.2, ǫ2 =
0.5, a1 = a2 = 0.5: a) Densidade das populações de presas e predadores como uma função do tempo; b)
Retrato de fase; c) Plano de fase das espécies x e z e o seu ciclo limite; d) Plano de fase das espécies y e
z, mostrando a instabilidade.

Simulamos e comparamos os modelos dados em (3.17) e (3.18) para vários valores de


n e o mesmo conjunto de parâmetros e pudemos observar a influência estabilizadora do
efeito switching do predador.
3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Logı́stico para as Presas 56

(a) (b)

(c) (d)

Figura 38: Modelo com switching (n = 1) com os mesmos parâmetros da figura anterior: a) Evolução
da trajetória de cada espécie no tempo; b) Retrato de fase; c) e d) Os planos de fase e estabilidade
assintótica. Ponto de coexistência: x = 7.90; y = 5.27; z = 7.51.

A figura 37 mostra as trajetórias de cada uma das espécies do modelo sem switching do
predador, dado pelo sistema (3.17). Para diversos parâmetros observamos a instabilidade
do ponto de equilı́brio não trivial, em que uma das espécies de presa vai à extinção, nesse
caso a presa y. Na mesma figura (figura 37 (a,b,c)) exibimos o retrato e os planos de fase
para o sistema. Na projeção do retrato de fase no plano xz a trajetória é do tipo ciclo
limite, figura 37 (c), já as espécies projetadas no plano yz evoluem em uma trajetória em
que y vai à extinção, figura 37 (d).

Em nossas simulações percebemos que, como observado na seção 3.2, a espécie de presa
que vai à extinção é a que tem menor razão entre sua taxa de crescimento intrı́nseco e sua
taxa de mortalidade devido a predação, ou seja, a que tem menor razão ri /ǫi , (i = 1, 2).
No exemplo da figura 37 temos r1 /ǫ1 = 4.5 e r2 /ǫ2 = 3.0 e como r2 /ǫ2 < r1 /ǫ1 = 4.5 a
espécie y vai à extinção, como já argumentamos.
3.3 Modelo com duas Presas e um Predador: Crescimento Logı́stico para as Presas 57

Com os mesmos parâmetros e as mesmas condições iniciais que usamos no sistema


(3.17), simulamos numericamente o modelo com switching dado pelo sistema (3.18). Os
resultados podem ser visualizados na figura 38. Neste caso temos a estabilidade do ponto
de equilı́brio não trivial ou ponto de coexistência das espécies, figura 38 (a). Tais resultados
podem ser confirmados no retrato de fase, figura 38 (b), e nos planos de fase, figuras 38
(c e d).

Ressaltamos que usamos escalas diferentes para plotar os gráficos dos modelos com
e sem switching devido a rapidez com que uma das presas vai à extinção no caso sem
switching. Observe na figura 37 (a) que a presa y vai à extinção quando t é menor que 10
unidades de tempo, enquanto as outras espécies continuam oscilando no tempo. Por outro
lado, na figura 38 podemos observar que as trajetórias estabilizam num tempo maior que
80 unidades para atingir a coexistência.

Concluı́mos, portanto, que considerando o sistema presa-predador sem switching, para


diferentes conjuntos de parâmetros, uma das espécies vai à extinção. Por outro lado,
quando consideramos o efeito switching as trajetórias convergem assintoticamente para
seu ponto de equilı́brio.
58

Conclusão

Neste trabalho desenvolvemos simulações computacionais em sistemas presa-predador


com duas e três espécies.

Analisando o modelo de Lotka-Volterra, vimos que neste as espécies coexistem in-


dependentemente das condições iniciais e dos parâmetros utilizados e que as trajetórias
do sistema que o representa são periódicas. Baseando-nos no modelo de Lotka-Volterra
apresentamos modelos com regulação de crescimento para as presas e predadores (presas e
predadores crescendo logisticamente) e observamos que a coexistência das espécies nesses
modelos está condicionada aos valores dos parâmetros utilizados.

Analisamos dois modelos com três espécies, reconstruindo os experimentos feitos em


[25] e [26], com e sem o acréscimo de um termo que caracteriza o efeito switching do
predador. Ambos os modelos foram usados para estudar o comportamento de uma popu-
lação de duas presas e um predador. O primeiro modelo é uma generalização do modelo
de Lotka-Volterra para três espécies, sendo que as presas crescem linearmente. O segundo,
propõe que as presas cresçam logisticamente.

Considerando os modelos com três espécies sem switching observamos que, para dife-
rentes conjuntos de parâmetros, uma das espécies de presas vai à extinção. Entretanto,
considerando o modelo com o efeito switching as trajetórias convergem assintoticamente
para seu ponto de equilı́brio. Tomando diferentes valores para n, constatamos que quanto
maior o valor de n mais rápida se dá a convergência do sistema para seu ponto de equi-
lı́brio (veja figura 31). Portanto, concluı́mos que ao considerarmos o efeito switching
estabilizamos o sistema como um todo garantido a co-existência de todas as espécies.

Usamos o critério de Routh-Hurwitz e verificamos que o sistema com três especies com
switching estudado tem um ponto de equilı́brio estável. No caso especial em que as duas
presas tem taxas de crescimento iguais, usamos uma função do tipo Lyapunov e mostramos
que o sistema estabelece oscilações tipo Lotka-Volterra em um plano vertical no espaço
tridimensional. Mostramos que o modelo apresentado sempre atinge o equilı́brio ou estado
oscilatório nos quais o predador depende das duas presas a uma proporção constante.

Pretendemos continuar esse estudo, propondo e analisando modelos que incluem com-
Conclusão 59

petição entre as espécies de presas e, futuramente, analisar situações reais de interações


entre espécies afim de validar os resultados obtidos computacionalmente.
60

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63

APÊNDICE A
Sistema Linear Autônomo

Tendo em vista que os modelos que apresentamos neste trabalho dependem essencial-
mente de sistemas de equações diferenciais e que estes são fundamentais na modelagem de
fenômenos biológicos, fı́sicos, quı́micos, dentre outros, resolvemos nos dedicar a escrever
um pouco sobre os mesmos, neste e nos próximos apêndices. Ressaltamos, no entanto, que
enfatizaremos apenas os tópicos abordados em nosso trabalho e que são de fundamental
importância para que o leitor compreenda algumas passagens de nosso desenvolvimento.
Outrossim, faremos uma abordagem predominantemente teórica tendo em vista que os
modelos apresentados exemplificam a aplicabilidade dos sistemas de equações diferenci-
ais. Não obstante, sugerimos ao leitor, interessado em se aprofundar mais no assunto,
consultar [13], [27] e [28].

Considere o sistema de equações diferenciais


(
ẋ = F (x, y)
(A.1)
ẏ = G(x, y),

onde F, G : R2 → R são funções de classe C 1 definidas em todo o plano.

O sistema acima é denominado sistema autônomo, pois F e G não dependem explici-


tamente da variável (tempo) t, mas apenas das variáveis dependentes x e y.

Considere o sistema A.1 escrito na forma vetorial

ẋ = f(x), x(t0 ) = x0 (A.2)

onde x = xi + yj, f(x) = F (x, y)i + G(x, y)j e x0 = x0 i + y0 j.

Um ponto de equilı́brio do sistema (A.2) é uma solução dele tal que ẋ = 0.

Um ponto de equilı́brio xe é dito estável se, dado qualquer ǫ > 0, existe um δ > 0, tal
que para qualquer solução x(t) do sistema (A.2) satisfazendo:
Apêndice A Sistema Linear Autônomo 64

kx(0) − xe k < δ, então kx(t) − xe k < ǫ para todo t ≥ 0.

Essa definição nos diz que todas as soluções que começam “suficientemente próximas” (isto
é, a uma distância menor que δ) de xe permanecem “próximas” (isto é, a uma distância
menor que ǫ) de xe . Um ponto crı́tico que não é estável é dito instável, [13].

Um ponto de equilı́brio xe do sistema é assintoticamente estável, se é estável, e se


existe um número δ0 > 0 tal que para qualquer solução x(t) que satisfaz

|x(0) − xe | < δ0 ,

tivermos
lim x(t) = xe .
t→∞

Assim, as trajetórias que começam “suficientemente próximas” de xe não apenas per-


manecem “próximas”, mas também tendem a este ponto.

Ressaltamos que, embora estejamos trabalhando aqui com sistemas de segunda ordem,
as abordagens feitas também se aplicam a sistemas de dimensão n.
65

APÊNDICE B
Sistemas Quase Lineares e Ciclos Limites

B.1 Sistemas Quase Lineares

Consideraremos, agora, um sistema autônomo bidimensional não-linear

ẋ = f(x), (B.1)

com x = 0 como ponto de equilı́brio (isto é, f(0) = 0), e que numa vizinhança da origem
tenha a forma
ẋ = Ax + f(x), (B.2)

onde A é uma matriz n × n de termos constantes e f(x) satisfaz

i) f(0)=0;

ii) As componentes de f têm derivadas parciais contı́nuas;

iii) kf(x)k / kxk → 0 quando x → 0, isto é, kfk é pequeno em comparação com kxk
próximo à origem.

Neste caso dizemos que o sistema é Quase Linear, ou seja, a função f(x) é satisfato-
riamente aproximada pela função linear Ax próximo à origem.

Pode-se mostrar que próximo à origem o sistema quase linear se comporta como se
fosse um sistema linear, ou seja, a estabilidade de um ponto de equilı́brio do sistema
quase linear é equivalente à estabilidade do ponto de equilı́brio do linear correspondente
Ax, exceto quando A admite autovalores imaginários puros (para maiores detalhes sobre
autovalores de sistemas lineares sugerimos consultar [29] e [30]).
B.1 Sistemas Quase Lineares 66

Veremos agora um método para linearizar sistemas quase lineares. Para tanto, volte-
mos ao sistema não-linear geral (B.1) que, em forma escalar bidimensional, fica
(
ẋ = F (x, y)
(B.3)
ẏ = G(x, y).

Pode ser mostrado, usando a expansão em séries de Taylor, que ele será quase linear
em uma vizinhança de um ponto (x0 , y0 ) sempre que as funções F e G tiverem derivadas
parciais contı́nuas até segunda ordem. Expandindo (B.3) temos

F (x, y) = F (x0 , y0 ) + Fx (x0 , y0 )(x − x0 ) + Fy (x0 , y0 )(y − y0 ) + η1 (x, y),


G(x, y) = G(x0 , y0 ) + Gx (x0 , y0 )(x − x0 ) + Gy (x0 , y0 )(y − y0 ) + η2 (x, y)

onde η1 e η2 são os termos de segunda ordem e η1 (x, y)/[(x−x0 )2 +(y−y0 )2 ]1/2 → 0 quando
(x, y) → (x0 , y0 ), e analogamente para η2 (x, y). Notamos que F (x0 , y0 ) = G(x0 , y0 ) = 0
e que dx/dt = d(x − x0 )/dt e dy/dt = d(y − y0 )/dt. Então, o sistema (B.3) pode ser
reescrito como
! ! ! !
d x − x0 Fx (x0 , y0 ) Fy (x0 , y0 ) x − x0 η1 (x, y)
= + , (B.4)
dt y − y0 Gx (x0 , y0 ) Gy (x0 , y0 ) y − y0 η2 (x, y)

ou ainda, em notação vetorial,


du df
= (xe )u + η(x), (B.5)
dt dx
onde u = (x − x0 , y − y0 )T e η = (η1 , η2 )T .

Esse resultado tem duas consequências. A primeira é que, se as funções F e G forem


duas vezes diferenciáveis, então o sistema (B.3) é quase linear e não é necessário usar
a prova do limite. A segunda é que o sistema linear que aproxima o não-linear nas
vizinhanças de (x0 , y0 ) é dado pela parte linear das equações (B.4) e (B.5), a saber
!
T Fx (x0 , y0 ) Fy (x0 , y0 )
(u˙1 , u˙2 ) = (u1 , u2 )T , (B.6)
Gx (x0 , y0 ) Gy (x0 , y0 )

onde u1 = x − x0 e u2 = y − y0 .

A equação (B.6) fornece um método simples e geral para se encontrar o sistema linear
correspondente a um sistema quase linear na vizinhança de um ponto crı́tico. Tal método
usamos no capı́tulo 2 para estudar os pontos de equilı́brio do sistema presa-predador de
Lotka-Volterra.
B.1 Sistemas Quase Lineares 67

B.1.1 Classificação de Pontos Crı́ticos e Estabilidade de Sis-


temas Quase Lineares

Em sistemas quase lineares, como o termo não-linear é pequeno comparado com o


termo linear quando x tende ao ponto crı́tico, é razoável esperar que as trajetórias do
sistema linear correspondente sejam boas aproximações para as trajetórias do sistema
quase linear, ao menos em uma vizinhança do ponto crı́tico. Isso ocorre na maioria dos
casos, mas não em todos.

Nas tabelas 1 e 2 abaixo apresentamos a relação entre os autovalores da matriz de


coeficientes do sistema linear correspondente e o tipo de ponto crı́tico e estabilidade do
sistema linear (tabela 1) e quase linear (tabela 2)

Tabela 1: Propriedades de Estabilidade de Sistemas Lineares


Autovalores Tipo Estabilidade
λ1 > λ2 > 0 Nó Instável
λ1 < λ2 < 0 Nó Assintoticamente estável
λ 2 < 0 < λ1 Ponto de sela Instável
λ1 = λ2 > 0 Nó próprio ou nó impróprio Instável
λ1 = λ2 < 0 Nó próprio ou nó impróprio Assintoticamente estável
λ1 , λ2 = λ ± iµ
λ>0 Ponto espiral Instável
λ<0 Assintoticamente estável
λ1 = iµ λ2 = −iµ Centro ou Ponto espiral Estável

Tabela 2: Propriedades de Estabilidade de Sistemas Quase Lineares


Autovalores Tipo Estabilidade
λ1 > λ2 > 0 Nó Instável
λ1 < λ2 < 0 Nó Assintoticamente estável
λ 2 < 0 < λ1 Ponto de sela Instável
λ1 = λ2 > 0 Nó ou Ponto Espiral Instável
λ1 = λ2 < 0 Nó ou Ponto Espiral Assintoticamente estável
λ1 , λ2 = λ ± iµ
λ>0 Ponto espiral Instável
λ<0 Assintoticamente Instável
λ1 = iµ λ2 = −iµ Centro ou Ponto espiral Indeterminado

Observamos que as duas tabelas são bastante parecidas. As duas diferem em apenas
dois casos, quando os autovalores são reais e iguais e quando os autovalores são imaginários
puros.

O fato mais importante a ser considerado aqui é que, exceto nesses dois casos mais
sensı́veis a perturbações, em todos os outros casos o termo não-linear não altera o tipo
B.2 Ciclos Limites 68

ou estabilidade do ponto crı́tico. Assim, na maioria dos casos, o tipo e a estabilidade de


um sistema não-linear (quase linear) podem ser determinados pelo estudo de um sistema
linear bem mais simples.

Portanto, a partir da linearização de um sistema quase linear, podemos resumir as


propriedades de estabilidade apresentadas nas tabelas acima da seguinte maneira:

i) Se Re(λ1,2 ) < 0, então o estado de equilı́brio local é assintoticamente estável;

ii) Se λ1 λ2 < 0, o estado de equilı́brio é instável;

iii) Se Re(λ1,2 ) > 0, então o estado de equilı́brio é instável.

Como este tipo de análise só é válido para regiões “próximas” dos pontos crı́ticos,
vale ressaltar que as trajetórias do sistema quase linear podem ser bastante diferentes
das trajetórias do sistema linear correspondente em regiões “mais distantes”. No entanto,
estudar as trajetórias do sistema sabendo como se comportam todos ou grande parte dos
seus pontos crı́ticos é de grande ajuda para a construção do retrato de fase do sistema.

B.2 Ciclos Limites

Uma trajetória fechada no plano de fase tal que outras trajetórias fechadas tendem a
ela, por dentro ou por fora, quando t → ∞, é chamada de Ciclo Limite.

Se todas as trajetórias que começam próximas a uma trajetória fechada (dentro ou


fora) se aproximam dela quando t → ∞, dizemos que o ciclo limite é estável.

Se as trajetórias de um lado tendem à trajetória fechada, enquanto as do outro lado


se afastam quando t → ∞, dizemos que o ciclo limite é semi-estável.

Se as trajetórias de ambos os lados da trajetória fechada se afastam quando t → ∞,


dizemos que o ciclo limite é instável.

Também é possı́vel existir trajetórias fechadas tais que outras trajetórias nem se apro-
ximam nem se afastam dela, por exemplo, as soluções periódicas das equações de Lotka-
Volterra que abordamos no capı́tulo 2 (seção 2.2). Nesse caso, a trajetória fechada é
estável, [13].
69

APÊNDICE C
Funções de Liapunov e Critério de
Routh-Hurwitz

C.1 Funções de Liapunov

Agora apresentaremos, sucintamente, uma técnica muito útil para determinar as


condições necessárias para estabilidade das soluções de equações lineares: Funções de
Liapunov. Preferimos omitir demonstrações para sermos concisos, mas estas podem ser
encontradas com detalhes em [27].

Considere o sistema autônomo geral

ẋ = f (x), f : Rn → Rn (C.1)

Seja V (x) : Ω ⊂ Rn → R uma função de classe C 1 , definida num conjunto D, com


centro na origem. Dizemos que V é uma Função de Liapunov para a equação (C.1),
quando

V (0) = 0, V (x) > 0, se x 6= 0,

e
V̇ (x) ≤ 0, ∀x (C.2)

onde V : Ω → R é definida por


n
X ∂V (x)
V̇ (x) = fi (x), (C.3)
i=1
∂xi

com i = 1, 2, . . . , n, ou ainda

V̇ (x) = h(grad V ) (x), f (x)i .


C.2 Critério de Routh-Hurwitz 70

Quando temos em (C.2) a desigualdade estrita, ou seja, V̇ (x) < 0, para todo x 6= 0,
dizemos que V é uma Função de Liapunov estrita.

Se existe uma Função de Liapunov para (C.1), então a solução nula, x(t) ≡ 0, é
estável. Se a Função de Liapunov for estrita, então a solução nula é assintoticamente
estável. Também se V̇ (x) = 0, x ∈ Ω, então a origem é um centro, isto é, soluções
em Ω são periódicas, e suas equações no plano de fase são dadas pela famı́lia de curvas
V (x) = C.

C.2 Critério de Routh-Hurwitz

Como vimos no apêndice (B.1), para que o ponto de equilı́brio de um sistema quase
linear seja assintoticamente estável é suficiente que os autovalores da matriz de coeficientes
do sistema linear correspondente tenham parte real negativa.

Se o sistema é de ordem n, o polinômio caracterı́stico pode ser representado na forma


geral:
P (λ) = λn + a1 λn−1 + . . . + an (C.4)

onde os coeficientes ai , i = 1, 2, . . . , n, são todos reais. Nós assumimos que an 6= 0,


caso contrário λ = 0 seria uma solução, e o sistema então seria de ordem n − 1. Nós
queremos condições sobre ai , i = 1, 2, . . . , n, tal que os zeros de P (λ) satisfaçam a condição
Re(λ) < 0. As condições necessárias e suficientes para isto acontecer são dadas pelo
critério de Routh-Hurwitz. Segundo Murray, [2], existem várias formas equivalentes a
esta, uma das quais é, junto com an > 0, D1 , D2 , D3 , . . . , Dk > 0, onde



a1 a3 . . . .


a a
1 a 2 a4 . . .

a a
1 3 0

1 3 0 a 1 a3 . . .
D1 = a 1 , D 2 = , D3 = 1 a2 0 , . . . , Dk = ,
1 a2 0 1 a2 . . .
0 a1 a3

. . . . . .

0 0 . . . ak

para k = 1, 2, . . . , n.

Estabilidade em sistemas que modelam dinâmica populacional geralmente é estudada


através de raı́zes de polinômios caracterı́sticos, que são os autovalores da matriz formada
pelos coeficientes do sistema e, como argumentado anteriormente, se esses autovalores
C.2 Critério de Routh-Hurwitz 71

têm parte real negativa o sistema é assintoticamente estável. Nesses caso, o critério de
Routh Hurwitz é bastante útil, pois nos garante que isso acontece, desde que as condições
colocadas acima sejam satisfeitas. Porém nem sempre tais condições são todas satisfeitas
ao mesmo tempo, nesse caso o critério de Routh-Hurwitz falha, e é preciso buscar méto-
dos alternativos para estudar a estabilidade do ponto crı́tico. Uma boa alternativa é a
utilização de Funções de Liapunov, como fizemos no capı́tulo 3. Nesse tipo de estudo acon-
selhamos, primeiramente, usar o critério de Routh-Hurwitz, tendo em vista a dificuldade
em encontrar Funções de Liapunov apropriadas.
72

APÊNDICE D
Método Numérico de Runge-Kutta

Os métodos de Runge-Kutta são os mais usados dentre aqueles apropriados para os


problemas de valor inicial. Seus atrativos são simplicidade, alta precisão e versatilidade
nas aplicações, [1]. Este método é derivado das séries de Taylor e foi desenvolvido por
Carl David Runge (1895) com contribuições posteriores de M. Wilhelm Kutta (1901). A
principal vantagem desse método reside no fato de nos prescindir do cálculo de derivadas,
o que é um processo lento e complicado na maioria dos problemas, como é exigido por
outros métodos. Para mais detalhes sobre métodos numéricos sugerimos a leitura de [31]
[32], [33] e [34].

Neste apêndice nós faremos uma breve discussão do método de Runge-Kutta de quarta
ordem, o qual usamos para resolver numericamente todos os sistemas de equações presa-
predador apresentados e estudados em nosso trabalho. Como sugere a ordem, o método
de Runge-Kutta de quarta ordem está baseado na expansão das séries de Taylor até a
quarta ordem com os termos kn1 , kn2 , kn3 e kn4 dados como segue

kn1 = hf (tn , yn ) , (D.1)


 
1 1
kn2 = hf tn + h, yn + hkn1 , (D.2)
2 2
 
1 1
kn3 = hf tn + h, yn + hkn2 , (D.3)
2 2
 
1
kn4 = hf tn + h, yn + hkn3 . (D.4)
2

A fórmula de Runge-Kutta envolve uma média ponderada de valores de f (t, y), dados
pelos termos acima, em pontos diferentes no intervalo tn ≤ t ≤ tn+1 e é dada por
1
yi+1 = yn + (kn1 + 2kn2 + 2kn3 + kn4 ) . (D.5)
6

Como podemos facilmente observar, o método de Runge-Kutta é de natureza sequen-


Apêndice D Método Numérico de Runge-Kutta 73

cial, onde Kn2 depende de kn1 , Kn3 depende de kn2 , kn4 depende de kn3 e assim por
diante.

O método de Runge-Kutta apresenta as seguintes caracterı́sticas:

i) Requer quatro avaliações por passo, gerando respostas mais precisas que as de outros
métodos numéricos com número de avaliações e tamanho de passos equivalentes;

ii) Apresenta erro de truncamento local proporcional a h5 e, para um intervalo finito, o


erro de truncamento global é, no máximo, proporcional a h4 ;

iii) É consistente e condicionalmente estável.

Análise mais detalhada dos itens acima e demonstrações sobre consistência, convergên-
cia e estabilidade de tal método podem ser encontradas em [35].

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