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Se La Distinction havia, nos termos de Wacquant, instaurado a revoluo copernicana na anlise cientfica dos cnones do gosto, As Regras da
Arte, esta obra mais recente de Bourdieu, completa essa revoluo, ao tomar
como objeto, no mais o consumo, mas a prpria obra de arte e, sobretudo, o
campo da produo de bens culturais onde ela emerge.
As Regras da Arte prope um modelo de anlise das relaes entre o
campo literrio e o campo do poder em que a obra literria tomada como
objeto de anlise, como reservatrio de elementos etnogrficos e, por vezes,
como uma espcie de laboratrio de experimentaes sociolgica. E se a obra
de Flaubert, A Educao Sentimental, se presta particularmente bem a esse
triplo papel na medida em que o autor e a obra se situam como casos quase
ideal tpicos para a anlise que Bourdieu se prope. Pois, Flaubert e, sobretudo Baudelaire, so analisados enquanto os quase-heris do processo pelo
qual o universo de produo artstica torna-se relativamente autnomo para
as injunes da economia e da poltica. E A Educao Sentimental aparece,
nessa leitura sociolgica, como um laboratrio do campo do poder, pois a
histria de uma srie de indivduos situados numa combinatria sistemtica
de relaes de atrao e repulso conforme sua posio nos campos (econmico, cultural, poltico), trajetrias especficas e o tipo de capital de que
dispem.
A fico aparece assim como uma espcie de duplicata da iluso da
realidade que o prprio quotidiano das interaes sociais impem-nos. Se a
interao entre as pessoas produz em ns, quotidianamente, uma iluso de
realidade sob a qual a o real se dissimula, a (boa) fico se organiza de
modo similar a essa apreenso subjetiva imediata do real, isto , esconde
sob interaes sentimentais mais ou menos intensas as estruturas sociais mais
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