Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
– Por dez justos, Deus teria perdoado milhares de habitantes de duas cidades.
II. COM JESUS CRISTO cumpriu-se o que fora anunciado: pela morte de um
só, todos puderam salvar-se5. O mistério da solidariedade humana atinge em
Cristo uma plenitude inimaginável. Nada foi nem nunca será, mesmo de longe,
tão agradável a Deus como o oferecimento – o holocausto – que Jesus fez da
sua vida pela salvação de todos, e que culminou no Calvário: “Para que se
desse na terra, numa alma humana, um ato de amor a Deus de valor infinito,
era necessário que essa alma humana fosse a de uma Pessoa divina. Assim
foi a alma do Verbo feito carne: o seu ato de amor alcançava, na Pessoa divina
do Verbo, um valor infinito para satisfazer e para merecer”6.
São Tomás de Aquino ensina que Jesus Cristo ofereceu a Deus mais do que
seria necessário em justiça para compensá-lo da ofensa causada por todo o
género humano. E isso cumpriu-se: pela grandeza do amor com que Cristo
sofreu; pela dignidade da Vida que entregou em satisfação por todos, pois era
a vida do Deus-Homem; pela grandeza dos sofrimentos que padeceu...7 “Maior
foi a caridade de Cristo paciente que a malícia dos que o crucificaram, e por
isso Cristo pôde satisfazer mais com a sua Paixão do que puderam ofender os
que o crucificaram infligindo-lhe a morte, a tal ponto que a Paixão de Cristo foi
suficiente e ultrapassou sobreabundantemente os pecados dos que o
crucificaram”8, e os de todos os homens de todos os tempos, tanto os pessoais
como o pecado original de todas as almas; foi “como se um médico preparasse
um remédio que pudesse curar todas as doenças, mesmo as futuras”9.
Jesus Cristo deu plena satisfação ao amor eterno do Pai10. Assim o ensinou
sempre a Igreja11. O amor de Cristo morrendo por nós na Cruz agradava a
Deus mais do que podem desagradar-lhe todos os pecados de todos os
homens juntos. E na medida em que vamos identificando a nossa vontade com
a do Senhor, apropriamo-nos dos méritos de Cristo: oferecemos uma
reparação a Deus fazendo nossos o amor e os méritos do seu Filho! Nisto se
baseia o valor incomparável que um só homem santo tem aos olhos de Deus.
Ainda que sejam muitos os pecados que se cometem todos os dias, há
também muitas almas que – apesar das suas misérias – desejam agradar a
Deus com todas as suas forças!
Não interessa se a nossa vida tem ou não uma grande ressonância externa;
o que interessa é a nossa decisão de ser fiéis, de converter os dias da nossa
vida numa oferenda a Deus. Quem sabe olhar para o seu Pai-Deus, quem o
trata com a confiança e a amizade de Abraão, não cai no pessimismo, mesmo
que o seu empenho constante por servir o Senhor não dê resultados externos
de que se possa gloriar. Que grande engano quando o demónio procura que a
alma se encha de pessimismo em face dos resultados aparentemente irrisórios
dos seus esforços! E, pelo contrário, como o Senhor fica contente, às vezes
muito contente, com a nossa luta diária, com o nosso recomeçar contínuo!
III. EM ATENÇÃO aos dez justos, não a destruirei. Teriam bastado dez
justos! As pessoas santas compensam de longe todos os crimes, abusos,
invejas, deslealdades, traições, injustiças, egoísmos... de todos os habitantes
de uma grande cidade. Pela nossa união com o sacrifício redentor de Jesus
Cristo, Deus olhará com especial compaixão para os nossos familiares,
amigos, conhecidos..., que talvez se tenham extraviado por ignorância, por
erro, por fraqueza ou por não terem recebido as graças que nós recebemos.
Quantas vezes não teremos “pechinchado” com Jesus, de modo amistoso e
afável, como Abraão “pechinchou” com Javé! Olha, Senhor – continuaremos a
dizer –, essa pessoa é melhor do que parece, tem bons desejos..., ajuda-a! E
Jesus, que conhece bem a realidade, movê-la-á com a sua graça em atenção à
nossa amizade com Ele.
São Paulo diz aos primeiros cristãos que eles brilham como “astros no
mundo”14, iluminando todos os homens com a luz de Cristo. Do Céu, Deus olha
para a terra e delicia-se com essas pessoas que vivem uma vida corrente,
normal, mas que são conscientes da dignidade da sua vocação cristã. O
Senhor enche-se de alegria ao ver como cumprimos as nossas tarefas, quase
sempre pequenas e sem relevo, se procuramos ser fiéis.
(1) Hebr 11, 13; (2) São João Crisóstomo, Homilia sobre a Epístola aos Hebreus, 2, 3; (3) Gen
18, 16-33; Primeira leitura da Missa da segunda-feira da décima terceira semana do TC, ano I;
(4) cfr. Jos 7, 16-26; (5) Is 53, 1 e segs.; (6) R. Garrigou-Lagrange, El Salvador, Rialp, Madrid,
1972, pág. 297; (7) cfr. São Tomás, Suma Teológica, III, q. 48, a. 2; (8) ib.; (9) ib., q. 49, a. 1;
(10) cfr. João Paulo II, Enc. Redemptor hominis, 4-III-1979, 10; (11) cfr. Conc. de Trento, Sec
VI, cap. 7; cfr. Pio XII, Enc. Humani generis, Denz-Sch 2318/3891; (12) São Josemaría Escrivá,
Forja, n. 194; (13) João Paulo II, Homilia, 11-II-1981; (14) Fil 2, 15.