O eterno debate sobre o que é certo e errado remonta aos clássicos
filósofos gregos. Platão acreditava que as virtudes (coragem, justiça, temperança, etc) eram racioncínios complexos e para entendê-los era necessário treinamento nas ciências e metafísica. Aristóteles, com sua visão empiricista, via a sabedoria como uma prática pois através da prática se aprende a agir da melhor forma em diferentes situações. A questão do certo ou errado têm sido sempre motivo de debates, discórdias e até mesmo guerras. Afinal, cada um pensa que está certo e o ‘outro’ está errado! Mas, é possível chegarmos à uma verdade que esteja acima de nossas limitadas visões de mundo? Se consideramos as leis como definidoras do que seja certo ou errado, iremos descobrir logo que esse é um caminho tortuoso. O conceito de certo e errado tem mudado no decorrer dos tempos. Além disso, as leis são diferentes para diferentes países. Na cidade de Nova York, por exemplo, é proibido fumar nos bares e restaurantes, e também beber na rua. Não se pode nem mesmo carregar uma garrafa de bebida alcólica aberta na mão. No entanto, aborto é permitido. Talvez a religião possa nos dar uma resposta clara. Mas de que religião estamos falando? A Bíblia (livro dos cristãos), o Alcorão (livro dos mulçumanos) e o Torá (livro dos judeus), por exemplo, podem nos dar diferentes perspectivas sobre a questão. Mesmo na religião, a visão ainda é de que estamos certos e o ‘outro’ está errado. Recentemente, uma nova hipótese, dentro da linha evolucionista, tem dado uma nova luz sobre o tema. Marc D. Hauser, um biologista de Harvard, afirma que nós nascemos com uma “moral grammar” (gramática da moral, minha tradução) nos nossos circuitos cerebrais, resultado de nossa evolução como raça humana. Para Dr. Hauser, nós não nascemos completamente vazios de julgamento moral, como uma ‘tabula rasa’. Ele argumenta que ateus e pessoas de diferentes religiões têm julgamentos morais iguais. A gramática da moral restringiria nosso comportamento humano de tal forma que muitas regras morais seriam semelhantes nas sociedades do mundo: cuidar das crianças, cuidar dos doentes, não matar, evitar adultério e incesto, não roubar ou mentir. Testes psicológicos com crianças a partir dos 3 anos têm mostrado que as crianças têm um senso inato do que seja justo e injusto. A hipótese desafia a idéia de que os pais, a sociedade, a religião são fontes de moral mas, que são, na verdade, um reforço dos instintos morais de comportamento que trazemos conosco ao nascer. Dr. Hauser se inspirou em uma outra teoria, a do lingüista Noam Chomsky, embora estejam em áreas diferentes. Chomsky, professor da MIT, mudou a lingüística moderna ao demonstrar que ao nascermos, trazemos no cérebro as ferramentas necessárias para a aquisição da língua. Língua, portanto, é inato. Embora existam diferentes línguas no planeta, elas são restringidas por uma Gramática Universal, comum a todas as línguas (por exemplo, todas as línguas têm sujeito). Da mesma forma, a gramática da moral restringe nosso comportamento humano e permite, ao mesmo tempo, variações, dependendo da cultura em que nos encontramos. Se Dr. Hauser está certo ou não, ainda não sabemos. Sua hipótese tem de ser comprovada. É, entretando, uma hipótese intrigante e que nos faz pensar! Será possível?
Denise Osborne é mestranda em Lingüística Aplicada no Teachers College
Columbia University (Nova York) e professora de português como língua
estrangeira.
Artigo originalmente publicado pelo Jornal Clarim (Minas Gerais, Brasil):
Osborne, D. (2007, November 16). Certo ou errado: Quem decide? Clarim, Ano 12, n. 594, p. A2.