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III Seminário do Centro de Ciências Sociais Aplicadas

Cascavel – 18 a 22 de Outubro de 2004

A divisão do trabalho como instrumento de dominação.


José Otacílio da Silva1
Rosana Kátia Nazzari2
Elizabeth Maria lazzarotto3
Antônio Pimentel Pontes Filho4

Resumo: Trata-se de averiguar, aqui, até que ponto a divisão do trabalho constitui um
instrumento de dominação da força de trabalho. Com este objetivo, num primeiro momento,
o artigo discute as noções de técnica e de dominação e mostra, num segundo momento, como
a questão da divisão e especialização do trabalho foi tratada pelos clássicos da sociologia –
Karl Marx e Èmile Durkheim. Por fim, a discussão procura mostrar como a divisão do
trabalho pode ser utilizada não só como técnica de produção, mas também como técnica de
dominação. A divisão do trabalho que, num primeiro estágio de seu desenvolvimento, ocorreu
espontaneamente entre as diversas tribos, com o advento da propriedade privada, das
inovações tecnológicas e, particularmente, do capitalismo, se expandiu em especializações
com o propósito deliberado de ampliar a produtividade do processo produtivo e, assim, a
lucratividade do capital. Com este propósito, a divisão e especialização do trabalho foram
utilizadas não só como uma técnica de produção, mas também, como foi demonstrado em um
estudo de caso, como uma técnica de dominação, isto é, como um instrumento de imposição
dos interesses do capital sobre os interesses do trabalhador.
Palavras-Chave: Divisão do trabalho, Técnica de produção, Técnica de dominação.

1.Introdução

A relação que os homens estabelecem com a natureza para obter os recursos


necessários para sua subsistência, desde os primórdios da humanidade, passou por um longo
processo de transformação. Num primeiro momento, a própria natureza fornecia ao homem
aquilo que ele necessitava para sobreviver. Depois, o homem descobriu suas ferramentas e,
com elas, passou a extrair da natureza os produtos de que necessitavam e a criar novas
necessidades a serem supridas da mesma forma. Se, no começo, o homem obtinha os recursos
de que necessitava sem o auxílio de outros, com o surgimento da propriedade privada e da
troca, cada vez mais a divisão do trabalho se impôs no processo de produção e os homens
passaram a depender uns dos outros para sobreviver. Num primeiro momento, criou-se a
especialidade na produção de um determinado produto, depois as próprias operações

1
José Otacílio da Silva é professor de Sociologia e Ciência Política do CCSA – Centro de Ciências Sociais
Aplicadas e membro do GPCP – Grupo de Pesquisa sobre Comportamento Político, da UNIOESTE –
Universidade estadual do Oeste do Paraná, Campus de Cascavel-PR.
2
Rosana Kátia Nazzari é professora de Ciência Política do CCSA – Centro de Ciências Sociais Aplicadas e
membro do GPCP – Grupo de Pesquisa sobre Comportamento Político, da UNIOESTE – Universidade
estadual do Oeste do Paraná, Campus de Cascavel-PR.
3
Elizabeth Maria Lazzarotto é professora do CCBS – Centro de Ciências Biológicas e da Saúde e membro do
GPCP – Grupo de Pesquisa sobre Comportamento Político, da UNIOESTE – Universidade estadual do Oeste
do Paraná, Campus de Cascavel-PR.
4
Antônio Pimentel Pontes Filho é professor de Sociologia e Antropologia do CCSA – Centro de Ciências
Sociais Aplicadas e membro do GPCP – Grupo de Pesquisa sobre Comportamento Político, da UNIOESTE –
Universidade estadual do Oeste do Paraná, Campus de Cascavel-PR.
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necessárias para a produção desse produto foram divididas entre os homens e, cada um, se
especializou em tarefas cada vez mais específicas.
O processo de divisão e especialização do trabalho e de introdução de novas
tecnologias no processo produtivo trouxe consigo um grande paradoxo. Se, por um lado, as
transformações ocorridas no processo produtivo permitiram aos homens dominar a natureza
ao invés de serem dominados por ela, por outro lado, essas mesmas transformações os
submeteram aos ditames do sistema de produção. É diante desse paradoxo que o presente
artigo pretende tratar da divisão e especialização do trabalho que se instaurou no processo
produtivo do mundo moderno. Trata-se de averiguar, aqui, até que ponto a divisão do
trabalho constitui-se como um instrumento de dominação da força de trabalho. Com este
objetivo, num primeiro momento, serão discutidas as noções de técnica e de dominação e,
num segundo momento, a discussão mostrará como a questão da divisão do trabalho foi
tratada pelos clássicos da sociologia – Karl Marx e Èmile Durkheim – e, por fim, por meio de
um estudo de caso, a discussão procurará mostrar como a divisão do trabalho é utilizada não
só como técnica de produção, mas também como técnica de dominação.

2. A noção de técnica e a noção de dominação.

A noção de técnica pode ser compreendida com a visualização da relação que os


homens estabelecem com a natureza. O que difere os homens dos outros animais é sua
capacidade de estabelecerem planos; sua capacidade de traçarem, a priori, os caminhos e os
meios para a consecução de determinado objetivo. Como dizia Marx (apud, Braverman, 1980,
p. 49), “o que distingue o pior arquiteto da melhor das abelhas é que o arquiteto figura em sua
mente sua construção antes de transformá-la em realidade”. Esta figura construída na mente,
constituindo-se de conhecimentos adquiridos pelo homem durante sua existência, transforma-
se em instrumento para a consecução de determinados fins, ou seja, transforma-se em técnicas
para a execução de suas atividades. Assim, pode-se dizer, à medida que o homem avança no
tempo, novos conhecimentos são obtidos e novas tecnologias podem ser traçadas para atingir
os mais diversos fins.
É compreensível, portanto, que qualquer atividade humana racionalmente planejada e
colocada em prática com vistas a alcançar um determinado fim, não é outra coisa senão uma
técnica de produção. Se o objetivo a ser alcançado pelo homem é, por exemplo, o descanso,
os conhecimentos por ele adquiridos e aplicados com o intuído de alcançar o repouso, não são
senão uma técnica de descanso. Entre determinados povos convencionou-se que dormir em
redes descansa-se melhor que em qualquer outro lugar. Outros criaram as camas e ainda
outros que preferem o escuro e o silêncio em lugar de claridade e do barulho para um
descanso mais confortável. Não importa a maneira escolhida para o repouso. A opção revela
que a práxis gerou conhecimento e que este conhecimento constitui uma tecnologia a serviço
do descanso. Ainda exemplificando, se o que se busca é aumentar a produtividade de uma
determinada atividade, a utilização de máquinas em substituição às ferramentas manuais, a
divisão do trabalho, etc., constituem técnicas de produção. Da mesma forma, se o objetivo é
fazer com que os outros ajam da maneira que não gostariam de agir, a persuasão, a coerção, a
força, etc, podem ser consideradas como técnicas de dominação.
A noção de dominação refere-se à relação dialética que se estabelece entre dois ou
mais indivíduos ou grupos sociais que possuam vontades ou interesses divergentes ou
antagônicos. Não existe dominado sem dominador, nem dominador sem dominado. A
dominação é um fenômeno existente tanto nas relações entre países como nas relações entre
grupos ou indivíduos. Não conceber a existência da dominação nessas relações é considerar,
abstratamente, a inexistência do conflito. Nas relações de dominação, as posições dos pólos
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antagônicos podem aparecer invertidas conforme as diversas situações. O professor, em


determinadas circunstâncias, pode ser dominador em relação aos alunos, mas, em outras, pode
estar submisso a eles. Quer dizer, nas relações de dominação há que considerar que ambos
pólos da relação, num nível maior ou menor são possuidores de recursos e de habilidades para
a defesa de seus interesses específicos.
Neste caso, aquele que está interessado em mudar o comportamento do outro, pode
acionar todo um arsenal de conhecimento para persuadir ou para obrigar o outro a mudar de
atitude. Se o objetivo é fazer com que o indivíduo produza além da quantidade e qualidade
possibilitadas pelas suas motivações espontâneas, as leis, os regulamentos, os prêmios de
produção, os prêmios de assiduidade, os adicionais sobre horas extras, a hierarquia salarial, a
ameaça de desemprego, etc., transforma-se em técnicas de dominação. Na fábrica a relação de
dominação ocorre, essencialmente, entre os interesses empresariais e os interesses do
trabalhador. De um lado, se encontram os interesses empresariais exigindo normas de conduta
para a obtenção ou manutenção dos lucros e, de outro, os interesses dos trabalhadores em se
libertarem das normas que cerceiam suas vontades e que limitam a remuneração do trabalho.
No contexto deste artigo, a divisão do trabalho pode ser entendida como uma técnica
de produção e como uma técnica de dominação. A divisão do trabalho é uma técnica de
produção na medida em que sua implementação visa ampliar a produtividade do trabalho e,
no mundo capitalista, a lucratividade do capital. A divisão do trabalho é, também, uma técnica
de dominação, na medida em que é utilizada pelo capitalista como um instrumento para a
obtenção da obediência dos trabalhadores.

3. Divisão do Trabalho: solidariedade ou alienação?

Em seu livro A divisão social do trabalho, Émile Durkheim (1975), não está
interessado em examinar a divisão do trabalho como técnica de produção ou como técnica de
dominação. Ao invés disso, naquela obra Durkheim defende a tese de que, longe de promover
a desintegração da sociedade, a divisão do trabalho constitui um dos fatores responsáveis pela
integração social. Na demonstração desta tese, Durkheim faz distinções entre sociedades
inferiores ou segmentares e sociedades superiores ou orgânicas. As sociedades inferiores
seriam as sociedades dos primórdios da evolução humana onde não havia divisão do trabalho,
onde a consciência coletiva, sendo muito forte, se impunha facilmente a todos e onde,
portanto, os indivíduos eram semelhantes em suas maneiras de pensar, agir e sentir. É essa
semelhança existente entre os membros da sociedade que os mantinham, mecanicamente,
integrados, coesos, solidários. Ao contrário, nas sociedades superiores, onde a divisão e
especialização do trabalho se encontram bastante acentuada, onde a consciência coletiva
perde sua força coercitiva e onde, portanto, os indivíduos se tornam diferentes em suas
maneiras de pensar, sentir e agir, o que os tornam integrados, coesos, solidários, é justamente
as diferenças existentes entre eles. Quer dizer, aos olhos de Durkheim, a divisão do trabalho
tornou os indivíduos diferentes e enfraqueceu a consciência coletiva, mas, ao mesmo tempo,
gerou a dependência entre eles e é justamente esta dependência que os mantêm integrados,
coesos, solidários.
Diferentemente de Durkheim, Marx (1980), tem a divisão e especialização do trabalho
como fonte da alienação humana. Isto é, no entendimento de Marx, com a divisão do trabalho,
o indivíduo perde o controle do processo de produção e do produto de seu trabalho. Se antes
da divisão do trabalho o indivíduo dominava o processo produtivo, decidia o que produzir,
como produzir, o quanto produzir e para quem produzir, com a divisão do trabalho, ele se
torna alienado no sistema. Em outras palavras, com a divisão do trabalho o indivíduo perde a
compreensão e o controle sobre sua atividade econômica e, com isto, as exigências do
processo produtivo lhes são impostas. Com a divisão do trabalho, o trabalhador não decide
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mais o que produzir, pois o suposto mercado consumidor e os proprietários dos meios de
produção já decidiram por ele; já não decide mais o quanto produzir, pois a necessidade de
acumular riqueza aliada á necessidade de atender ao consumo estimulado, também já
tomaram estas decisões; não decide mais como produzir, pois os técnicos já traçaram os
movimentos que ele deve seguir durante o trabalho; já não sabe mais para quem produz, pois
não é necessariamente ele quem vai consumir e nem os membros de sua família. Enfim, na
avaliação de Marx, com a divisão e especialização do trabalho, o trabalho perde o sentido para
o trabalhador.
As visões de Durkheim e de Marx sobre a divisão do trabalho requerem alguns
comentários. Ao contrário do que supunha Durkheim, a divisão do trabalho não foi capaz de
gerar a solidariedade social nas sociedades modernas. Pelo contrário, os conflitos de
interesses entre os homens – entre capitalistas e trabalhadores; entre os próprios capitalistas;
entre os próprios trabalhadores; entre as raças; entre as religiões, etc – são cada vez mais
alarmantes no mundo moderno onde, paradoxalmente, impera a divisão e especialização do
trabalho. Mesmo com a criação das leis, regulamento e normas de condutas que, aos olhos de
Durkheim, poderiam suprir as deficiências da divisão do trabalho na geração da integração
social, o que se nota é o individualismo exacerbado em detrimento da ação solidária. Quanto a
Marx, não há como contestar suas observações sobre a divisão do trabalho. Se se compara o
trabalhador assalariado moderno e o artesão da idade média, é fácil constatar o quanto o
assalariado moderno é dominado pelo processo de produção. Enquanto o artesão – por ser
proprietário de seus meios de produção e por produzir, diretamente, para a satisfação de suas
necessidades e de sua família – concebe, planeja e executa sua atividade produtiva como um
todo, o trabalhador assalariado moderno, com suas tarefas fragmentadas e sem a posse de seus
meios de produção, se limita, obrigatoriamente, a executar apenas as tarefas produtivas
concebidas e planejadas por outros e, no final, o produto de seu trabalho não mais lhe
pertence.

4. A evolução da divisão trabalho

A divisão do trabalho é resultado do longo processo de desenvolvimento da


humanidade, quer dizer, ela surge e se desenvolve conforme as circunstâncias históricas. Nos
primórdios da humanidade, quando os homens ainda eram nômades, o trabalho não se fazia
necessário, pois a natureza lhes oferecia os produtos de que necessitavam para sobreviver.
Mesmo quando se tornaram sedentários, os homens ainda não haviam conhecido a divisão do
trabalho, pois as atividades econômicas necessárias para garantir a sobrevivência da tribo
eram, indistintamente, executadas por todos.
Na verdade, a primeira divisão do trabalho ocorreu, não entre os indivíduos, mas entre
os grupos sociais no momento em que, deixando de ser nômades, os homens tornaram-se
sedentários. Conforme Engels (1984), a primeira grande divisão do trabalho ocorreu quando,
na vida cotidiana, as tribos nômades perceberam que as sementes poderiam ser cultivadas e
que certos animais poderiam ser domesticados, as tribos que se dedicaram ao plantio se
especializaram na agricultura e as tribos que se dedicaram à criação de animais se tornaram
pastoras. A segunda grande divisão social do trabalho ocorreu com o surgimento da atividade
artesanal. À medida que os homens descobriam as ferramentas para produzir os produtos de
que necessitavam para sobreviver, eles se tornaram proprietários de suas ferramentas e ao
mesmo tempo, criavam com essas ferramentas, novas necessidades a serem satisfeitas e, junto
com essas novas necessidades, surgiam novos artesãos oficiais, isto é, trabalhadores que
produziam um determinado produto do começo ao fim, sem nenhuma divisão das tarefas. A
terceira grande divisão do trabalho social ocorreu com o surgimento do comerciante. O
comerciante, embora não participa diretamente da produção dos recursos de que a
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comunidade necessita para a sobrevivência, se incumbiu da tarefa de intermediar as trocas


entre os produtores. O comerciante instigou o desenvolvimento do comércio, direcionou a
produção para mercado e não mais para a satisfação imediata dos trabalhadores, criou o
dinheiro para facilitar as trocas e, com ele, a figura do usurário: um novo agente econômico
que iria viver da compra e da venda de moedas e não da transformação direta da matéria
prima em valor de uso.
O surgimento da moeda constitui um dos fatores básicos que, antes do advento do
capitalismo industrial, contribuíram para a aceleração da divisão e especialização do trabalho.
A moeda, facilitando a troca entre os produtores, possibilitou que o homem, ao invés de
produzir os diversos produtos de que necessitava, se especializasse na produção de apenas
determinados produtos e trocasse o excedente de sua produção pelos demais produtos de que
necessitava, mas que não os produzia. Enfim, a moeda abriu as possibilidades não só para que
os homens se dedicassem a uma atividade específica, mas também para a criação de novas
necessidades e de novas atividades econômicas. Assim, com o crescente desenvolvimento da
divisão do trabalho e com a crescente descoberta de novas técnicas de domínio sobre a
natureza, a sociedade pôde desenvolver suas forças produtivas e pôde produzir um excedente
econômico de modo a propiciar o nascimento de uma nova divisão do trabalho: o trabalho
intelectual separado do trabalho manual.

5. A divisão do trabalho como técnica de produção e de dominação

A divisão do trabalho que, até então, fora um processo espontâneo de organização das
atividades econômicas que nasciam no seio de desenvolvimento das sociedades, com o
advento do comércio e da indústria, haveria de transformar-se em uma técnica de produção e
uma técnica de dominação deliberadamente utilizada para a ampliação da produtividade dos
processos produtivos. Ou seja, a divisão e especialização do trabalho se tornam um
mecanismo para incrementar a produção e os lucros dos capitalistas, a partir do momento em
que os agiotas e comerciantes transformaram-se em capitalistas, isto é, em proprietários dos
meios de produção que passaram a comprar a força de trabalho e a destinar a produção para o
mercado e não mais para a satisfação direta das necessidades humanas.
No artesanato ou no sistema produtivo manufatureiro que antecederam o capitalismo,
apesar dos artesãos trabalharem aglomerados num mesmo pavilhão, o processo de produção
se dava sem a especialização das tarefas. Habilitado a executar todas as tarefas necessárias
para a confecção de um produto, o trabalhador dominava os sistemas produtivos. O próprio
trabalhador determinava a quantidade que deveria produzir; a qualidade do produto; o seu
tempo diário de trabalho; decidia sobre as interrupções que deveria fazer durante o trabalho;
escolhia as ferramentas com as quais deveria trabalhar; decidia como utilizá-las e, acima de
tudo, tinha a possibilidade de criar, de dar a forma desejada a seus produtos.
A necessidade de ampliação dos lucros constituiu o fator decisivo na transformação do
artesanato ou da manufatura no sistema fabril cuja característica básica é introdução da
divisão e especialização do trabalho e da maquinaria no sistema produtivo. Com a divisão e
especiação das tarefas, o sistema fabril fez o ritmo da produção de um trabalhador depender
do ritmo da produção do outro; tirou do trabalhador a possibilidade de conceber e planejar
suas atividades; de decidir sobre a quantidade da produção; sobre o horário de trabalho e
sobre as eventuais interrupções diárias do trabalho. No sistema fabril, deixar de trabalhar um
dia ou interromper continuamente o trabalho, significa acumular peças inacabadas ou não dar
seqüência á produção; significa, portanto, menos produtividade e menos lucro.
A divisão e especialização do trabalho, ao mesmo tempo em que racionaliza o
processo produtivo com vistas à ampliação dos lucros, impõe aos indivíduos condições de
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trabalho que também são favoráveis ao processo de acumulação. A especialização do trabalho


otimiza o desenvolvimento das atividades produtivas intensificando o ritmo do trabalho e
aumentando, com isso, a sua produtividade. Por conseqüência, o trabalhador deixa de
determinar o ritmo de seu trabalho e tem que se submeter ao ritmo dos demais trabalhadores,
pois, desenvolver sua tarefa mais demoradamente, redundaria no atraso das tarefas dos
trabalhadores subseqüentes, portanto, na lucratividade do capital. É assim que, para evitar
estes transtornos, o empresário fabril laça mão dos regulamentos, das normas, da hierarquia,
dos prêmios de produção, enfim, de uma diversidade de mecanismos de coerção, de modo a
intensificar o ritmo de trabalho.
Com a automação, isto é, com a introdução do sistema de máquinas no processo
produtivo, o domínio do capital sobre o trabalho se intensifica. No momento anterior à
automação, o trabalhador havia perdido seu poder de decisão sobre a intensidade do trabalho e
sobre sua jornada de trabalho, tornando-se dependente da morosidade ou da aceleração do
ritmo de trabalho do outro. Agora, com a automação, é o ritmo do motor que irá condicionar o
ritmo das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores. Neste estágio, interromper o processo
produtivo é gerar pane em todo sistema de produção. Ausentar-se de seu posto de trabalho é
interromper a seqüência das tarefas e criar condições desfavoráveis para a realização das
tarefas seguintes como danos para a quantidade e qualidade da produção.
O empresário, ao implantar a divisão e especialização do trabalho em sua empresa,
evidentemente, está procurando racionalizar o processo produtivo de modo a obter uma maior
produtividade e, por conseqüência, uma maior lucratividade. Entretanto, esta mesma divisão e
especialização do trabalho, muitas vezes, são utilizadas pelo empresário, ao mesmo tempo,
como técnica de produção e como técnica de dominação. Como técnica de dominação, a
divisão e a especialização do trabalho é acionada pelo empresário no momento em que o
trabalho executado integralmente pelo trabalhador torna-se um instrumento de defesa dos
interesses do trabalhador em detrimento dos interesses do próprio empresário. Quer dizer,
assim como a empresa está constantemente buscando técnicas para obter ampliação de sua
lucratividade e, com isso, garantir sua existência, também o trabalhador está constantemente
buscando mecanismos para gerar aumento de seu salário e melhorias em suas condições de
trabalho e de vida. Na própria práxis o trabalhador descobre que quanto mais sozinho ele
executa as tarefas necessárias para a produção de um determinado produto, isto é, quanto mais
o seu trabalho é executado sem a divisão dessas tarefas entre os demais trabalhadores e quanto
mais importante for o seu trabalho em termos de lucratividade para a empresa, mais êxito ele
terá em suas reivindicações. Este é um dos momentos em que a empresa utiliza a
fragmentação do trabalho como técnica de dominação. É nesse momento em que o
trabalhador descobre a importância de seu trabalho para a empresa e se sente orgulhoso de seu
ofício, que o empresário faz da divisão e especialização do trabalho uma técnica de
dominação. Dividir as tarefas que são executadas por um único trabalhador é depreciar o seu
poder de barganha. Neste caso, se a divisão do trabalho permite a intensificação do trabalho e
o aumento da produtividade, ela permite, também, o combate ao poder reivindicatório do
trabalhador.

6. Divisão do trabalho e dominação: um estudo de caso

Uma análise do processo produtivo de uma pequena indústria, do interior paulista, de


fusos para máquinas extrusoras de plástico, pode revelar como a divisão e especialização do
trabalho podem ser utilizadas pelo empresário, não só como técnica de produção, mas também
como técnica de dominação. Sua atividade principal sempre foi o recondicionamento de fusos
extrusores gastos e, especialmente a produção de fusos novos. Nesta atividade de reparo e
produção de fusos extrusores a indústria empregava cerca de cinqüenta trabalhadores, entre
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eles, projetista, técnicos administrativos, encarregados, soldadores, faxineiros, ajudantes


gerais, vigias, torneiros mecânicos, ajustadores, frezadores que se ocupavam com a
recuperação de fusos usados e um torneiro que se incumbia da produção de fusos novos.
O processo de recuperação dos fusos usados não exige mão-de-obra altamente
qualificada e as diversas tarefas são divididas entre diversos trabalhadores. O fuso extrusor
gasto, depois de chegar na indústria para a recuperação, era conduzido por um ajudante até a
sessão de solda e, ali, o soldador preenchia de solda dura, em várias camadas, os filetes gasto
do fuso extrusor. Em seguida, o fuso era conduzido para a sessão de tornos onde algum dos
trabalhadores treinados fazia o lixamento da solda que rodeava os filetes extrusores. Depois
de sucessivos lixamentos com lixas grossas e finas, os filetes extrusores estavam recuperados
e o fuso era reconduzido para a sessão de frezas onde seria reparado o rasgo de chaveta do
fuso e, posteriormente, depois de inspecionada a recuperação, o fuso era reenviado para o
cliente que solicitou a recuperação.
Nas diversas etapas de produção de fusos novos, conforme Figura 1, eram envolvidos
apenas um torneiro altamente especializado e um ajudante que era necessário quando o fuso a
ser feito fosse muito pesado. O ajudante era necessário para o deslocamento do material, do
depósito para o torno e do torno para a embalagem. Auxiliado pelo ajudante, o torneiro
buscava o material no deposito, serrava-o no comprimento aproximado, tirava as rebarbas do
material e fazia dois furos de centro, um em cada uma de suas extremidades laterais para fixá-
lo no torno mecânico. Depois que o material – tarugo de aço bruto que, às vezes, tinha 4
metros de comprimento e 40 centímetros de diâmetro – ia para o torno e ali era fixado, o
ajudante era dispensado até quando o fuso estivesse pronto necessitando ser retirado da
máquina. Conforme a figura 1, com o material no torno, o torneiro, numa primeira etapa,
desbastava os diâmetros em medidas aproximadas e, feito isto, a próxima tarefa a ser
executada – sempre pelo mesmo torneiro – era rosquear, ou seja, dar a forma ao filete extrusor
– um trabalho minucioso que requeria muita perícia do torneiro no manuseio dos dispositivos
. Terminada esta operação, isto é, dada forma ao filete extrusor, a próxima tarefa do torneiro
era fazer uma rosca comum na extremidade esquerda da peça. Depois disso, o mesmo torneiro
iria adaptar um aparelho no torno para fazer dele uma freza e abrir um rasgo de chaveta na
extremidade onde foi aberta a rosca comum. Por fim, depois de vários dias na construção do
fuso, o próprio torneiro – com uma lixadeira adaptada ao torno – fazia o acabamento final nos
filetes e no fuso como um todo para, finalmente, parar e contemplar sua obra de arte e
orgulhar-se de seu trabalho.
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Figura 1: Etapas de produção de um fuso extrusor.

Fonte: Desenho de José Otacílio da Silva

Esta produção de fusos novos, por ser a atividade mais lucrativa da empresa, era a
função melhor remunerada, e por isto o torneiro produtor de fusos novos obtinha mais
prestígio tanto diante da empresa como diante dos demais trabalhadores. Nesta situação, o
conflito entre empregado e empregador era inevitável. De um lado, o torneiro, ciente da
importância de seu trabalho para a empresa, se achava no direito e com força bastante para
reivindicar e obter aumentos salariais e outras regalias. Neste caso, a demissão do torneiro não
seria desejável, pois um torneiro recém admitido levaria de oito a doze meses para adquirir a
habilidade do torneiro demitido. Portanto, demitir o imponente torneiro significava admitir
outro torneiro impotente, mas inoperante; significava diminuição da quantidade da produção e
deterioração da qualidade do produto. A saída encontrada pela empresa foi dividir as tarefas
necessárias na confecção do fuso entre os diversos trabalhadores. Mesmo estando a matéria-
prima fixada, durante todo o processo de produção, em um mesmo torno mecânico, cada
tarefa era designada a um trabalhador específico, ao invés do mesmo torneiro executar todas
as tarefas. Quando um trabalhador terminava a tarefa que lhe era designada, o outro se dirigia
ao torno mecânico para executar a tarefa seguinte e assim sucessivamente até o término da
construção do fuso.
Com a divisão das tarefas necessárias para a construção do fuso, a força de trabalho
haveria de se curvar diante da astuta decisão empresarial. O torneiro que antes era orgulhoso
de seu trabalho, daí para frente, faria apenas uma das tarefas e as demais por outros
especialistas. Não poderia mais se vangloriar por transformar materiais brutos numa obra de
arte; por transformar materiais brutos em caríssimas peças que iriam proporcionar esplêndidos
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lucros para a empresa. O material bruto que antes saia do deposito diretamente para seu torno
e dali saia minuciosamente acabado para o uso, agora tem que passar por várias mãos, embora
numa mesma máquina. O ajudante busca o material no deposito e o entrega para o serrador
fazer o corte no comprimento necessário. Depois o material cortado é entregue ao ajustador
que tira suas rebarbas e faz os furos de centro das extremidades. Em seguida o torneiro faz a
rosca extrusora e outro torneiro, a rosca comum da extremidade do fuso. Agora, o rasgo de
chaveta é feito por um frezador e não mais pelo torneiro versátil. Finalmente, outro torneiro se
incumbe de dar o acabamento e polimento final. Subdividiu-se o trabalho não só para
aumentar a produtividade, mas também para amesquinhar o trabalho e coibir as reivindicações
do trabalhador. .

7.Conclusão

A divisão do trabalho que, num primeiro momento, ocorreu espontaneamente entre as


tribos primitivas, com o advento da propriedade privada, das inovações tecnológicas e,
particularmente, do capitalismo, se expandiu em especializações com o propósito deliberado
de ampliar a produtividade do processo produtivo e, assim, a lucratividade do capital. Com
este propósito, a divisão e especialização do trabalho puderam ser utilizadas tanto como uma
técnica de produção quanto, como foi mostrado em um estudo de caso, como uma técnica de
dominação, isto é, como um instrumento de imposição dos interesses do capital sobre os
interesses do trabalhador. Em ambos os casos, o que o capitalista busca é a manutenção ou
ampliação da taxa de lucros.

8. Bibliografia

BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista. Rio de Janeiro: Zahar, 1980.


DURKHEIM, Emile. A ciência social e a ação. São Paulo: Difel, 1975.
DURKHEIM, Emile. A divisão social do trabalho. Lisboa: Presença, 1984.
MARX, Karl. O Capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.
ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1984.

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