Sie sind auf Seite 1von 406
™ A. S. Neill i (Summerhill) _ pretécio de Erich Fromm Hh LIBERDADE SEM MEDO SUMMERHILL talvez seja_a escola menos comum déste mundo. Trata-se de um lugar ‘onde as criangas no sfo.obrigadas a ie as aulas — podem deixar de assitir a Uigdes dus ante anos, se asin 0 quiserem. - Contudo, « bastante estranhamente, o¢ meninos ¢ meninas dessa escola APRENDEM! "E, na. verdade, 0 fato de serem privados das ligbes chega a set considerado um castigo severo. SUMMERHILL hi quase quarenta anos vem sendo dirigida por A.'S. Neill. E'a maior expe- rimentagio do. mundo ‘na outorga de lieido amor, ¢ aprovagio, & erianea. 0 lugar onde tum homem corajoso, apoiade por carajoros, teve a fortaleza de aplicar realmente — e sem reservas — 05 prinefpios da lberdade © da no: repressio, A escola movimenta-se sob um verdadeito go. vémo de criancas, onde os “patrbes” sio elas préprias. “Apesar da crenga comum de que tal Aatmosfera ctiaria uma quadritha de moleques incontrolaves, 05 visitantes de SUMMERHILT. ficam impressionados com a disciplina imposta si priprios pelos alunos, com sua alegria, ¢ fom suas boas mane'ras. Aquelas eriangas mos- tram uma simpatia e uma auséncia de descon- fianga em relagio aos adultos, que € a mara- vilha e 0 encanto mesma dos investigadores escolares oficiais da Tnglaterra. Neste livro, A, 8. Neill expressa, francamente, ies tinieas — e sadicate ~ quanto a0 aspeetos importantes da paternidade v da edu ‘eagio das eriangas. Muttas recomendagdes de feducadores, autores, socidlogos, psicdlogos. ¢ profess6res’famosos atestam que todos oF pais que lerem_éste livro encontrario néle ‘mui ‘exemplos de como se pode uplicar a files dde Neill as situagdes cotidianas. Os educs- ores achario inspiradores e priticos os pontos evista renovadores de Neil A leitura daste livro é uma experigneia escep- mente agradivel, pois que éle di pala- ‘ras aos sentimentos mais profundos de quan- tos se predcupam com as vriangas «© desejam vé-las aleangar uma vida feliz ¢ proveitoss, LIBERDADE SEM M&DO Sumani, Biblioteca “TEMAS MODERNOS” ~ 20 = Volumes publicados: - C. H. Thigpen = TAs Trés Faces de Eva” J.-A. M. Merlo. -- “O Rapto do Espirito” J. M. Murtagh e Sarah Harsis “Atire a Primeira Pedra” G.L-Kline “Bducacdo Sovistica” “A Longa Marcha" Simone de Beauvoir “Apocalipse do Atomo” Fernand Gigon brad Gerard Sparrow “Crimes em Desfile” Amold J. Toynbee = "De Leste a Oeste” Robert C. Cook — “Fertilidade Humana” E, Lancaster e J. Poling — “A Face Final de Eva” Martin Gardner - “Manias ¢ Crendices” Lucien Barnier = “A Nova Giéncia dos Sovtéticos” fean Rostand ~ "Fandticas ¢ Sébios” ‘ance Packard = “A Conquista do Prestigio Pes- soal” ‘Vance Packard ~ "A Nooa Téonica de Concen- cer’. Vance Packard ~ — “A Estratégia do Desperdicio” te , A. «par YP LIBERDADE “ SEM MEDO Preffcio de Soxmeesim, ERICH FROMM Radical Pransformacao na | Teoria e Tradugio de na Pratica da Baveagio Nair LACERDA 98 edigto TBRASA ‘h, Insiwisdo Brasileira de Difusdo Cultural S.A. «*0¥38, sores BOF Titulo do original inglés: ‘Summerhill Copyright 1960 Hart Publishing, Co, y Os! versos de O PROFETA, de Keblil Gibran, so reproduzides com permissio’do editor Alired. Knopf K Ine, Copyright 1025 by Kahlil Gibran, renovado em 1951 por Administrators CTA. of Kahlil Cib-an Estate, © Mary G. Gibran, t Ciaigo para obter tum livre guske V-20 Copa de Federico SPITALE 1970 Direitos exclusicos para a lingua portuguésa da TBRASA Instmrvigio Baasiiema pe Dervsio Cuurunat. S.A. Pea. D. Jost Gaspar, 134 - 8° and, - ej /83 - Tels, $7-5266/32-1008 - S.P. ‘ As criancas do Futuro, por nascer, Quando pagina tal puderem ler, Saberio que nos tempos do passado © Winuiase Bugs, Um crime o doce amor era julgado, Ys vir Teus filhos ndo sao teus filhos. Sao fithos ¢ filhas da Vida, anelando por si prépria, Vem através de ti, mas ndo de ti, E embora estejam contigo, a ti ndo pertencem. Podes dar-lhes teu amor, mas néo teus pensamentos, Pois que éles tém seus'pensamentos préprios. Podes abrigar seus corpos, mas ndo suas almas. Pois que suas almas residem na casa do amanhd, que ndo podes visitar sequer em sonhos. Podes esforcar-te por te parecer com éles, mas néo procures fazé-los semelhantes a ti, Pois a vida ndo recua, ¢ ndo se retarda no ontem, Tu és 0 arco do qual teus filhos, como flechas vivas, sd0 disparados "Que a tua inclinagao, na mao do arqueiro, seja para a alegria, Kanu. Ginran var A HAROLD H. HART Espero que receba tanto crédito (ou tantas cer- suras) quanto ev, por ésto livre. Sua atuagio nia foi apenas a de um editor, mas a de um crente no (que Summerhill féc, e esti fazendo, Sua pacitncia causou-me estupefacio. Escolher mi- Ihares de palaveas nos mens livros mais antigos, re visiclas, © combind-las com material ndvo — fol tarofa Em sua visita & escola, mostrou que sua preoen- gio principal era contar 4 Amésica algo do. qu> viv © gostou, Algo em que acreditou, Vin tudo quanto era fundamental, e fgnorou, com téda a razic, (9 que no importava, como, por exemplo, desi lino de eriangas felizes. Por éste meio eu o elejo aluno honorivio de Sum- meri A. S, Neill Outubro, 30, 1959 Summerhill, Liston, Suffolk, Inglaterca INDICE Profécio, por Erich Fromm ...... ‘Uma palavra de Introdugio, pelo Autor . I. ESCOLA SUMMERHILL A Idéia de Summerhill wees Uma Vista de Olhos a Summerhill 2.2.2... ‘A Educagio de Summerhill versus Educacio Padronizada © Que Acontece Com Os Que Se Forman Em Summerhill wees Ligdes Particulares Em , Summerhill... Autonomia Co-educagio Trabalho Diversio Teatro Danga e Misica Esporte © Jogos . Relatério dos Inspetores do Govdeno Britinico Notas sébre 0 relatério dos Inspetores de Sua Majestade O Futuro de Summerhill BR 22, a7 32 4a Bl 54 37 61 66 6s 70 80 83, xL IL TI. xu EDUCAGAO DE CRIANGAS A Crianga Sem Liberdade A Crianga Livre .....cceceecee Amor e Aprovagio Meédo Tnferioridade © Fantasia ‘Tendéncia A Destruigio Mentiras Responsabilidade ..... Obediéncia © Disciplina Kecompensas e Castigos Defecagio ¢ Hibitos de Higione Alimentagio Saride ¢ Sono Limpeza e Roupas « Brinquedos Rumor Maneiras Dinheiro Humor SEXO Atitudes Em Relagio a0 Sexo... Instrugio Sexual Masturbagio Nudez Pornografia ... Homossexualidade ....+ Promiscuidade, Iegitimidade e Aborto... 89 110 16 124 129 136 42 M4 151 160 164 169 im 115 uw 179 184 187 191 202, 212 214 217 219 IV. RELIGIAO E MORAL Religiéo . 225 Instrugio Moral 231 Influenciando a Crianga 238 Blasfémias © Tnsultos ... . 241 Censura esses ceteteceeens MME Vv. PROBLEMAS DAS CRIANCAS Crueldade © Sadismo seeseetteteeree OBL Criminalidade ........0++ 254 Roubo 258 Delingiiéneia . 263 A Cura da Crianga 269 ‘Estrada para a Felicidade. 274 VI. PROBLEMAS DOS PAIS Amor ¢ Odio ..... 281 Estragando a Crianga 285 Poder ¢ Autoridade 288 Cities 295 Divéreio wee 301 Ansiedade dos Pais 303 ‘Compreensio dos Pais 309 VIl. PERGUNTAS E RESPOSTAS Em Geral 319 ‘Sébre Summerhill 324 xu xv Sébre a Educacdo de Criancas .... Sobre Sexo Sobre Religito Sobre Psicologia Sobre Aprendizado Referencias 331 344 348 351 354 356 LIBERDADE SEM MRDO Sunnceneuns, Prefacio de Erich Fromm Tr Durante o século dezoito as idéias de liberdade, democracia @ autodeterminacio foram proclamadas por pensadores pro- gressistas, e, & altura da primeira metade do século vinte, tais idéias surgiram com proveito no campo da educagio. O prin- cipio bésico de tal autodeterminacio era a substituigio da autoridade pela liberdade, ensinando-se a erianga sem uso da férga, e sim através do apélo & sua curiosidade e as suas ne- cessidades espontineas, ganhando assim 0 interésse dela para © mundo que a rodeia, Essa atitude marcou o inicio da edu- cago progressiva ¢ foi passo importante no desenvolvimento {umano, Contudo, os resultados do névo método foram, muitas vézes, desapontadores. Nos iiltimos anos instalou-se reagio crescente contra a educagdo progressiva. Hoje, muitas pessoas acreditam gue a propria teoria seja errdnew devendo ser posta de Indo, forte tendéncia para obter cada vez maior disciplina, ‘hé, mesmo, uma campanha no sentido de que se permita aos professdres’ das escolas piblicas a aplicagio de castigos corpo- rais aos alunos, Talvez 0 fator mais importante nessa reagio seja o notével sucesso obtido pelo ensino na Unio Soviética. Ali, os mé- todos antiquados de autoritarismo sio aplicados com todo o ri- gor. E os resultados, no que se refere a conhecimentos, parecem indicar que agirfamos mais acertadamente voltando 3s velhas disciplinas, pondo de parte a questi da liberdade da crianca, Serd errénea a idéia de educagio sem emprégo da férca? Mesmo quando nfo 0 seja, tedricamente, como explicar seu relativo maldgro? : Acredito que a idéia da liberdade para as criangas ndo seja errada, Mas, foi, quase sempre, pervertida. A fim ce discutir com clareza 0 assunto, devemos, antes de mais nada, compre- ender a natureza da liberdade. Para tanto, devemos estabe- xv Tecer a diferenga entre autoridade manifesta e autoridade and- ‘A aiiforidade manifesta é exercida direta ¢ explicitamente. A pessoa que a exerce fala com franqueza aquela que The esta submetida: —Deve fazer isto, Se nfo o fizer, determinadas sangGes The serio aplicadas. A autoridade andnima tende a esconder que a fora esti sendo empregada, Faz de conta que ndo hd autoridade, que tudo € feito com’o consentimento de cada qual. O professor do pasado dizia a Johnny: —Deves fazer isto. Se nao fizeres, eu te castigarei, professor de hoje diz: =Tenho certeza de que gostards de fazer isto. Aqui, a sangio por desobediéncia nfo & 0 castigo corporal, mas 0 rosto penalizado dos pais, ou, 0 gue € pior, o levar consigo a sensacio de nfo estar “ajustado", de nao agir como os demais. A autoridade manifesta usava a forea fisica, ¢ au- toridade andnima emprega a manipulagio psiquica, ‘A. modificagio da autoridade manifesta do século dezenove para autoridade anénima do século vinte foi determinada elas necessidades de organizagio de nossa sociedade indus- trial modemna. A concentracio do capital leva A formagio de emprésas gigantescas, dirigidas por burocracia hierirquicamente organizada, Grande aglomerado de trabalhadores ¢ funcioné- ios trabalha em conjeinto, sendo cada individuo uma parte de vasta méquina de produgio organizada, que, para bem fun- cionar, deve fazé-lo sem dificuldades, nem interrupedes. © tra- balhador individual torna-se. apenas 'um_parafuso_em_til-mé- quina, Nessa organizagio de produgio 0 individuo é dirgido manipulado. Na esfera do consumo (na qual se tem a impressio de que © individuo expressa livre escolha) também éle 6 dirigido manipulado. Se no consumo de comida, de roupas, de -be- bidas, de cigarros, de programas de ridio e televisio, um poderoso aparelho de sugestio trabalha com dois propésitos Aumentar constantemente 0 apetite individual para novas como- Alidades, c, sogundo lugar, drigir tal apetite aos canals mais proveitosos para a indiistria, O homei & transformado no a8 TES consumidor, no etemo pimpotho de mama, eujo tinico desejo € consumir, cada vez mais, “melhores” coisas. Nosso sistema econdmico precisa criar homens que se adap- temi as suas Hecessidades, homens que cooperem hamoniosa- “mente, Tiomens que desejem consumir cada vez mais. Nosso sistema precisa criar homens cujos gostos sefam padronizados, homens que possam ser influenciados com facilidade, homens cujas necessidades possam ser conhecidas com antecipacao. ‘Nosso sistema precisa de homens que se sintam livres ¢ inde- pendentes, mas que, apesar disso, estejam dispostos fazer 0 que déles se espera, homens que se ajustem 4 maquina social, sem friecio, que possam ser guiados sem o emprégo da forca, que possam ser liderados sem Iideres, e que possam ser diri gidos sem qualquer ontro alvo que nao seja “ter sucesso”(*) Kautoridade no desapareceu, nem mesmo perdeu seu vigor, mas foi transformada de autoridade manifesta em autoridade andnima de persuasio e sugestio, Em outras palavias, para ser adaptivel, o homem modemo é obrigado a nutrir a ‘ilusio de que tudo é feito com seu consentimento, mesmo quando ésse consentimento Ihe é extraido através de sutil manipulacio. Seu consentimento & obtido, sim, mas atrés de suas costas, para além de sua conseiéncia, Os mesmos artificios sio empregados na edueagio progres- siva, A crianca é forgada a engolir a pilula, mas a esia pilula aplica-se uma cobertura de agiicar. Pais ‘e professdres tém confundido a auténtica educagao despida de autoritarismo com educagio por meio de persuasdo e coacdo ocultas. Assim, educagao progressiva foi rebaixada. Malogrou no tornar-so 0 que se pretendia que ela fésse, e nunca se desenvolveu como se esperava. Ir ~ O sistema de A. §. Neill & uma aproximagio radical no que se refere & educagao da crianga. Em minha opinizo, éste livro 6 de grande importincia, porque representa o verdadeivo prin. efpio da educagio despojada de médo, Na Escola Summerhill 8 autoridade nao mascara um sistema de manipulagio. ida, ver" The Bane’ Sisley, ES 18 xX Summerhill nfio exp6e uma teoria: relata experiéncia de ‘quase 40 anos, O autor sustenta que “a liberdade funciona”. s prineipios fundamentais do sistema de Neill sio apre- sentados de maneira simples e inequivoca neste livre. Em resumo, so os seguintes: 1-Neill mantém £€ inquebrantével na *bondade. da crianga” Acredita que a crianga nfo nasce deformada, covarde, nem como autémato destituido de alma, mas tem’ amplas poten- cialidades para amar a vida e por ela se interessar. 2-0 alvo da educago-que vem a sero alvo da vida~é trabalhar jubilosamente ¢ encontrar felicidade. Ter felicidade, segundo Neill, significa estar interessado na vida, ou, como diria eu, é atender a apélo da vida nfo apenas com o cérebro, ‘mas com téda a personalidade. 3-Na educagio, o desenvolvimento intelectual nio é 0 bas- tante, A educagéo deve ser ao mesmo tempo intelectual _e emocional, Na sociedade moderna encontramos uma separagio cerescente entre cérebro e sentimento, As experiéncas ‘do homem, hoje, so mais, e principalmente, experiéncias do pen- samento, e niio o reconhecimento imediato do que 0 coragio sente, os olhos véern, e os ouvidos ouvem, Realmente, a sepa- ragio entre 0 inteleto ¢ 0 sentimento levou 0 heme. 10 leno a um estado mental que se aproxima do eesquiziide ¢ no qual ale se tomou incapar ‘de ter qualquer eipeencia ‘nfo ser através do pensamento. 4A educagio deve ser entrosada com as necessidades pst- quicas da crianga, A crianca nfo é altrufsta, Ainda nio ama, no sentido do amor amadurecido do adulto. & um érro es- rar de uma crianga algo que ela s6 pode exibir de maneira ipécrita. O altruismo se desenvolve depois da infancia 5—Disciplina e castigo, dogmaticamente expostos, geram médo, ¢ médo gera hostilidade..Tal hostilidade pode nio ser consciente e manifesta, mas, apesar disso, paralisa o es‘drgo e 1 autenticidade do sentimento. A disciplina extensiva imposta as criangas é prejudicial e impede o desenvolvimento psiquico sadio, =Liberdade nao significa licenca. Este principio, muito importante, no qual Neill insiste, diz que o respeito pela pessoa deve ser miituo, Um professor nao usa de fdrca contra 9 crian- Gi, nei a crianga tem o direito de usar de forga contra o pro- xX fessor. Uma erlanga nfo pode impor ao adulto s6 por ser lima erjanca, nem pode a erianga suportar a pressio Aue de varias maneiras The impoem. fealitinamente relacionads com éste principio est a neces- sidade_do_uso.deverdadeira sinceridatle por pari ee eee qué iiunea, om seus 40° ands de tabblo cm Summerhill, mentiv a uma crianga, Quem quer que leis éste livro ficard_convencido de que tal’ afirmativa, embers possa parecer € a simples verdade. 50 desenvolvimento humano toma necessirio que a cri- Anca corte, eventualmente, os lagos esseneiais que 4 ligam. 4 seu pai e a sua mae, ou a substitutes posteriores, na sociedad, a fim de tomarse de fato independente. Deve aprender enfrentar 9 mundo como individuo. Deve aprendee a pro- curar a seguranga, néo num apégo simbélico, mas em sua Cope. cidade de reconhecer 0 mundo, intelectual, emociona: e artieth Gamente, Deve usar de_tédas_as suas {Orcas para conseguir, yatio com 0 miindo, em lugar de procurar seguranga. atravér de ‘submissio ou dominio, ” 9~Sentimentos de culpa tém, antes de mais nada, a fungéo dle pronder a etianga & autoridade, Sentimentos de’ culpa ado. empecilho para a independéncia: iniciam tum ciclo que’ oscila: constantemente entre a rebeligo, 0 arrependiment, a sub. missio, ¢ nova rebelifo. Culpa, tal como é sentida pela tmaioria das pessoas em nossa sociedade, no 6, principal» Mente, reagioavoz_da_consciéneia, ‘mas, essendalmente, compreensio da desobediéncia contra a autoridade, ¢ médo di. represilia. Nao importa que a punigéo seja representada, por castigo corporal, pela privacio do amor, ou pelo fao det se conseguir que 0 castigado so sinta como um intruso em sou meio. Todos ésses sentimentos de culpa geram médo, ¢ 0 médo gera hostilidade © hipocrisia. \ 10-A_Escola Summerhill _néo oferece_educacao_religiosa.. Entréianto, tal coisa néo significa que Summerhill deixe de Se interessar por aquilo que nos podemos referir, vagamente, comio valézes Ihumanisticos basfeot Neill vole questio de maneira sucinta: “A batalha nfo é entre os que acrecitam ne teologia e os que it sim entre os que. acredi tam mab ide Thumana eos quo acreditam na su Bresso da Miberdade humana.” O- autor continua: “Algam dia, “uma nova geragdo deixar de aceitar a religiio © os xx mitos obsoletos de hoje. Quando essa nova religifo vier, seré para recusar a idéia de que o homem nasceu em pecado. Essa nova religiZo Iouvari Deus por ter feito os homens felizes.” Neill & um critico da sociedade dos dias presentes. Insiste em que a especie de pessoas que se esté desenvolvendo nela & 4 do homem*asea, “Estamos vivendo numa sociedade hnensa"™ ¢ “a maior parte das nossas priticas religiosas é impostura.” Bastante lbgicamente, o autor é internacionalista, ¢ mantém a opinigo, firme ¢ intransigente, de que a disposigio para a guera_é_um barbaro atavismo da raca_humana., ~ } Realmente, Neill nfo tenta educar criancas para se ajusta- | rem bem & ordem existente mas empenha-se em educar exiangas que se tomnarao séres humanos felizes, homens e mulheres cuja nogio de valores nao seja a de ter muito mas a de ser. Neill 6 um realista, Sabe que mesmo quando as criangas que educa nfo venham a ser necessiriamente grande sucesso no sentido | mundano, terdo adquirido senso de autenticidade que evitari, com eficféncia, que se fagam desajustadas, ou miseréveis men- digas. O autor tomou uma decisio entre o desenvolvimento integral humano e 0 éxito integral de mercado, ¢ é intransi- gentemente honesto na mancira pela qual segue a estrada que leva ao fim escolhido, ur Lendo éste livro, eu me senti grandemente estimulado e en- corajado. Espero ‘que 0 mesmo aconteca a muitos leitores. Nao quero dizer com isso que esteja de acérdo com tédas_as declaragées do autor. E, certamente, a maior_parte dos lei- t éste livro’ como se se, tratasse_do_Evargelho, Estou certo de que~o autor seria o tltimo a desejar que tal coisa acontecesse. Posso me referir a dois pontos sébre os quais fago minhas principais reservas. Acho que Neill, de certa forma, subestima 4 importincia, o prazer, a autenticidade de uma comprecnsio intelectual do mundo, preferindo-the compreensio-artistica e “emocional. Ainda mais, o autor esté embebido nas suposicdes de Freud, e, ao que ‘me parece, como que superestima a importincia do sexo, 0 que 6 de habito entre os freudiands. Ainda assim, fica-mé a impressio de que 0 autor é homem de tal forma realista e de tio genuina compreensio no que se XxxIT relaciona com a crianga, que estas minhas erfticas se referem mais a algumas de suas formulagdes do que & sua real atitude no que tange & crianga. Dou énfase & palavra “realismo” porque 0 que mais me im- pressiona na atitude do autor é a sua capacidade de ver, de discemnir entre os fatos ¢ a ficcio, para nfo se deixar levar pelas racionalizacoes e ilusdes segundo as quais a maioria das essoas vive, ¢ com as quais essas mesmas pessoas bloqueiam @ passagem da experiéneia auténtica. Neill 6 homem possuidor de uma espécie de coragem rara em nossos dias, a coragem de acreditar no que vé, e de com- Dinar realismo'com uma fé inabalivel na razio e no amor. Mantém para com a vida reveréncia intransigente, ¢ respeito pelo individuo. E um experimentador_e_um_observador, nao uum dogmatic tomado de interésse egoistico pelo que esta fazendo. Mescla educagio com terapéutica, mas para éle a terapéutica,nfo ¢ assunto separndo, cujo fim seria soluionar “problemas” especiais, porém, simplesmente, 0 processo que pode demonstrar A erianga que a Sida all teth Stim de ber compreendida, e nfo para que fujamos dela Ficara bem claro para o leitor que a experiéncia relatada neste livro no é das que podem ser repetidas muitas vézes na sociedade dos dias presentes. TsS0~acontece nio apenas por depender, para se realizar, de uma pessoa ext-aordindria como Neill, mas também porque poucos ‘pais tém_acoragem ne es pack pent ina Tales a “sucessa-déles. "Isso, entretanto, nid dimiar 2 tmportancla deste livro. Y¥ Embora nio_ exista hoje nos Estados Unidos uma escola semelhante a Summerhill, qualquer pai teri proveito com a presente leitura. Sao capitulos que o desafiam a revistar a propria atitude em relacdo a seu filho, Perecbera que a me- neira de Neill lidar com criangas 6 bem diferente daquela que muitas pessoas poem escamecedoramente de parte como “tolerante”. A insisténcia de Neill quanto a um certo equilibrio tas relagdes entre pais e filhos-liberdade sem licenca—é a expécie de pensamento’ que pode transformar radicelmente as atitudes no lar, Os pais refletidos vao ficar impressionados a0 compreende- rem 0 quanto de pressio e poder esto usando, inconseiente- mente, contra seus filhos. Bste livro fornecerd signifieagdes novas para as palavras amor, aprovacdo, liberdade. Neill fostra inquebrantével respeito pela vida e pela liber- dade, ¢ sua negativa é radical quanto ao uso de forca. As XML criangas educadas com tais métodos desenvolvem em seu in- timo as qualidades de razo, amor, integridade, coragem, metas da tradigso humanistica ocidental. Se tal coisa aconteceu um dia em Summerhill, poderd acon- tecer em téda parte—uma vez que as pessoas estejam prepa- © "| radas para isso. Nao hé, realmente, criangas-problemas, como diz o autor, mas apenas “pais-problemas”, ¢ “humanidade-pro- bleme”. Acredito que o"Gabalho de Neill-sesemente que ‘gerinmard. Com o tempo, suas idéias terlo aceltacdo geral uma sociedade nova, na qual o proprio homem, e sua ex- | pansio, sejam a meta’ suprema de todo 0 esférco social. xxIV Spl D&O p Uma Palavra de Introducio any Em psicologia, homem algam sabe muito. As fis interio- res da vida humana ainda se mostram largamente ocultas para nds, Desde que 0 génio de Freud a tornou viva, a psicetogia tem caminhado muito, mas ainda é uma ciéncia nova, éelineando a costa de continente desconhecido. Daqui a cingiienta anos ‘5 psicélogos com certeza sorriréo da nossa ignorincia de hoje. A partir do momento em que deixei a educacio e me voltei para a psicologia infantil, tenho tratado com téda espécie de ‘criangas-incendiérias, ladras, mentirosas, das que vrinam na cama, das de mau génio. Anos de trabalho intensivo no trei- namento da crianga convenceram-me de que sei relativamente pouco sébre as forgas que dio motivo A vida. Estox também Convencido, entretanto, de que pais, necessitados de tratar com seus préprios filhos, sabem muito menos do que eu. Por acreditar que a crianga dificil é quase sempre assim em conseqiiéncia de tratamento errado no lar, ouso dirigir-me aos ais, ual é a finalidade da psicologia? Sugiro a palavra cura LiSnk eeatade de talon, Sug. pslams ee ‘que tenho de escolher, como cbrés, 0 Taranja_c_o-pitto; nto muero ser curado do hibito de fumar; no quero ser curado ‘do hibito de gostar de uma garrafa de cerveja. Professor algum tem 0 direito de curar uma crianga do habito de fazer” ruldo com um tambor. A nica das curas que deveria ser praticada 6 a cura da infelicidade. ian difel_4-a.crlanga infllz,., Esté om hostiidade aberta consigo propria, €, em” conseqtiéncia, em guerra com todo mundo. © adulto dificil vé-se na mesma situagio. Jamais um homem| feliz perturbou uma reuniio, pregou uma guerra ou linchou tum negro. Jamais uma mulher feliz atormentou seu marido xxv = Th SS on seus fils. Jamais um homem feliz cometeu assssinio ou roubo, Jamais-empregador feliz assustou seus empregados "Todos 08 crimes, todos os Gdios, tOdas as gucrTis: podem relacionar-se com a infelicidade, Bste livro é uma tentativa para mostrar como surge a infelicidade, como essa infelicidade arruina as vidas humanas, e como as criangas podem ser edueadas de forma que tal infelicidade jamais surja. Mais do que isso: éste livro é a histéria de um lugar-Sum- merhill—onde a infelicidade das criancas é curada, e, 0 que & mais importante, onde as criangas sio educadas para a feli- cidade, XXVT UM ESCOLA SUMMERHILL A IDBIA DE SUMMERHILL Esta é a historia de uma escola moderna—Summerkill. Sum- ‘merhill foi fundada em 1921. Esté situada na-aldeia-de-Leiston fem Suffolk, Inglaterra, e fica mais ou menos a cem mithas de Londres. a Uma palavra sébre os alunos de Summerhill, Alguns para ali vao Com a idade de cinco anos, ¢ outros ja com quinze. {As criangas, geralmente, permanecem na escola até aleancarem os dezesseis anos, Temos, quase sempre, vinte ¢ cinco rapazes vinte menina: As criancas sio divididas em trés grupos etirios. O mais névo vai dos cinco aos sete anos, 0 intermediario dos oito aos dez, © 0 mais velho dos onze aos quinze. Contamos, geralmente, com um bom punhadinho de erianeas vindas de paises estrangeiros. No momento (196), temos cinco escandinavos, um holandés, um alemio ¢ um americano. ‘As criangas stio instaladas pelos grupos etirios, com uma smic-da-casa” para cada grupo. O5 intermedifrios dormem num edificio de pedra, os mais velhos dormem em cabanas. ‘Apenas um ou dois alunos mais velhos tém quartos parti Cculares. Os rapazes ficam aos dois, trés, ow quatro num dormi tério, e 0 mesmo acontece as meninas. Nao sofrem inspecio dos quartos ¢ ninguém vai apanhar 0 que éles deisarem fora do lugar, Fieam em liberdade, Ninguém Thes diz 0 que de- vem vestir, Usam a roupa que guerem, a qualquer momento. Os jomais chamam a isso uma “Escola-do-faga-o-que-quiser”, ¢ insinuam que se trata de uma reuniéo de selvagens primi- tivos, desconhecedores das leis e das manciras. Parece necessirio, portanto, que eur escreva a histéria de Summerhill tio honestamente quanto me seja possivel. Que feu 0 faca com certo partidarismo, é natural: ainda assim, tentarei mostrar os deméritos de Summerhill, tanto quanto seus méritos, que serio os que se referem ao fato de existirem 8 ali criangas saudavels, livres, cujas vidas niio estiio. contamt- tnadas pelo médo e pelo édio. / Obviamente, uma escola que faz. com que alunos ativos fi- [quem sentados nas carteias,estudando assuntos em sus maior | parte intteis, € uma escola mé. Sera boa apenas para os que 2 | Rereditam em esclas deste tipo, para os cldsiosno-eadaves que desejam criancas déceis, nfo criadoras, prontas a se adap- tarem a uma civilizagIo cujo marco de sucesso é 0 dinheiro. Summerhill comecou como escola experimental. Ja nio o é. Agora, é uma escola de demonstragio, pois demonstra que a liberdade funciona. ” " Quando minha primeira espdsa e eu comegamos a escola, tinhamos uma idéia principal: fazer com que a escola se adap tasse as criangas, em lugar de fazer com que as criangas se adaptassem A’ eseola, Durante muitos anos eu havia lecionado em escolas comuns. | Conhecia bastante a outra férmula, Sabia que exa inteirsmente errada, Exrada por se basear numa concepgio adulta do que a erianga deveria ser e de como uma erianga deveria apren- der. A’ outra frmula datava dos dias em que a psicologia ainda era ciéneia desconhecida. Bem: resolvemos fazer uma escola na qual darfamos as criangas a liberdade de serem elas proprias. Para tivemos de renunciar_inteiramente a disciplina, ® directo, & sugesti6, a treinamento moral e A instrucao religiosa, Cha- iniiram=nds corajosos, mas isso nao exigia coragem. ‘Tudo quan- to requeria era 0 que tinhamos—crenea completa na crianca como ser bom, endo mau. Durante quase quarenta anos essa cerenga na bondade da crianca jamais vacilou, antes tomou-se 46 definitiva, Meu ponto de vista & que a crianga, de maneira inata, & sensata ¢ realista. Se fOr entregue a si propria, sem sugestio adulta alguma, ela se desenvolverd tanto quanto for capaz de se desenvolver. Logicamente, Summerhill é um lugar onde 8 pessoas que tém habilidade inata e desejo de se fazerem ceruditas, serao eruditas, enquanto as que apenas, sejam capazes de varrer ruas, varrerdo ruas. Mas, até agora, nio produzimos = yarredor de ruas. Nad escrevo isso para me dar ares, nrenbunt va , ar ares pois preferia antes ver a escola produzir um varredor de Fins feliz do que um erudito. neutdteo. Que tal é Summerhill? Bem, para falar numa das coisas: as “aulas, uli, dependem de opgio. As criangas poden, com- 4 arecer ou niio, e isso durante anos, se assim o desejarem. Ha um horério, mas s6 para 0s profess6res. ‘As criangas tém aulas, habitualmente, de acdrdo com a sua idade, mas, as vézes, de acdrdo com os seus interésses, Nao temos novos métodos de ensino, porque nao achamos que o ensino, em si mesmo, tenha grande importincia. Que uma escola’ tenha ou nio ‘algum meétodo especial para ensinar a dividir, & coisa de somenos, pois a divisio nao é importante se- do para aquéles que querem aprendé-la, E a crianca que quer aprender a dividir, aprenderd, seja qual for 0 ensino que receba, ‘As criangas que vém para Summerhill, destinadas ao jardim- da-infincia, assistem as aulas desde 0 infcio de sua estada, mas alunos provenientes de outras escolas juram que jamais tomario a aprender nenhuma estupida ligio em suas vidas, a tempo algum, Brincam, andam de bicilets, steno n0, ca minho dos outros, mas nfo querem saber de ligdes. Isso dura meses, em certos casos. O tempo de recuperacéo & propor: cional ao édio que trazem em relagio A thtima escola que freqiientaram, Nossa recordista, nesse ponto, foi ura gardta egressa de um convento. Vadiou trés anos. © periodo médio de reeuperagio, no que se refere & repulsa quanto a lighes, é de trés meses, Os estranhos a esta concepgio de liberdade esterio cogi- tando na espécie de casa-de-orates que deve ser exsa escola fem que as criangas brincam o dia inteiro, se assim 0 desejam. Muitos adultos dizem: —Se eu tivesse sido mandado para essa escola, rada teria feito em minha vida. Outros declara —Essas criangas vio sentir-se fortemente prejudicadas quan- do tiverem de competir com as que foram levadas a aprender. Penso em Jack, que nos deixa com dezessete anos para trabalhar numa fabrica de miquinas. Certo dia, o diretor-ge- rente mandou chamé-lo: =Vocé é 0 garoto que veio de Summerhill—disse éle~e eu estou curioso para saber que tal Ihe parece a edueacio que recebeu, agora que esté convivendo com garotos vindos das velhas escolas. Se tivesse de escolher novamente, iria para Eton ou para Summerhill? Oh! Para Summerhill, naturalmente—respondeu Jack, — Mas que oferece essa escola, que as outras niio oferecem? Jack cogou a cabega e respondeu, lentamente: Sei Iél Penso que dé a gente uma sensagio de completa autoconfianga, —Sim=disse o gerente, sécamente.—Reparei_nisso, quando voeé entrow nesta sala. ® jeu Deus!—riu Jack.—Lamento ter-The dado essa impressio. =Eu gostei—falou 0 diretor—A maior parte dos homens que ~chamo para aqui fica se retorcendo téda, parece sentir-se angustiada. Vocé veio como meu igual. A’propésito, para que departamento disse que gostaria de ser transferido? Essa histéria mostra que 0 ensino, em si mesmo, nio é tio importante quanto a personalidade ¢ o carater. Jack fracassou nos seus exames universitérios, porque detestava o ensino dos livros. Mas sua falta de conhecimento no que se referia aos Ensaios de Lamb ¢ & lingua francesa, nfo Ihe prejudicou a, vida. Hoje, 6 um bem sucedido mecinico. > Seja como for, ensina-se bastante em Summerhill. Talvez {um grupo dos nossos alunos de doze anos nao possa competir com uma classe de idade igual, em caligrafia, ortografia © fracoes, Mas, num exame que exigisse originalidade, nosso _grupo bateria ‘inteiramente os demais. Nao temos_provas de classe, em nossa escola, mas s-vézes organizamos um exame, como divertimento. As perguntas se- gtintes foram feta mun detest pose Onde se acha o que se segue: Madrid, a itha Quinta-Feira, ‘ontem, amor, democracia, dio, minha chave de fenda de béisa (ai de mim, para esta iiltima ndo houve resposta que valesse a pena). Dé as significacdes do que se segue: (0 ntimero mostra santas signficacdes sao eaperadas para cada palacra) Mao {aye apenas tres deram’ a tercela significa. cera: ¢ medida padrio para um cavalo. Metais (4)... metal, faces, altos oficiais do exército, ‘segdo de uma orquestra, Traduza o-“Ser-ou-ndo-ser” do Hamlet para Summerhiliense. Seré escusado dizer que tais perguntas nfo foram feitas a sério, e as criangas divertiram-se & grande com clas. Os re- ccém-chegados, em regra, nfio chegam a aleancar 0 padréo de respostas dos alunos que j4 estio aclimatados na escola. Nio se trata de serem menos capazes mentalmente, mas ce se terem de tal forma habituado a trabalhar numa trilha séria, que qualquer toque assim leve os deixa perplexos. Esse é 0 lado divertido do nosso ensino. Em tddas as classes trabalha-se bastante. Se, por qualquer razio, um professor 6 niio pode comparecer em determinado dia, isso & sempre um desapontamento para os alunos. Davi, de nove anos de idade, teve de ser isolado por estar com coqueluche. Chorou amargamente. =Vou perder a ligio de Geografia da Senhorita Roger!— protestava éle, Davi estivera na escola priticamente desde que niscera, ¢ tinha idéias definitivas ¢ categéricas quanto A necessidade de receber as suas ligSes, Hoje, Davi é explanador de matemé- tica na Universidade de Londres. Hi alguns anos, numa Assembléia Geral da Escola (na qual tddas as regras escolares 80 votadas pela escola inteira, Cada aluno e cada membro dp ‘compo, docente tendo um sot), al uém propds que certo aluno faltoso devesse ser punico com 0 slastamento dis aulay durante sete das, Os demats proves: f taram, alegando que seria castigo severo demais. Minka congregacio e eu nutrimos cordial aversio por tudo quai Para 6s, 0s exames. das. universidedes 20 uum ‘gndtemay Mas nao podemos recusar As criangas 0 ensino das matérias ali exigidas, Obviamente, enquanto existirem exa- pes des terio forga sObre ns. Daf o ser a congresagio de Summerhill sempre composta de professéres qualificados para ensinar pelos padrées estabelecidos. Nao que haja muitas criangas desejosas de fazer tais exames: s6 as que vio para a universidade passam por éles. E tais criangas nfo parecem achar grande dificuldade no en- frenté-los, Geralmente, comegam a’ preparar-se, sériamente, com a idade de catorze anos, e passam trés anos dedicando-se a isso. Como é natural, nem sempre vencem na primeim tenta- tiva, mas 0 importante é que tentem outra vez. Talver, soja Summerhill a escola mais feliz do mundo. Nao temos vadios, e dificilmente aparece um caso de nostalgia do lar. Musto raramente temo brigas, Diseusfes, sim, mas poucas vézes testemunhef uma daquelas lutas a punhos que tinhamos, quando ézamos rapazes. Raramente se ouve uma cr 1, porque as eriangas, quarido em liberdade, tém muito-menos édio a expressar do que quando sio oprimidas. Odio gera édio, amor gera amor. Amor significa ser favordvel A crianga, ¢ isso & essen- cial em qualquer escola. Nao se pode estar do lado da crianca, se a castigamos e repreendemos violentamente. Summerhill & uma escola em que a crianga sabe ser vista com aprovacio. Compreendam, entretanto, que nfio estamos acima ou além das fraquezas humanas. Passei semanas plantando batatas, 7 oi oito plantas arrancadas, em junho, fiz um barull n, havia uma diferenga entre o barulho que fiz eo q um autoritirfo,Meu rebuligo referia-se a batatas, mas o do autoritdrio arrast © campo moral—do direito ¢ do errado. Eu ni cerrado _rouba s hatatas, nfo fiz disso-uma_questio de bem_ou de-mal. Fiz barulho porque se tratava das minhas batatas. Exim minhas @ nfo deviam ter sido tocadas. Espero estar fazendo bem clara a distingio entre as duas atitudes.. Deixe-me dizer isso de uma outra maneira, Para as cri- angas, no sou autoridade que temam. Sou igual a clas, ¢ 0 barulho que fiz por causa das minhas batatas nao teve, # seus olhos, significagio maior do que o barulho que um ¢os ra- pazes poderia ter feito se encontrasse furado um dos preuma- ticos de sua bicicleta. Nao hé perigo em armar_barulho com. uma criana, quando 6 fazemos-em_térmos de igualdade, ‘Bem, alguns dirio: —Tudo isso & discurseira. Nao pode haver igualdade. Neill 6 0 chefe, 0 maior e o mais sensato. Isso 6 realmente verdade. Sou 0 chefe, € se houvesse um incéndio na casa as criangas correriam para mim, Sabem que sou maior e tenho mais conhecimentos, mas isso no importa quando as enfrento em seu préprio terreno, no caso 0 canteiro de batatas. Quando Billy, de cinco anos de idade, me mandou sair de sua festa de aniversirio porque eu nao fora convidado, sai imediatamente, tal como Billy sai do meu gabinete quando eu nio desejo a companhia déle. Nao é facil descrever ésse tipo de relagdes entre professor © aluno, mas todos os visitantes de Summerhill sabem 0 que quero dizer quando afirmo que essas so as relagées ideais. Vé-se isso na atitude para com o pessoal em geral. Rudd, 0 professor de Quimica, é chamado Derek. Outros membros do pessoal sio conhecidos como Harry, Ulla, Pam, Eu sou Neill ¢ a cozinheira é Esther. Em Summerhill todos tém direitos iguais. Ninguém tem licenga para usar meu piano de cauda e eu nfo tenho licenca para usar a bieicleta de um dos garotos sem a sua permissio. Na Assembléia Geral da Escola o voto de uma crianga de seis ‘anos-conta tanto quanto.o_meu., —Mas—dizem os sabidos—na pratica, naturalmente, os votos dos adultos contam. A erianga de seis anos no espera para ver como votam os outros, antes de levantar a propria mao? certa primavers, © quand 8 Eu As vézes gostaria que assim fdsse, pois muitas des minhas roposigbes tém sido recusadas.Criancus lives no se defsam influenciar facilmente. A auséncia do médo explica ésse fend- meno. Realmente, a auséncia do médo € a coisa mais bela que pode acontecer & uma erlang: ‘Nossas eriangas no tém medo do pessoal da escola. Uma das nossas regras € que depois de dez. horas da noite deve reinar siléncio no corredor de cima. Certa noite, mais ou menos 3s onze horas, Iutas de travesseiros se estavam tra- vando ali, e eu deixei minha escrivaninha, onde trabalho, para yrotestar contra o ruido. Quando cheguei ao alto da escada, Fouve um tropel de pés, e-0 corredor aparece vacio © silew, cioso. De sibito, ouvi uma vor desapontada exclamar: —Ora bolas! E s6 0 Neilll Imediamente a brincadeira recomegou. Quando expliquei que estava lé embaixo tentando eserever um livro, mostraram-se preo- caps ¢ concordaram em acabat com o barulho, Sus coreria tinha sido provocada pela suspeita de que fosse 0 funcionario dla noite (umn dos de sia propria idade) que estivesee chogund, Insisto na importéncia da auséncia de médo dos adultos. Uma crianga de nove anos viré contar-me que quebrow uma vidraga com a bola. Conta-me, porque nio receia provocar eélera, ou indignada prelegio moral. Pode ter de pagar pela vidraga, mas no deve recear descomposturas ou castigos. Houve uma ocasiéo, hé alguns anos, em que 0 Govérno Escolar renunciou ¢ ninguém se apresentou para as eleigdes. Servi-me da oportunidade para Iangar um manifesto: “Na auséneia de Govérno, eu, abaixo-assinado, declaro-me Gitador. Heil Neill!” Depressa houve murmiitios. Pelo correr da tarde, Vivien, de seis anos, veio ter comigo e disse: Neill, quebrei uma vidraga, Fizlhe sinal para que se fésse dali. =Nao me incomode por causa dessas coisinhas. Um pouco mais tarde éle voltava, dizendo que quebrara duas vidragas. A essa altura fiquei curioso e perguntefIhe que hist6ria era aquel —Nilo gosto de ditadores—explicou éle—e nio gosto ce passar sein a minha comida, (Descobri, mais tarde, te oposgue A ditadura tentado desforrar-se na cozinheira, que, prontamente, fechou a cozinha ¢ foi para casa.) —Bem—perguntei—e que vai fazer nesse caso? —Quebrar mais vidragas—declarou éle, obstinadamente. =Pois vi-falei. Ble foi. Quando voltou, anunciou ter quebrado dezessete vid:acas, Mss fique sabendodise,aninadamente—que pagarc por —Como? Com a minha mesada particular. Quanto tempo levaret para pagar tudo? Fiz um célculo rapido ¢ respondi: Mais ou menos dez anos. Por um instante le parece entistecer, mas Togo depois seu rosto iluminou-se: Ora bolas!—exclamou.—Néo tenho de pagar coisa nenbumal =E que se faz da regra sobre a propriedade privada?—indaguei. —As vidragas das janelas sio de minha propriedade privada, sei, mas agora nfo hi nenhuma regra de propridade privada. Nio ha govémo, e 0 govémo & que faz as regras. E talvez tenha sido a minha expressio que o levou a diz Mas, seja como for, pagaret as vidracas. No precisou pagar. Logo depois, fazendo eu uma confe- réncia em Londres, contei essa histéria, e, ao fim da minha palestra um jovem aproximou-se e entregou-me uma nota de tuma libra “para pagar as vidragas que aquéle demoninho par- tin”. Dois anos depois Vivien ainda contava aos demais a his- téria das vidragas ¢ do homem que as pagara: —Deve ter sido um télo terrivel, porque nem me tinha visto nunca. ‘As criangas estabelecem contato com estranhos muito mais facilmente quando nfo conhecem o médo. A reserva inglésa, no fundo, realmente, médo, e. por iss0 _0s_mais reservados sio os que tém maior fortuna. O fato de as criangas de Summerhill Serem excepcionalimente amistosas para com visi- tantes e estranhos é uma fonte de orgulho para mim € para © meu pessoal. Devemos confessar, entretanto, que muitos dos nossos_visi- tantessio pessoas, que interesam 8 cxiangas A espe, de visita mais Agradavel para elas é a do professor, especialmente do professor animado, que deseja ver seus cadernos e trabalhos escritos. A mais bem recebida é a visita que saiba contar fistnas de aventuras, viegens, ou, melhor do. que tds, de aviagio. Um jogador de boxe ou um bom tenista séo imedia- tamente rodeados, mas os visitantes que comegam a porejar teorias so postos’inteiramente de parte. 10 © comentirio mais freqiiente por parte dos visitantes é 0 de que se faz dificil distinguir entre membros do pessoal ¢ alunos, ei Summerhill, TE verdade: @ sensagio de inidade &” forte, quando as criancas sentem aprovagio, Nao ha defe- réncia para com um professor, como professor. Pessoal alunos tém a mesma comida e devem obedecer as mesmas leis da comunidade. As criancas se ressentiriam de qualquer privi- Iégio outorgado a0 pessoal. Quando eu tnha o hibito de fazer t6da a semana uma, pa lestra sObre psicologia, para a congregacio, havia murmirios aque disiam ho ser justo aquilo. "Made! ‘do plano passe! a fazer as palestras para todos que tivessem mais de doze anos. Tédas as tércas-feiras, 4 noite, meu gabinete fica cheio de animados jovenzinhos, que nfo sé ouvem como expressam livremente suas opinides. Entre os assuntos que as criangas me pediram que tratasse nessas palestras, estavam: “O Com- exo de Inferioridade”, “A Psicologia do Roubo”, “A Psico- logia_do_Quadrilhiefro”, “A Psicologia do Humor", “Por que o Homem se tomou um Moralista?” “Masturbagio”, “A Psico- eae Mugans™ © evident que tals riangas ito para a Si in conhiecimento amplo e claro sdbre si mesmas € sobre os demais, A pergunta que os visitantes de Summerhill fazem com mais freqiténcin 6: jas a crianga um dia no se voltaré contra a escola, cul- pando-a por ndo a ter feito estudar aritmética ou misica? A resposta & que 0 jovem Freddy Beethoven ou 0 jovem ‘Tommy Einstein ‘recusariam ser mantidos fora de sua esfera de aco. A fungio da crianga é viver sua propria vida, nfo a vida que seus pais, angustiados, pensam que elas devem levar, nem a que estd de acdrdo com os propésitos de um educador que imagina saber 0 melhor. ‘Téda interferéncia e orientagio por parte de adultos s6 produz uma geragio de robés. Niio se pode fazer criancas estudarem miisica ou qualquer outra colst sem de certa forma converte-las em aduos, deste tuldos de vontade, Sio modeladas como accitadores do satus quo—boa coisa para uma sociedade que precisa de ccupantes Sbedientes de Higubres escrivaninhas. de eatseitos de lope, de assageiros meciinicos do_subtirbio das 8,30—uma sociedade, para resumir, que vai sendo levada sdbre os ombros débeis de um homenzinho-o conformista morto de médo, Wn UMA VISTA DE OLHOS A SUMMERHILL Deixe-me deserever um dia tipico de Summerhill. A pri- meira refeicio vai das 8,15 as 9 horas. Pessoal e alunos levam essa refeicio da cozinha para a sala de jantar. As camas dovem estar feitas até as 9,30, quando comegam as ligdes. ‘Ao inicio de cada perfodo escolar um horirio é fixado. Assim, Derek pode ter no Iaboratério a Classe I, na segunda- feira, a Classe II na térga-feira, ¢ assim por diante. Eu tenho horétio idéntico para Inglés ¢ Matematica. Maurice 0 tem para Geografia e Historia. As criangas menores (dos sete ‘40s nove anos) passam, habitualmente, com se proprio pro- fessor, grande parte da manha, mas também vio para as Salas, de Ciéncias e Arte. Nenhum aluno & forgado a freqiientar as aulas. Mas, se Jimmy vem para o Inglés na segunda-feira e nfo mais aparece até a sextafeira da semana seguinte, os outros reclamam, com téda a razio, dizendo que éle esté atrasando trabalho. E lem expulsé-lo, por impedir 0 progresso. SAS ligées vio até uma hora, vimas as criancas do jardim da ‘infincia e as que ficam entre sete € nove anos almogam as 12.0, A escola tem de set alimentada em dois tums. A ‘congregagio os maiores almogamn & 1,30. As tardes sio inteiramente livres para todos. O que fazem durante a tarde nio sei. Eu me dedico & jardinagem, e rara- mente vejo meninos por ali, Os pequeninos, sim, que brincam de mocinho e bandido. Alguns dos mais’ velhos ocupam-se ‘com motores e radios, com desenhos e pinturas, Quando 0 tempo est bom, dedicam-se a jogos ao ar livre, Outros ficam na Oficina, consertando suas bicicletas ou fazendo barcos ¢ revdlveres. cha ¢ servido as quatro horas. As cinco, viias atividades tém inicio. Os mais jovens gostam que se leia para éles. Os 12 | médios preferem trabalhar na Sala de Arte—pintura, recortes de oleado, feitura de cestas. Na cerimica h& sempre um grupo ativo e, realmente, ceriimica parece ser uma obsessio, a manha ¢ & noite. Os mais velhos trabalham das cinco horas em diante, As oficinas de carpintaria e metalurgia ficam cheias t6das as noites. Nas noites das segundas-feiras os alunés vio ao cinema local, a expensas dos pais. Quando mudam o programa, is quintas- feiras, 05 que tém dinhieiro tormam a ir. Nas noites das térgas-feiras a congregacio e os ma’s velhos ouvem minha palestra sdbre psicologia. Ao mesmo tempo os menores formatn varios grupos de leitura. As noites das quar- tas-feiras sio para a danca, e os discos podem ser escolhidos entre uma pitha enorme. "As criangas ‘mpstram-se, todas, boss dangarinas, e alguns visitantes se tém sentido em condigio de inferioridade, dangando com elas. Nas noites das quintas- feiras néo hd nada de notivel. Os mais velhos vio ao cinema, em Leiston ou Aldeburgh. As noites das sextas-feiras sio re- servadas para algum acontecimento especial, talvez ensaio de ecas teatrai Mais importante & a noite de sibado, pois ¢ quando se faz a Assembléia Geral da Escola, Habitualmente, segue-se um baile. Durante as noites de invemo, as de domingo ficam sendo noites de teatro. Nao hé horério para o trabalho manual, Néo hi ligdes esta- belecidas para carpintaria. As criangas fazem 0 que querem fazer, € 0 que querem fazer é, quase sempre, um revélver de brinquedo, um canho, um barco, ow um papagaio. Nao se interessam muito pelos trabalhos que exigem encaixes com- licados. Mestno os mais velhos nfo apreciam a carpintaria fic. Nao ha muitos que se interessem pelo meu proprio passatempo-metal martelado—porque nio se pode por muita Inventiva numa vasilha de metal. Quando o dia esté bom & possivel que nfo se vejam os meni- nos quadrilheiros em Summerhill. Esto pelos cantos distantes, cuidando de suas peraltagens. Mas ver-se-io as meninas, que, ‘ou estio dentro de casa ou nas proximidades da casa. Nunca se afastam muito dos adultos. Freqiientemente se pode encontrar a Sala de Arte repleta de meninas que pintam ou fazem coisas coloridas, com teci- dos. Em geral, entretanto, acho que os meninos pequenos sio mais eriadores, pelo menos munca ouvi um déles dizer que 13 esti aborrecido porque nfo sabe 0 que hi de fazer, enquanto ae a " ‘Talvez eu considere os meninos mais criadores do que as meninas por estar a escola melhor aparelhada para les do que para elas. Meninas de dez anos, ou mais, nio véem grande uso numa oficina de ferro ou de madeira. Nio tém disposigio para lidar com maquinas, nem se sentem atraidas pela eletricidade e pelo ridio, ‘Tém seu trabalho de arte, que incluj cerimica, blocos de oleado, pintura, costura, mas’ para algumas isso nio € 0 bastante. Os meninos sio tio expertos como as meninas, no que se refere & cozinha. Uns ¢ outras fescrevem e representam suas proprias pecas, fazem seus pré- rios costumes ¢ cenérios. Geralmente, 0 talento teatral dos hlunos é de alto nivel, porque representam com sinceridade e ‘ngo para se exibirem. ‘As meninas parecem freqiientar o laboratério de quimica com tanta assiduidade quanto os rapazes. A oficina é 0 tinico lugar que nao atrai o elemento feminina, dos nove anos para cima. ‘Tomam as meninas parte menos ativa do que os meninos nas Assembléias Gerais da Escola, e nio encontro explicagao pronta para isso, ‘Até h& uns poucos anos, as meninas vinham sempre tarde para Summerhill: tivemos muitos fracassos, com eriancas. pro- Nenientes de conventos-e de escolas exclusivamente femininas, Jamais considerei uma dessas criangas como exemplo verda- Geiro da educagio livre. Tais meninas vinham assim tarde para a escola, procediam, quase sempre, de pais que nao apre- Giavam a liberdade, pois se a apreciassem suas filhas nio se teriam convertido em problemas. Entio, quando a menina se curava em Summerhil} de sua frustragio especial, era arreba- tada pelos pais “para uma excelente escola onde ela seri edu- cada’ Mas, nos anos recentes, estamos reccbendo meninas gue vém de casas onde se acredita em Summerhill. Formam uum belo grupo, sim, cheio de espirito, de originalidade ¢ ini- ciativa, Ocasionalmente, temos perdido meninas, por motivos finan- ceiros, as vézes por estarem seus irmaos freqitentando colégios pariculares dspendiosos. A velha uadigio ‘de fazer do filho jomem elemento importante da familia é obstinada. Per- demos tanto mieninas Como meninos por causa do cidime pos- th a ee ESE i een — sessivo dos pats, que temlam ver as_criangastransferirem-para S°SSeole sof tesldide em lagi a0 lan. m Summerhill sempre lutou um pouco para se manter. Poucos pais tém paciéncia e £6 suficientes para enviar o filho a uma Beola onde as criancas podem brincar, como alternativa para cena Tremem, co perber que aos vinte un anos se filha talvez se mostre sem Capacidade para ganhar a vida. Hoje, os alunos de Summerhill sio, em sua maioria, ri angascujos. pais as querem educar sem disciplina restritiva. Isso 6 um dos fatos mais felizes, pois nos velhos dias eu teria tm filho dos de arraigada tradigio apenas se 0 pai 0 enviasse tn desespéro de causa, Tais pais nio tém interésse algum na liberdade das criangas, e, secretamente, devem nos considerar tum bando de excéntricos Iuniticos. Foi muito dificil explicar Coisas a ésses obstinados. ‘Tembro-ine de um militar que pensou em matricular em Summerhill 0 filho de nove anos. —O lugar me parece bom—disse éle—mas tenho un receio. Meu rapaz pode aprender a masturbar-se aqui. PerguntetIhe porque temia tanto isso. Porque Ihe far muito mal—foi a resposta. “Nio féz tanto mal assim ao senhor nem a mim, nfo & mesmo?—indaguet eu, alegremente. O homem sain depressa, Tevando 0 filho. TE houve também a mie rica, que, depois de me fazer, per- untae durante. una hora, voliow-se para o.marido ¢ se: -Nio consgo resslvr se mando ou no Marjorie para esta “Nio se preocupe—disse-Ihe eu.—Resolverei pela Senhora. [No receberemos sia filha \ Tive que explicar-The o que quisera dizer aquilo: A senhora no acredita realmente em liberdade, ¢ se sua filha vier para c4, vai me fazer gastar a metade da minha vida a explicarthe tudo, e, a0 fim, ainda ndo estar. conven- Gida, © resultado seria. desastroso. para, Marjorie, porque a menina se veria constantemente diante de uma divida atroz: “Quem tem razio, o lar ou a escola?” ‘Os pais ideais sio os que chegain e dizem: Summerhill é © lugar para 0s nossos garotos. Nenhuma outra escola. serviia ‘Quando abrimos a escola as dificuldades eram particular. mente graves. Sb podiamos receber criangas das classes média 15 ¢ alta, porque tinhamos de equilibrar um orcamento, Nao contivamos com nenhum rieago para nos dar apoio. Nos pri- rmeiros dias da escola, um benfeitor, que insiste em permanecer #0 anonimato, ajudou-nos a atravessar uma ou duas épocas més, e mais tarde um dos pais féz generoso donativo—uma cozinha nova, um rédio, nova ala para nosso chalé, © nova oficina. Foi o benfeitor ideal, pois nao determinou_coadigdes, e nada pediu em troca. Summerhill deu ao meu Jimmy a educagio que eu desejava para éle—foi 0 que disse, dmpleznente, pois James Shand era uum crente verdadeiro na liberdade para a crianga, Entretanto, jamais tivemos possibilidade de_receber_os fi- Jhos_dos_pobres. F uma pena, 1880, pois temos de resuinir nnossos estudos apenas aos filhos dos da classe média. E as vézes & dificil ver a natureza da crianga quando escondida atrés de muito dinheiro e de roupas dispendiosas, Quando uma menina sabe que aos vinte e um anos entrar ni posse de substancial quantia, nio é facil estudar nela a natuzeza da crianga, Felizmente, entretanto, a maior parte dos alunos pre- sentes ¢ passados de Summerhill nio foi estragada pela for- tuna, Todos éles souberam, e sabem, que terio de ganhar a vida, quando deixarem a escola, Em Summerhill temos empregadas domésticas, da cidade, que trabalham para nds 0 dia todo, mas dormem em suas préprias casa, Sio jovens, e trabalham bastante bem. Numa atmosfera livre, onde ninguém toma ares de patrio, trabalham mais ¢ melhor do que as empregadas que o fazem sob auteridade, Sob todos os aspectos sio excelentes mécas, Sempre senti certa vergonha ao ver essas jovens terem de trabalhar tanto por haverem nascido pobres, quando tinhamos tido meninas imadas, de familias abastadas, sem energia suficiente para fazerem ‘as préprias camas. Devo confessar, porém, que eu proprio detesto ter de fazer a minha cama. Minha desculpa esfarrapada nesse caso, isto é, a alegagéo de que tenho muitas outa ‘coisas a fazer, nao convence as eriangas. Cagoam da minha defesa, quando digo que nio se pode esperar que um general se sie oeupando de ninherias Mais de uma vez fiz sentir que os adultos, em Summerhill, nio. so protétipos de virtude. Somos humanos como téda gente, © nossas fraquezas humanas muitas vézes entram em conflito com as nossas teorias. No lar médio, se uma crianga ‘quebra um prato, 0 pai ou a mae armam barulho, tornmdo'o 16 prato mais importante do que a crianga. Em Summerhill, se ima camareira ou uma crianga deixa cair uma pilha de pratos cou nada digo, minha espésa nada diz. Acidentes so acidentes. Mas se a crianga pede um livro emprestado e deixa-o ficar li fora, exposto a chuva, minha espdsa se zanga, porque livros, para ela, tém muita importincia. Em tal caso, eu, pessoal- mente, sou indiferente, pois os livros para mim tém pouco valor. Por outro lado, minha espdsa parece vagamente surpre- endida se eu fao barulho a propésito de um formio estragado, Dou valor a ferramentas, mas para ela as ferramentas pouco representam. ‘Em Summerhill temos uma vida em que damos de és, com tempo integral. As visitas cansam-n0s iangas, jis também clas desejam receber de nds. Pode ser maior éngio dar do que receber, mas, sem divida alguma, 6 mais exaustivo. Nossas Assembléias Gerais nas noites de sdbados, ai de mim, revelam 0 conflito entre erianigas e adultos, 1880 @ natural, pois numa comunidade de pessoas de varias idades, se ccda qual sacrificasse tudo as criangas menores, seria estragar completa- mente essas criangas. Os adultos queixam-se de um grupo de alunos mais velhos que no os deixain dormir, conversando ¢ indo depois que todos se recolheram. Harry queixa-se de que passou uma hora aplainando uma almofada para a porta da frente, e, a0 voltar do alméco, verificou que Billy se tinha servido dela para fazer uma prateleira, Eu fago acusagées contra as criangas que pediram emprestado meu material de Somagem e ni o devolveram. Minha mulher faz barulho por- que trés das criangas menores, depots da ceia, disseram estar gom fome, receberam pio e geléia, e, na manhi seguinte os pedagos de pio foram encontrados no piso do vestibulo. Peter conta, com tristeza, que alguns meninos atiraram sua preciosa argila uns nos outros, na sala da cerimica, E_a_eoisa_vai assim, a luta entre 0 ponto de vista adulto ¢ a falta de conhe- mento consciente dos jovens. Mas tal Tuta néo degenera jamais ei” hostilidade pessoal: nfio hd sentimentos amargos em relagio a cada qual. © conflito mantém Summerhill muito fanimado, Ha sempre alguma coisa acontocendo, e durante todo (© ano nem um s6 dia se passa insipidamente. Felizmente, 0 pessoal no tem excessivo sentimenta de pos- se, embora eu confesse que me magoa, quando compro uma Tata especial de tinta, a trés libras o galio, saber que uma das 17 meninas se serviu dela para pintar velha armacio de cama. Sou possessivo no que respeita ao meu carro, & minha maquina de escrever, 2s ferramentis da minha oficina, mas a0 tenho tal sentimento em relagio a pessoas, Quando se, é possesixn em relagio a pessoas nao se deve ser mestre-escol. © uso e estrago de material em Summerhill & processo natu- ral, $6 poderia ser impedido pela introducao de médo. O uuso estrago das f0rcas psiquicas ndo podem de forma alguma ser impedidos, pois as criangas pedem, e devem receber. Cin- jienta vézes ‘por dia a porta da minha sala se abre e uma crianga pergunta qualquer coisa: Hoje é dia de cinema? ~Por que nao tenho uma L. P.? (Licdo Particular.) =Vocé viu Pam? —Onde esté Ena? Tudo isso num dia de trabalho, € nao sinto jamais cansaco, embora nao tenhamos verdadeiramente vida particular, por- que a casa nio se presta muito para escola—nio se presta tito do ponte de vista adult, pois as eranas esti, sempre em cima de nés. Mas, a0 fim do periodo escolar, minha es- pésa ¢ eu estamos cansadissimos. Um fato digno de mencio é 0 de que dificilmente os mem- bros da congregacio perdem a calma. Isso tanto diz bem déles como das criangas. Sio, realmente, criancas adoraveis ara se conviver, € poucas ocasies aparecem em que se po- deta perder a ching Se a cranga & live e sentese aprovads, niio ser, regra geral, odienta. Nao terd prazer algum em levar um adulto a perder calma, ‘Tivemos uma professéra super-sensivel no que se referia & critica, e as meninas a atormentavam, Nao podiam atormentar qualquer outro,membro do pessoal docente, porque nen déles reagiria. $6 se pode atormentar quem tem digridade, {As criangas de Summerhill mostram tendéncia agressiva, coisa habitual nas criancas comuns? Bem, téda crianga deve ter alguma agressividade, para forcar seu caminho através da vida. A agressividade exagerada, que vemos nas criangas nio-libertas, 6 um protesto exagerado contra a animosidade que se demons: tra em relagio « elas. Em Summerhill, onde crianca alguma se sente detestada pelos adultos, a agressividade nfo & neces- sfria, As criangas agressivas que nos aparecem provém, inva- riivelmente, de lares onde nfo Thes dao amor e compreensao, 18 Quando eu era menino e freqiientava uma escola de aldeia, narizes sangrando mostravam-se um fenémeno semanal, pelo menos. Agressividade do tipo lutador & animosidade, ¢ jovens cheios de animosidade precisam lutar. Quando as eriancas estio. numa atmosfera da qual a animosidade foi eliminada, nio demonstram tal sentimento. ~~ Penso que a insisténcia freudiana sobre a agressividade é devida ao estudo de lares e escola, tal como éles sao. Nao se pode estudar a psicologia canina estudando 0 eo-de-caca préso wrrente. Nem se pode teorizar dogmaticamente sdbre psicologia humana quando a humanidade esté sob fortes_ca- deias, cadeias Forjadas por geragoes de odientos da vida, Acho ‘que iia liberdade de~Summerhill- a agressividade nfo se faz (° sentir em coisa alguma com a férga que tem nas escolas cstritas, Em Summerhill, entretanto, liberdade no significa anulaio do bom senso. Tomamos tédas as precaugdes para a sexu- ranga dos alunos. As eriangas s6 podem ir a0 banho de mar quando esta presente um salva-vidas para cada seis delas, ¢ nenhum dos alunos de menos de onze anos pode andar sb- zinho pelas ruas, de bicicleta. Essas regras foram ditadas pelas proprias criangas, nas Assembléias Gerais da Escola, Nao ha leis, contudo, quanto A escalada das drvores, Subir as arvores faz parte da educagio da vida, e proibir tidas as empresas perigosas sera fazer a erangs um covarde. Prof bimos a subida a telhadi di primido ow de~qualque 08 Sempre aft quando surge’ Tiana’ periodiea das espadas de madeira, Insisto em que as pontas seam cobertas com bor- racha, ou pano, mas, mesmo assim, fico setisfeito quando a mania passa, Nio é fécil marcar a linha diviséria entre realis- tico e simples afligio: - Nunca tive alunos prediletos, na escola. Naturalmente, sem- pie_gostel mais de-umas eriangas-do-que de outras, mas con- segui_manter tal coisa ignotada, Possivelmente 0 suéesso ‘de Summerhill se deva, em parte, ao fato de as criancas sen- tirem que sio tratadas da mesma maneira, ¢ tratadas com respeito. Temo, para qualquer escola, a existencia de atitude sentimental em relagio aos alunos. E tio fécil fazer cisaes dos nossos gansos, ¢ ver Picasso numa crianga que saiba espalhar tintas, 19

Das könnte Ihnen auch gefallen