A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS USUÁRIOS DE ACESSO RÁPIDO moveu a
presente ação civil pública em face de TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S.A. - TELESP alegando, em síntese, que a requerida é fornecedora do serviço denominado Speedy e que, por força do contrato de prestação de serviços, os usuários são obrigados a contratar provedores para o acesso à Internet (ISP), desnecessariamente, porquanto existe plena viabilidade técnica para que a conexão com emprego da tecnologia ADSL (Asymmetric Digital Subscriber Line) se dê diretamente. Sustentou que por ocasião da contratação do serviço, o instrumento contratual não mencionava expressa ou tacitamente a necessidade do usuário contratar um provedor. Não obstante, a requerida bloqueou o fornecimento do serviço dos usuários que não tinham contratado provedor de acesso, cobrando normalmente pela prestação do serviço. Apresentou em sua petição inicial quadros ilustrativos que auxiliaram na fundamentação dos pedidos e se propuseram a demonstrar a diferenciação entre o serviço do provedor (ISP) e da requerida, bem como a viabilidade técnica de fornecimento de acesso à internet pelo Speedy sem a intervenção do provedor de acesso. Juridicamente, questionou o argumento apresentado pela requerida no sentido de haver óbice legal à desvinculação entre o serviço que prestava e aquele prestado pelo provedor de acesso. Segundo a autora, ao prever no artigo 60, §1º o que se entende por serviço de telecomunicações, a Lei 9.472/97 não excluiu a transmissão de dados que consistem, em última análise, em símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. Questionou ainda outros aspectos do contrato subjacente à pretensão posta, a exemplo da ilegalidade perpetrada na imposição de locação do modem ADSL. Sustentou que dada a não oferta da possibilidade de alugar ou adquirir o modem de fornecedor diverso da ré, o custo anual da locação equiparava-se à compra do aparelho de terceiros. Nesse passo, o consumidor estaria sendo lesado em duas frentes, ao ser iludido quanto à impossibilidade de adquirir o modem por conta própria e pela cobrança de valores altíssimos pela locação. Em outra frente de argumentação, pleiteou a declaração de nulidade da cláusula contratual 2.1.1 do Contrato de Prestação de Serviços Speedy que garante apenas 10% da velocidade de transmissão de dados contratada, de modo que o consumidor estaria comprando banda estreita a preço de banda larga. Finalmente, questionou a validade das cláusulas 8.1 e 8.2 do mesmo contrato que prevê o reajuste do valor cobrado pelo serviço Speedy com data base anual de 1º de janeiro de 2000, quando julga isonômico o reajuste anual de acordo com a data de adesão ao serviço pelo assinante. Assim, formulou os seguintes pedidos: a) imposição de fornecimento do serviço Speedy sem a necessidade de contratação de provedor de acesso à internet; b) caso necessário, que a requerida aceitasse qualquer provedor de acesso, inclusive gratuito; c) condenação no fornecimento gratuito do modem ADSL, sempre informando o consumidor no momento da venda que há possibilidade de alugar ou adquiri-lo em outro fornecedor; d) condenação na devolução em dobro dos valores pagos aos provedores de acesso no período; e) condenação em indenizar os usuários por não ter oferecido a opção de compra ou aluguel do modem ADSL com terceiros; f) declaração de ser abusiva a cláusula que garante apenas 10% da velocidade contratada, impondo a garantia de 100%, restituindo-se o eventualmente pago a mais; g) declaração de nulidade da cláusula 8.1 com a fixação da data base para reajuste como sendo aquela da contratação do Speedy e devolução em dobro do reajuste anual antecipado, quando inferior ao período de 12 meses; h) condenação na indenização por danos morais pelas irregularidades perpetradas; i) devolução do valor da assinatura pelo período em que os usuários ficaram com o acesso bloqueado pela não contratação do provedor de acesso; j) condenação na obrigação de fazer consistente na imposição de readequação do contrato padrão ao artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor, mediante a inclusão de informações claras, precisas e ostensivas. Juntou documentos de fls. 40/256. Foi indeferida a tutela antecipada (fls.262/263). A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PROVEDORES DE ACESSO, SERVIÇO E INFORMAÇÕES DE REDE INTERNET – SÃO PAULO (ABRANET.SP) requereu sua inclusão como assistente litisconsorcial da requerida, apresentando manifestação de fls.297/329 e juntado documentos de fls.331/405. Validamente citada, a requerida Telesp S.A. apresentou contestação tempestiva argüindo preliminares de ilegitimidade ativa e impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, sustentou que lhe é vedado por lei a prestação cumulativa de serviços de telefonia fixo comutado (STFC) e acesso à rede mundial de computadores (internet), de acordo com o artigo 61 da Lei 9.472/97, sendo este último caracterizado como serviço de valor adicionado. Desse modo, o serviço de conexão à internet entregue ao usuário final deve ser provido por terceiro estranho à empresa de telecomunicações, que é entendido pela lei como o real usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte. Segundo sustentou, o serviço prestado pela requerida Telesp S.A. denominado Speedy, consiste no transporte de dados em alta velocidade, enquanto o serviço prestado pelo provedor é possibilitar o acesso a uma rede de computadores específica, a internet. Pugnou pela observância do princípio da legalidade, que veda à requerida o exercício de atividade diversa do serviço de telefonia fixa comutada. Outrossim, frisou que cabe ao usuário final manter a infraestrutura necessária para prestação do serviço, contratando um provedor de acesso, conforme consta no contrato padrão registrado em tabelionato. No tocante à locação do modem, sustentou a impossibilidade de modificação do contrato celebrado voluntariamente entre as partes. Ademais, não seria qualquer modem adequado à prestação do serviço, tendo que se submeter à homologação e certificação junto à ANATEL e ABNT, sob pena de interferir em toda a rede de serviços. Com relação à data-base de reajuste do preço do serviço, sustentou a validade da estipulação contratual, aduzindo que se assim o fizesse, a parcela de consumidores que pagou com reajuste superior a doze meses estaria violando a igualdade por via inversa. Finalmente, sustentou que a garantia mínima de 10% da velocidade contratada coaduna com a propaganda veiculada, pois consigna que a velocidade chegará até o limite contratado, não sendo sempre estável, porquanto se submete a fatores diversos que podem implicar em variação na velocidade entregada. Baseada nesses argumentos, a requerida pleiteou a improcedência dos pedidos formulados, em sua integralidade. Juntou documentos de fls. 451/559. Manifestação da autora quanto ao pedido de assistência às fls.564/570. Foi reiterado o pedido de tutela antecipada pela autora, fundamentando-se no fato de que a despeito da requerida sustentar em sua contestação ser impedida de explorar o acesso à internet diretamente, colocou no mercado provedor próprio de acesso à internet (iTelefônica – www.itelefonica.com.br) comprovando não haver vedação legal para tanto, ao contrário do que sustentou (fls.578). Réplica às fls.585/598. O Ministério Público manifestou-se acerca da contestação e réplica (fls.626/634). A Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL manifestou desinteresse em integrar a lide (fls.714). Foi deferida a inclusão da ABRANET.SP como assistente (fls.752). O feito foi saneado (fls.838/839), oportunidade em que foram repelidas as preliminares argüidas, fixado o ponto controvertido e deferida a produção de prova pericial. Foram indicados assistentes técnicos pelas partes, que ofereceram pareceres após apresentado o laudo pericial (fls.1046/1075), seguindo-se esclarecimentos (fls.1207). Declarada encerrada a instrução processual, as partes procederam aos debates na forma de memoriais. O Ministério Público ofertou parecer opinando pela procedência parcial do pedido (fls.1672/1679). É o relatório. DECIDO. Da possibilidade técnica e jurídica de acesso direto O primeiro pedido formulado tem por pressuposto a análise da possibilidade de acesso direto dos assinantes do Speedy à Internet sem a necessidade de contratar provedores de acesso. O tema deve ser abordado sob dois aspectos: o técnico e o jurídico. Do ponto de vista técnico, discordo da conclusão alcançada pelo nobre perito judicial, porquanto verifico que os fatos que envolvem a questão, bem como os quesitos formulados não possibilitaram ao experto elucidar na sua conclusão o que ficou muito claro em sua bem elaborada fundamentação. Isto porque ao responder ao quesito 9.2.9 o perito faz concluir ao leitor mais afoito ser impossível a conexão direta do usuário com o Speedy à internet, porém ao responder o quesito 9.2.10 deixa claro ter sido induzido a erro pelo teor da pergunta. Extrai-se de seu laudo que para a conexão física, o assinante precisa ter em sua residência um modem ADSL que fará a conexão entre seu computador e o par de fios de cobre pelo qual trafegam as informações vindas da companhia telefônica. Na outra ponta, já na estação telefônica, esse par de fios de cobre será agregado aos dos demais assinantes em um DG (distribuidor geral) e lá mesmo enviado ao DSLAM (multiplexador de linha de acesso do assinante) onde as informações de cada assinante serão multiplexadas (codificadas as informações de duas ou mais fontes de dados em um único canal) e, através de um COMUTADOR, realizada a preparação dos dados numa interface ATM. As diversas saídas ATM das diversas estações telefônicas da cidade são criteriosamente distribuídas aos AGREGADORES, que efetivamente fazem a conexão entre as redes ATM e a Internet. Também é nos AGREGADORES que é atribuído a cada usuário um perfil próprio com respectivo número de IP, nele sendo armazenada a velocidade atribuída e o tipo de acesso, bem como fornecidos dois números no padrão DNS (Sistema de Nomes de Domínio), que são a localização do Data Center da Estação Telefônica. Caso o usuário opte por usar o DNS de um provedor de acesso, receberá as informações diretamente dele. Finalmente, tem-se que o DNS é quem efetivamente fornece as informações vindas das diversas redes, inclusive da rede mundial de computadores denominada Internet. Isso, não sem antes proceder à autenticação do usuário. Até aqui, segundo o laudo pericial, nenhuma solicitação ou comunicação é feita com o provedor de acesso, tanto que consignou às fls.1068: “Quando o usuário tenta realizar uma autenticação, o identificador único de seu acesso é enviado ao servidor de autenticação da Telefônica. Este (o servidor de autenticação da Telefônica), por sua vez, valida as informações verificando a existência do acesso em seu cadastro devolvendo o perfil (velocidade) contratado a ser aplicado para o cliente. Após validar o acesso (última milha), o servidor identifica qual o provedor é o contratado pelo cliente e encaminha as informações da conta (usuário e senha) para o servidor de autenticação do provedor. Caso a conexão não tenha seu acesso à internet autorizado pelo provedor, ou em outras palavras, a conta não for autenticada, a conexão do usuário fica estendida até o agregador de serviços, porém sem conexão com a internet”. (grifei) Como dito, nos AGREGADORES são atribuídos os perfis de cada usuário, mediante a validação do acesso pelo envio de um identificador único ao servidor de autenticação da Telefônica, que devolve todas as informações necessárias para identificar cada usuário, velocidade contratada e sua localização. Ressalta-se que somente depois de identificado o usuário e seu perfil é identificado o provedor contratado e são encaminhados os dados de usuário e senha para o servidor de autenticação do provedor. Trata-se de uma segunda checagem, baseada na redundância. Vê-se que o provedor de acesso faz somente uma validação formal do acesso já liberado pelo servidor de autenticação da Telefônica, sendo certo que, havendo a liberação, o agregador inclui o usuário na rede ATM (Método de Transmissão Assíncrono), possibilitando que os diversos usuários tenham através dela o acesso à Internet, independentemente dos meandros seguidos a partir de então. Interessa-nos que nenhuma prova foi feita no sentido de que a autenticação de usuário junto ao provedor de acesso seja etapa essencial na linha de comunicação, consistindo, na verdade, em mero autenticador redundante. Isso é o que dá substrato técnico ao que os fatos demonstram. Até pouco tempo atrás, por força de decisão judicial liminar proferida pelo juízo da 3ª Vara Federal de Bauru nos autos de ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, a requerida foi compelida a fornecer acesso sem a necessidade da contratação de provedores. Constatou-se, até que fosse cassada a decisão pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que há plena viabilidade técnica de fazê-lo. Aliás, a própria possibilidade de acesso direto não adveio do questionamento da juridicidade do ato, mas da experiência realizada com sucesso por um usuário, o que afasta qualquer argumento acerca da viabilidade técnica do pedido. Cumpre agora analisar o tema mais tormentoso, consistente na possibilidade legal da requerida fornecer o serviço de acesso à internet sem a intervenção de provedor de acesso. O tema tem por amparo legal a Lei 9.472/97, Lei Geral de Telecomunicações, e orbita em torno do enquadramento jurídico do serviço de acesso à internet Speedy como serviço inerente ao serviço de telecomunicações ou como serviço de valor adicionado. Uma vez que por força de seu artigo 86, a empresa concessionária deve ter por objeto exclusivo a exploração dos serviços de telecomunicações objeto da concessão, deve-se proceder a uma interpretação estrita de seus termos. De fato, foi concedida à empresa Telefônica a exploração do serviço de telefonia fixa comutada (STFC), definido pelo Plano Geral de Outorgas (Decreto nº 2.534 de 02/04/98) em seu artigo 1º, §1º, como sendo o serviço de telecomunicações que, por meio de transmissão de voz e de outros sinais, destina-se à comunicação entre pontos fixos e determinados, utilizando processos de telefonia. A Lei Geral de Telecomunicações positivou o conceito de “telecomunicação” em seu artigo 60, §1º como sendo a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. É cediço que os dados que trafegam pela rede mundial de computadores (Internet) nada mais são do que resultados gráficos e sonoros que em última análise advêm do processamento de dados binários, representados pelos caracteres “0” e “1”, consistentes em bits, menor unidade de informação digital armazenável. É de clareza solar que se o conceito de telecomunicação envolve a transmissão, emissão ou recepção por fio (de cobre ou de fibra ótica) de caracteres, por si só se justifica a interpretação de que o serviço Speedy se enquadra no conceito de serviço de telecomunicação. Em outras palavras, cada imagem, som, caractere, movimento reproduzido num navegador que interpreta páginas transmitidas pelo protocolo HTTP (HyperText Transfer Protocol); cada arquivo baixado via download pelo protocolo FTP (File Transfer Protocol); cada e-mail transmitido pelo protocolo POP (Post Office Protocol) ou SMTP (Simple Mail Transfer Protocol); cada mensagem instantânea veiculada pelos comunicadores MSN, Aol Instant Messenger, Skype que se utiliza do protocolo AIM (AOL Instante Messenger Protocol), IRC (Internet Relay Chat) ou congênere, consiste em informação digital que, em última análise, são instruções geradas por códigos binários (bits), que são, na tecnologia digital empregada pelo modem ADSL, caracteres numéricos “0” e “1”. Em suma, se telecomunicação é definida por lei como tráfego de informações, dentre as quais de caracteres ou símbolos, a única interpretação possível é a de que o serviço Speedy consiste em serviço de telecomunicação. Não se ignora o posicionamento diverso esposado em grande parte dos julgados, tendo ilustrado inclusive diversas decisões das cortes superiores. Respeitosamente, discordo. Ainda que se possa trazer à baila a existência do conceito de serviço de valor adicionado, passo a analisá-lo para demonstrar que em nada colide com o até agora exposto, por se tratar de serviço absolutamente diverso. Parte-se do conceito legal de serviço adicionado existente no artigo 61 da Lei 9.472/97, advindo do que consta do item 3, alínea “b” da Norma nº 004/95 aprovada pela Portaria Ministerial nº148, de 31/05/1995, do Ministério das Telecomunicações, publicada dois anos antes da Lei Geral da Telecomunicações. É conceituado legalmente como sendo “a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações”, mais restrito que a definição da aludida Norma nº 004/95 que o definiu como sendo “o serviço que acrescenta a uma rede preexistente de um serviço de telecomunicações, meios ou recursos que criam novas utilidades específicas, ou novas atividades produtivas, relacionadas com o acesso, armazenamento, movimentação e recuperação de informações”. Conforme analisado anteriormente, o provedor de acesso exerce, tecnicamente, a função secundária de autenticação na linha de ação que consiste no serviço Speedy, fazendo uma nova validação do usuário já validado junto ao AGREGADOR. Denota-se que o enquadramento do Speedy como sendo serviço de telecomunicação relega ao provedor de acesso a função que consiste em acrescentar àquela rede de telecomunicações (Speedy), novas utilidades específicas ou novas atividades produtivas, relacionadas com o acesso (mediante o fornecimento de discadores próprios), armazenamento (de arquivos em diretórios virtuais mantidos junto aos seus servidores próprios, de e-mails mantidos em contas do usuário em seu servidor), movimentação (transmissão e recepção de e-mails e mensagens instantâneas) e recuperação de informações (provenientes de base de dados própria). Não há, portanto, como se confundir a atividade do Speedy e do provedor de acesso. Toma-se por exemplo uma empresa emblemática do mercado de provedores de acesso, o Universo On Line (www.uol.com.br) que fornece desde longa data aos seus assinantes o conteúdo completo de jornais como a Folha de São Paulo, dicionários para consulta on-line como o Aurélio e o Houaiss, servidor de e-mail próprio (com domínio @uol.com.br), espaço para armazenamento de fotos (UOL fotos), espaço para hospedagem de blogs, dentre outros serviços. Trata-se de autêntico serviço de valor adicionado por definição legal, dentre os quais, está o de prover o acesso à rede mundial de computadores através de seu discador próprio, mas que em nenhum aspecto se confunde com a própria transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, este consistente no serviço de telecomunicação que é o Speedy. Por esses motivos tenho por inarredável o entendimento de que o serviço Speedy prestado pela requerida enquadra-se na definição legal de serviço de telecomunicação e, como tal, pode ser prestado diretamente pela empresa de telefonia concessionária da exploração do serviço de telefonia fixa comutada (STFC), sem a intervenção ou condicionamento da contratação de provedor de acesso, este sim que presta serviço de valor adicionado diverso daquele. Consequentemente, o pedido consistente na aceitação pela requerida de provedor de acesso gratuito fica prejudicado, porquanto nenhum provedor de acesso é preciso. Do bloqueio de assinantes não contratantes de provedores Assim, tem-se por abusiva a atitude da requerida em ameaçar proceder ao bloqueio do acesso dos assinantes do Speedy que não tivessem contratado provedor de acesso até 29 de setembro de 2001, conforme demonstra uma das cartas enviadas a um dos assinantes (fls.160). Esse fato não foi contrariado pela requerida que, antes, apresentou justificativa na vedação legal que ora se considera inaplicável. Revela-se que muito embora alegasse ter agido compelida a cumprir a imposição legal que julgava emanar da Lei Geral de Telecomunicações, tal circunstância revela duas situações. A primeira, de que até então havia a mais plena e irrestrita prestação do serviço Speedy sem a necessidade de contratação de provedor de acesso, o que fulmina o argumento de impossibilidade técnica, já sufragado pela fundamentação acima esposada. A segunda, de que embora alegasse ter sido compelida a instituir tal proceder por força da aludida lei, não justificou o fato de ter prestado o serviço à revelia da lei neste particular, deixando de exigir provedor de acesso terceirizado até então (29 de setembro de 2001), não demonstrando sequer qual o ato que a impulsionou a instituir o condicionamento da contratação de provedores de acesso. Destas circunstâncias se extrai a verdadeira dimensão da arbitrariedade e inverdade das escusas apresentadas pela requerida, seja no tocante à questionável legitimidade da postura tomada ou em relação à alegada impossibilidade de prestação direta do serviço de provimento de acesso à internet. Os fatos articulados não levam ao acolhimento do pedido de devolução em dobro dos valores pagos aos provedores de acesso, conforme prescreve o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de negócio jurídico estranho ao que vincula os assinantes ao usuário Speedy, refugindo ao preceito contratual da res inter alios acta. Por outro lado, logicamente, é devida a devolução dos valores cobrados pela assinatura Speedy de seus respectivos usuários que a despeito de terem pago pelo serviço ficaram impossibilitados de usá-lo em virtude da não contratação de provedor de acesso, sob pena de, por via diversa, prestigiar o locupletamento ilícito do valor do serviço pelo fornecedor sem a sua respectiva prestação. Da possibilidade e conveniência de aquisição de modem ADSL por empresa diversa da requerida. Novamente, há que se abordar o tema sob os enfoques técnico e jurídico. Do ponto de vista técnico, muito embora seja consenso entre profissionais da área que o tráfego de informações pela rede de computadores não faz distinção entre marcas dos produtos que a compõem, mas entre suas especificações, há que se reconhecer óbice de caráter infraestrutural no que concerne ao uso de equipamentos não homologados pela ANATEL na estrutura de rede de acesso Speedy. Trata-se da necessidade de eleger e autorizar o uso aparelhos que sejam compatíveis com os padrões adotados pelo sistema nacional de transmissão de dados, em diversos aspectos diversos daqueles já à época existente nos países em que os aparelhos são produzidos. Basta, para se verificar a verdade da assertiva, considerar que a própria rede mundial de computadores, Internet, já era uma realidade incorporada ao cotidiano do usuário comum estrangeiro, que em nada se comparava à precariedade estrutural (hardware) e lógica (software) do acesso que tínhamos em solo pátrio, até então limitado ao acesso discado, estabelecido sobre tecnologia diversa. Feitas essas considerações, os preceitos da livre escolha pelo consumidor e da livre concorrência devem ter aplicabilidade mitigada no caso, porquanto sua plena eficácia comprometeria o próprio funcionamento de toda a rede, repita-se, ainda em estágio incipiente. Ademais, sob o aspecto da oferta, regida pelas leis de mercado, não era exigível que naquele estágio de implementação da base física com os primeiros assinantes, fosse permitida tal miríade de opções ao assinante, quando nem mesmo suporte técnico terceirizado se encontrava disponível no mercado de prestadores de serviço. Desse modo, fere a lógica do razoável se exigir da fornecedora que permitisse a compra ou aluguel de aparelhos não homologados pelo órgão fiscalizador (ANATEL) exigindo, em contrapartida, que a estes oferecesse suporte ilimitado. A despeito do respeitável parecer ministerial, não há como reputar ilícita a conduta de vincular o fornecimento do modem, locando-o ou vendendo-o, sobretudo à míngua da possibilidade de produzir-se prova conclusiva em contrário neste estágio dos acontecimentos. Da validade da cláusula de garantia mínima de velocidade A insurgência da associação autora quanto à questão da garantia de velocidade mínima em 10% do contratado tem por pressuposto a existência de uma rede ideal, sem os chamados “gargalos”, e com o emprego de cabeamento ótico por toda a extensão. O princípio da boa-fé contratual informa que o impasse deve ser analisado sob a ótica do razoável, reputando-se cumprida a obrigação assumida pela prestadora de serviços se atribuir aos usuários aderentes às diversas classes de velocidade a banda disponibilizada e, não efetivamente, à velocidade entregue. Explica-se. Numa rede que não atenda ao ideal, como a existente até hoje, deve-se exigir do fornecedor do Speedy que forneça ao contratante da menor velocidade uma vazão de dados provenientes de seus servidores em determinada medida que seja a exata metade da vazão de dados atribuída para o contratante da velocidade dobrada e assim por diante, independentemente se a velocidade que chega ao usuário é exatamente a contratada. Assim, considera-se que ainda que não atingindo o nível máximo de entrega de informações no modem ADSL do usuário, o contratante da velocidade dobrada recebe algo próximo ao dobro daquele que contratou a velocidade padrão. Tem-se assim, a distribuição do prejuízo decorrente de um contingente fático inafastável, sem que o contratante da velocidade padrão e da velocidade dobrada recebam de fato a mesma velocidade. Ambos receberão os dados em velocidade intermediária, mas observado maior volume do contratante da maior velocidade. Raciocínio em sentido diverso levaria à exigência da existência de condições ideais, o que é impossível até mesmo em países líderes em tecnologia. Por esse motivo, e tendo em conta o princípio da boa-fé contratual, informado pelo aspecto da razoabilidade, entendo que a garantia de que ao menos 10% da velocidade nominal seria entregue de fato, não viola o princípio fundamental da igualdade, nem importa em meio sorrateiro da fornecedora de se eximir de responsabilidade. Da reformulação do contrato padrão O pedido consistente na imposição de readequação dos termos do contrato padrão aos usuários dos serviços tratados neste feito são, em termos práticos, inócuos na medida em que os produtos não mais estão no mercado e os ainda em vigor encontram-se abrangidos pelos termos deste sentença, na forma do artigo 103, inciso II da Lei 8.078/90. Da validade da cláusula de reajuste que fixou data base em 1º de janeiro de 2000 Em via contrária ao aludido princípio da isonomia encontra-se a disposição prevista na cláusula 8.1 do contrato padrão que fixou a data-base para reajuste como sendo 1º de janeiro de 2000. Trata-se de cláusula inequivocamente abusiva, porquanto é cediço que o contratante que aderiu ao serviço em dezembro, sofrerá reajuste já em janeiro seguinte, enquanto os aderentes dos meses anteriores terão maior lapso temporal para tanto, o que gera situação de desigualdade repudiada no trato do consumidor. Melhor atende ao princípio que seja feito o reajuste anual baseado no mês da contratação. Desse modo, deve a requerida, ressarcir as diferenças, devidamente reajustadas monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescidas de juros legais desde a data do desembolso, aplicando aos assinantes o reajuste anual, baseado no mês da contratação. Dos danos morais Com a previsão do artigo 5º, inciso X, da Carta Magna, a indenização por danos de aspecto moral é palco de infindáveis querelas doutrinárias e jurisprudenciais, mormente com a proliferação de demandas acerca do tema. Tem-se buscado coibir a utilização do instituto como meio de enriquecimento sem causa, porém, é curial que não se deixem indenes danos efetivamente observados, ainda que não sejam expressivos, embora consideráveis, no tocante às conseqüências, se razoáveis e amoldados ao conceito doutrinário que se lhe impôs. A repressão deve ficar adstrita aos abusos de aproveitadores casuísticos. Consoante os magistérios de Humberto Theodoro Jr., referindo-se a Carlos Alberto Bittar: “Danos morais são os danos de natureza não-econômica e que se traduzem em turbações de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis e constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera do lesado. (...) De maneira mais ampla, pode-se afirmar que são danos morais os ocorridos na esfera da subjetividade, ou no plano valorativo da pessoa na sociedade, alcançando os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal) ou da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social).” (Dano Moral, p. 2, Oliveira Mendes, 1998) Entendo que a indenização por danos morais possui dupla finalidade. De um lado, busca confortar a vítima de um ato ilícito, consistente em lesão de cunho íntimo, a qual não se consegue avaliar por critérios objetivos, porém é possível estimá-la atribuindo ao ofendido uma compensação pecuniária, reparando assim o mal causado de maneira eqüitativa. De outro, nos termos da teoria do desestímulo, é necessária a imposição de multa ao infrator, em caráter preventivo, e não repressivo, com o intuito de que fatos semelhantes ao ocorrido não mais se repitam, ou sejam eficazmente desestimulados. Nesse sentir é a lição de Caio Mário da Silva Pereira, extraída da sua obra Responsabilidade Civil, (pp. 315-316), que ensina: “Como tenho sustentado em minhas Instituições de Direito Civil (v. II, n.176), na reparação por danos morais estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I- punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II- pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é um pretium doloris, porém um meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material, o que pode ser obtido ‘no fato’ de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo de vingança”. Em se tratando de dano moral decorrente da violação de direito coletivo, na medida de sua definição inscrita no artigo 81, parágrafo único, inciso II do Código de Defesa do Consumidor, e sendo voltado o ressarcimento à recomposição do direito metaindividual lesado, nos termos do artigo 13 da Lei 7.347/85, há que se ter em conta maior foco no fator desestímulo da atividade nociva que atinge uma quantidade enorme de consumidores, ao invés do caráter ressarcitório da indenização pelo dano extrapatrimonial causado a cada qual, individualmente. O representante do Ministério Público ressaltou com propriedade em seu parecer que não vislumbrou a imposição de sofrimento aos usuários, a despeito de pugnar pela procedência parcial da ação. Todavia, e este é o ponto nevrálgico na tutela de interesses coletivos, a análise do sofrimento individual para arbitramento do dano moral em sede de relações de consumo deve ceder terreno para que se concentre no caráter inibitório da reiteração da prática soberba e nociva de empresas que, por deter o monopólio do fornecimento de determinado serviço, valem-se dessa circunstância para impor situação de extremo e inegável prejuízo à outra, no caso os consumidores. Neste caso concreto, tenho que ao se valer de uma suposta imposição do órgão regulador para condicionar o fornecimento do serviço Speedy à contratação de provedor de acesso terceirizado, a requerida infringiu pelo menos dois princípios basilares dos contratos regidos pelas leis de consumo: não informou adequadamente e de antemão o consumidor a respeito do motivo da imposição de contratação de provedor de acesso, sendo certo inexistir causa legal para tanto (artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor), e condicionou ilegalmente o fornecimento de um produto a outro (artigo 39, inciso I do Código de Defesa do Consumidor). Agindo dessa forma, a empresa requerida desempenhou sua função social de maneira reprovável, uma vez que depois de angariar milhares de assinantes espalhados pelas diversas unidades da federação, fornecendo o serviço, à época, em regime de monopólio, valeu-se dessa confortável situação para impor ao consumidor a contratação de outro serviço sem justificativa clara e conclusiva, sem que houvesse previsão contratual expressa, clara, e de ciência inequívoca do aderente de que algum dia poderia vir a ser obrigado a pagar a mais pelo mesmo serviço que já era prestado. Trata-se de potestade vedada em contratos deste jaez. Não existe qualquer dúvida acerca da existência do dano moral imputado à ré, uma vez que decorrente de ato ilícito. Cumpre analisar sua extensão. À míngua de parâmetros legais de baliza no arbitramento do dano moral, mas atento que por se tratar de direito coletivo o valor imposto deve ser tal que implique num fator de desestímulo à reiteração dessa prática, reputo que o valor adequado a exercer tal função é equivalente ao dobro do valor apurado para o ressarcimento de todos os assinantes pelo período que ficaram sem acesso à Internet, nos termos acima preconizados. O valor apurado será revertido para o fundo de que trata o artigo 13 da Lei 7.347/85. Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados nesta ação civil pública proposta pela ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS USUÁRIOS DE ACESSO RÁPIDO em face da TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO – TELESP, e resolvo o mérito com base no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil c.c. artigo 103, inciso II da Lei 7.347/85, para: a) declarar inexigível a contratação de provedor de acesso para o fornecimento do serviço Speedy; b) indeferir o pedido de imposição à requerida de aceitação de provedor de acesso gratuito, prejudicado logicamente com o deferimento do pedido anterior; c) indeferir a condenação da requerida na devolução em dobro dos valores pagos aos provedores de acesso no período; d) condenar a requerida na devolução do valor da assinatura pelo período em que os usuários ficaram com o acesso bloqueado pela não contratação do provedor de acesso; e) condenar a requerida na indenização por danos morais ao direito coletivo lesado, correspondente ao dobro do valor apurado para o ressarcimento de todos os assinantes pelo período que ficaram sem acesso à Internet, nos termos acima preconizados; f) indeferir o pedido de imposição do fornecimento gratuito do modem ADSL; g) indeferir a condenação em indenizar os usuários por não ter oferecido a opção de compra ou aluguel do modem ADSL com terceiros; h) indeferir o pedido declaratório de ser abusiva a cláusula que garante apenas 10% da velocidade contratada, impondo a garantia de 100%, restituindo-se o eventualmente pago a mais; i) declarar a nulidade da cláusula 8.1 do contrato de adesão e fixar a data base para reajuste como sendo aquela da contratação do Speedy e condenar a requerida a ressarcir as diferenças, devidamente reajustadas monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescidas de juros legais desde a data do desembolso, aplicando aos assinantes o reajuste anual, baseado no mês da contratação, nos termos da fundamentação; j) indeferir a condenação na obrigação de fazer consistente na imposição de readequação do contrato padrão ao artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor, mediante a inclusão de informações claras, precisas e ostensivas. Em virtude da sucumbência recíproca, as partes arcarão com parcelas idênticas das custas processuais, bem como com os honorários de seus respectivos patronos, observado o artigo 18 da Lei 7.347/85. Publique-se, registre-se, intimem-se e cumpra-se. São Paulo, 10 de fevereiro de 2010. FERNANDO ANTONIO TASSO Juiz de Direito