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ILUSÃO AMOROSA EM FREUD E WINNICOTT


ANA LILA LEJARRAGA

A proposta deste trabalho é fazer um contraponto entre o caráter ilusório do amor na


teoria freudiana e na perspectiva winnicottiana, cientes de que Freud explicita claramente
sua teoria do amor enquanto a concepção de Winnicott deve ser lida nas entrelinhas.

Em Freud, a dinâmica amorosa se compreende em torno dos processos de


idealização e das tentativas de restauração do estado narcísico. O estar apaixonado consiste
num transbordar da libido narcisista sobre o objeto, tendo a virtude de cancelar repressões e
restabelecer perversões (Freud, 1914/1988). O objeto sexual é elevado ao nível do ideal, já
que possui o que falta ao eu para alcançar seu próprio ideal. O apaixonamento representa,
assim, uma via imediata de acesso ao ideal e à onipotência narcísica.
O investimento libidinal do objeto amado torna o eu apaixonado frágil e dependente
do amado. O trabalho de idealização outorga ao objeto virtudes e perfeições imaginárias,
deixando “cego” o eu apaixonado. E na medida em que o objeto é colocado no lugar do
ideal, o amante torna-se um humilde servo do objeto idealizado (Freud, 1921/1988).
Através da idealização do objeto de amor, e da aspiração de união com ele, o eu pretende a
fusão narcísica, a completude. O amor, por sua natureza narcísica, aspira a um reencontro
com os primeiros objetos, perdidos para sempre, e a uma plenitude impossível.
O apaixonamento tem um caráter ilusório em, ao menos, três sentidos: primeiro,
porque projeta no objeto os próprios ideais narcísicos, conferindo-lhe perfeições
inexistentes; segundo, porque os objetos escolhidos serão sempre meros substitutos dos
objetos incestuosos primordiais; e, terceiro, porque acena imaginariamente com uma
completude irrealizável.
A noção da ilusão, na teoria freudiana, remete à ordem do desejo e à negação do
desamparo e, embora não se trate propriamente de erro ou irrealidade, o ilusório funciona
como uma defesa contra a realidade. Assim, a metapsicologia do amor centrada no
narcisismo enfatiza o caráter impossível e ilusório da plena realização amorosa, já que o
sujeito idealiza a fusão com o objeto amado como forma de restaurar a plenitude narcísica
perdida, aspiração esta fadada ao fracasso. Por outro lado, o amor adquire um viés
patologizante, já que o cerne do amor consiste na idealização do amado e na submissão do
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sujeito apaixonado, o que acarreta que pouco se teorize sobre a experiência amorosa
saudável, enriquecedora do sentimento do si-mesmo. No mesmo sentido, a questão da
capacidade de amar é pouco explorada teoricamente desde a metapsicologia freudiana, já
que essa capacidade pressupõe uma conquista, índice de saúde psíquica, mas alheia à
dinâmica da paixão amorosa descrita acima.
Entendemos que o pensamento de Winnicott, com sua original visão da ilusão e da
transicionalidade, constitui uma inovadora perspectiva para abordar a dimensão do amor
como ilusório e transicional e, por isso mesmo, saudável, enriquecedor e criativo.
A concepção de Winnicott do impulso criativo remete à noção da criatividade
primária, experiência pela qual o bebê tem a ilusão de que existe uma realidade externa
correspondente a sua própria capacidade de criar. Essa ilusão é propiciada pela mãe
quando, no estágio da dependência absoluta, oferece o seio real ao bebê no momento em
que ele o alucina, ocorrendo sobreposição entre o que é “objetivamente percebido” e o que
é “subjetivamente concebido” (Winnicott, 1953/1975, p. 26). Estabelece-se, assim, um
momento de ilusão no bebê, já que a realidade coincide com sua fantasia, enriquecendo-a.
A experiência da ilusão e da onipotência é proporcionada pelos cuidados de uma mãe
devotada, permitindo ao bebê afirmar seu impulso interno criativo e acreditar na realidade
externa, condições para a posterior renúncia gradual a essa onipotência infantil.
A partir dessa experiência inicial desenvolvem-se os objetos e fenômenos
transicionais, marcados pelo paradoxo, que se continuam no brincar, na arte e na cultura.
Esses objetos e fenômenos transicionais inauguram as experiências da área intermediária,
do “entre”, mistura do impulso criativo interno e do “achado” externo. A terceira área ou
espaço potencial é uma área de experimentação, em que o indivíduo pode descansar da
árdua tarefa de manter as realidades interna e externa separadas, vivendo o paradoxo de não
estar totalmente no mundo subjetivo nem no objetivo, mas “entre” ambos. Winnicott
considera que o espaço potencial é a área em que podemos repousar e desfrutar, já que é o
espaço em que nos permitimos ser espontâneos, experienciando o viver criativo. A
confiança é a base para poder experienciar a área intermediária; o brincar criativo, o uso de
símbolos, os vínculos amorosos e toda a vida cultural. A experiência da transicionalidade se
prolonga ao longo da vida, como um espaço de não integração, de “recreio”, imprescindível
para a expressão do gesto espontâneo e da criatividade.
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No texto Vivendo de modo criativo (1970/1999), Winnicott discorre sobre o


casamento e a criatividade, afirmando que uma relação amorosa saudável constitui uma
experiência transicional, na qual os parceiros amorosos, sem abrir mão do gesto criativo e
espontâneo, são capazes de ter um relacionamento com o outro externo. No encontro
amoroso, que ocorre no espaço potencial, os dois parceiros são, as mesmo tempo, criados e
achados, encontrados na realidade externa e também criados subjetivamente. A pessoa
amada seria, paradoxalmente, outra pessoa reconhecida como diferente e parte do mundo
subjetivo. Desse modo, viver uma experiência amorosa se torna uma experiência criativa
em que o indivíduo usufrui e fortalece o sentimento do si-mesmo.
Assim, Winnicott confere outro valor à experiência de ilusão, já que é pela ilusão
que o bebê estabelece contato prazeroso e criativo com a realidade. A ilusão,
paradoxalmente, mais do que defesa contra a realidade, cria a realidade, já que o bebê cria
aquilo que estava lá para ser encontrado. Quando se estabelece um padrão ilusório e
criativo de contato com a realidade, o indivíduo está em condições de se desiludir e aceitar
a objetividade do mundo, mas continuará vivendo e usufruindo experiências criativas na
realidade compartilhada. Assim, a experiência amorosa é ilusória, porque o indivíduo que
ama cria ilusoriamente o parceiro amoroso que é encontrado na realidade. O amor é ilusório
porque é lúdico e saudável, porque os parceiros amorosos se criam mutuamente e se
reconhecem como diferentes.
Partindo da leitura de Winnicott, poderíamos abordar outros aspectos da experiência
amorosa, que dizem respeito principalmente à capacidade de amar, tais como o
conernimento pelo outro, o reconhecimento de sua alteridade, a intimidade e a confiança,
aspectos que adquirem significações novas e pouco exploradas pela perspectiva de Freud.
Entretanto, extrapolaria abordar essas questões pelos limites deste trabalho.
Retornando ao contraponto entre Freud e Winnicott, considerávamos que em Freud
o amor era teorizado em tom patologizante. Como o modelo de referência era o amor
apaixonado, cuja característica fundamental é a idealização, a teoria do amor aponta para
todas as modalidades de dominação e submissão: a cegueira da idealização, a desigualdade
do amante e do amado, a servidão amorosa, etc., traços todos eles considerados como
inerentes ao “amor”. Winnicott não parte do modelo do apaixonamento, mas do amor
materno e da capacidade de amar. Ele desenvolve a noção do amor materno, que remete
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principalmente a uma forma de identificação – a identificação materna – permitindo a


adaptação ativa e empática da mãe às necessidades infantis (Winnicott, 1956/2000). E em
várias passagens de sua obra Winnicott faz referência à “capacidade de amar”, que se
relaciona fundamentalmente com a capacidade de concernimento (1963/1990), ou seja, a
capacidade de considerar e se importar com o outro, reconhecido na sua alteridade. A
idealização não pareceria ser, na sua visão, uma característica essencial do amor. E quando
ele aborda algumas questões relativas ao casamento, seu referencial é o viver criativo e a
saúde. Parece possível construir, partindo de Winnicott, uma noção da experiência amorosa
saudável, que não pressuponha idealização ou inibição. O amor, como fenômeno
transicional, seria, da perspectiva winnicottiana, uma das experiências que permitem o
viver criativo e o sentir-se real, bases de uma vida emocionalmente saudável.
Entendemos que Winnicott explora terrenos não tocados por Freud. Não
poderíamos dizer que se trata de duas perspectivas teóricas opostas do fenômeno amoroso,
mas, quiçá, de leituras complementares desse fenômeno. Enquanto Freud, mergulhado no
romantismo sombrio alemão, teorizava sobre os apaixonamentos impossíveis e trágicos,
Winnicott, com outras influências teóricas, aborda a experiência amorosa saudável e a
construção positiva da capacidade de amar no sujeito, permitindo-nos vislumbrar novas
dimensões do fenômeno amoroso.

BIBLIOGRAFIA
FREUD, S. (1914). Introducción del narcisismo, vol. VII. Obras Completas. Buenos Aires:
Amorrortu, 1988.
________. (1921). Psicología de las masas y análisis del yo, vol. XVIII, Obras Completas.
Buenos Aires: Amorrortu, 1988.
WINNICOTT, D. W. (1953). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In:
________. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.
________. (1956). A preocupação materna primária. In: ________. Da pediatria à
psicanálise. Obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago, 2000.
________. (1963). O desenvolvimento da capacidade de se preocupar. In: ________. O
ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
________. (1970). Vivendo de modo criativo. In: ________. Tudo começa em casa. São
Paulo: Martins Fontes, 1999.
________. (1975). O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago.
________. (1990). O ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artes Médicas.
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