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Autores
Anna Maria Bertini1
Wladimir Taborda2
Jean Carl Silva3
Publicação: Jan-2007
Diabetes melito gestacional (DMG) é definido por intolerância a carboidratos de graus variáveis,
com início ou primeiro reconhecimento durante a gestação. A definição aplica-se
independentemente da utilização de insulina para o tratamento durante a gravidez e da
persistência ou não do problema após o parto.
Outros fatores associados são hipertensão arterial (PA maior que 140x90 mm/Hg), HDL-
colesterol inferior a 35 mg/dL e ou triglicérides superior a 250 mg/dL. Finalmente, mulheres que
tiveram natimortos em gestação anterior, malformações fetais e síndrome de ovários
policísticos também têm maior risco de serem portadoras de diabetes melito.
1
Professora Associada Livre Docente do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp);
Chefe do Setor de Diabetes e Gestação no Centro de Diabetes da Unifesp.
2
Doutor em Medicina pela Unifesp;
Diretor responsável pelo Setor de Maternidade do Hospital Israelita Albert Einstein.
3
Doutor em Medicina pela Unifesp;
Professor da Universidade de Joinville, Santa Catarina.
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Tabela 1. Diabetes com aparecimento na gestação
Classe Aparecimento Glicemia de Glicemia 2 horas pós- Tratamento
jejum prandial
A1 Gestacional <105 mg/dl <120 mg/dl Dieta
A2 Gestacional >105 mg/dl >120 mg/dl Insulina
Sim, o diabetes tipo 2 é uma doença genética, na maior parte dos casos, poligênica. Mutações
específicas estão presentes somente em pequenas subpopulações, como as encontradas em
casos de MODY (Mature Onset Diabetes of the Young). A doença é heterogênea, com fatores
genéticos e ambientais exercendo papéis importantes no seu desenvolvimento. A incidência é
especialmente alta em determinados grupos étnicos, como hispânicos, latinos, aborígines da
Austrália, índios Pima. História familiar de diabetes tipo 2 é importante fator de risco para
desenvolvimento da doença. Gêmeos idênticos apresentam concordância de 75% de
desenvolvimento da doença. O risco genético é devido a interações entre múltiplos genes.
Variações nas seqüências de aminoácidos de determinadas proteínas têm sido ligadas a uma
maior susceptibilidade à doença.
Durante a gravidez ocorrem muitos fenômenos adaptativos, sendo que do ponto de vista
metabólico destaca-se que a principal fonte de energia para o feto é a glicose de origem
materna, pois não há produção de glicose por ele. Assim, a passagem da glicose da mãe para
o feto ocorre por difusão facilitada e por meio de carreadores específicos de glicose. Ademais,
a insulina não atravessa a barreira placentária e, embora o feto possa produzir insulina a partir
da 12a semana de gestação, seu nível glicêmico é controlado pelo nível glicêmico materno
durante as 24 horas do dia. A concentração de glicose materna se mantém estável – variando
de 4,0 a 4,5 mmol/L ou 70 a 80 mg/dL – durante todo o dia ao longo da gestação, sendo a
concentração de glicose fetal somente 10 a 20 mg/dl inferior à materna. As concentrações de
insulina materna elevam-se com a evolução da gestação, chegando a dobrar no último
trimestre. O fenômeno é importante para suprir as necessidades crescentes de glicose para o
feto, caracterizando a gravidez normal como um estado de relativa e progressiva resistência à
insulina.
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Em função da elevação contínua das necessidades de glicose e aminoácidos ao longo da
gestação, a grávida apresenta valores de glicemia inferiores aos da mulher não grávida. As
solicitações fetais incluem aminoácidos, ácidos graxos e colesterol, além da glicose. Em jejuns
não prolongados (até 3 horas) a gestante recorre a mecanismos alternativos de produção de
energia como a gliconeogênese – que está prejudicada pela passagem contínua de
aminoácidos da mãe para o concepto – a glicogenólise e a hidrólise de triglicérides. Em jejuns
prolongados, as reações oxidativas de ácidos graxos no fígado levam a produção de corpos
cetônicos, que atravessam a barreira placentária livremente, tanto mais quanto maior for o
período de jejum. Em relação aos lipídios, há um aumento dos triglicérides e do HDL-colesterol
com o progredir da gestação.
Admite-se que toda a doença apresentada pelo feto e neonato pode ser explicada a partir do
hiperinsulinismo fetal, determinado pela hiperglicemia fetal persistente, que, por sua vez,
decorre da hiperglicemia materna. Assim, à medida que a gestante não produz insulina em
quantidade suficiente – ou apresenta resistência periférica à sua ação - para metabolizar a
glicose oriunda da dieta, estabelece-se o estado de hiperglicemia materna que obriga o feto a
estimular precocemente o seu próprio pâncreas, ainda em formação, a partir de 12 semanas de
idade gestacional. Ocorre também hiperaminoacidemia e hiperlipidemia fetal.
Não. Devem realizar teste(s) de diagnóstico como primeira abordagem, buscando ganhar
tempo para estabelecer o diagnóstico definitivo.
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quatro pontos). Dois ou mais valores alterados do OGTT-3h e glicemia de jejum normal
definem o diabetes gestacional A1.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe o OGTT- 2h, com sobrecarga de glicose de 75
g por via oral e duas determinações somente: em jejum e duas horas após a sobrecarga, sendo
um teste mais simples. Pela definição da OMS, a glicemia superior a 140 mg/dL em 2 horas
caracteriza o diabetes gestacional. Todos os OGTT de 2 ou 3 horas são realizados em jejum de
pelo menos 8 horas e dieta prévia rica em hidratos de carbono.
Sim. Valores glicêmicos ao acaso iguais ou superiores a 200 mg/dL devem ser considerados
no diagnóstico de diabetes melito.
15 - Então o diabetes gestacional (DMG) pode preceder o diabetes melito tipo 2 (DM2)?
Sim. Conforme já assinalamos, grande parte das pacientes com diagnóstico de DMG evolui
para DM2. Sabe-se também que muitas das características do DMG são semelhantes às
encontradas no DM2, como a resistência à insulina. A gestação é também um modelo
transitório de hiperlipidemia, elevação da leptina e desenvolvimento de um perfil aterogênico,
associado a alterações na coagulação e fibrinólise, o que aumenta o risco de fenômenos
trombeembólicos, demonstrado em estudos epidemiológicos.
Por outro lado, o DM2 pode apresentar uma fase pré-clínica com vários anos de duração. A
elevação da glicemia ocorre gradualmente e nos seus estágios iniciais não é intensa o bastante
para causar os sintomas clássicos da doença. Apesar disso, mesmo em fase inicial
(caracterizada por uma tolerância à glicose diminuída) podem ocorrer complicações vasculares.
Essas considerações ratificam o conceito de que estabelecer o diagnóstico de DMG constitui
uma importante ferramenta para prevenção e diagnóstico precoce de DM2.
Sim. A porcentagem é variável na literatura e um dos marcadores que pode predizer esta
evolução é a presença dos auto-anticorpos anti-descarboxilase do ácido glutâmico (GAD). A
prevalência destes auto-anticorpos pode chegar a 16% entre pacientes com DMG. A ocorrência
de maiores necessidades de insulina na gestação leva a hiperfunção das células beta,
resultando em maior exposição antigênica, facilitando a precipitação de fenômenos auto-
imunes em pacientes geneticamente predispostas à doença. Assim, se há hiperglicemia acima
200 mg/dL na gestação, o exame laboratorial GAD deve ser realizado.
Cumpre assinalar que a dieta na grávida com diabetes é a mesma recomendada para
gestantes normais. Em gestações normais a glicemia plasmática materna apresenta pouca
variação ao longo do dia em função da importante atividade da insulina de origem pancreática.
Após qualquer sobrecarga de glicose os níveis de glicose retornam ao basal (média de 80
mg/dL com variação de até 20 mg/dL) em 2 ou 3 horas. Se a gestante ficar 3 horas sem
alimentação, a glicemia cai para cerca de 70 mg/dL. Assim, recomenda-se ingestão de
alimentos a cada 3 horas, divididos em café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da
tarde, jantar e lanche noturno.
A dieta deve ser composta por 50% de hidratos de carbono; 30% de fibras e gorduras (pelo
menos metade poliinsaturada) e 20% de proteínas. É importante considerar duas variáveis: o
peso pré-gestacional (classificando-as em obesas e não obesas) e o trimestre ou semanas de
gestação. Na gestante não obesa, devem-se ter como meta do primeiro trimestre a ingestão de
até 30 kcal/kg/24 horas, alcançando 38 kcal/kg/24 horas nos segundo e terceiro trimestres de
gestação, já que nesta fase elevam-se muito as demandas fetais por todos os nutrientes. No
final do 2º trimestre (de 26 a 28 semanas de gestação) o feto tem em média 1 quilo e no final
de mais um trimestre (a termo) alcançará em média 3 a 3,5 quilos. Em gestantes obesas, deve-
se considerar uma restrição de 30%, indicando até 25 kcal/kg/24 horas.
Exercícios são muito importantes para o manejo do diabetes, tanto na gravidez quanto fora
dela. Existem fortes evidencias científicas que comprovam que exercícios e dieta adequados
são úteis para a manutenção da glicemia materna em níveis normais. Dieta e exercício seriam
as únicas medidas terapêuticas necessárias nas gestantes com DMG do grupo A1 (com
tolerância diminuída a glicose e glicemia de jejum normal). Na prática diária, entretanto,
constata-se que gestantes são menos aderentes à realização de exercícios físicos. Desta
forma, mesmo grávidas com DMG grupo A1 às vezes necessitam suplementação de insulina
ou utilização de hipoglicemiantes orais para o controle da glicemia a partir da 28ª ou 30ª
semana de gestação. Os exercícios na gravidez devem ser aeróbios, preferencialmente
caminhadas e hidroginástica. São particularmente úteis em gestantes com sobrepeso ou
obesidade.
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A primeira aplicação de insulina deve ser realizada no ambulatório médico com o auxílio da
enfermeira, que dará os primeiros ensinamentos no manuseio da sua aplicação. Alguns
serviços preferem internar por 24 horas as gestantes para o aprendizado com o manejo da
insulina.
As mais utilizadas são a insulina rápida (R) e a intermediária NPH (N). O cálculo da dosagem
inicial de insulina varia com o trimestre de gestação no qual a gestantes se encontra, devendo
a dose diária ser dividida em três ou quatro aplicações.
No 1º trimestre (até 12 semanas) da gestação utiliza-se 0,5 U/kg/24horas para gestantes não
obesas e 0,7 U/kg/24horas se a gestante for obesa. A partir da 26ª semana inicia-se com 0,8
U/kg/24horas com aumento progressivo até 1,2 u/kg//24horas.
Por exemplo:
• gestante de 60 kg na 30ª semana
• 0,8 U x 60 kg = 48 U em 24horas, divididas em 4 doses de 12 unidades
o antes do café da manhã 12 u de insulina NPH;
o antes do almoço 12 u de insulina regular;
o antes do jantar 12 u de insulina regular
o ao deitar 12 u de insulina NPH.
• As demais modificações das quantidades de insulina serão determinadas de acordo
com o perfil glicêmico obtido nos dias seguintes.
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ficando apenas 0,2% livre para cruzar a barreira placentária. Ademais, possui meia vida de
cerca de 4 horas, o que colabora para a não detecção no sangue fetal logo após o parto.
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29 - Quais os principais resultados clínicos da glibenclamida no tratamento do diabetes
melito gestacional (DMG)?
Podemos evocar diferentes vantagens em prol da utilização de hipoglicemiantes por via oral. O
uso de insulina necessita habilidade para manuseio e cuidados em seu armazenamento (que
exige refrigeração), que podem ser um problema limitante para pacientes desfavorecidas do
ponto de vista sócio-econômico. As insulinas humanas e as altamente purificadas,
teoricamente, não são imunogênicas, embora anticorpos antiinsulina tenham sido encontrados
em diabéticas tipo 1 e 2. É consenso que crianças anticorpo-positivo têm uma maior chance de
desenvolver diabetes tipo 1 e serem alérgicas à insulina exógena. Além disso, a aceitação de
medicamentos por via oral é muito maior e a insulinoterapia é tratamento muito mais caro que
os hipoglicemiantes orais. O controle glicêmico materno com a glibenclamida é semelhante ao
da insulina na grande maioria dos casos. As complicações perinatais em relação a
macrossomia e hipoglicemia neonatal são semelhantes às encontradas com o uso da insulina.
As malformações congênitas variam de 2,7% a 11,9%. Ocorrem com maior freqüência quando
a hemoglobina glicada for superior a 10% no primeiro trimestre, indicando que houve
hiperglicemia no período de organogênese (até a 8ª semana de gestação). São mais
freqüentes no diabetes melito tipo 1 e menos freqüentes no gestacional. O exame ultra-
sonográfico obstétrico realizado entre 11 e 14 semanas é obrigatório e permite o rastreamento
das cromossomopatias por meio da medida da translucência nucal, do fluxo no ducto venoso e
da presença de osso nasal. De acordo com os resultados do ultra-som podemos indicar
procedimentos invasivos (amostra de vilo corial ou amniocentese) para avaliar o cariótipo fetal.
O principal exame é a ultra-sonografia morfológica fetal, realizada entre 20ª e 24ª semanas de
gestação que pode avaliar a presença de malformações e macrossomia (o melhor elemento é
a circunferência abdominal do concepto), além de permitir o rastreamento do risco de
prematuridade (por meio da medida do comprimento do colo uterino) e de pré-eclampsia
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(Doplervelocimetria das artérias uterinas). Além disso, a ecocardiografia fetal é rotineira na
gestante diabética entre 19 e 22 semanas de gestação, com o objetivo de diagnóstico de
cardiopatia fetal, permitindo também tratamento e aconselhamento.
São elas:
• perfil biofísico fetal,
• cardiotocografia anteparto,
• doplervelocimetria das artérias uterinas, umbilicais e de cerebral média.
Devemos assinalar, entretanto, que a melhor prova para avaliação do bem estar fetal em
conceptos de gestantes diabéticas é obter uma glicemia plasmática materna normal, capaz de
evitar todas as complicações perinatais.
36 - Leitura recomendada
American Diabetes Association. Diagnosis and classification of diabetes mellitus. Diabetes Care
2005,28:37-42.
Barker DJ. The fetal and infant origins of adult disease. BMJ 1990:301:1111.
Cunniingham FG, Leveno KJ, Bloom SL et al. Diabetes. In Williams Obstetrics. 22nd ed. EUA.
McGRAW-HILL, 2006, pp. 1169-1187.
Langer O, Conway DL, Berkus MD et al. A comparison of gliburide and insulin in women with
gestational diabetes mellitus. New Engl J Med 2000,343:1134-1138.
Utpala G, Sysyn GD. Abnormal fetal growth: intrauterine growth retardation, small for
gestational age, large for gestational age. Pediatrics Clin North America 2004,51:1-14.
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