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Notas de Aula
Ademir J. Camargo
Fórmulas de integração
Γ 1 !
I.1
Γ 1 ⁄2
⁄
I.2
2
Função gama
Γ Γ. 1
Γ 1 Γ ! Γ. 2
1 ⁄
Γ Γ. 3
2
⁄
1 1·3·5 2 1
Γ 1, 2, 3, Γ. 4
2 2
5
Capítulo 1
No fim do século XIX os cientistas acreditavam que as leis físicas conhecidas eram su-
ficientes para explicar os fenômenos observados na natureza. A estrutura básica da física do
século XIX era, essencialmente, formada pela mecânica clássica, termodinâmica e teoria ele-
tromagnética. Os físicos acreditavam que qualquer problema relacionado aos fenômenos natu-
rais poderia ser solucionado aplicando as leis da física clássica conhecidas na época. Nessa
época, a física clássica estava fundamentalmente dividida em duas partes: a teoria corpuscu-
lar e a teoria ondulatória. Aceitava-se que matéria era formada por corpúsculo ou partícula e
a luz tinha uma natureza ondulatória.
Acreditava-se que corpúsculo e onda eram coisas totalmente distintas.
Entretanto, uma profunda revolução ocorreu no pensamento físico em um curto período de
tempo que se estende do final do século XIX ao início do século XX. As novas leis físicas
emergidas desta revolução levaram ao surgimento de áreas completamente novas. Contudo, os
fundamentos básicos da física clássica permaneceram, mas com limites de validade bem defi-
nidos.
Muitos acontecimentos científicos ocorrem nesse extraordinário período histórico. En-
tre os principais acontecimentos ocorridos neste período podemos citar brevemente os seguin-
tes:
Corpo negro é um objeto físico teórico proposto por Gustav Robet Kirchhoff (1824-
1887) capaz de absorver 100% de toda radiação eletromagnética incidente. Como ele absorve
toda a radiação que nele incide, então nenhum tipo de radiação pode atravessá-lo ou ser refle-
tida. Nesse sentido, a 0 K, o corpo negro se mostra como um objeto perfeitamente negro. Co-
mo ele é capaz de absorver todos os comprimentos de ondas, o corpo negro também funciona
como um radiador eletromagnético ideal, isto é, quando aquecido acima do zero absoluto é
capaz de irradiar em todos os comprimentos de onda. Assim, um corpo negro é um absorve-
dor e emissor ideal de radiação, isto é, toda a radiação incidente é absorvida e, em seguida, é
emitida. Sabemos, experimentalmente, que o espectro da radiação emitida por um corpo físico
qualquer depende da temperatura. Por exemplo: quando aquecemos um pedaço de ferro ve-
mos que sua coloração passa pelas cores vermelha, laranja, amarela, branca e azul. Concluí-
mos, a partir desta observação experimental, que existe uma relação direta em entre a radia-
ção emitida pelos corpos reais e sua temperatura. Por definição, esta relação observada ex-
perimentalmente se mantém para um corpo negro ideal.
7
Figura 1.2. Função de distribuição da densidade de energia δ λ, em função do comprimento de onda λ e da tem-
peratura T em Kelvin. Observe que os pontos de máximos das curvas deslocam-se para a esquerda à medida
que a temperatura aumenta. (Figura modificada de Physical Chemistry, Peter Atkins, 7a ed.).
A Figura 1.2 mostra que, para cada temperatura, a curva da densidade de energia no
interior da cavidade apresenta um ponto de máximo para um determinado comprimento de
onda. À medida que a temperatura aumenta os máximos deslocam-se da região do infraver-
melho (maior comprimento de onda) para a região do ultravioleta (menor comprimento de
onda). O total de energia emitido para uma determinada temperatura T é dado pela área sob a
curva correspondente. Assim, quanto maior a temperatura maior a área sob a curva e, portan-
to, maior a quantidade de energia emitida. Como há energia na radiação, podemos definir uma
densidade ρ de energia no interior da cavidade:
ρ (1.1)
onde ρ representa a densidade de energia no interior da cavidade a qual depende da tempe-
ratura T da cavidade, V é o volume da cavidade e E é a energia total devida a todos os com-
primentos de ondas no interior da cavidade. Vamos mostrar que essa densidade de energia no
interior da cavidade exerce uma pressão nas paredes da cavidade, chamada de pressão de ra-
diação. Em seguida, vamos usar essa pressão, juntamente com as leis da termodinâmica, para
9
derivarmos uma relação matemática que relaciona a densidade ρ com a temperatura T das
paredes da cavidade.
Começamos nossa análise observando que as ondas eletromagnéticas são portadoras
de momento. O momento da radiação produz uma pequena pressão, a pressão de radiação,
quando são refletidas ou absorvidas na superfície interna da cavidade do corpo negro. A pres-
são da radiação eletromagnética incidente em uma superfície que a absorve ou a reflete foi
deduzida teoricamente por James Clerk Maxwell em 1871 e Adolfo Bartoli em 1876. A com-
provação experimental foi realizada por Lebedev em 1900 e por Ernest Fox Nichols & Gor-
don Ferrie Hull em 1901.
Para obter uma expressão matemática da pressão de radiação, suponha, inicialmente,
que ondas eletromagnéticas planas incidam perpendicularmente sobre uma superfície perfei-
tamente absorvente. Ondas planas são ondas cuja frente de onda é um plano. Agora, seja Q a
quantidade de momento por unidade de volume. A quantidade de momento que chega à su-
perfície por unidade de tempo é
Q ⋅ cz ⋅ A .
. (1.4)
Usando a relação termodinâmica de Maxwell, podemos reescrever a Equação
. (1.5)
Rearranjando a Equação (1.1) e derivando-a em relação a V com T constante, temos
⇒ ⇒ . (1.6)
Além disso,
11
⇒ . (1.7)
Usando as equações (1.7) e (1.6) em (1.5), temos:
1 1 1 1
⇒4 ⇒ 4
3 3
4 4
. (1.8)
Na dedução da equação acima fizemos . O valor experimental da constante α é
7,569 10 · · . A Equação (1.8) é conhecida como lei de Stefan-
Boltzmann1 e nos permite calcular a densidade de energia no interior da cavidade em função
da temperatura. Inicialmente, essa equação foi obtida experimentalmente por Stefan. Boltz-
mann, que foi aluno de Stefan, fez a sua dedução teórica.
A emissão de energia de uma cavidade por unidade de área de abertura do orifício é
diretamente proporcional à densidade de energia ρ no interior da cavidade. Esta emissão de
energia na forma de radiação eletromagnética por unidade de área é chamada de “poder emis-
sivo total” (εtotal) ou simplesmente emissividade e é dado por , onde 5,672
10 · · · ou 5,672 10 · · . Como a emissividade é direta-
mente proporcional à temperatura, podemos usar esta equação para estabelecer uma escala de
temperaturas absolutas. Um fato interessante na Equação (1.8) é que ela foi obtida usando as
leis da termodinâmica.
A energia no interior da cavidade é o resultado da soma das energias de vários com-
primentos de ondas. Logo, a densidade de energia dρ resultante das contribuições das radia-
ções com comprimentos de ondas entre λ e λ+dλ pode ser calculada usando a Equação
λ, λ, λ, (1.9)
onde λ, é chamada de função de distribuição da densidade de energia no interior da
cavidade do corpo negro. Se a forma analítica da função de distribuição λ, for conheci-
da, poderemos calcular a densidade total de energia no interior da cavidade, para uma dada
temperatura T, por integração:
1
Ludwig Eduard Boltzmann (Viena, 20/02/1844 — Duino-Aurisina, 5/09/1906) físico austríaco que foi aluno
de Joseph Stefan e ficou conhecido pelo seu trabalho em termodinâmica estatística. É considerado junto com
Josiah Willard Gibbs e James Clerk Maxwell como o fundador da mecânica estatística. Foi defensor da teoria
atómica, numa época em que esta era bem controversa.
12
∞
λ,
λ, λ. (1.10)
Esta equação representa a soma das contribuições de todos os comprimentos de onda de zero
ao infinito para a cavidade em equilíbrio térmico à temperatura T. Observe que em (1.10) es-
tamos pensando em λ como sendo uma variável contínua, i.e., todos os comprimentos de on-
das são possíveis no interior da cavidade. Lembre-se que a densidade de energia é uma função
da temperatura T, isto é, fixada a temperatura, a densidade ρ também apresentara valor defini-
do. Medir experimentalmente os comprimentos de onda das radiações emitidas pelo corpo
negro é bastante fácil. Verifica-se, experimentalmente (Figura 1.2), que o comprimento de
onda máximo, λ , desta distribuição é inversamente proporcional à temperatura, i.e.,
· .λ (1.11)
A Equação (1.11) é conhecida como lei de deslocamento de Wien ( em homenagem ao físico
alemão Wilhelm Carl Werner Otto Fritz Franz Wien que recebeu o prêmio Nobel em 1911
pela descoberta da lei do deslocamento em 1893). Não confunda com a lei de Wien ou lei da
distribuição de Wien2 que descreve o espectro da radiação térmica do corpo negro. A cons-
tante 1,44 · é chamada de segunda quantização da radiação. Os pontos de máxi-
mos da Figura 1.2 ilustra a lei do deslocamento de Wien. Usando esta lei poderemos calcular,
por exemplo, que o comprimento de onda máximo de um corpo negro que se encontra a
1000K é λmax 2900 nm. Uma aplicação interessante da lei do deslocamento de Wien é que
com ela podemos calcular a temperatura das estrelas a milhões de anos-luz de distância sim-
plesmente medindo seu comprimento de onda máximo de radiação e supondo que as estrelas
comportam-se, aproximadamente, como corpos negros ideais. Calcular a função de distribui-
ção da densidade de energia δ λ, era um dos grandes interesses dos físicos do final do sé-
culo XIX. Rayleigh, usando as leis bem estabelecidas da física clássica, obteve uma fórmula
para δ λ, , cujas consequências foram catastróficas para a física clássica.
No próximo parágrafo discutiremos o modelo proposto por Rayleigh para a função de
distribuição da densidade de energia no interior da cavidade de um corpo negro.
Exercícios
1) Calcule a densidade de energia da radiação, ρ (T ) , em uma cavidade para as temperaturas 2000, 5000,
10000 e 100000 K.
2
I ( f , T ) = 2hf 3e−hf kT
c2 , onde I(f,T) é a quantidade de energia por unidade de área, unidade de tempo,
unidade de ângulo sólido e unidade de frequência. f é a frequência, k é a constante de Boltzman, T a temperatura
e h é a constante de Planck. Esta fórmula pode ser deduzida a partir da equação de Planck.
13
2) A que comprimento de onda ocorre o máximo na função de distribuição da densidade de energia para
corpo negro se: i) T = 3000 K? ii) T = 5000 K?
3) Qual deverá ser a temperatura para que a função de distribuição da densidade de energia tenha um má-
ximo a 6.000 angstroms?
John William Strutt, 3rd Baron Rayleigh (1842-1919), com uma pequena contribui-
ção de Sir James Hopwood Jeans (1877 – 1946), derivou uma fórmula para a função de dis-
tribuição da densidade de energia δ λ, no interior da cavidade do corpo negro usando os
conceitos clássicos da física. Rayleigh usou o teorema da equipartição da energia. Este teo-
rema afirma que
“se a energia de uma molécula puder ser escrita na forma de uma soma de termos, onde cada um dos
quais proporcionais ao quadrado de uma velocidade ou de um deslocamento, então cada um dos termos qua-
drados contribui com ⁄2 para a energia média total3”.
des da cavidade. Rayleigh e Jeans propuseram uma estratégia para calcular o número desses
modos vibracionais ou número de ondas estacionarias compreendidos entre λ e λ λ,
por unidade de volume da cavidade. O valor que eles encontraram foi
8π
λ.
λ
No próximo parágrafo, vamos derivar esta expressão em detalhes. Para simplificar o proble-
ma, consideraremos uma cavidade metálica cúbica com arestas L. Não há perca de generali-
dade na argumentação devido ao fato de estarmos usando um tipo particular de cavidade,
pois, como veremos adiante, o número de ondas estacionárias no interior da cavidade não
depende do tipo de material empregado ou da forma geométrica da cavidade, isto é, só depen-
de da temperatura.
Suponhamos que as paredes da cavidade sejam aquecidas uniformemente até certa
temperatura T. Quando aquecidas, as paredes emitirão radiações eletromagnéticas. Isto ocorre
por causa dos movimentos acelerado das partículas carregadas na parede metálica devido à
agitação térmica. Ao invés de estudarmos detalhadamente o comportamento das partículas na
parede da cavidade, estudaremos o comportamento das ondas eletromagnéticas em seu interi-
or. Como já mencionado, as ondas eletromagnéticas estacionárias na cavidade não podem
assumir qualquer valor λ. De fato, os campos elétricos E das ondas devem ter valores nulos
nas superfícies metálicas, isto é, amplitude de campo elétrico zero. Do contrário, as ondas
seriam absorvidas pelas paredes metálicas e não seriam refletidas. Além disso, as ondas esta-
cionárias no interior da cavidade devem satisfazer a equação da onda em três dimensões:
1
, (1.12)
3
Gilbert Castellan, Fundamentos de Físico-Química, Vol. 1, pag. 77.
15
A solução de (1.13) pode ser obtida usando o método da separação de variáveis. Este
procedimento consiste na suposição de que a solução possa ser escrita como um produto de
quatro funções, cada uma delas dependendo de uma única variável, ou seja,
, , , . (1.14)
Observe que o lado esquerdo da Equação (1.17) só depende de x e o lado direito é indepen-
dente de x. Além disso, as variáveis x, y, z e t são independentes. Essa igualdade só tem senti-
do se os lados da equação forem ambos iguais a uma mesma constante, digamos . O sinal
negativo e o quadrado são usados aqui para simplificar os cálculos que se seguirão. Logo,
1
. (1.18)
Resolvendo (1.18) para a função , teremos:
0. (1.19)
A Equação (1.19) é uma equação diferencial ordinária (EDO) homogênea, linear e com coefi-
cientes constantes, cuja solução pode ser obtida fazendo , onde r é uma constante
que pode ser determinada derivando este ansatz duas vezes em relação a x e substituindo em
(1.19):
0
0.
Esta última equação só é verdadeira se 0. Com essa observação obtemos
, onde √ 1 é a unidade complexa. Logo, a solução de (1.19) pode ser escrita
como
cos sin . (1.20)
Em (1.20) usamos a relação de Euler, isto é,
16
sin . (1.23)
C e D são constantes a serem determinadas. Procedimento similar pode ser usado para encon-
trar a solução geral de T ( t ) :
2 2
sin sin 2 .
Logo, 2 ⁄ é o período de (1.26). Por outro lado, sabemos que o período temporal T de uma
onda eletromagnética é dado por λ⁄ , onde λ é o comprimento de onda e c é a velocida-
de da luz. Igualando estes dois valores, obtemos o valor da constate k:
2 λ
,
2
·
λ
O número k é chamado de número de onda, pois expressa o número de comprimento de on-
das em um comprimento de 2π. Em espectroscopia, o número de ondas é, geralmente, indica-
do por ν e é definido como sendo o inverso do comprimento de onda: ν 1⁄λ. Substituindo
k em (1.26), temos a forma funcional de :
2
sin .
λ
A solução geral de (1.14) é obtida multiplicando as funções , , e :
2
, , , sin sin sin sin . (1.27)
λ
Em (1.27) fizemos · · · . Note que a função de onda , , , é função perió-
dica de x, y, z e t. Derivando parcialmente (1.27) duas vezes em relação a x, y, z e t e substitu-
indo em (1.13), temos:
1 2
,
λ
4
. (1.28)
λ
Como a frequência ν e o comprimento de onda λ de uma onda eletromagnética estão relacio-
nados pela equação λν, podemos reescrever (1.28) como segue:
4 ν
. (1.29)
Note que (1.29) tem dois graus de liberdade, isto é, fixado os valores de e o valor de
fica determinado. Isto significa que existem duas ondas na cavidade que obedecem à condição
(1.29), ou seja, suponha que seja fixado, então poderíamos ter, por exemplo, e
ou e . Essas duas possibilidades obedecem à condição (1.29). Os físi-
cos costumam interpretar este fato dizendo que a Equação (1.29) representa duas ondas ele-
tromagnéticas de frequência ν polarizadas perpendicularmente. Não devemos esquecer tam-
bém que a condição para que uma onda estacionária exista na cavidade é expressa por (1.28)
18
ou (1.29). L é fixo, pois é a aresta da cavidade metálica cúbica, e a frequência ν varia de zero
ao infinito. Para cada valor da frequência ν, o número de modos vibracionais N possíveis,
resultante das combinações , e , deve obedecer à condição (1.29), isto é,
ν ⁄ . Desse modo, podemos pensar em n como sendo o raio de uma esfera dada
⁄ ⁄
por ν ⁄ no espaço dos ’s. Quanto maior for ν maior
será o número de modos vibracionais possíveis, pois maior é a superfície da esfera, e cada
ponto da superfície da esfera representa uma onda estacionaria possível de se encaixar na ca-
vidade. Se ν for zero, então o número possível de modos será zero. Para sabermos o número
total N de combinações possíveis para todos os comprimentos de ondas possíveis basta calcu-
lar o volume da maior esfera que contém as demais. Lembre-se que estamos trabalhando no
espaço dos n’s. Portanto, N será dado por
4 4 4 4 ν (1.30)
·
3 3 3
Esta Equação representa o volume da esfera de raio n. Como visto anteriormente, cada onda
eletromagnética no interior da cavidade é a combinação de duas outras ondas polarizadas per-
pendicularmente uma em relação à outra. Isto significa que devemos multiplicar a Equação
(1.30) por dois. Um segundo problema de (1.30) é que esta equação leva em consideração
tanto os valores positivos, quanto os negativos dos ’s. Mas, na solução de (1.13), conside-
ramos apenas os valores positivos dos , e . Assim, devemos dividir (1.30) por oito,
isto é, só nos interessa a primeira octante da esfera. Aliás, a divisão por 8 foi a única contribu-
ição feita por Jeans à fórmula de Rayleigh. Feito essas correções, podemos tomar o volume
como uma medida do número de modos vibracionais ou ondas estacionárias no interior da
cavidade metálica cúbica. Esta aproximação é tanto melhor quanto maior for o tamanho da
cavidade em relação aos comprimentos de ondas. Este é exatamente o caso das ondas eletro-
magnéticas em uma cavidade finita. Usando (1.29) em (1.30) obtemos finalmente uma ex-
pressão para o cálculo do número de modos vibracionais, N, na cavidade:
2 4 4 ν 8 ν (1.31)
·
8 3 3
Esta expressão nos fornece o número de ondas estacionárias na cavidade em função da aresta
L e da frequência ν que está em equilíbrio térmico com as paredes do corpo negro. Para obter
o número de ondas estacionárias compreendido entre ν e ν ν devemos derivar (1.31)
em relação ν.
19
8 ν
ν. (1.32)
Esta é a famosa fórmula de Rayleigh - Jeans para a função distribuição da densidade de ener-
gia no interior da cavidade em função da frequência. No entanto, ela prediz uma densidade de
energia infinita quando ν ∞, ou, de modo equivalente, quando λ 0 (veja Figura 1.3), isto
é, uma densidade de energia infinita na cavidade, o que é um absurdo! A Equação (1.34)
mostra que mesmo os corpos a temperaturas próximas do 0 K são capazes de emitir radiações
a altas frequências. Mas, sabemos, do cotidiano, que os corpos só emitem luz visível (altas
frequências ) quando estão bem aquecidos. De acordo com a fórmula de Reyleigh-Jeans não
deveria nem mesmo haver escuridão.
A Equação (1.34) pode ser expressa em termos do comprimento de onda λ ao invés
da frequência ν. Usando a expressão ν ⁄λ e derivando a frequência ν em relação ao com-
primento de onda λ, temos:
ν λ. (1.35)
λ
No intervalo de frequência ν e ν ν , a densidade de energia é a mesma, quer a distribu-
ição da densidade de energia seja expressa em função da frequência ou do comprimento de
onda, ou seja,
ν, ν, ν.
λ, λ, λ.
Como a aumenta com o aumento da frequência ν e diminui com o aumento de λ, então
ν, νe λ, λ devem ter sinais opostos, isto é,
20
λ, λ ν, ν. (1.36)
Usando a relação ν ⁄λ e as equações (1.34) e (1.35) em (1.36), temos
8
λ, λ λ.
λ
A partir desta expressão obtém-se a função de distribuição da densidade de energia no interior
da cavidade em termos do comprimento de onda λ:
8
λ, . (1.37)
λ
A Figura 1.3 mostra que existe um bom acordo entre teoria e experimento para altos valores
de λ. A completa discordância ocorre para valores baixos de λ, ou seja, na região do ultravio-
leta. Daí o nome catástrofe do ultravioleta!!!
Figura 1.3. Gráfico mostrando a distribuição da densidade de energia λ, em função de λ. A fórmula de Rayleigh -
Jeans mostra que quando λ temos λ, ∞. (Figura modificada de Physical Chemistry, Peter Atkins,
7a ed.)
Em 1900, Max Planck4, aos quarenta e dois anos, propôs uma solução para a obtenção
da função de distribuição da densidade de energia λ, da cavidade do corpo negro usando
um procedimento que não era nada ortodoxo. Max Planck não discordava do procedimento
metodológico de Rayleigh para a obtenção do número de ondas estacionárias no interior da
cavidade dado pelas fórmulas (1.31) e (1.32). Planck pensou que talvez o problema estivesse
na energia média das ondas, , obtida usando o teorema da equipartição da energia. Planck
pensou em um procedimento diferente para o cálculo da energia média dos osciladores. Para
este cálculo Max Planck pensou nas seguintes hipóteses:
1. as energias dos osciladores são discretas e igualmente espaçadas, isto é, osciladores
encontram-se no estado fundamental cuja energia relativa será denotada por zero, os-
ciladores com energia ε, osciladores com energia 2ε e assim por diante;
2. os osciladores são distribuídos segundo a lei de distribuição de Boltzmann
⁄
;
3. a energia do oscilador é diretamente proporcional à frequência de oscilação, isto é,
ν, onde ν é a frequência de oscilação e h é uma constante de proporcionalidade a
ser determinada.
A primeira hipótese é bastante esotérica, pois, nada indicava no final do século XIX
que a energia pudesse ser, em algumas circunstâncias, uma quantidade quantizada, isto é,
apresentar valores discretos. O próprio Planck não acreditava que a quantização da energia
dos osciladores tivesse uma interpretação física real. Na verdade ele pensava que se tratava
apenas de um artifício matemático para chegar à fórmula da função de distribuição da densi-
dade de energia da cavidade. Vale lembrar que o número de ondas estacionárias é igual ao
número de osciladores na parede da cavidade, pois, cada onda foi produzida por um oscilador.
Rayleigh-Jeans usou o teorema da equipartição da energia para calcular a energia média dos
osciladores. Planck usou a hipótese de que as energias dos osciladores eram discretas e igual-
mente espaçadas e a hipótese de que a distribuição destas energias obedecia à distribuição de
Boltzman para calcular a energia média dos osciladores. O cálculo da energia média dos osci-
ladores será feito em três etapas: i) cálculo do número total N de osciladores, ii) cálculo da
energia total dos osciladores e iii) cálculo da energia média dos osciladores, fazendo
⁄ . Observamos, inicialmente, que o número total de osciladores N é obtido soman-
do os osciladores que estão no estado fundamental, isto é, com energia 0, mais o número
de osciladores com energia , mais o número de osciladores com energia 2 e assim por
diante. Ou seja,
4
Max Karl Ernst Ludwig Planck (Kiel, 23/04/1858 — Göttingen, 4/10/1947) físico alemão que ganhou o
prêmio Nobel de Física em 1918 e é considerado o pai da física quântica. Planck obteve sua fórmula inicialmente
22
⁄ ⁄ ⁄
⁄ ⁄ ⁄
1 .
⁄
Fazendo , na Equação anterior, temos que 1 . A
expressão entre parêntese é uma série geométrica de razão x, com | | 1. Portanto, esta série
é convergente e converge para 1⁄ 1 . Multiplicando este resultado por , obtemos o
número total de osciladores N:
. (1.38)
1
A energia média dos osciladores é obtida dividindo a energia total dos osciladores pelo
número total N de osciladores, ou seja,
·0 · ·2 ·3
⁄ ⁄ ⁄
· · ·2 · ·3 ·
⁄ ⁄ ⁄
· · ·2 · ·3 ·
· · 2 2 2
·
⁄
No resultado anterior, fizemos . Usando o fato de que a série 2 2
2 é convergente e converge para ⁄ 1 , podemos escrever a energia média
como segue:
· (1.39)
1
Usando (1.38) em (1.39), obtemos:
·
· 1 1
1
⁄
Dividindo o numerador e o denominador desta equação por 1⁄ e fazendo , ob-
temos a expressão para a energia média dos osciladores:
· (1.40)
1
por interpolação.
23
Usando o valor da energia média dos osciladores dado pela expressão (1.40) no lugar de
da Equação (1.37), obtemos a expressão matemática da função de distribuição da densidade
de energia em termos de comprimento de onda λ:
8
λ, ·
(1.41)
λ 1
A Equação (1.41) mostra que se a energia ε for constante, então λ, tende para o infinito
quando λ → 0 . No entanto, se usamos o terceiro postulado de Max Planck, isto é,
ν ,
λ
em (1.41), teremos para a função de distribuição da densidade de energia a seguinte fórmula:
8
λ, ·
(1.42)
λ λ 1
A lei do deslocamento de Wien pode ser obtida da fórmula de Planck calculando a de-
rivada da função de distribuição da densidade de energia no interior da cavidade e igualando a
zero:
⁄λ ⁄λ
8 5λ 1 λ ·
λ
λ, 0
λ
λ λ 1
⁄λ ⁄λ
5λ 1 λ . 0,
λ
24
⁄λ ⁄λ
5 1 · 0,
λ
5 0,
λ
1 1
λ 1,44 · ,
5 5
1
λ .
5
é chamada de segunda constante de quantização; h é a constante de Planck ( 6,6260
10 · ); é a constante de Boltzmann ( 1,38066 10 · ). Na obtenção da
⁄λ
lei do deslocamento de Wien, usamos o fato de que 1 e fizemos a seguinte apro-
⁄λ ⁄λ
ximação: 1 . Como visto, para grandes valores de λ a fórmula de Ra-
yleigh-Jeans concordava com os valores experimentais. O problema surgia quando λ 0.
Nesse sentido, a fórmula de Planck deve concordar com a fórmula de Rayleigh - Jeans para
grandes valores de λ. De fato isto acontece: se λ é grande, então 1 e poderemos ex-
λ
⁄λ
pandir em série de potência nas proximidades de zero, isto é,
λ 1 1 · (1.43)
λ λ λ λ
Substituindo (1.43) em (1.42), temos:
8 8
λ, · (1.44)
λ 1 1 λ
λ
A equação de Planck também explica a fórmula de Stefan-Boltzmann. Para mostrar isto, basta
integrar λ, em relação à λ, com λ variando de zero ao infinito.
8
λ, λ .
(1.45)
λ λ 1
onde
8
·
15
A concordância da fórmula de Planck com os resultados experimentais realmente é fenome-
nal. No entanto, esta fórmula foi obtida com a hipótese de que a energia dos osciladores é
quantizada. Esta hipótese era difícil de ser aceita pela comunidade científica da época, pois, o
conceito de que a energia era contínua estava muito bem estabelecido na cabeça dos físicos da
época. Outra questão levantada na equação de Planck é que a troca de energia entre os osci-
25
ladores só pode ocorrer com valores múltiplos de ν. Os físicos tinham expectativas de que
uma nova dedução da equação de Planck fosse encontrada sem as hipóteses de Planck. O pró-
prio Planck esperava esta explicação usando a lógica da física clássica.
Exercícios
4) Numa cavidade a 1.0000 K, calcule a fração da densidade de energia proveniente da luz na região entre
7.800 – 8.000 angstroms. Repita o cálculo para 2.5000 K.
Quando um raio de luz atinge uma superfície metálica limpa, no vácuo, a placa metáli-
ca emite elétrons. Este fenômeno é conhecido como efeito fotoelétrico. O efeito fotoelétrico
foi descoberto e investigado em 1887 pelo físico alemão Heinrich Rudolf Hertz (22/021857 -
1/01/1894). As principais características experimentais do efeito fotoelétrico são:
a) Os elétrons só são emitidos se a radiação incidente tiver uma frequência mínima ν ;
b) Essa frequência mínima depende da característica do metal;
c) A energia cinética dos elétrons emitidos aumenta linearmente com a frequência da radiação;
d) A energia cinética dos elétrons não depende da intensidade da luz, somente da frequência;
e) A quantidade de elétrons emitidos é proporcional à intensidade da radiação luminosa;
f) Não há intervalo de tempo significativo entre a radiação incidente e os elétrons ejetados;
g) A direção em que os elétrons são ejetados depende da direção da radiação incidente.
Do ponto de vista da física clássica, o elétron está ligado à placa metálica por certa e-
nergia potencial , chamada de função trabalho. Para retirar um elétron que está ligado ao
metal deve-se fornecer ao elétron energia igual ou superior a . Se, além disso, o elétron
emitido pelo metal possuir energia cinética, então a energia total do elétron emitido é:
. (1.46)
2
Na Equação acima, é massa do elétron ejetado, representa a velocidade do elétron e
é a função trabalho, ou seja, a energia mínima necessária para se retirar o elétron que está li-
gado ao metal.
26
Figura 1.1. Quando a luz incide no prato emissor, os elétrons são emitidos e coletados pelo prato coletor gerando
uma corrente elétrica. Variando o potencia da bateria pode-se interromper a corrente de elétrons. Des-
ta forma, a energia cinética dos elétrons emitidos pode ser medida.
O elétron adquire esta energia necessária para ser ejetado da luz incidente na placa me-
tálica. Classicamente, a energia do raio de luz dependeria exclusivamente da sua intensidade,
e a energia deveria ser absorvida continuamente pelos elétrons da placa metálica. Do ponto de
vista clássico, pode se demonstrar que, para uma radiação de pequena intensidade e valor ra-
zoável , um grande período de tempo, dias ou mesmo anos, deveria se passar antes que
qualquer elétron pudesse adquirir energia suficiente para ser ejetado do metal. Após este perí-
odo de tempo, uma grande quantidade de elétrons deveria apresentar energia suficiente para
ser ejetados, e uma corrente contínua deveria ser observada fluindo do metal. Aumentando a
intensidade da radiação, o tempo necessário para a emissão dos elétrons deveria diminuir.
Entretanto, experimentalmente, não se observa intervalo de tempo entre a radiação incidente e
a emissão dos elétrons. A proporcionalidade entre a intensidade luminosa e a corrente é expli-
cável usando a física clássica, mas a ausência de intervalo de tempo entre a radiação incidente
e a emissão de elétrons não pode ser explicada classicamente.
Em 1905, o físico teórico alemão Albert Einstein (14/03/1879 – 18/04/1955) forneceu
uma elegante explicação para o efeito fotoelétrico usando dois novos postulados:
1. a energia da radiação luminosa é discreta e está concentrada em pequenos pacotes chamados de
quanta, cujos valores são dados pela Equação de Planck: ó ν, onde ν é a frequência da
radiação;
2. o elétron absorve integralmente um quanta de energia, ou seja, o elétron não divide o quanta de
energia com os demais elétrons: ou ele absorve o quanta de energia ou ele não absorve o quanta de
energia.
Como consequência dos postulados de Einstein, a energia do elétron, após receber um quan-
tum de energia, deve ser ν e deve ser igual à energia total do elétron ejetado:
ν . (1.47)
2
27
A Equação (1.47) é a famosa equação fotoelétrica proposta por Einstein em 1905. Por este
trabalho, Einstein foi laureado com o prêmio Nobel em 1921. De todos os trabalhos de Einste-
in este foi o que gerou maior impacto tecnológico. Fazendo em (1.47) obtém-se a fre-
quência mínima ν (frequência crítica) necessária, dada por ν ⁄ , para que o elétron
adquira suficiente energia do quantum de luz para escapar do metal. Isto explica a frequência
mínima observada experimentalmente. Maior intensidade significa maior quantidade de fó-
tons incidindo no metal e, portanto, maior quantidade de elétrons é ejetada; a energia cinética
do elétron ejetado independe da intensidade luminosa.
Com o valor da constante de Planck, obtida no tratamento da radiação do corpo negro,
a Equação (1.47) fornece excelente explicação para o efeito fotoelétrico. Contudo, neste mo-
delo, Einstein propôs a quantização da energia luminosa. Esta era outra ideia esquisita para a
época em que se acreditava que a energia luminosa era contínua.
Em resumo, temos até agora, que os trabalhos de Planck sugerem que as energias dos
osciladores das paredes do corpo negro são quantizadas e os trabalhos de Einstein sugerem
que as energias das radiações luminosas são quantizadas.
O conceito de energia é bastante abstrato e enigmático. Energia não é uma quantida-
de que tem existência física real. Não faz sentido falarmos de energia como se fosse algo que
exista por si só. Na realidade, energia é um conceito da física clássica que expressa uma re-
lação funcional entre as variáveis físicas. As variáveis físicas (massa, força, velocidade, ace-
leração, posição etc. ) tem existência real e podem ser interpretadas fisicamente. O que real-
mente é incrível e merece uma análise filosófica aprofundada é que essa relação funcional
entre as variáveis físicas se conserva, isto é, a variação de uma variável física implica na
variação de uma segunda ou mais variáveis, de tal maneira que a relação funcional destas
variáveis se conserva.
Exercício
São necessários cerca de 8x10-19 J de energia para remover um elétron do interior da platina. Qual é a frequência
mínima de luz necessária para observar o efeito fotoelétrico?
Como já enfatizamos anteriormente, no final do século XIX os físicos sabiam que ha-
via elétrons no interior dos átomos, e quando estes elétrons eram chacoalhados emitiam luz e
28
outras radiações eletromagnéticas. Mas ainda permanecia um curioso mistério a ser resolvido.
Quando um raio de luz passa através de um prisma, a luz branca é decomposta pelo prisma
nas cores do arco íris. Entretanto, quando se olha a luz proveniente de um único elemento,
hidrogênio, por exemplo, não vê todas as cores do arco íris. Observa-se apenas algumas linhas
brilhantes de certas cores. Estas linhas coloridas ou linhas espectrais são características de
cada elemento, formando uma espécie de assinatura espectral do elemento.
Estas linhas espectrais foram vistas pela primeira vez por William Wollaston em 1802.
Em 1814, o alemão Joseph von Fraunhofer as estudou de modo sistemático, catalogando-as.
Fraunhofer marcou cuidadosamente a posição de cada linha, mas não tentou dar uma explica-
ção do por que estas linhas apresentavam tais características. Por volta de 1850, o físico Gus-
tav Kirchhoff decidiu investigar o fenômeno com a ajuda do químico Robert Bunsen (o inven-
tor do bico de Bunsen). Eles seguraram varias substâncias nas chamas do bico de Bunsen. A
luz emitida pelo elemento aquecido foi separada em seu espectro usando um prisma. Eles ob-
servaram que cada elemento apresentava seu próprio conjunto de linhas que era diferente do
conjunto de linhas dos outros elementos. Na realidade, por volta de 1860, eles descobriram
, ,
dois novos elementos, césio ( ) e rubídio ( ), ao analisar o conjunto de espectros
que não correspondia a nenhum outro elemento conhecido. Mas tarde, os elementos químico
, , , , ,
hélio ( ), argônio ( ), neônio ( ), kriptônio ( ) e xenônio ( )
foram descobertos usando a espectroscopia.
A descoberta do espectro de absorção por Fraunhofer foi acidental. Fraunhofer não
estava estudando este tipo de fenômeno em particular. Na verdade, ele estava simplesmente
testando um moderno prisma que havia construído. Quando a luz solar entrou por uma peque-
na fenda e atingiu um dos prismas, formou-se o espectro de um arco íris colorido, como espe-
rado. Entretanto, o espectro continha uma série de linhas escuras.
A explicação das linhas escuras observadas por Fraunhofer é a seguinte: antes da luz
branca do sol, que contém toda faixa do espectro, atingir o prisma, ela passa pelo ar da atmos-
fera que contém vários tipos de gases. Alguns dos comprimentos de onda da radiação solar
são absorvidos pelo ar. Sendo que o restante da radiação atravessa a atmosfera, atinge o pris-
ma e são decompostos produzindo o espectro observado. A análise cuidadosa mostra que o ar
atmosférico produz um espectro de absorção com mais ou menos 600 linhas escuras. Em ho-
menagem a Fraunhofer essas linhas foram denominadas de linhas de Fraunhofer.
Usando as linhas espectrais podemos saber a composição elementar das estrelas. Pois,
cada elemento químico apresenta um único conjunto de linhas espectrais.
29
1 1 1
. (1.55)
λ
Em homenagem a Johannes Rydberg, a constante R passou a ser chamada de constante de
Rydberg. Para 1 temos a série de Lyman, para 2 temos a série de Balmer, 3a
série de Paschen etc. A fórmula acima pode ser estendida para átomos hidrogenóides:
1 1 1
, (1.56)
λ
onde Z representa o número atômico do átomo hidrogenóide. Em 1911 surge o modelo atômi-
co do físico nuclear neozelandês Ernest Rutherford (30/08/1871 – 19/10/1937). O modelo de
Rutherford, baseado em seu famoso experimento do espalhamento das partículas alfas (núcleo
de hélio, ), apresentava inconsistência com a teoria do eletromagnetismo clássico. O
seu modelo semelhava-se ao sistema solar, isto é, o átomo era formado por um núcleo central
denso e positivo rodeado por elétrons circulante com cargas negativas, onde o núcleo tinha
um diâmetro 10.000 vezes menor do que o átomo. O problema do modelo é que cargas elétri-
cas em movimento acelerado emitem radiação eletromagnética. Portanto, os elétrons estariam
emitindo energia constantemente e entrariam em uma órbita espiralada que acabariam por
colidir com o núcleo. Nestas condições nenhum átomo seria estável. Contudo, observamos na
natureza exatamente o contrário. A maioria dos átomos apresenta isótopos estáveis.
O problema do modelo de Rutherford para o átomo de hidrogênio foi resolvido por
Niels Bohr5, o qual propôs uma teoria que explicava muito bem a série espectral do hidrogê-
nio e a estrutura periódica dos elementos químicos. No parágrafo seguinte descreveremos o
modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio.
5
Niels Henrick David Bohr (1885-1962) físico teórico dinamarquês que contribui no desenvolvimento da física quântica.
Concluiu seus estudos em Copenhaga, sua cidade natal, em 1911. Trabalhou com Joseph John Thomson e Ernest Ruther-
ford na Inglaterra. Em 1913, publicou seu modelo atômico que justificava o modelo de Ruthaford e esplicava as séries
espectrais do átomo de hidrogênio e a estrutura periódica dos elementos químicos. Em 1928, formulou o princípio da
correspondência e o princípio da complementaridade. Bohr recebeu o prêmio Nobel de Física em 1922.
31
está acelerado, o sistema deve irradiar energia, o que torna o sistema instável, ou seja, deveria
haver um colapso da matéria. Como sabemos a matéria não se colapsa. A solução inventada
por Niels Bhor foi desconsiderar as leis da física clássica e postular que:
1) somente algumas órbitas são permitidas, sendo o sistema estável nestas orbitas;
2) quando um elétron salta de uma órbita para outra ele absorve ou emite energia, sendo a fre-
quência da radiação emitida dada por ∆ ν. Quando o elétron vai de uma órbita interna
para uma órbita externa ele absorve energia, em sentido contrário emite energia;
3) O momento angular do elétron é um múltiplo inteiro de ħ, ou seja, ħ, onde
é a massa do elétron, a velocidade do elétron, r a orbita do elétron e ħ ⁄2 .
velocidade
Força
A força de atração eletrostática entre o elétron e o núcleo é dada pela lei de Coulomb:
1
·
4
O sinal negativo indica que as cargas do elétron e do próton têm o mesmo módulo, porém
sinais opostos. Para facilitar os cálculos que se seguirão, vamos definir uma nova quantidade
̃ da seguinte forma:
̃ .
4
Em termos de ̃ a lei de Coulomb assume uma forma relativamente simples:
32
̃
·
̃
· (1.57)
̃
· (1.58)
ħ
Observe que a velocidade do elétron em (1.58) não depende da massa do elétron, diminui
com o aumento de n e é quantizada. Isto ocorre porque Bohr postulou que o momento angular
L do elétron é quantizado.
Usando a velocidade dada por (1.58) no terceiro postulado de Bhor ( ħ), po-
demos determinar o raio da orbita do elétron como segue:
2
· · ħ,
ħ
ħ
2
· (1.59)
Novamente, a quantização do momento angular faz com que somente alguns valores de r se-
jam permitidos. Para 1 temos que ħ2 ⁄ ̃ , onde é o raio da primeira órbita
de Bohr, conhecido como raio de Bohr. O valor de 0 não é aceitável, pois, isto levaria a
um valor nulo de r, o que significaria que o elétron estaria no núcleo. é adotado, atualmen-
te, como unidade de medida de comprimento no sistema de unidades atômicas de medida.
Substituindo os valores das constantes em (1.59) para 1, obtemos o valor número de :
1 ħ
2
0,529Å 0,529 10 5,291772 10 . (1.60)
33
Nosso objetivo nesta secção é obter a energia do elétron. Estamos considerando o sis-
tema formado pelo elétron girando ao redor do núcleo do átomo de hidrogênio que se mantém
fixo. A energia total ( ) deste sistema é obtida somando a energia cinética ( ) e a ener-
gia potencial ( ) do elétron, isto é,
.
A energia potencial do sistema é obtida a partir da relação ⁄ , isto é,
̃ ̃
,
̃
,
̃
,
̃
·
um nível de menor energia para um nível de maior energia, a variação da energia do elé-
tron é
̃ 1 ̃ 1 ̃ 1 1
∆ . (1.63)
2 2 2
De acordo com o segundo postulado de Bohr, devemos ter ∆ ν ⁄λ. Usando este
resultado em (1.63), obtemos a fórmula de Rydberg:
̃ 1 1
,
λ 2
1 1 1 ̃
, onde · (1.64)
λ 2
O valor da constante de Rydberg RH encontrado usando (1.64) concorda muito bem com os
valores experimentais. Contudo, Bohr obteve a constante de Rydberg com a ajuda de três pos-
tulados nada aceitável do ponto de vista clássico.
A partir dos trabalhos de Bohr, a natureza corpuscular da luz não dava mais para ser
ignorada. A conexão entre matéria e radiação estava finalmente sendo aceita. Na década se-
guinte à descoberta de Bohr, o que é agora denominado teoria quântica clássica ou “antiga
teoria quântica” floresceu. A interpretação sistemática dos dados catalogados dos espectros
progrediu. O modelo atômico de Bohr-Sommerfeld, utilizando-se de órbitas circulares e elípti-
cas foi introduzido, mostrando-se muito útil. A partir do estudo dos espectros, Bohr construiu
uma tabela periódica teórica que concordava com a dos químicos. Um detalhe era diferente;
de acordo com Bohr, o elemento 72, que os químicos situavam entre as terras raras, não era
uma terra rara, e sim um membro da quarta família com titânio e zircônio. Mais tarde, estudo
das linhas espectrais mostrou que o zircônio era uma mistura de zircônio e o elemento 72, o
qual recebeu o nome de Háfnio ( Hf ). Com certeza, a teoria de Bohr ajudou a destruiu as
últimas resistências ao modelo quântico. A natureza da luz passou a ter um caráter dual.
A parte matemática do modelo atômico de Bohr é boa, mas os postulados de Bohr são
bastante estranhos do ponto de vista clássico. Como, por exemplo: por que o momento angu-
lar do elétron é quantizado? Por que o elétron emite ou absorve energia quando muda de
nível eletrônico?
O modelo de Bohr realmente explica os resultados experimentais para os átomos hi-
drogenóides, mas por que o átomo de hidrogênio se comporta dessa maneira?
35
Em 1923, cerca de 10 anos após Bohr ter publicado seus resultados, Louis-Victor De
Broglie apareceu com uma ideia interessante: a matéria possui um caráter ondulatório.
Os argumentos de De Broglie para sua suposição exige algum conhecimento da teoria
da relatividade e do eletromagnetismo. Resumidamente podemos fazer a seguinte argumenta-
ção para justificar a fórmula de De Broglie: segundo a teoria da relatividade de Einstein maté-
ria e energia relativística estão relacionadas como mostra a Equação (1.65):
, (1.65)
onde E é a energia, m é a massa relativística da partícula6, c é a velocidade da luz e p é o mo-
mento. Por outro lado, de acordo com Planck e Einstein, a energia de um fóton é ν
⁄λ. Combinando essa Equação com (1.65), temos
· (1.66)
λ
Louis De Broglie levanta a hipótese de que (1.66) vale para partículas também. Isto é, existe
uma onda associada à partícula. Se a teoria de De Broglie estiver correta, então podemos justi-
ficar as suposições arbitrárias no modelo atômico de Niels Bohr. Um elétron com massa m e
velocidade deveria ter um comprimento de onda igual a
λ ·
Agora, como o elétron possui uma onda associada e está em movimento circular ao redor do
núcleo, então o comprimento da órbita deve ser um múltiplo do comprimento de onda λ. Do
contrário resultaria em uma interferência destrutiva da onda do elétron com ela mesma e a
órbita não seria estável. Matematicamente, devemos ter:
2 λ, (1.67)
onde é o raio da órbita e n é um número inteiro positivo. Usando o valor de λ dado pela
Equação De Broglie em (1.67), teremos:
· (1.68)
2
Sabemos que o momento angular para uma órbita circular é dado por . Então,
se assumirmos que o elétron se comporta como uma onda com λ dado pela fórmula de De
Broglie, obteremos automaticamente a restrição sobre o momento angular imposta por Bohr,
ou seja,
6
O fóton não tem massa de repouso.
36
ħ.
2
O modelo de De Broglie realmente nos impressiona e funciona muito bem. Mas, seria este
modelo apenas um truque matemático? Ou realmente as partículas apresentam um compor-
tamento ondulatório?
Poucos anos após De Broglie publicar sua hipótese, vários experimentos foram feitos
mostrando o comportamento ondulatório dos elétrons. O primeiro destes experimentos foi
feito em 1927 por Clinton J. Davisson e Lester H. Germer da Bell Telephone Laboratory.
Com análise cuidadosa, eles mostraram que um feixe de elétrons havia sido espalhado pela
superfície de um cristal de níquel com ângulos de espalhamento preditos pela fórmula de
Bragg para a difração de raio-x com comprimento de onda dado pela fórmula de De Broglie.
No mesmo ano de 1927, G. P. Thomson, filho de J. J. Thomson relatou seu experimen-
to em que um feixe de elétrons foi difratado por uma fina folha de ouro. Os experimentos de
Davisson & Germer e Thomson provaram que as ondas de De Broglie não eram apenas con-
veniências matemáticas. Elas existiam fisicamente. Em 1937 estes pesquisadores receberam o
prêmio Nobel pelos seus trabalhos. A confirmação da teoria de De Broglie introduziu a duali-
dade na natureza das partículas fundamentais. Uma partícula deixava de ser simplesmente
uma partícula e adquiria um caráter de onda. Esta ideia conduziu muito rapidamente ao de-
senvolvimento da mecânica ondulatória ou mecânica quântica por Heisenberg e Schrödinger.
Todas as nossas ideias modernas sobre estrutura atômica e molecular baseiam-se na mecânica
ondulatória. Os conceitos distintos (onda ou partícula dos físicos do século XIX) agora estão
ligados. Podemos dizer, com precisão, em que circunstância é mais útil tratar o elétron como
uma partícula clássica ou o fóton como uma onda clássica. Não há como classificar um objeto
físico como sendo partícula ou onda. As ideias de partícula e onda são aplicáveis ao mesmo
objeto físico. Em 1927, Werner Heisenberg e Erwin Schrödinger formularam independente-
mente a lei que governa o movimento de uma partícula. A discussão neste texto estará restrita
à formulação de Schrödinger por permitir uma visualização do átomo. A formulação de Hei-
senberg é bastante abstrata e não permite visualizar o átomo, além apresentar uma matemática
bastante complicada. Para Heisenberg, o átomo é em si incognoscível.
Capítulo 2
por uma função senoidal, este movimento é chamado de Movimento Harmônico Simples
(MHS). Por definição, um objeto executa um movimento harmônico se seu movimento puder
ser descrito por uma função do tipo Asenωt, Acosωt, Asen(ωt+φ) ou Acos(ωt+φ). Estas fun-
ções diferem entre si apenas pela escolha da origem e são chamadas de funções sinusoidais.
Muitos fenômenos naturais podem ser descritos usando estas funções: a vibração de
um diapasão, o movimento de um pêndulo, uma bolinha presa na ponta de uma mola etc.
Para um ciclo completo de oscilação da partícula Q, que corresponde a uma revolução com-
pleta de P, temos
2
2 ν,
onde T representa o período, isto é, o tempo necessário para que ocorra uma oscilação e ν é
a frequência de oscilação, ou seja, o número de oscilações por unidade de tempo. Período e
frequência são grandezas inversamente proporcionais: ν 1⁄ . Como é diretamente pro-
porcional à frequência ν, é chamado de frequência angular do movimento oscilatório da
partícula Q. Se considerarmos P como um ponto z do plano complexo, então o movimento do
ponto P pode ser descrito como
,
onde , , e A é a amplitude da oscilação ou amplitude da fun-
ção. Em muitas situações é melhor trabalhar com a forma complexa. Neste caso, o movimen-
to da partícula Q é descrito pela parte imaginária de z, ou seja,
.
A velocidade de Q é obtida derivando em relação a :
Um fato interessante a ser notado nessa fórmula é que a energia total só depende da massa
e da amplitude da velocidade.
2.2. Ondas
Definiremos onda como sendo uma perturbação que se propaga através do espaço e
do tempo transportando energia de um ponto a outro sem que haja transporte de massa (ou
no máximo pequeno transporte de massa). As ondas mecânicas se propagam através de um
meio material, enquanto que as ondas eletromagnéticas são capazes de viajar através do vá-
cuo. Nosso objetivo nesta secção é descrever matematicamente as ondas. Começamos a nossa
análise estudando as translações de funções, como mostrado na Figura 2.1, onde se nota a
translação da função ao longo do eixo sem que haja deformação do gráfico da função.
Ψ = f(x-x0)
x
Figura 2.1. Translação da função em unidades para à direita.
, . (2.1)
A constante representa a amplitude da onda e é uma constante introduzida na função para
dar maior flexibilidade à função na descrição dos fenômenos ondulatórios. Sendo (2.1) a fun-
ção que descreve uma onda, seria interessante, a partir dessa função, encontrar a equação
diferencial cuja solução fosse exatamente (2.1). Fazendo em (2.1), temos
, . (2.2)
Derivando (2.2) duas vezes em relação a x e duas vezes em relação a , obtemos:
,
(2.3)
e
,
. (2.4)
Dividindo (2.4) por e igualando com (2.3), obtemos a Equação da onda unidimensional:
, 1 ,
, (2.5)
onde é a velocidade de propagação da onda. Verifica-se, por substituição direta, que qual-
quer função do tipo ou é solução da Equação da onda unidimensional.
Uma solução geral de (2.5) pode ser obtida usando o método de D’Alembert. Este método
consiste em definir duas novas várias, digamos e , tais que e . Nos-
so objetivo é determinar a função , de tal modo que , seja solução de (2.5). Pri-
meiramente, derivamos , , , duas vezes em relação à variável e duas vezes
em relação à variável usando a regra da derivação em cadeia, ou seja,
, ,
,
, , , ,
2 ,
, ,
,
, , , ,
2 .
Substituindo e na Equação
, 1 ,
,
41
obtemos
1
2 2 ,
0. (2.6)
Integrando (2.6) em relação à variável , obtemos
.
Esta é uma equação diferencial de variáveis separáveis, isto é, , a qual pode ser
integrada novamente para encontrarmos a função :
, 2 .
λ
A função , descreve um movimento ondulatório sinusoidal que se propaga sem defor-
mação no sentido positivo do eixo x. A função que descreve a propagação no sentido negati-
vo de x é dada por
, 2 .
λ
Existem muitos tipos de perturbação que se propagam no espaço e que são classificados co-
mo movimentos ondulatórios. As funções que descrevem estes movimentos são, em geral,
complexas. No entanto, estas funções são sempre soluções da Equação da onda.
Exercício.
Verifique se as funções ξ , ξ ,ξ , ξ e ξ , ξ são solu-
ções da equação da onda monodimensional
Ψ , 1 Ψ ,
·
Uma onda propagando-se na direção do eixo-x não precisa ser interpretada obrigatori-
amente como estando concentrada no eixo-x. Se uma onda descrita pela função
se estender por todo o espaço, fixado t, toma o mesmo valor em todos os pontos
do espaço com mesma coordenada x. Mas, x constante representa um plano perpendicular ao
eixo-x, o qual será denominado de superfície de onda ou frente de onda. Se a frente de onda
for um plano, a onda será designada como onda plana. Se for cilíndrica será chamada de on-
da cilíndrica e se for esférica será uma onda esférica. Assim, uma função do tipo
descreve uma onda plana que se propaga na direção positiva do eixo-x com velo-
cidade . Devemos ter em mente que em uma onda plana o importante é a direção de propa-
gação da frente de onda. Essa direção de propagação pode ser descrita por um vetor unitário
43
Figura 2.2. Representação simplificada de uma onda plana, ou seja, uma onda em que a frente de onda é um
plano perpendicular ao eixo-x que se propaga na direção do vetor unitário .
A Equação (2.10) representa uma onda plana a uma distância média · da origem do
sistema coordenado viajando na direção do vetor u. Para o caso particular de uma onda se-
noidal podemos escrever a função de onda como
ξ ξ · ,
onde ξ representa a amplitude da função de onda plana. Na forma complexa, a função de
onda plana pode ser escrita como
ξ ξ ·
ξ ·
. (2.11)
O vetor de propagação da onda ou vetor número de onda é definido como , ou se-
ja, um vetor que aponta na direção do vetor unitário e| | 2 ⁄λ. Usando o vetor número
de onda e observando que 2 ν 2 ⁄λ , podemos reescrever (2.11) como segue:
44
ξ , ξ ·
ξ , (2.12)
em que kx, ky e kz são as componentes do vetor que satisfaz a relação
| | ⁄ .
(2.13)
,
(2.14)
.
Como as funções seno e cosseno são funções ortogonais, então devemos ter
0 se
se
0 se
se
Usando estes resultados em (2.14), obtemos a fórmula para calcular os coeficientes de Fouri-
er ’s:
45
1
, 0,1,2,3, . (2.15)
A forma complexa da série de Fourier pode ser obtida usando as relações de Euler, isto é,
e . Inicialmente, observamos que usando as rela-
ções de Euler podemos expressar o e como segue:
e . (2.17)
2 2
Usando as equações (2.17) em (2.13) e fazendo ⁄ , obtemos
(2.18)
2 2 2 2
Em (2.18) fizemos
e ·
2 2 2 2
Os coeficientes e são obtidos de modo similar ao procedimento usado na obtenção das
fórmulas (2.16), os quais podem ser calculados usando as fórmulas
1
, 0,1,2,3, ,
2
(2.19)
1
, 0,1,2,3, .
2
As equações (2.19) podem ser combinadas em uma única expressão matemática:
1
, onde 0, 1, 2, 3, . (2.20)
2
46
, (2.21)
onde os coeficientes ’s são dados por (2.20). As equações (2.13) e (2.21) mostram que po-
demos expandir uma função em uma série complexa, desde que a função seja periódica com
período 2L, integrável e absolutamente integrável. No entanto, podemos estender a expansão
(2.21) para funções que não sejam periódicas. Esta extensão pode ser feita fazendo o período
– , expandir-se para ∞, ∞ . Logicamente, qualquer função não periódica cabe no
domínio ∞, ∞ . Esta ideia pode ser desenvolvida usando as equações (2.20) e (2.21).
Inicialmente, vamos definir uma nova variável tal que ⁄ e∆
⁄ · Logo, devemos ter
1 ∆
·
2 2
Com essas mudanças, podemos reescrever as equações (2.20) e (2.21) como seguem:
, (2.22)
∆ ∆
. (2.23)
2 2
Em (2.23) trocamos a variável de integração x para a variável de integração u afim de evitar
futuras confusões. Substituindo (2.23) em (2.22), temos:
∆
2
∆ 1
∆ ,
2 2
1
∆
2
tem o aspecto formal de uma soma de Riemann. Lembrando que ∆ ⁄ , então quando
∞ temos que ∆ 0. Isto significa que
47
1 1
lim ∆ ,
∆ 2 2
. (2.26)
1 1
2 2
1
2
1
,
2
. (2.27)
onde
1
2
é chamada de transformada de Fourier de . Não existe motivo para continuarmos usan-
do a variável de integração , visto que não há mais possibilidade de confusão. Assim, po-
demos voltar à variável de integração , ou seja,
1
. (2.28)
2
A transformada de Fourier existe quando for contínua por parte e for absoluta-
mente integrável em relação à variável x.
Exemplo 2.1.
48
Solução.
1 1
.
2 2 2
Usando esta transformada, podemos escrever como segue:
1
,
2
1
.
2
Na seção 1.9 lidamos com a hipótese de De Broglie, ou seja, que as partículas apre-
sentam um caráter ondulatório. Uma onda harmônica plana certamente não pode representar
uma partícula, pois ela se espalha por todo o espaço. Precisamos de uma onda que seja limi-
tada no espaço. Uma maneira de se fazer isso é pela superposição de ondas planas com veto-
res de ondas próximos. Esta superposição é chamada de pacote de onda e possui uma ex-
tensão espacial limitada com um máximo em (ver Figura 2.2). Como visto anteriormen-
te, a integral de Fourier pode ser usada para representar uma função, mesma que ela não seja
periódica. Um pacote de onda, resultado da superposição de ondas harmônicas, pode ser re-
presentado por uma função, digamos , . Não conhecemos a expressão matemática da
função , , mas sabemos que podemos expressá-la em uma a integral de Fourier, ou seja,
·
, , (2.29)
·
, . (2.31)
Figura 2.2. Representação esquemática de um pacote de onda com máximo em dada pela Equação (2.31).
O pacote é formado pela superposição de uma imensa quantidade de ondas planas com vetores nú-
mero de onda muito próximos.
Supondo que a partícula possa ser descrita por um pacote de onda (Figura 2.2), não
podemos determinar com precisão a posição da partícula. Porém, é razoável supor que a par-
tícula esteja confinada dentro deste pacote de onda, havendo uma incerteza quanto a sua loca-
lização que é determinada pela extensão do pacote. Se for verdade que a partícula está no
pacote de onda, então é razoável supor que a velocidade da partícula deve ser igual à velo-
cidade do pacote de onda. Na Figura 2.2, a velocidade do pacote na direção do eixo-x é dada
por
, (2.32)
·
0. (2.34)
. (2.35)
·
0,
·
0,
·
0,
·
0,
·
0.
·
0. (2.36)
ou seja,
. (2.37)
. (2.38)
A Equação (2.38) mostra que a velocidade de propagação do pacote ou grupo de onda é igual
à derivada da frequência angular em relação ao vetor de onda.
Usando a hipótese de De Broglie, podemos relacionar a energia e a frequência an-
gular , isto é,
ν . (2.39)
2
Ainda usando a hipótese de De Broglie, podemos relacionar o momento da particular com
o vetor de onda , ou seja,
. (2.40)
2
Além disso, derivando ⁄2 em relação ao momento , vemos que
A Equação (2.41) mostra que uma partícula livre move-se com a mesma velocidade de um
pacote de ondas harmônicas. Um fato interessante a ser notado na Equação (2.40) é que, para
se ter precisão completa no momento, deve-se usar uma única onda harmônica, a qual ocu-
pará todo o espaço, de tal forma que a posição da partícula fica totalmente indeterminada.
Se quisermos a posição da partícula completamente determinada, o pacote de onda deve ter
dimensões infinitamente pequenas. Isto significa que devemos variar de ∞a ∞. Nesse
caso, o momento seria completamente indeterminado. Essa análise nos leva a pensar que deve
existir uma relação inversa entre a precisão da posição e a precisão do momento da partícu-
la, ou seja, se aumentarmos a precisão da posição da partícula, diminuímos a precisão do
momento da partícula e vice-versa.
Nosso problema aqui é como encontrar uma equação diferencial que descreva os esta-
dos de uma partícula considerando o fato de que esta partícula apresenta um comportamento
52
A teoria das ondas de matéria de Louis De Broglie nos leva naturalmente à obtenção
da equação de onda não relativística para uma partícula livre. Como já discutido anteriormen-
te, uma única onda plana não pode representar um partícula, pois esta está completamente
deslocalizada no espaço. Como visto, a solução é considerar a superposição de uma infinida-
de de ondas, com vetores de onda bastante próximos. Desta maneira construímos um paco-
te de onda que possui limitações no espaço e, portanto, pode ser usado para representar a par-
tícula. O pacote de onda pode ser representado pela integral de Fourier, como mostra a Equa-
ção (2.29). A energia e o momento do pacote de onda podem ser incorporados explicitamente
na Equação (2.29) usando a relação de Planck e de De Broglie, isto é,
53
,
2
,
2
e
· · ⁄
, .
· ⁄
, . (2.42)
Como já citado anteriormente, só podemos ter uma derivada em relação ao tempo, mas não
há limitação quanto ao número de derivadas em relação a . Na obtenção da Equação de
Schrödinger para a partícula livre, usaremos um procedimento similar ao empregado na ob-
tenção da Equação da onda (2.5), ou seja, vamos derivar parcialmente a Equação (2.42) uma
vez em relação a , duas vezes em relação a :
, · ⁄
, (2.43)
· ⁄
, , (2.44)
· ⁄
, . (2.45)
· ⁄
, . (2.46)
2
Observamos que os lados da direita das Equações (2.43) e (2.46) são iguais e, consequente-
mente, podemos igualá-los para obter a Equação de Schrödinger para a partícula livre:
,
, . (2.47)
2
Da maneira como (2.47) foi obtida satisfaz o princípio da correspondência, pois, for-
malmente, fizemos uma analogia com a mecânica clássica, isto é, a Equação (2.47) é a trans-
formação para a mecânica quântica da equação clássica ⁄2 . A energia e o mo-
54
mento são traduzidos para a linguagem da mecânica quântica pelos operadores diferenciais
atuando sobre a função de onda , de acordo com as regras de correspondências, isto é,
e . (2.48)
· ⁄ · ⁄
,
· ⁄ · ⁄
,
· ⁄ · ⁄
,
· ⁄ · ⁄
,
. (2.49)
· ⁄ · ⁄
,
· ⁄ · ⁄
,
.
A Equação (2.47) foi obtida usando a Equação ⁄2 , a qual não leva em con-
sideração os efeitos relativísticos, ou seja, não considera a teoria da relatividade. Contudo, a
teoria de De Broglie não sofre desta limitação. Para obter uma equação relativística para a
partícula livre, repetimos os argumentos anteriores substituindo a Equação ⁄2 pela
Equação da energia cinética relativística , a qual pode ser escrita como
. (2.50)
Derivando a Equação (2.43) mais uma vez em relação ao tempo, obtemos:
, · ⁄
. (2.51)
· ⁄
, ,
· ⁄
, ,
· ⁄ · ⁄
, .
· ⁄ · ⁄
, . (2.52)
1 ,
, . (2.53)
1
,
, 0.
das como descrita na Figura 2.2. Este pacote é descrito matematicamente pela Equação
(2.42). Como mostrado na seção 2.3, temos evidências muito fortes de que o pacote de seja,
na verdade, a partícula ou pelo menos que a partícula esteja na região do pacote de onda,
pois, como mostrado, as velocidades da partícula e do pacote de onda são iguais. Consideran-
do que o potencial é independente do tempo, do ponto de vista clássico, a energia da partícula
é dada por
,
2
ou
0. (2.54)
2
é constante e e são funções muito bem definidas do tempo. Além disso, é plausível
levantar a hipótese de que na região compreendida pelo pacote de onda o potencial é
constante, ou pelo menos aproximadamente constante, de tal modo que podemos fazer
, , . (2.55)
O que estamos supondo em (2.55) é que o operador quântico de uma constante é a própria
constante. Usando as relações de equivalência entre quantidades clássicas e operadores quân-
ticos, dadas pelas relações (2.48) e (2.49), obtemos as seguintes correspondências:
,
, , (2.56)
, , . (2.57)
Multiplicando (2.57) por 1⁄2 e (2.55) por 1 e somando membro a membro com a e-
quação (2.56), temos
,
, , , 0,
2 2
,
, . (2.58)
2
Na Equação (2.58) fizemos uso de (2.54). O processo de obtenção de (2.58) é bastante con-
vincente, mas não garante o sucesso da fórmula. O procedimento natural a ser seguido é pos-
tularmos que a Equação (2.58) descreve o estado de uma partícula de massa e velocidade
, sob a ação de um potencial escalar mesmo quando as condições da sua obtenção não
são totalmente preenchidas. Na Equação (2.58), o potencial escalar é independente do tempo.
No caso do potencial dependente do tempo, postularemos que a descrição do estado da parti-
cula é descrito pela Equação (2.58):
57
,
, , . (2.59)
2
A validade das Equações (2.58) e (2.59) é dada pelas concordâncias das predições realizadas
com os valores experimentais. A Equação (2.59) contém uma derivada primeira em relação
ao tempo, o que nos permite calcular os estados futuros do sistema desde que conheçamos o
estado no tempo presente . Observe que a quantidade
,
2
representa a soma dos operadores para a energia cinética e potencial. Por analogia com a me-
cânica clássica vamos denominá-lo de operador hamiltoniano . Geralmente, denotamos os
operadores com um chapéu sobre o operador, isto é,
, .
2
Exemplo 1.
58
Como primeiro exemplo ilustrativo, vamos escrever a equação de Schrödinger para o átomo
de hidrogênio. O átomo de hidrogênio é um sistema formado por um núcleo positivo e um
elétron. Classicamente, a energia deste sistema é dada por
̃
, (2.60)
2 2
onde m, p, M e P representam, respectivamente, a massa e o momento do elétron e momento
do núcleo e r é a distância do elétron ao núcleo. ̃ é definido como ̃ ⁄ 4 , onde e
representa a carga do elétron. O primeiro e segundo termo do lado direito da Equação (2.60)
representam, respectivamente, as energias cinéticas nuclear e eletrônica e o terceiro termo
representa a energia potencial clássica de interação do elétron com o núcleo do hidrogênio.
No segundo passo, substituímos as quantidades clássicas pelos respectivos operadores quân-
ticos, ou seja,
ħ ħ ̃
ħ . (2.61)
2 2
Multiplicando ambos os lados de (2.61) por Ψ , , teremos a equação de Schrödinger para
o átomo de hidrogênio:
ħ ħ ̃
ħ Ψ , Ψ , . (2.62)
2 2
Esta equação pode ser resolvida analiticamente, e faremos isto à frente.
Exemplo 2.
Considere um átomo com carga nuclear Z e N elétrons. A equação clássica da energia para
este sistema é
̃ ̃
.
2 2
ħ ħ ̃ ̃
ħ .
2 2
ħ Ψ , , , ,
ħ ħ ̃ ̃
Ψ , , , , ,
2 2
Exemplo 3.
Seja uma molécula formada por N elétrons e M núcleos. A energia clássica deste sistema é
dada por
̃ ̃ ̃
.
2 2
ħ ħ ̃ ̃ ̃
ħ
2 2
ħ Ψ , , , , ,
ħ ħ ̃ ̃
2 2
̃
Ψ , , , , , .
As equações que foram escritas nos exemplos da seção anterior são equações depen-
dentes do tempo. A solução analítica destas equações é extramente difícil. No entanto, se o
hamiltoniano do sistema for temporalmente simétrico, isto é, se não houver uma dependência
explicita do hamiltoniano em relação ao tempo, então podemos escrever a função de estado
como um produto de duas funções: uma dependente das posições espaciais e outra dependen-
te do tempo. Observando o hamiltoniano de uma partícula sob a ação de um potencial escalar,
notamos que se o potencial sentido pela partícula for independente do tempo, isto é, sistema
conservativo, então o hamiltoniano é independente do tempo:
ħ
.
2
Neste caso, se escrevermos a função de estado como Ψ , τ , então podemos
separar as variáveis espaciais e temporais da equação de Schrödinger, obtendo, desse modo,
duas novas equações: uma dependente apenas das coordenadas espaciais e outra dependente
apenas do tempo. O procedimento para a separação das variáveis consiste em derivar a fun-
ção de estado Ψ , τ duas vezes em relação à r , Ψ , ϕ τ ,e
τ . (2.65)
Fazendo C = E em (2.64) podemos escrevê-la como uma equação dependente apenas das
coordenadas espaciais:
ħ
. (2.66)
2
significa uma função de onda complexa do ponto de vista da interpretação física. Este pro-
blema foi investigado em 1926 pelo físico alemão Max Born (11/12/1882 – 5/1/1970). Como
a função de onda é complexa não faz sentido dar a ela uma interpretação física. Mas, se ele-
varmos a função de onda ao quadrado, o resultado será uma quantidade real que tem sentido
físico. Max Born postulou que
“o quadrado da função de onda representa a distribuição da densidade de probabili-
dade de encontrarmos a partícula em certa região do espaço”.
Por exemplo, a probabilidade de encontrarmos uma partícula unidimensional entre e
é dada, de acordo com o postulado de Max Born, por
, |Ψ , | , (2.68)
onde , |Ψ , | é chamada de função da densidade de probabilidade ou função de
distribuição da densidade de probabilidade. Podemos entender melhor este conceito a partir
da seguinte analogia clássica: considere, por exemplo, um fio metálico distendido ao longo
do eixo-x. Se quisermos calcular a densidade de massa do fio entre e , usamos a
fórmula
onde representa a densidade e a massa. Se o fio não for homogênio, então a densidade é
função de x, ou seja,
· (2.69)
Figura 2.3. Gráfico mostrando a função de distribuição da densidade de massa . A área sob a curva repre-
senta a massa do pedaço de fio compreendido entre a e b.
Seguindo esta linha de raciocínio e usando o postulado de Max Born, vemos que a
probabilidade de encontrarmos uma partícula entre x = a e x = b é
|Ψ , | Ψ , Ψ , .
A última igualdade resulta do fato de que Ψ , é uma função complexa. Neste caso, o seu
modulo ao quadrado deve ser calculado multiplicando o complexo conjugado da função pela
função:
|Ψ , | Ψ , Ψ , . (2.70)
O asterisco em (2.70) denota o complexo conjugado da função Ψ , . O complexo conjuga-
do de um número é calculado trocando o sinal da parte imaginária do número. Por exemplo,
dado o número complexo , onde x é a parte real e y é a parte imaginária, o com-
plexo conjugado de é .
A inspiração de Max Born para este postulado veio do fato de que a intensidade de
uma onda eletromagnética é proporcional ao quadrado da amplitude máxima da onda. Como
a onda eletromagnética pode ser pensada como sendo formada de fótons (pacotinhos discre-
tos de energia), então o quadrado da amplitude da onda pode ser pensado como sendo a pro-
babilidade de encontrarmos um fóton em certa região do espaço.
Para tornar mais claro este pensamento, vamos definir a intensidade de uma onda
eletromagnética como sendo a energia que passa por unidade de tempo através de uma área
unitária perpendicular à direção de propagação da onda. Podemos obter I usando o vetor
poynting S. Esta grandeza física foi descoberta por John Henry poynting e Oliver Heaviside e
64
Esta analogia nos dá mais confiança no pensamento de Max Born na proposição do postulado
expresso em (2.68).
Na Equação (2.76) usamos o conceito de valor médio de uma função. O valor médio
de uma função contínua definida no intervalo , é calculado usando a seguinte fór-
mula:
. (2.77)
altura . A área deste retângulo é igual à área dada pela integral . Portanto, a
ideia de valor médio de uma função é o valor da função que multiplicado pelo intervalo
, |Ψ , | . (2.79)
Se tivermos variando de zero a infinito, temos 100% de certeza de que a partícula está em
algum lugar do universo. Nesse caso, devemos impor a condição de normalização à função
de probabilidade, isto é,
0 ∞ |Ψ , | 1. (2.80)
Quando Ψ , satisfaz esta condição, dizemos que a função Ψ , está normalizada à uni-
dade. Esta condição é importante, pois qualquer função que satisfaça essa condição é fisica-
mente admissível como função de onda ou função de estado (como preferem os físicos). De-
vemos ter em mente que e são vetores, isto é, , , e , , . Em
coordenadas cartesianas, a Equação (2.80) deve ser escrita como
66
∞ ∞, ∞ ∞, ∞ ∞
(2.81)
|Ψ , , , | 1.
A maioria dos fenômenos quânticos de interesse da química é descrito por estados es-
tacionários. Neste texto, estamos particularmente interessados no estudo de sistemas quími-
cos descritos por estados estacionários, isto é, a Equação de Schrödinger independente do
tempo.
67
Capítulo 3
.
2
No caso da partícula livre, o hamiltoniano só contém o operador da energia cinética.
, , , , . (3.1)
2
,
,
.
Como consequência, a energia total do sistema será dada por . De fato,
, , , ,
.
O que nos leva a conclusão imediata de que .
No caso da partícula livre o hamiltoniano obviamente pode ser separado:
, ,
2 2 2 2 (3.4)
Portanto, a Eq. (3.1) é de variáveis separáveis e devemos resolver separadamente três equa-
ções de uma variável, ou seja, três equações diferenciais ordinárias:
,
2
, (3.5)
2
.
2
A energia total do sistema partícula livre, como já mencionado, será dada por
e a função de onda total poderá ser escrita como , , .
A etapa seguinte é encontrar as soluções gerais das equações (3.5). As soluções deste
tipo de equação já foram estudadas e são da forma
⁄ ⁄ ⁄ ⁄
,
⁄ ⁄
, (3.6)
⁄ ⁄ ⁄ ⁄
.
70
Quais são as condições de contorno que devemos impor às soluções (3.6)? Como visto
na seção 2.8, a função de onda deve ser finita. Usando esta condição em (3.6), vemos que a
energia não pode ser negativa. Se a energia fosse negativa, então teríamos
2 · ⁄ 2 · ⁄ 2 · ⁄ ,
ou seja, o expoente seria real e ∞ quando ∞. A mesma análise pode ser feita
para e . Lembrando que o momento da partícula é dado por 2 , onde
é a energia cinética da partícula, podemos escrever como segue:
⁄ ⁄
. (3.7)
O primeiro termo do segundo membro representa uma partícula movendo-se no eixo-x para a
direita com momento enquanto que o segundo representa uma partícula movendo-se para
a esquerda com momento . Vemos, portanto, que a energia da partícula livre não é quan-
tizada e a única restrição é que a energia deve ser positiva.
A função de onda total , , da partícula livre é dada pelo produto das funções
expressas nas equações (3.6), ou seja,
, , .
Para normalizar a função de onda , , , devemos impor a condição de normalização:
1.
Esta função pode ser normalizada separadamente em cada uma das suas variáveis, ou seja,
71
1,
1, (3.8)
1.
Ao resolvermos estas integrais, notamos que elas são divergentes, isto é, a função de onda
não é normalizável. Isto significa que uma partícula livre pode estar no infinito, inclusive. Na
verdade esta é uma situação hipotética bastante difícil de se encontrar, pois, é muito difícil ter
uma partícula que não interaja com nenhuma outra partícula no universo. Este resultado mos-
tra que o potencial sobre a partícula, provenientes de alguma força, é o responsável pela
quantização da energia. O algoritmo para a solução da partícula livre descrito anteriormente
é de aplicação absolutamente geral e seguiremos esses passos na solução de problemas mais
complexos.
Exercício
Mostre que as integrais (3.8) não são convergentes e, portanto, não podem ser normalizadas.
3.2. Partícula em uma caixa unidimensional com potencial infinito nas extremidades
Figura 3.1. Quando a partícula está entre 0 e L o potencial que atua na partícula é nulo. Mas, para valores de
ou o potencial sentido pela partícula é infinito. Portanto, a partícula fica presa no seguimento de
reta , , daí a expressão caixa unidimensional.
ħ d
. (3.9)
2
A notação significa que o potencial é infinito se a partícula estiver fora da caixa uni-
dimensional. Manipulando algebricamente a Equação (3.9), temos:
1 ħ d
.
2
A partir deste resultado, pode-se concluir que 0 0, e para valores de x menores
do que zero e maiores do que L a função onda também é nula. Como | | descreve
a densidade de probabilidade de encontrar a partícula ao longo da dimensão x, então a proba-
bilidade de encontrarmos a partícula para valores de 0 ou valores de é nula. Para
valores de x entre 0 e L, o potencial sentido pela partícula é nulo e a Equação de Schrödinger
pode ser escrita como
ħ d
, (3.10)
2
ou
d 2
0. (3.11)
ħ
A solução geral de (3.11) é
(3.12)
ħ ħ .
Usando a relação de Euler (1.21), podemos reescrever (3.12) como segue:
2 2
. (3.13)
ħ ħ
2
. (3.14)
ħ
2
0. (3.15)
ħ
Logicamente, em (3.15) a constante B não pode ser zero, pois, isto nos levaria à solução geral
nula que não nos interessa. Então, devemos fazer
73
2
0. (3.16)
ħ
2 (3.17)
,
ħ
pois, 0. O sinal negativo em (3.17) não produz uma nova solução, pois, a fun-
ção seno é uma função impar e o sinal negativo seria incorporado na constante B. Manipulan-
do algebricamente (3.17) obtemos a expressão matemática para a energia da partícula na cai-
xa unidimensional:
ħ
1,2,3, . (3.18)
2 8
A princípio, poderia assumir também o valor zero. Mas, isso faria com que a energia
fosse nula. Se fizermos 0 em (3.10), a solução de (3.10) seria do tipo ,
onde a e b são constantes a serem determinadas. Usando as condições de contorno 0 0
e 0, descobrimos que 0 e, portanto, teríamos 0. Obviamente, essa
solução nula não nos interessa. Consequentemente, devemos ter 0. Observe que em
(3.18) que a energia da partícula na caixa unidimensional é quantizada, isto é, assume valores
discretos. Isto aconteceu porque impomos a restrição que a partícula deve estar confinada na
caixa unidimensional. É exatamente essa restrição que leva à quantização da energia da partí-
cula na caixa. Outro fato interessante é que a energia é inversamente proporcional ao quadra-
do de L. Quanto maior for a dimensão da caixa menor a energia da partícula. A energia E
também diminui com o inverso da massa m da partícula. Para 1 temos a energia do esta-
do fundamental, ou seja, o estado de mais baixa energia. Para os outros valores de n temos os
chamados estados excitados, isto é, 2 para o primeiro estado excitado, 3 segundo
estado excitado e assim por diante. Observe que o espaçamento entre os estados varia com
. Isto significa que estados excitados altos são difíceis de serem atingidos.
⁄
Isolando em (3.17), considerando apenas os valores positivos de n, e substi-
ħ
. (3.19)
| | | | | | | | | |
| | | | 1,
2
⁄
2
| | . (3.20)
2 (3.21)
, 1,2,3, .
O número n nas equações (3.18) e (3.21) é chamado de número quântico. Para cada valor de
n teremos uma função de estado diferente, ou seja, um estado diferente, como pode ser visto
na Figura 3.2.
No final da seção 2.3 comentamos rapidamente que deveria haver uma relação inver-
samente proporcional entre a precisão da posição, a qual denotamos por ∆ , e a precisão do
momento da partícula, a qual será denotada por ∆ . De acordo com a hipótese de Broglie,
⁄λ, a partícula comporta-se como se fosse uma onda de comprimento λ. Se usarmos
uma única onda plana para representar a partícula, então teríamos precisão absoluta do mo-
mento da partícula, pois o momento fica completamente determinado: , onde éo
vetor número de onda que tem o sentido da propagação da frente de onda e modulo dado por
| | 2 ⁄λ, desde que conheçamos com precisão o comprimento de onda λ. No entanto,
como uma única onda plana é completamente deslocalizada no espaço, teríamos uma impre-
cisão total da posição da partícula. Entretanto, nosso senso comum diz que a partícula possui
uma posição definida no espaço. Resolvemos este problema, na seção 2.3, usando um pacote
formado por muitas ondas planas em que os vetores de onda k possuem valores próximos
entre si. Ao usar a ideia do pacote de onda melhoramos o conhecimento da precisão da posi-
ção, mas perdemos informação sobre a precisão do momento de acordo com a relação
, pois agora estamos usando uma quantidade enorme de vetores de onda. Isto nos le-
vou a suspeita de que existe uma relação inversamente proporcional entre ∆ e ∆ , isto é,
∆ 1⁄∆ . Agora, usando os conhecimentos adquiridos na solução da partícula na caixa,
podemos ampliar um pouco mais o entendimento da relação entre ∆ e ∆ para o caso de
uma partícula unidimensional. Suponha que uma partícula na caixa unidimensional encontra-
se no estado com energia dada pela Equação (3.18). Como não sabemos a posição da
partícula na caixa de comprimento L, podemos tomar L como sendo a imprecisão da posição:
∆ . O momento da partícula pode ser obtido como segue:
8 8 ∆
2 8 ∆
·
2∆
Nesta Equação, 1,2,3, . Os sinais positivos e negativos são interpretados como sendo o
momento da partícula que percorre o sentido positivo e negativo do eixo-x, respectivamente.
Podemos escrever a incerteza do momento como segue:
77
∆ 1,2,3, , (3.22)
2∆ 2∆ ∆
onde representa o momento da partícula que viaja no sentido positivo da trajetória e
representa o momenta da partícula que viaja no sentido negativo da trajetória. Rearranjando
os termos de (3.22), obtemos uma estimativa para o princípio da incerteza de Heisenberg:
∆ ∆ .
Este resultado mostra que quanto maior for a certeza na posição da partícula maior será a
incerteza do valor do momento.
Exercício:
Por que não podemos conhecer com qualquer grau de precisão a posição e a velocidade de uma par-
tícula simultaneamente?
ħ ħ ħ ħ
· (3.25)
2 2 2 2
Neste caso, como comentado na secção 3.1, a Equação (3.23) é de variáveis separáveis, ou
seja, a solução de (3.23) pode ser escrita como um produto de três funções, onde cada função
depende de apenas uma variável, isto é, , , φ φ φ . Substituindo
2 2 2
, , φ φ φ ,
8
, , , , ,
(3.26)
, , 1,2,3,
Os subíndices , , de , , em (3.26) são empregados para indicar a dependência
de , , em relação aos números inteiros , , . As constantes a, b e c representam,
respectivamente, as arestas da caixa tridimensional. A energia da partícula na caixa tridimen-
sional é obtida somando os autovalores das autofunções φ ,φ eφ , respecti-
vamente:
, , , , , 1,2,3, . (3.27)
8
No caso particular de uma caixa cúbica, em que , a Equação (3.27) toma uma for-
ma mais simples:
, , , , , 1,2,3, .
8
Note que
79
6
, , , , , , ·
8
Neste caso, os níveis de energia 2,1,1 , 1,2,1 e 1,1,2 apresentam a mesma energia e, por
isso, são chamados de níveis degenerados. No entanto, as funções de estado para estes níveis
são matematicamente diferentes:
8 2
, , , , ,
8 2
, , , , ,
8 2
, , , , .
Quando autoestados (autofunções) diferentes apresenta o mesmo autovalor, dizemos que es-
tes autoestados são degenerados. O número de autofunções que apresenta a mesma energia é
chamado de degenerescência do nível ou grau de degenerescência. No exemplo acima, o
nível de energia considerado é triplamente degenerado. O caso bidimensional é inteiramente
análogo ao caso tridimensional. A Figura 3.3 mostra um exemplo ilustrativo para o caso de
uma caixa bidimensional quadrada em que os lados da caixa são 2. Neste caso, a
solução da Equação de Schrödinger para este sistema pode ser escrita como
4
, , , , 1,2,3, .
, , , 1,2,3, . (3.28)
,
2 2
Os gráficos das funções de estado para os níveis 1,1 , 2,1 , 2,2 e 3,2 , juntamente com
as respectivas densidades de probabilidades são mostradas na Figura 3.3.
80
, , , ,
, , , ,
Figura 3.3. Gráficos das funções de estado e da densidade de probabilidade para os 4 primeiros estados dados
pela Equação (3.28). Os gráficos foram feitos usando o programa Maple.
Suponhamos agora que a partícula esteja em uma caixa unidimensional com potencial finito
nas extremidades e potencial nulo dentro da caixa. Uma interpretação gráfica desta situação
pode ser visualizada na Figura 3.4.
I V0 II III
x =0 x=l
Figura 3.4. caixa unidimensional com potencial finito nas extremidades e potencial nulo no intervalo que vai de
0 a l.
Neste problema, temos três regiões a serem analisadas: regiões I, II e III. As funções de esta-
do para essas regiões serão denotadas por , e , respectivamente. As equa-
ções de Schrödinger para as regiões I e III podem ser escritas como seguem:
81
ħ
região I: ,
2
ħ
região III: .
2
Temos duas situações a serem analisadas neste problema: a primeira é quando ea
segunda situação é quando . Do ponto de vista clássico, na primeira situação a partícu-
la está confinada na caixa, pois, a mesma não tem energia suficiente para sair. Na segunda
situação, como a energia da partícula é maior do que a energia potencial, ela sai da caixa sem
nenhuma dificuldade. Vamos, inicialmente, resolver as equações das regiões I e III para o
caso em que . Com essa restrição, as equações das regiões I e III podem ser rearranja-
das algebricamente de tal modo que podem ser escritas como segue:
2
região I: 0,
ħ
2
região III: 0.
ħ
Essas equações diferenciais ordinárias são bastante conhecidas, cuja Equação característica é
2 ⁄ 0. Resolvendo esta Equação para obtemos as soluções das Equa-
ções para as regiões I e III para o caso em que :
⁄ ⁄
⁄ ⁄
,
⁄ ⁄
⁄ ⁄
.
Como as funções de onda devem ser finitas, então devemos impor as restrições 0 e
0. Sem estas restrições, ∞ quando ∞e ∞ quando ∞.
Com essas observações, as funções e podem ser reescritas como seguem:
⁄
⁄
,
⁄
⁄
.
A solução na região II já foi discutida anteriormente e é dada por
⁄ ⁄
2 ⁄ 2 ⁄ .
As constantes A, B, C e G podem ser determinadas usando as seguintes condições de contor-
no:
1) 0 0 ;
2) ;
3) 0 0 ;
4) .
82
As condições 3 e 4 vêm do fato de que a derivada primeira da função de onda deve ser
contínua. Observe que a função de onda é oscilante na região II e decai exponencialmente nas
regiões I e III. Como já comentado, classicamente, as regiões I e III são proibidas, pois a par-
tícula não tem energia suficiente para transpor a barreira de energia potencial, no entanto,
existe uma probabilidade quântica de encontrarmos a partícula nestas regiões. Este fenômeno
é conhecido como tunelamento e ocorre com bastante frequência na química. Como exemplo
de tunelamento que ocorre podemos citar a emissão de partículas α por núcleos radioativos, a
inversão dos átomos de hidrogênio na molécula de amônia, a rotação da molécula de
, reações de óxido-redução e reações em que ocorre a transferência de hidrogênio.
Para o caso em a Equação de Schrödinger pode ser escrita como segue:
2
0.
ħ
A equação característica para essa Equação é 2 ⁄ 0, cujas raízes são
⁄
2 ⁄ . Como , então as soluções nas regiões I e III são:
⁄ ⁄
· ⁄ · ⁄
,
⁄ ⁄
· ⁄ · ⁄
.
Neste caso, não existe nenhuma razão para que as constantes D e F sejam nulas. A solução é
oscilante e a partícula pode assumir qualquer valor de energia, ou seja, a energia não é mais
quantizada.
x0
Figura 3.5. Oscilação de um corpo de massa m preso a uma mola de massa desprezível em torno de . Nesse
modelo não há atrito entre o corpo a superfície.
Na posição , o corpo está em equilíbrio e a força da mola sobre o corpo é zero. A equação
diferencial que descreve o movimento de oscilação mostrado na Figura 3.5 pode ser obtida
usando as leis de Newton e Hook combinadas. A lei de Hook afirma que a força exercida pela
mola é diretamente proporcional a distensão e tem sentido oposto ao sentido do movimento
do corpo. Esta lei fornece bons resultados desde que não haja deformação da mola. Matema-
ticamente, a força exercida pela mola é dada por
,
onde é uma constante que depende do tipo de material do qual a mola é feita. O sinal nega-
tivo é introduzido nesta Equação para indicar que o sentido da força opõe-se ao sentido do
movimento. A força produz uma aceleração no corpo preso na extremidade da mola de
tal modo que devemos ter . Usando esta informação na Equação de Hook, obte-
mos a equação diferencial do movimento oscilatório clássico:
0. (3.29)
⁄ ⁄
que 2 ⁄ ⁄ . Isto mostra que 2 ⁄ ⁄ é o período de (3.31), ou
seja,
2
2 .
⁄
Definimos a frequência ν como sendo o número de oscilações por unidade de tempo. Como o
período T é o tempo necessário para que ocorra uma oscilação completa, então período e fre-
quência são grandezas inversamente proporcionais, isto é,
1 1
ν · (3.32)
2
ħ 1
, (3.34)
2 2
onde E representa a energia do oscilador harmônico quântico unidimensional. Esta é a Equa-
ção de Schrödinger procurada e é um importante modelo para o entendimento de muitos fe-
nômenos químicos. Manipulando algebricamente (3.34), obtemos uma equação diferencial
homogenia em que o coeficiente de não é constante:
2
0.
.
2
Como os valores de a, podemos escrever a solução geral de (3.36):
. (3.38)
86
. (3.39)
A constante em (3.39) não precisa ser escrita, pois esta será incorporada na função .
Substituindo em , temos:
. (3.40)
0,
0.
Esse produto só é verdadeiro se 0.
Agrupando os termos semelhantes e fatorando , temos:
2 0. (3.41)
A Equação (3.41) é bastante conhecida dos matemáticos e é chamada de Equação de Hermi-
te, cuja a solução são os polinômios de Hermite. A Equação de Hermite é resolvida usando
série de potências. Neste procedimento, supomos que a solução de (3.41) possa ser escrita
como uma série de potências, isto é,
. (3.42)
1 2 1 .
2 1 .
2 1 2 0,
2 1 2 0. (3.43)
Colocando todos os termos de (3.43) sob um único sinal de somatório e fatorando , obte-
mos:
2 1 2 0.
Este polinômio só será identicamente nulo se todos os seus coeficientes forem nulos. Portan-
to, devemos ter 2 1 2 0. Resolvendo esta Equação
para , temos:
2 2
. (3.44)
2 1 2 1
Lembrando que fizemos 2 ⁄ħ e substituindo o valor de em (3.44), obtemos uma
fórmula de recorrência de dois termos para os coeficientes do polinômio :
2 2
. (3.45)
2 1
Essa fórmula de recorrência leva a duas soluções linearmente independentes, isto é, se fize-
mos , obteremos a solução par:
. (3.46)
, , ,
. (3.47)
, , ,
A solução geral é obtida fazendo a combinação linear da solução par com a impar:
. (3.48)
e são constantes a serem determinadas. As soluções (3.47) e (3.46) não são convergentes,
isto é, são infinitas. Portanto, não são soluções aceitáveis. Para que essas séries sejam finitas,
devemos impor a restrição de que para valores de maiores do que certo valor , todos os
coeficientes ’s serão nulos, isto é, 0. Isto significa que em
88
1
ν .
2
ν2
,
para par,
(3.51)
para impar.
Os coeficientes de (3.51) são obtidos pela fórmula de recorrência
2
2 1
e pela condição de normalização. Por exemplo, a função de onda do oscilador harmônico
quântico para o estado fundamental, isto é, para 0, é
89
.
Usando a condição de normalização podemos determinar a constante .
⁄
1 2| | 2| | ⁄
,
2
⁄
| | .
.
⁄
Usando a condição de normalização encontramos a constante , isto é, 4 ⁄ .
Substituindo em , obtemos a função de onda para o primeiro estado excitado do os-
cilador harmônico quântico:
4 ⁄ ⁄
. (3.53)
Observe que (3.53) é uma função impar e, consequentemente, simétrica em relação a origem.
Pauling & Wilson derivaram uma fórmula geral para as soluções normalizadas
do oscilador harmônico quântico:
1
1 ,
√2 !
⁄
onde . O polinômio
Capítulo 4
Neste capítulo vamos resolver a equação de Schrödinger para o momento angular, rotor rígi-
do e para o átomo de hidrogênico.
Muitos fenômenos estudados pela química são entendidos a partir das consequências
do estudo do momento angular quântico. Entre estas consequências esta a Espectroscopia
Molecular Rotacional (EMR), cuja origem está no momento angular das moléculas. O estudo
da EMR nos fornece importantes informações sobre as características fundamentais das mo-
léculas como geometria e comprimento de ligações. Outra consequência do estudo do mo-
mento angular é a Ressonância Magnética Nuclear (RMN) e a Ressonância Paramagnética
Eletrônica (RPE) que são fenômenos baseados na existência dos spins nucleares e eletrôni-
cos. Essas ressonâncias nos fornecem importantes informações sobre as estruturas e configu-
rações das moléculas. As formas dos orbitais atômicos são também definidas pelo momento
angular orbital dos elétrons nos átomos. Essas formas são importantes na definição da orien-
tação espacial dos orbitais atômicos, os quais definem as ligações químicas e estereoquímica
das moléculas. No caso em que o momento angular for conservado, podemos usá-lo também
para classificar os níveis de energia do sistema.
A Figura 4.1 mostra uma partícula p girando em um círculo de raio e centro c com
velocidade . Como a velocidade da partícula tem uma componente perpendicular ao raio ,
então podemos definir para esta partícula uma quantidade , chamada de momento angular.
Figura 4.1. Gráfico mostrando uma partícula p girando em um círculo de raio r e centro c.
92
Classicamente, o momento angular é definido como sendo o produto vetorial do raio pelo
momento da partícula, ou seja,
.
Esta definição mostra que o momento angular é um vetor perpendicular aos vetores e
cujo sentido é dado pela regra da mão direita. Observa-se que apenas a componente do mo-
mento perpendicular ao vetor contribui para o momento angular. Nesse sentido, o módulo
do vetor momento angular pode ser calculado fazendo o produto do raio pela componente do
momento linear , ou seja,
| | | || | ,
onde é o ângulo formado entre os vetores e . As componentes do momento angular
clássico são definidas por
,
, (4.1)
.
Essas componentes podem ser facilmente memorizadas usando a permutação cíclica. Outra
maneira prática de memorizar as componentes (4.1) é construir uma matriz em que na primei-
ra linha colocamos os vetores unitários , e , na segunda linha colocamos as variáveis x, y e
z e na terceira linha colocamos as componentes , e do vetor momento linear e em
seguida calcula-se o determinante desta matriz, ou seja,
, , .
, (4.2)
cas que não se comutam. Isto significa que, em geral, . A comutação entre dois ope-
radores é definida por
, . (4.3)
Se os operadores e comutarem, por definição, devemos ter
, 0.
Algumas propriedades úteis na química quântica sobre operadores são dadas a seguir:
1) , , ,
2) , 0, 1,2,3, ,
3) , , , ,
4) , , , ,
5) , , , ,
6) , , , ,
7) , , , .
Todas essas propriedades são facilmente demonstráveis usando a definição (4.3). Na terceira
propriedade, representa um escalar.
Os operadores de ocorrência comum na química quântica são lineares. Um operador
é dito ser linear, se obedecer as seguintes regras:
1) ,
2) ,
onde é uma constante escalar e e são funções. Em quântica, se dois operadores comu-
tam, então eles têm em comum um conjunto completo de autofunções, ou seja, em um único
experimento, podemos medir os observáveis relativos aos dois operadores.
Obviamente, se dois operadores não comutam, eles não possui um conjunto completo
de autofunções em comum e, consequentemente, não podemos medir no mesmo experimento
os observáveis relativos aos dois operadores, precisaremos fazer um experimento para cada
observável. Mas, isso não impede que eles tenham uma ou mais autofunção em comum.
Exercícios
1. Mostre que quando dois operadores comutam entre si, então eles têm em comum um conjunto
de autofunções. Adicionalmente, quando eles têm um conjunto de autofunções em comum, en-
tão eles comutam.
2. Mostre que , ̂ , ̂ ̂, ̂ .
3. Mostre que , ̂ 2 ·
4. Mostre que , ̂ .
94
Como , ̂ 0, não podemos ao mesmo tempo medir valores definidos dos operadores e ̂ .
Classicamente, podemos medir com qualquer grau de precisão os valores de x e . Usando o resulta-
do , ̂ , pode-se dizer que no limite clássico devemos ter 0. Quando uma função de esta-
do Ψ não é uma autofunção do operador , então ao se fazer várias medidas de A obtém-se vários
valores não definidos do observável A. O valor médio A esperado do operador após se fazer várias
medidas é dado por
onde representa a função de estado normalizada e representa o valor médio das medidas da
propriedade A e representa o elemento de volume de integração. A média da dispersão destes valo-
res entorno da média das medidas é chamada de variância, que em estatística costuma-se usar o
símbolo para representá-la e na química quântica usamos o símbolo ∆ :
∆ 2 2 2 2 .
∆ ∆ .
O desvio padrão é a medida de dispersão mais comumente usada e faremos uso do desvio
padrão como medida da incerteza de uma propriedade A. O produto dos desvios padrão de
duas propriedades de um sistema quântico com função de estado é dado por
1
Δ Δ , . (4.4)
2
A demonstração de (4.4) para dois operadores hermitiano e pode ser feita da seguinte
maneira: definimos, inicialmente, duas funções e tal que e
. Como consequência desta definição, temos:
Δ ,
(4.5)
|
Δ .
é positivo. Zero é um número que não é positivo e nem negativo. Temos dois casos a ser ana-
lisado: 1) e 2) . Desenvolvendo a integral I para o primeiro caso, temos:
| | | | | . (4.6)
Este polinômio em só adimitirá duas raízes iguais e nulas se tivermos 4 , ou seja, se
4 | | | | .
No caso 2, o integrando de I será sempre positivo. Isto significa que as raízes de (4.6) devem
ser complexas. Logo, o discriminante de (4.6) deverá ser negativo, ou seja,
4 | | | | .
Combinando os dois casos, temos que
4 | | | | . (4.7)
Desenvolvendo (4.7) obtemos (4.4) de modo direto:
4 | | | |
Usando (4.5) e dividindo ambos os lados desta Equação por 4 e tirando a raiz, obtemos a E-
quação (4.4):
1
Δ Δ , .
2
Se os operadores , e comutarem, então eles possuirão em comum um conjunto de
autofunções, ou seja, em um único experimento poderemos medir as três componentes do
vetor momento angular. Para determinarmos se os operadores e comutam, devemos
mostrar que , 0. Conhecemos o efeito de um operador quando apli-
camo-lo a alguma função, digamos , , . Usando as Equações (4.2), temos:
,
96
, .
Similarmente, temos
, ,
, .
Estes resultados mostram que os operadores das componentes do momento angular não co-
mutam. Isto significa que não podemos ter um conjunto comum de autofunções aos operado-
z y
r 2 = x 2 + y 2 + z 2 ; coss (θ ) = ; tang (φ ) =
(4.88) .
x2 + y2 + z 2 x
Em coorddenadas carttesianas um ponto está completamen
c nte especificcado quandoo são dados asa
suas coorrdenadas x, y e z. O messmo ponto esstá completaamente descrrito em coorrdenadas esfé
fé-
ricas se for o os valores de θ, φ e r, ou seja,
f conhecido
g ( x, y, z ) = f θ ( x, y , z ) , φ ( x, y , z ) , r ( x, y, z ) .
∂g ∂f ∂r ∂f ∂θ ∂f ∂φ
= + +
∂x y , z ∂r θ ,φ ∂x y , z ∂θ r ,φ ∂x y , z ∂φ r ,θ ∂x y , z
∂g ∂f ∂r ∂f ∂θ ∂f ∂φ
= + +
∂y x , z ∂r θ ,φ ∂y x , z ∂θ r ,φ ∂y x , z ∂φ r ,θ ∂y x , z
∂g ∂f ∂r ∂f ∂θ ∂f ∂φ
= + + .
∂z x , y ∂r θ ,φ ∂z x , y ∂θ r ,φ ∂z x , y ∂φ r ,θ ∂z x , y
Para conv
verter as equ
uações acimaa em equaçõões de operad
dores, é só deletar
d g e f:
98
∂ ∂r ∂ ∂θ ∂ ∂φ ∂
= + +
∂x y , z ∂x y , z ∂r ∂x y , z ∂θ ∂x y , z ∂φ
∂ ∂r ∂ ∂θ ∂ ∂φ ∂
= + + (4.9)
∂y x , z ∂y x , z ∂r ∂y x , z ∂θ ∂y x , z ∂φ
∂ ∂r ∂ ∂θ ∂ ∂φ ∂
= + + .
∂z x , y ∂z x , y ∂r ∂z x , y ∂θ ∂z x , y ∂φ
Usando (4.8) obtemos
∂r ∂r ∂r
= sen (θ ) cos (φ ) , = sen (θ ) sen (φ ) , = cos (θ ) ;
∂x y , z ∂y x , z ∂y x , z
∂θ cos (θ ) cos (φ ) ∂θ cos (θ ) sen (φ ) ∂θ sen (θ )
= , = , =− ;
∂x y , z r ∂y x , z r ∂z x , y r
∂φ sen (φ ) ∂φ cos (φ ) ∂φ
=− , = , = 0.
∂x y , z r ⋅ sen (θ ) ∂y x , z r ⋅ sen (θ ) ∂z x , y
∂ ∂
Lˆx = ih senφ + cotθ cosφ . (4.11)
∂θ ∂φ
De modo similar, obtemos Lˆ y e Lˆz :
∂ ∂
Lˆ y = −ih cosφ − cotθ senφ
∂θ ∂φ
∂
Lˆ z = −ih . (4.12)
∂φ
Para obtermos o operador L̂2 , basta elevar ao quadrado os operadores Lˆx , Lˆ y e Lˆz e somá-los:
∂2 ∂ 1 ∂2
Lˆ2 = − h 2 2 + cotθ + .. (4.13)
∂θ ∂θ sen 2θ ∂φ 2
Observe que em coordenada cartesiana o operador momento angular L̂2 depende de x, y e z.
Mas, em coordenadas esféricas o operador momento angular só depende de θ e φ. Nosso pro-
blema agora é encontrar as autofunções comuns de Lˆz e Lˆ2 , as quais são comumente denota-
Lˆ zY (θ , φ ) = bY (θ , φ ) (4.14)
Lˆ2Y (θ , φ ) = cY (θ , φ ) , (4.15)
onde b e c são os respectivos autovalores. Como o operador Lˆz só depende de φ, podemos
T (φ ) = Aeibφ h . (4.17)
Aqui, A é uma constante de integração. Para que (4.17) seja uma solução aceitável devemos
impor a seguinte restrição:
T (φ + 2π ) = T (φ ) .
Logo,
T (φ + 2π ) = T (φ )
ib(φ +2π ) ibφ
Ae h = Ae h
ibφ ib 2π ibφ ,
Ae h ⋅e h = Ae h
ib 2π
e h =1
Usando a relação de Euler, temos:
100
b 2π b2π
cos + i ⋅ sen = 1. (4.18)
h h
Para que a condição (4.18) seja satisfeita, devemos ter
b2π
= 2π m
h .
b = mh onde m = 0, ±1, ±2,L
∫ Aeimφ dφ = 1
0
2π
∫ A*e−imφ Aeimφ dφ = 1 .
0
2π
∫
2
A dφ = 1
0
1
A= .
2π (4.20)
Usando este resultado em (4.19), temos as autofunções de Lˆz :
1 imφ
T (φ ) = e m = 0, ±1, ±2,L . (4.21)
2π
A Eq. (4.21) mostra que a projeção do momento angular no eixo-z é quantizada. Tendo resol-
vido a Equação (4.14), o nosso trabalho agora será encontrar a solução de (4.15). Substituin-
do (4.21) em (4.16) e depois substituindo em (4.15), temos
Lˆ2Y (θ , φ ) = cY (θ , φ )
Lˆ2 S (θ ) T (φ ) = cS (θ ) T (φ )
1 imφ 1 imφ
Lˆ2 S (θ ) e = cS (θ ) e . (4.22)
2π 2π
Usando (4.13) em (4.22), temos
101
∂2 ∂ 1 ∂2 1 imφ 1 imφ
2 ( )
− h 2 2 + cotθ + S θ e = cS (θ ) e
∂θ ∂θ sen θ ∂φ 2π 2π
2
d 2S dS Sm 2 c
+ cotθ − =− 2 S. (4.23)
dθ 2 dθ sen 2θ h
A Equação (4.23) é bastante conhecida da matemática e pode ser resolvida usando série de
potências. Para tornar mais fácil a solução de (4.23) usando série de potência é melhor fazer
uma mudança de variável:
w = cosθ .
dS d 2S
seguinte é encontrar as derivadas e para que possamos substituir em (4.23):
dθ dθ 2
dS dG dw dG 1 2 dG
= = − senθ = − (1 − w2 ) . (4.24)
dθ dw θ dw dw
d 2S
Para encontrarmos precisamos fazer uma pequena operação no operador diferencial de
dθ 2
segunda para estar correto com a mudança de variável:
d2 d d 12 d 12 d
= = − (1 − w2 ) − (1 − w2 )
dθ 2
dθ dθ dw dw
d2 2 12 1
2
d 2 12 d
dθ 2
= − (1 − w ) − (1 − w )
2 −1 2
( −2 w ) + (1 − w ) 2
2 dw dw
2 2
d d d
= (1 − w2 ) 2 − w .
dθ 2
dw dw
Usando este operador em S (θ ) = G ( w ) , temos:
d 2S 2
2 d G dG
dθ 2
= (1 − w ) dw 2
−w
dw
. (4.25)
temos:
d 2G dG c m2
(1 − w2 ) dw2
− 2 w + −
dw h 2 1 − w2
G = 0. (4.26)
Como se trata de uma equação diferencial de segunda ordem, precisamos de duas soluções
linearmente independentes para gerar todo o espectro da solução. Como estamos resolvendo
(4.26) usando série de potência, devemos procurar uma fórmula de recorrência de dois ter-
102
mos. Para isso, precisamos modificar (4.26) mais uma vez. Vamos fazer isso definindo uma
nova função H ( w ) de tal modo que
m
G ( w ) = (1 − w2 ) 2 H ( w) . (4.27)
( )
m 2
Calculando G ′ e G ′′ e substituindo em (4.26) e em seguida dividindo por 1 − w2 , te-
remos:
(1 − w ) H ′′ − 2 ( m + 1) wH ′ + ch
2 −2
− m ( m + 1) H = 0 . (4.28)
∞
H ′ ( w ) = ∑ ja j w j −1
j =0
∞ ∞
H ′′ ( w ) = ∑ j ( j − 1) a j w j − 2 = ∑ ( j + 2 )( j + 1) a j + 2 w j
j =0 j =0
∞
c
∑ ( j + 2 )( j + 1) a
2
j +2 + − j 2 − j − 2 m j + 2 − m − m a j w j = 0.
j =0 h
Como visto no caso do oscilador harmônico, este polinômio é identicamente nulo se cada
coeficiente for nulo. Usando esta restrição conseguimos uma fórmula de recorrência de dois
termos:
( j + m )( j + m + 1) − c h 2
a j +2 = aj . (4.30)
( j + 2 )( j + 1)
Esta fórmula de recorrência fornece duas séries de potências: uma impar e outra par. A solu-
ção geral é a combinação linear dessas duas soluções. No entanto, essas séries são infinitas e
divergentes, pelo menos seguramente para w = ± 1 . Este não é um fato aceitável para uma
função de onda. Para contornar este problema, faremos como fizemos para o oscilador har-
mônico quântico, i.e., vamos truncar a expansão para algum valor de k. Queremos dizer com
isto que para j > k todos os termos serão iguais a zeros. Isto é feito impondo a restrição de
que o numerador de (4.30) seja zero e trocando j por k:
103
( j + m )( j + m + 1) − c h = 0 para j > k
2
c = h ( k + m )( k + m + 1) .
2
com k = 0, 1, 2, 3, L (4.31)
Em (4.31), podemos fazer l = k + m obtendo deste modo os autovalores do momento angular
L̂2 :
c = l ( l + 1) h2 l = 0,1, 2,3,L (4.32)
Nesse sentido, a magnitude do momento angular da partícula será dado por
L = c = l ( l + 1)h . (4.33)
Usando (4.29) em (4.27) e fazendo w = cosθ , obtemos as autofunções do operador L̂2 :
l − m
∑ a2 jcos (θ )
2j
solução par,
j=0
Sl ,m (θ ) = sen (θ ) l − m
m
(4.34)
a cos 2 j+1 θ solução impar.
∑ 2 j+1 ( )
j=0
A soma é sobre os valores ímpares ou pares de j, dependendo se l − m é par ou ímpar, isto é,
se l − m for ímpar, então j será ímpar. Se l − m for par, então j será par. De acordo com
( j + m )( j + m + 1) − l ( l + 1)
a j +2 = aj . (4.35)
( j + 1)( j + 2 )
Em resumo, as autofunções e os autovalores dos operadores Lˆ2 e Lˆz são:
1
Yl m (θ , φ ) = Sl ,m (θ ) T (φ ) = Sl , m (θ ) eimφ . (4.36)
2π
L Yl (θ , φ ) = l ( l + 1) h Yl (θ , φ ) l = 0,1, 2,L
ˆ2 m 2 m
(4.37)
,
Lˆ zYl (θ , φ ) = mhYl (θ , φ )
m m
m = −l , −l + 1,L , l − 1, l ; (4.38)
onde l e m encontram-se diretamente relacionados ao momento angular e a sua projeção no
eixo-z.
As funções (4.36), as quais são dependentes de l e m, são chamadas de esféricos har-
mônicos ou superfícies harmônicas. As funções Sl ,m (θ ) são, na verdade, as funções associ-
1
2l + 1 ( l − m ) ! 2
Sl ,m (θ ) = ( cosθ )
m
Pl
2 ( l + m )!
e
m l+ m
1 d
( w) ≡ l (1 − w2 ) 2 l + m ( w2 − 1) ,
m l
Pl l = 0,1, 2,L e m = −l ,L , l
2 l! dw
Pl
m
( w) representa as funções associadas de Legendre e w = cos θ .
Yl m (θ , φ ) = Sl ,m (θ ) T (φ ) = ( cosθ ) eimh .
m
Pl (4.39)
4π ( l + m ) !
1. l = 0
1
1.1. Y00 = 2
2
2. l = 1
1
2.1. m = −1 → Y1−1 = 3 sin θ e −iφ
2
1
2.2. m = 0 → Y10 = 6 cos θ
2
1
2.3. m = 1 → Y11 = 3 sin θ e −iφ
2
3. l = 2
1
3.1. m = −2 → Y2−2 = 15 sin 2 (θ ) e − i 2φ
4
1
3.2. m = −1 → Y2−1 = 15 sin θ cos θ e − iφ
4
3.3. m = 0 → Y20 =
1
4
(
10 3 cos 2 θ − 1 )
1
3.4. m = 1 → Y21 = 15 sin θ cos θ eiφ
4
1
3.5. m = 2 → Y22 = 15 sin 2 (θ ) ei 2φ
4
105
então não podemos obter o autovalor correspondente, i.e., Ô ϕ ≠ c ϕ , onde c seria o obser-
determinamos explicitamente. Não podemos usar as autofunções do operador Lˆz , para deter-
minar as projeções dos operadores Lˆx e Lˆ y , exceto no caso em l = 0 . Mas, nem tudo está
perdido. Se fizermos um grande número de medições dos observáveis dos operadores Lˆx e
encontraremos uma série de diferentes valores, cujos valores médios podem ser calculados
como
Yl m (θ , φ ) Lˆx Yl m (θ , φ )
Lˆx =
Yl m (θ , φ ) Yl m (θ , φ )
Yl m (θ , φ ) Lˆ y Yl m (θ , φ )
Lˆ y = .
Yl m (θ , φ ) Yl m (θ , φ )
O rotor rígido é um sistema formado por duas partículas ligadas entre si por uma vare-
ta rígida sem massa e que gira em qualquer direção entorno de um centro de massa fixo. Co-
mo a distância entre as duas partículas é fixa, então a energia do sistema é constituída intei-
ramente de energia cinética rotacional e translacional, isto é, o sistema não apresenta energia
potencial, ou seja, 0. Aqui, só estamos interessados na energia cinética rotacional do
sistema, a qual pode ser escrita para um sistema formado pelas partículas a e b como:
. (4.40)
2 2
O problema de duas partículas descrito pelo conjunto de coordenas {(xa, ya,za), (xb, yb,zb)}
pode ser reduzido a um problema equivalente de uma partícula, dado pelo conjunto de coor-
denadas {(X,Y,Z), (x,y,z)}, onde X, Y, e Z representam as coordenadas do centro de massa e x,
y e z são as coordenadas relativas que descreve a posição de uma partícula com relação a po-
sição da outra:
106
x = xa − xb , y = ya − yb e z = za − zb (4.41)
N N
As coordenadas do centro de massa são obtidas usando a fórmula qi = ∑ m j qij ∑ m j , on-
j j
No nosso caso, como o centro de massa é fixo (por definição), podemos tomá-lo como ori-
gem do nosso sistema de coordenadas, isto é, X = 0 , Y = 0 e Z = 0 .
Combinando as equações (4.41) e (4.42), obtemos:
mb mb mb
xa = X + x, ya = Y + y e ya = Z + z
ma + mb ma + mb ma + mb
ma ma ma
xb = X − x, yb = Y − y e yb = Z − z
ma + mb ma + mb ma + mb
Em notação vetorial, termos:
mb ma
ra = R + r e rb = R − r.
ma + mb ma + mb
No nosso caso, R = 0 , pois estamos considerando que o centro de massa do rotor é fixo e está
localizado na origem.
mb ma
ra = r e rb = − r. (4.43)
ma + mb ma + mb
Derivando (4.43) em relação ao tempo e substituindo em (4.40), temos:
107
pa2 pb2 1 1
Ecin = + = pa pa + pb pb
2ma 2mb 2ma 2mb
1 ma mb m m 1 mb ma m m
= r& a b r& + − r& − b a r&
2ma ma + mb ma + mb 2mb ma + mb ma + mb
1 ma2 mb2 2 1 ma2 mb2
= r
& + r& 2
2ma ( ma + mb ) 2
2mb ( ma + mb ) 2
1 ma mb2 + ma2 mb 2 1 ma mb ( mb + ma ) 2
= r& = r&
2 ( ma + mb )2 2 ( ma + mb )2
1 ma mb
= r& 2
2 ( ma + mb )
1 2
Ecin = µ r&
2
Definimos a massa reduzida de um sistema de duas partículas a e b como
ma mb
µ= .
( ma + mb )
Como não há energia potencial para este sistema, o operador hamiltoniano é dado simples-
mente pela energia cinética rotacional:
h2 2
Ĥ = − ∇ .
2µ
Como o sistema foi reduzido a um sistema equivalente a uma partícula de massa µ movimen-
tando em uma esfera com centro no centro de massa, se torna mais conveniente trabalharmos
com o laplaciano em coordenadas esféricas. Elevando as equações (4.10) ao quadrado e so-
mando-as, teremos o laplaciano em coordenadas esféricas:
∂2 2 ∂ 1 ∂2 1 ∂ 1 ∂2 (4.44)
∇2 = + + + cot θ + .
∂r 2 r ∂r r 2 ∂θ 2 r 2 ∂θ r 2 sin 2 θ ∂φ 2
No caso do rotor rígido, r que representa a distância relativa entre as duas partículas é cons-
tante. Logo, as derivadas em relação a r na Equação (4.44) são zeros. Consequentemente, o
hamiltoniano em coordenadas esféricas pode ser escrito como:
h2 ∂ 2 ∂ 1 ∂2 1 ˆ2
Hˆ = − 2
+ cot θ + 2
= L .
2 µ r ∂θ 2
∂θ sin θ ∂φ 2µ r 2
2
1
J ( J + 1) h 2YJm (θ ,φ ) = EYJm (θ ,φ )
2µ r 2
J ( J + 1) h 2
E= . (4.46)
2µ r 2
O momento de inércia de um sistema com N partículas é definido por
N
I = ∑ mi ri ,
i
J ( J + 1) h 2
E= , J = 0 ,1, 2 ,L .
2I
Quando J = 0, a energia do rotor rígido é zero e aumenta com o aumento de J. Como as auto-
funções do rotor rígido ( YJm (θ ,φ ) ) dependem de m, e m varia de –J a +J , então os níveis de
energia do rotor rígido são 2J+1 degenerados. m representa a projeção do vetor momento
angular do rotor rígido no eixo z. É bom ter em mente que o vetor momento angular rotacio-
nal J ( J + 1)h representa o momento angular de duas partículas que giram entorno de um
∆E ( EJ +1 − EJ ) h
2
J ( J + 2 ) − J ( J + 1) h
f = = = = 2 ( J + 1) B
h h 8π I
h
B = 2 , J = 0 ,1, 2,L .
8π I
109
Nossa atenção nesta secção está focada na solução da Equação de Schrödinger para
átomos hidrogenóides, ou seja, átomos com número atômico e apenas um elétron na ele-
trosfera, como por exemplo, o átomo de , o átomo de , o átomo de etc. Estes sis-
temas atômicos são formados por uma região central positiva chamada núcleo e um elétron
que supostamente gira ao seu redor; sendo, portanto, um problema de força central. A energia
potencial destes sistemas depende apenas da do elétron ao núcleo. A expressão da energia
potencial é obtida a partir da lei de Coulomb por integração, ou seja,
1
,
. (4.47)
2
A Equação (4.47) está escrita em coordenadas cartesianas. Esta Equação não é de variáveis
separáveis em coordenadas cartesianas, mas é separável em coordenadas esféricas. Usando
(4.44) em (4.47) podemos escrever a Equação de Schrödinger em coordenadas esféricas co-
mo segue:
2 1 1 1 1
, ,
2 (4.48)
, , .
Usando (4.13), isto é,
1
,
em (4.48), obtemos
110
2
, , , , . (4.49)
2 2
Isto mostra que o hamiltoniano para átomos hidrogenóides em coordenadas esféricas pode
ser escrito como a soma de três termos, onde o primeiro e o terceiro termo dependem apenas
de e o segundo depende de , e :
2
, , . (4.50)
2 2
Neste caso, a Equação de Schrödinger resultante pode ser resolvida pelo método é da separa-
ção de variáveis. Observamos, inicialmente, que o hamiltoniano (4.50) comuta tanto com
quanto com , isto é,
2
, ,
2 2
2
, , , 0,
2 2
2
, ,
2 2
2
, , , 0.
2 2
Na demonstração das comutatividades acima, usamos as propriedades dos operadores. Como
os operadores , e comutam, então podemos ter um conjunto de autofunções comum
aos três operadores, digamos , , . Usando (4.37) em (4.49), podemos reescrever
(4.49) como segue:
2 1
, , , , , ,
2 2 (4.51)
, ,
Como e são funções somente de θ e φ, então os esféricos harmônicos podem ser multi-
plicados por qualquer função de que ainda continuam sendo autofunções de e . Portan-
to, podemos escrever
, , , . (4.52)
é uma função que só depende de , chamada de função radial. Usando (4.52) em (4.51),
temos
2 1
,
2 2
111
2 1
, (4.53)
2 2
onde representa a distância do elétron ao núcleo. Este é um problema de duas partículas que
pode ser reduzido ao problema de uma partícula usando o conceito de massa reduzida , ou
seja,
Já temos uma boa experiência em resolver equações do tipo (4.55), cuja solução é
⁄ ⁄ (4.56)
ou seja, o coeficiente de é real. Como a função de onda deve ser finita, então devermos op-
tar pelo sinal negativo, isto é,
⁄
,
onde varia de zero a infinito. Nossa tarefa de agora em diante será encontrar as soluções
para valores pequenos de . Fazendo
, (4.57)
onde é definido como
⁄
2 2 (4.58)
.
. (4.60)
(4.61)
, 0.
, 0 (4.62)
1 1 ,
1 1 1
1 .
2
1 2 1 1 2 2 2 0 (4.68)
Igualando os coeficientes de (4.68) a zero, obtemos uma fórmula recursiva de dois termos:
2 2 2 2
1 2 1 1 (4.69)
Como no caso do oscilador harmônico, a série dada por não é convergente. Portanto,
devemos truncá-la para algum valor de , isto é, para todos os valores de ,
, , serão nulos. Isto significa que o numerador de (4.69) deve ser zero par :
2 2 2 2 0,
2 1 2 , 0, 1, 2,3, . (4.70)
Como e são números inteiros, então pode-se fazer
1, 1, 2, 3, . (4.71)
Fazendo 0 em (4.71) vemos que
1, (4.72)
ou seja, varia de 0 a 1. Usando (4.71) em (4.70), obtemos
114
. (4.73)
⁄
Usando o valor de 2 ⁄ em (4.73), temos
1
. (4.74)
2
Usando o valor de ⁄ em (4.74), obtemos
1
, (4.75)
2 8
⁄
onde fizemos ⁄ 4 , sendo a carga do elétron. A fórmula de Rydberg pode ser
obtida a partir de (4.75):
1 1 1 1 1
,
8
onde 109677,6 é a constante de Rydberg.
A Equação (4.71) mostra que a mais alta potência do polinômio
é 1, ou seja,
⁄
, (4.76)
onde ⁄ . A função de onda completa para átomos hidrogenóides pode ser escrita
em coordenadas esféricas como
, , , , (4.77)
⁄
onde 0 ∞, 0 ,0 2 e 2 . Como o elemento de
volume em coordenadas esféricas é dado por
,
então a condição de normalização para a função de onda , , pode ser escrita como
| , , | 1,
115
1.
⁄
| | 1.
Usando procedimento análogo ao descrito anteriorment e com a ajuda da fórmula (4.79), po-
demos obter todas as funções radiais para átomos hidrogenóides. A seguir, listamos as fun-
ções radiais para 1, 2 e 3:
Tabela 4.1. Funções radiais normalizadas para , , onde associamos a letra para , para
e para .
Função radial
⁄
1 0 2 ⁄
.
⁄
1 ⁄
2 0 1
√2 2
116
⁄
1 ⁄
1
2√6
⁄
1 2 2 ⁄
0 1
3√3 3 27
⁄
1 ⁄
3 1
27√6 6
⁄
1 ⁄
2
81√30
Multiplicando as funções radiais da Tabela 4.1 pelos respectivos esféricos harmônicos dados
por (4.34), obtemos as respectivas funções de onda , , para os átomos hidrogenói-
des:
⁄
1 18 2 ⁄
0 0 , , 27
81√3
⁄
-1 1 2 ⁄
, , 6
81
⁄
1 0 1 2 ⁄
, , 6
81
⁄
1 1 2 ⁄
, , 6
81
3 ⁄
1 ⁄
-2 , ,
162√
⁄
1 ⁄
-1 , ,
81√
⁄
1 ⁄
2 0 , , 3 1
81√6
⁄
1 ⁄
1 , ,
81√
⁄
1 ⁄
2 , ,
162√
Como pode ser visto na Tabela 4.2, exceto quando 0, todas as funções de onda hidroge-
nóides são complexas. A energia dos átomos hidrogenóides não depende de , ou seja, as
funções de onda dos átomos hidrogenóides são na verdade degeneradas. Qualquer combina-
ção linear de autofunções de níveis de energia degenerados é também uma autofunção do
respectivo nível com o mesmo autovalor. Isto significa que podemos combinar as autofun-
ções complexas para obter autofunções reais. Por exemplo, podemos combinar
, , e , , para produzir uma função real com o mesmo autovalor, isto é,
118
1
, , , ,
√2
⁄ ⁄
1 1 ⁄
1 ⁄
√2 8√ 8√
⁄
1 1 ⁄
√2 8√
⁄
1 ⁄
8√
⁄
1 1 ⁄
2
√2 8√
⁄
1 ⁄
.
4√2
O fator multiplicativo 1⁄√2 é a constante de normalização da combinação linear. Em coor-
denadas esféricas, temos que . Isto significa que a combinação linear anterior
pode ser reescrita como
⁄
1 ⁄
2 (4.81)
4√2
Uma segunda maneira de combinarmos as funções , , e , , para pro-
duzir uma segunda função real é
1
, , , ,
√2
⁄ ⁄
1 1 ⁄
1 ⁄
√2 8√ 8√
⁄
1 1 ⁄
√2 8√
⁄
1 ⁄
8√
⁄
1 1 ⁄
2
√2 8√
⁄
1 ⁄
,
4√2
em que 1⁄ √2 é a constante de normalização da respectiva combinação linear. Lembrando
que em coordenadas esféricas , podemos reescrever esta combinação liear
como segue:
119
⁄
1 ⁄
2 . (4.82)
4√2
A função , , é real e como em coordenadas esféricas podemos reescre-
vê-la como
⁄
1 ⁄
, ,
4√2
⁄
1 ⁄
2 . (4.83)
4√2
Por esta razão a chamamos de 2 . Observe que as funções 2 e2 continuam sendo auto-
funções do operador , mas não são autofunções do operador . O procedimento usado
anteriormente para obter funções reais a partir de funções complexas pode ser estendido para
estados mais altos. Essas funções reais podem ser obtidas a partir das funções complexas fa-
zendo as substituições
1
| |
1 √
√2 1
| |
√
Quando 0 a função de onda já é real. A Tabela 4.3 lista as funções de onda hidrogenói-
des para 1, 2 e 3.
Tabela 4.3. Orbitais hidrogenóides reais para , .
Funções de onda hidrogenóides reais.
⁄
1 ⁄
1 0 0 1
√
⁄
1 ⁄
0 0 2 2
4√2
⁄
1 ⁄
-1 2
4√2
2
⁄
1 ⁄
1 0 2
4√2
⁄
1 ⁄
1 2
4√2
⁄
1 18 2 ⁄
3 0 0 3 27
81√3
120
⁄
1 2
-1 3 6 ⁄
81
⁄
1 2
1 0 3 6 ⁄
81
⁄
1 1 2 ⁄
3 6
81
⁄
1 ⁄
-2 3 2
81√2
⁄
√2 ⁄
-1 3
81√
⁄
1 ⁄
2 0 3 3 1
81√6
⁄
√2 ⁄
1 3
81√
⁄
1 ⁄
2 3 2
81√2
o nome de momento angular spin, ou simplesmente spin. Em 1922, Otto Stern e Walther
Gerlach propuseram um experimento para medir o momento magnético dos átomos. Este
experimento é realizado com partículas ou átomos neutros para que não haja forças extras
sobre as partículas devido às cargas movendo-se em um campo magnético. No experimento
de Stern-Gerlach um feixe de vapor de átomos de produzido em uma fornalha passa atra-
vés de um campo magnético na direção do eixo-z e é depositado em uma lâmina. O campo
magnético no eixo-z faz com que os átomos de ganhem energia potencial magnética
∆ adicional, dada por
∆ ,
onde representa a componente do momento magnético na direção do eixo-z e é o campo
magnético. A força que atua no átomo na direção de é
∆
. (4.84)
é uma propriedade das partículas que não depende de z. Se o campo magnético for homo-
gênio, então a força magnética dada por (4.84) é nula. Fazendo o campo magnético depen-
dente de z, ou seja, não homogênio na direção do eixo-z, teremos uma força resultante dife-
rente de zero e podemos observar a deflexão do feixe de na lâmina. Considerando que os
momento de dipolo magnéticos estão orientados ao acaso, devemos observar, classicamente,
uma distribuição homogênio dos átomos de na lâmina coletora. Porém, o resultado da
experiência de Stern-Gerlach é totalmente diferente do esperado classicamente. Ao invés de
observarmos uma distribuição homogenia na lâmina coletora, observam-se duas manchas de
bem separadas e de mesma intensidade e simetricamente localizada em relação ao eixo-z,
uma na direção do eixo-z positivo e outra na direção do eixo-z negativo. Este resultado suge-
re a existência de apenas dois valores possíveis para o momento de dipolo magnético na dire-
ção do eixo-z. A partir da geometria do aparelho, do gradiente do campo magnético e do des-
vio dos átomos de , Stern e Gerlach calcularam uma projeção para o momento dipolar
magnético:
1 0,1 .
O experimento de Stern-Gerlach mostra a necessidade de postular a existência de um mo-
mento angular intrínseco eletrônico, ou simplesmente spin , tal que,
.
Usando a teoria de Sommerfeld-Landè, eles chegaram à conclusão de que o spin eletrônico
deveria valer 1⁄2, e consequentemente, 2.
122
1 1 1
1 √3 .
2 2 2
Isto mostra que duas partículas não podem ter os quatro números quânticos iguais, ou seja,
duas partículas de mesmo spin não pode ocupar o mesmo lugar no espaço. Este fato é co-
nhecido como repulsão de Pauli.
Próxima aula...........