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Resumo Psicologia e Ideologia Cap 1 e 4

PATTO, M. H. S. Psicologia e Ideologia: uma introdução à psicologia escolar. São Paulo: T.A.
Queiroz, 1984.

Cap. 1 Raízes: A relação Escola-sociedade

A principal motivação do trabalho, de seu cunho sociológico, é proporcionar uma


abordagem da psicologia que considere o sistema escolar em relação com o sistema
sócioeconômico vigente.

Existem duas concepções opostas quanto a essa relação (Escola x Estrutura) que
predominam no âmbito acadêmico: 1. Escola como meio de ascenção social, tendo como
principal expoente na sociologia Durkheim: “[...] os resultados do processo educacional,
especialmente os cognitivos (valores e atitudes), são humanamente positivos e politicamente
neutros [...]”; 2. Escola como aparelho ideológico das classes dominantes, tendo como principal
referência Karl Marx: para esta vertente “a escola cumpre um papel ideologizante [...]” (p. 16)
Cabe agora, detalhar um pouco mais cada uma dessas noções, além de alguns de seus
desdobramentos.

Sociedade e educação em Durkheim: um esboço

Durkheim (1858-1917) foi um sociólogo francês. Considerado um dos gigantes da


sociologia até hoje, é um dos ditos pais do funcionalismo. Sua contribuição vem tanto em
termos metodológicos, quanto em termos de criação de uma nova ferramenta de análise
social.

Quanto aos aspectos metodológicos, seu viés é absolutamente positivista. Defendia


uma abordagem das ciências sociais que se assemelhasse às ciências físicas e biológicas, ou
seja, “a investigação das leis que regem os fatos, enquanto expressões precisas das relações
estabelecidas empiricamente.” (p. 17)

A influência das ciências biológicas aparece em sua obra a partir do conceito de


solidariedade, que versa sobre dois tipos de agrupamentos sociais. De acordo com Durkheim,
há uma forma de integração desses agrupamentos, e essa integração pode ocorrer de duas
formas:

1. Solidariedade mecânica entre as partes: caracterizada por maior coesão entre os


participantes desse grupo pela pouca diferenciação entre os mesmos. Exemplos: horda e clã;

2. Solidariedade orgânica entre as partes: características das sociedades ditas complexas, aqui
a sociedade funciona como um todo complexo, em que “órgãos ou conjuntos especializados
de células” dividem funções de modo a relacionarem-se entre si garantindo o bom
funcionamento do sistema como um todo. O termo aqui utilizado é solidariedade orgânica
exatamente porque o princípio norteador da sociedade, por conta da complexa divisão social
do trabalho, das diferentes aptidões e funções de cada indivíduo e grupo social gerando uma
necessidade mútua entre os envolvidos, intrínseca e implicitamente, é agora o da
solidariedade orgânica (p. 18)

O que mais caracteriza a diferenças entre essas duas formas de integração social é o
nível de desenvolvimento das forças produtivas e, consequentemente, da divisão social do
trabalho. Para Durkheim, a origem dessa divisão social de trabalho mais complexa é fruto de
uma maior densidade material e moral em algumas localidades. Com isso, o autor que dizer: 1.
Aumento da densidade demográfica; 2. Aumento da frequência da relação entre indivíduos
que compõe determinada sociedade.

O termo funcionalismo designa a teoria de Durkheim exatamente por entender que a


divisão social de trabalho funciona via instituições que tem funções definidas a partir de uma
necessidade a ser suprida dentro do organismo social gerada a partir do aumento das
densidades material e moral. Neste sentido, é absolutamente positivo um sadio
desenvolvimento da divisão social do trabalho, que desenvolva tanto as forças produtivas
quanto as singularidades (cada trabalhador).

Para o autor o ser humano é movido pelo egoísmo, assim há um problema para que a
solidariedade orgânica ou mecânica se desenvolva. Deste modo, passa a ser necessário um
organismo que regule as ações de todos os indivíduos.

No caso da solidariedade mecânica predomina, na teoria de Durkheim, o direito


repressivo, previamente estabelecido em comum acordo entre seus integrantes, pela
consciência coletiva altamente desenvolvida, mas depois se desenvolve como um direito
imperativo sobre todos. Quanto à solidariedade orgânica, o autor entende que há mais
liberdade individual no sentido de que a divisão social de trabalho mais complexa implica
maior diferenciação entre seus componentes para que a sociedade se desenvolva.

Devido à maior liberdade individual promovida pela solidariedade orgânica, é


necessário educar seus componentes de modo a construir uma sociedade solidários entre suas
partes, por mais distintas que sejam. Ela homogeneíza ao mesmo tempo em que diferencia.
Ela torna as relações morais homogêneas, possibilitando que todos vivam na sociedade ao
mesmo tempo em que garante o pleno desenvolvimento de cada indivíduo. Daí o papel da
educação, da instituição Escola, como um dos pilares do funcionalismo Durkheimiano. (p. 20)

A teoria Durkheimiana é colocada em questão por seu autor em seu choque com a
realidade. A sociedade complexa com a qual lida, a sociedades industrializadas do séc. XIX é
tida por ele, pelo seu alto grau de desigualdade social, enquanto uma sociedade doente. (p.
21) Os conceitos de normalidade e patologia social em Durkheim surgem exatamente a partir
do estudo da sociedade capitalista do fim do séc. XIX e começo do séc. XX.

Quanto maior o progresso de uma sociedade complexa, diz Durkheim, maior sua
desintegração moral (aumento de suicídios e crimes de qualquer natureza). A raiz do
problema, segundo ele, é a ausência de um controle institucional da sociedade que não
acompanha a complexificação atingida pela sociedade. Suas instituições não estão executando
suas funções corretamente, não estão legislando e fazendo cumprir as leis que criam de modo
efetivo. Esse estado de falência jurídica de uma sociedade é denominado por Durkheim de
anomia.

Essa anomia se expressa, para o autor, tanto na débil capacidade estatal de conter
crimes, quanto na ausência de regulação efetiva para a exploração da força de trabalho. Para
tratar disso, o autor entende que não basta o uso da força para regular a sociedade: “As
paixões humanas não cessam senão diante de uma potência moral que respeitem” (p. 4 apud
pp. 22)

Durkheim propõe, como meio de regulação da exploração da força de trabalho


corporações profissionais com poder legal e regulamentar para tornar a relação entre os “mais
fortes e mais fracos” mais igual. Essas seriam instituições públicas voltadas não para a questão
econômica, como um sindicato, mas para a moral e de regulamentar as relações sociais
amenizando seus conflitos.

2. Liberalismo e ensino

Diferentemente de Durkheim quanto à solução do problema, mas na mesma linha do


autor quanto à necessidade de reforma da sociedade capitalista estão John Dewey e Karl
Mannheim. A principal diferença destes para o primeiro é o foco na educação escolar como
instituição capaz de transformar a sociedade a partir de seus indivíduos.

Patto começa essa seção explicando alguns aspectos centrais da doutrina liberal: 1.
Valorização do individualismo enquanto sinônimo de liberdade; 2. Crença na possibilidade de
criação de uma sociedade de classes onde a liberdade e o desenvolvimento individual estejam
garantidos a todos.

Após a revolução francesa consolida-se o ideário liberal. Dentre os intelectuais que


traduzem os avanços do ideário liberal para a educação podemos citar Condorcet e Lepelletier,
autores dos projetos de instrução pública para a França na segunda metade do séc. XIX. Em
ambos os casos, está presente a ideia de promover a igualdade de oportunidades por meio de
uma educação pública, gratuita e obrigatória. (p. 23)

2.1. Democracia e educação: o pensamento de John Dewey

O filósofo da democracia, John Dewey, famoso por seus trabalhos relacionando


filosofia, pedagogia e educação em geral é um dos maiores exemplos do ideário liberal
direcionado à educação. De acordo com Patto, é “nitidamente influenciado pelo pensamento
sociológico de Durkheim”, daí sua análise da função da escola na sociedade. Para Dewey a
escola deve desenvolver os indivíduos plenamente, sendo esse o maior remédios para as
patologias sociais. (p. 25)

Patto aponta fraqueza nos argumentos de Dewey quanto á análise da sociedade de


classes, em que não é capaz de sair do binômio “certo-errado”, mantendo-se no âmbito dos
próprios valores morais. Em suma, acaba por explicar a não concretização do ideário liberal a
partir de atitudes individuais daqueles que compõem o sistema, sendo a função da escola
então educar esses indivíduos. Para ele, esta é a única forma de combate às patologias da
sociedade de classes. Ou seja, só a educação pode promover a transformação social.

Cabe ainda dizer que para Dewey a educação deve ser incumbência do Estado e,
diferentemente de Durkheim, entende que “regulação” moral da sociedade seja tarefa
essencial da instituição escola.

Para Patto, a visão de Dewey sobre a superação das contradições da sociedade de


classes é ambígua, em especial em seu trabalho Democracia e educação, contudo, conclui a
autora:
Em última instância, a mudança social que defende e pela qual luta através do detalhamento de
um modelo educacional alternativo parece consistir numa maior permeabilidade nas barreiras
que separam rigidamente as classes, de modo a tornar maus justa a ascensão social e mais rico
o intercâmbio entre as classes. (p. 28)

2.2. Mannheim e o papel da educação numa sociedade democrática planificada

Mannheim, da mesma forma que Dewey, é bastante influenciado pela teoria


funcionalista Durkheimiana e também envereda pela linha de defender a função da instituição
escola de diminuir as barreiras e desigualdades impostas pela sociedade de classes.

O diagnóstico do autor quanto à sociedade capitalista parte do que chama de


Desintegração social e Desajustamente (crise) do sistema. Em linhas gerais, Patto assim
resume o dignóstico donde parte o autor:

[...] novas técnicas sociais estão favorecendo a concentração de poder nas mãos de um minoria;
há indícios claros de que os pequenos grupos auto-reguladores estão em decadência, bem como
os controles grupais tradicionais, o que resulta em fracasso na coordenação social em larga escala
e na desintegração dos controles cooperativos; o antagonismo entre as classes sociais tem
efeitos nitidamente desintegradores; com isto, assiste-se a uma desintegração a nível da
personalidade, do consenso e dos laços religiosos. (p. 29)

Por técnicas sociais Mannheim quer dizer técnicas desenvolvidas dentro dos
organismos sociais com o objetivo de promover a integração social, a partir da influência do
comportamento humano. Aí estão inclusas desde técnicas voltada às necessidade sociais mais
básicas (alimentação, higiene, transporte), até técnicas de cunho político, propagandísticas
etc. Para Mannheim, a educação é uma dessas técnicas sociais. Com o aumento populacional,
ocorre a superação da economia de livre mercado pelo capitalismo monopolista. As técnicas
sociais, assim, foram e são instrumentos para que uma minoria, detentora dos monopólios, se
mantenha no poder.

Quanto ao “antagonismo de classe”, cabe ressaltar que, para Mannheim, este só mais
um dos fatores que determinam a desintegração social, tendo o mesmo peso da perda dos
costumes, por exemplo.
Como solução terapêutica ao atual estado de coisas da sociedade capitalistas o autor
propõe a “planificação democrática”. O autor considera vazia a contradição capitalismo x
socialismo, burgueses x proletários, a “luta de classes” em geral. Assim, parte da utilização da
escola (medula dorsal de sua teoria) como meio de combater a anomia do atual sistema. O
autor, claramente não visa a superação das desigualdades sociais em absoluto, ou mesmo a
superação de uma sociedade baseada no capital, somente defende uma sociedade em que
essas desigualdades e interesses dos capitalistas não atinjam níveis que coloquem em risco a
“saúde” da sociedade como um todo.

Para adequar o ser humano, seu comportamento, sua moral e desenvolvimento


técnico às necessidades de uma saudável sociedade de classes e, assim, combater a
desigualdade social pela promoção de reformas de “educar o capital”, Mannheim vê na escola
a melhor saída. (p. 31)

3. Sociedade e Educação em Althusser: a escola como aparelho ideológico do Estado

Para entendermos a noção de escola como aparelho ideológico do Estado (AIE) Patto
começa explicando alguns pressupostos básicos do materialismo dialético. Ela descreve com
bastante cuidado a teoria marxista, a desvencilhando do rótulo banal de teoria
“economiscista”.

A explicação de Patto aponta os seguintes fatores para a compreensão do


materialismo histórico-dialético:

1. As sociedades fundam-se na contradição, na relação com o outro, na relação entre


consciências;

2. A história é a história do desenvolvimento das forças produtivas, da superação da natureza


pelo desenvolvimento do trabalho humano;

3. As condições concretas determinam as subjetivas, o que significa dizer que o modo de


produção, o desenvolvimento das forças produtivas influi a consciência antes desta influenciá-
lo;

4. A ideologia predominante em uma sociedade é a ideologia da classe dominante desta


sociedade;

5. São as instituições do Estado as responsáveis pelo processo de inculcação da ideologia


dominante, o que se dá de modo mais efetivo quanto mais sútil for o processo de imposição
ideológica.

Assim, longe de concordar com a perspectiva Durkheimiana, a perspectiva marxista vê


como utópica a saída pelas reformas das instituições estatais. Sua degradação, seu estado de
anomia, é na verdade efeito intrínseco do capital.

Althusser contribui com a perspectiva marxista ao propor os conceitos de AIE


(Aparelhos Ideológicos do Estado) e ARE (Aparelhos Repressivos do Estado). De acordo com o
entendimento de Patto da teoria social marxista, a sociedade é dividida em Estrutura
Econômica (relações de produção) e Superestrutura (estrutura jurídico-político e ideológica
Estatal), sendo a primeira sempre determinante da segunda. Althusser propõe um
aprofundamento da análise do Estado Capitalista e seu processo de dominação. É partir disso
que os conceitos de AIE e ARE são desenvolvidos.

A principal distinção entre AIE e ARE é a forma como operam, sendo o primeiro
sempre mais sutil que o segundo, visto que o ARE é mais facilmente caracterizado pelo uso da
coerção física, enquanto o AIE por sutis, mas extremamente eficazes métodos de inculcação e
dominação ideológica.

As principais instituições elencadas por Althusser como AIE são: Escola, Igreja, Família,
Comunicação Sociais e Instituições culturais. Contudo, para ele o AIE dominante é a Escola
unido à família, daí o duo Escola-Família como principais AIE. A razão principal para essa
categorização de Althusser é que essas Instituições atuam “diariamente sobre os indivíduos,
numa idade em que estão mais ‘vulneráveis’ às influências formadoras externas.” (p. 40)

Além do dito acima, a veiculação da Escola como instituição politicamente neutra


potencializa seu efeito ideologizante, como conclui Patto a seção: “Os mecanismo que
reproduzem este resultado são dissimulados por uma representação ideológica universal da
escola como uma instituição neutra, desprovida de ideologia.” (p. 40)

3.1. Establet e a análise da escola capitalista na França

Establet e Baudelot formam uma dupla de pesquisadores francesas bastante focados


na análise da escola na frança capitalista do séc. XX. Concordam com Althusser quanto á
função política e ideológica da instituição escola e ao analisar o contexto francês colocam a
teoria à prova.

A contribuição desses autores vem exatamente da análise de como a ideologia


dominante permeia o contexto escolar. De acordo com Patto eles demonstram a necessidade
de “ir além e atentar para as práticas rituais escolares”. (p. 41) Apontam ainda que é nas
práticas ritualísticas mais sutis quando essas transmissão da ideologia dominante é mais
eficiente. Em suma, além do conteúdo ideologizante, a forma como o conteúdo é ensinado em
sala de aula já é ideologizante.

Outro aspecto salientado por Patto no trabalho desses autores é a análise do conteúdo
em que se evidencia como o mesmo esconde a ideologia proletária. Um exemplo disso é que,
nos livros de história a expressão “classe operária” é substituída por povo. Algo sutil, mas
bastante eficiente em termos de dissimular a realidade e promover uma barreira contra o
acesso à ideologia proletária.

3.2. Pierre Bourdieu: o papel da escola na economia das trocas simbólicas

Pierre Bourdieu é um famoso sociólogo Francês. Após vários trabalhos na década de


60 sobre as condições sócioeconômicas dos operários argelinos, a partir de 1964 começa o
trabalho voltado para a educação.
Patto aponta que o objetivo básico do autor, bastante claro em seus diferentes
escritos é “a busca de um método de análise aplicável às várias linguagens simbólicas, inserido
num referencial teórico que tenha possibilidade de evidenciar os vínculos existentes entre os
sistemas simbólicos e a estrutura social na qual estes se produzem e se manifestam.” (PATTO,
1984, p. 45)

Em sua análise, Bourdieu passa pelos “três porquinhos” da sociologia, por mais
contraditório que isso possa parecer: Marx, Weber e Durkheim.

Uma importante contribuição de Bourdieu é o entendimento da cultura enquanto uma


categoria realidade própria. Porém, isso não significa dizer que tem uma realidade
completamente independente de sua realidade concreta.

O trabalho do autor, embora considere os fatores macrossociais, é voltado para a


esfera microssocial. Ou seja, análise “estrutural das relações entre os fatos simbólicos e a
estrutura social até encontrar o indivíduo;” além de evitar a linha de pensamento que aponta o
indivíduo como mera reprodução da estrutura e superestrutura. Assim, a discussão do autor
gira em torno da “passagem do fato social, enquanto fenômeno objetivo, à sua apreensão pelo
sujeito ou à sua incidência na consciência individual, recorrendo, portanto, à dimensão da
mediação subjetiva.” (p. 47) Ou seja, ou autor tenta explicar a “interiorização da exterioridade
e [a] exteriorização da interioridade” a partir dos fatos sociais escolares e da forma como se
movimento socialmente em nível simbólico.

Alguns conceitos chaves para a compreensão inicial do trabalho do autor são, de


acordo com Patto:

1. Arbitrário cultural: para Bourdieu o fato social, um sistema simbólico de relações entre
indivíduos de um contexto, é visto como um arbitrário. Este arbitrário não é uma
escolha gratuita, se desenvolve a partir das necessidades geradas das relações sociais
concretas. Todos os contingentes sociais de uma sociedade complexa são arbitrários
culturais, porém, em uma sociedade de classes, o arbitrário cultural colocado como
dominante é o da classe dominante desta sociedade. (p. 48-49)

2. Violência simbólica: trata-se do primeiro axioma de sua teoria. Refere-se à imposição


de um arbitrário cultural, à imposição de um sistema simbólico. (p. 48-49)

3. Ação pedagógica: exercida pela família, escola e meios de comunicação de massa,


envolve todas as formas de ações para inculcação simbólica dos valores da classe
dominante; (p. 50)

4. Autoridade pedagógica: é aquela que detém o poder da ação pedagógica. Essa última
pressupõe a primeira. E quanto mais sutil, mais desconhecida esta for dos indivíduos
simbolicamente subjugados mais eficiente ela será. (p. 50-51)

5. Trabalho pedagógico: dentro da concepção de Bourdieu, Patto assim explica esse


conceito: “trabalho de inculcação duradouro e suficiente para produzir um habitus,
resultante da interiorização dos princípios de um arbitrário cultural capaz de
perpetuar-se após a cessação da ação pedagógica e, por isso, de perpetuar na ação
social do receptor os princípios do arbitrário interiorizado.” (p. 51) Ou seja, trabalho
de inculcação, que cria o habitus e as condições para um reprodução independente e
voluntária do indivíduo vítima do processo de inculcação.

6. Habitus: é definido por Bourdieu como “sistemas de disposições duráveis, estruturas


predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, que dizer, enquanto princípio
de geração e de estruturação de práticas e de representação que podem ser
objetivamente ‘reguladas’ e ‘regulares’ sem que, por isso, sejam produto da
obediência a regras, objetivamente adaptadas a seu objetivo, sem supor a visada
consciente dos fins e o domínio expresso das operações necessárias para atingi-las e,
por serem tudo isso, coletivamente orquestradas sem o serem o produto da ação
combinada de um maestro” (Bourdieu, 1972, p. 175 apud p. 52) Ou seja, o habitus é
produção a partir do trabalho pedagógico, é uma forma de comportamento que
reproduz e recria o arbitrário cultural dominante sem necessariamente o indivíduo que
o reproduz saber disso. Na verdade, esta forma de comportamento é atingida por
meio de um duradouro trabalho de inculcação, trabalho este que quanto mais distante
do objeto consagrado, quanto maior seu desconhecimento do mesmo, mais efetivo o
será.

Por fim, de acordo com Patto, embora possamos promover uma série de
crítica à abordagem de Bourdieu, é inegável sua contribuição para o entendimento da
“microfísica do poder na instituição escolar.” (p. 53)

CAP. IV – Psicologia e classes subalternas

1. A psicologia da carência cultural: psicologia da pobreza ou pobreza da


psicologia?

Patto explica que após uma explosão de manifestações e movimento das chamadas
minorias políticas nos EUA na década de 60, programas educacionais de pesquisa de
financiamento público são ampliados em esfera nacional. De modo a encobrir os aspectos
sócioeconômicos que embasam a explicação dessa questão, todo um campo dentro da
psicologia foi desenvolvido de modo a tentar “explicar” as razões centrais da exclusão
social dessas minorias políticas. Esse campo é chamado de Teoria da carência cultural.

Em linhas gerais, de acordo com Patto, as principais suposições da Teoria da Carência


Cultural são:
“1) as minorias raciais estão à margem da sociedade porque não conseguem inserir-se
de forma estável no mercado de trabalho;

2) para que esta inserção seja possível é preciso que atingjam um mínimo de
escolaridade. Ora, o nível de escolaridade e de sucesso escolar entre os membros desses é
baixo: levantamentos estatísticos imediatamente o evidenciam;

3) portanto, para que esses cidadãos enfrentem, em condições de igualdade com os


demais membros da sociedade, a competição supostamente aberta e igualitária pela
ascensão social e pelo sucesso na vida, é preciso criar condições para que se escolarizem;

4) mas primeiramente é preciso responder à questão chave da teoria da carência


cultural: por que as crianças e adolescentes provenientes desses grupos apresentam
dificuldades de redimento escolar?” (p. 113-14)

De acordo Patto, os resultados das pesquisas que englobam o campo da Teoria da


carência cultural chegam à seguinte constatação: “os integrantes das ‘camadas
desfavorecidas’ são portadores de deficiências perceptivas, motoras, afetivo-emocionais e
de linguagem suficientes para explicar seu baixo rendimento nos testes de inteligência e,
consequentemente, seu fracasso escolar e social.” (p. 114)

Quanto às razões que explicam o fracasso escolar dos jovens das classes subalternas,
Patto aponta cinco explicações predominantes nos trabalhos sobre a teoria da carência
cultural aponta:

“a) carência de recursos econômicos; (sic) a falta de dinheiro, não esclarecido


enquanto efeito de um sistema produtivo específico, é tomada como causa de todas as
deficiências psicossociais, na medida em que impede que o pobre compre bens e serviços
de vários tipos;

b) carência de exposição a estímulos benéficos, tais como a não aprendizagem, em


casa, dos conceitos e do vocabulário necessários a um funcionamento eficiente na
sociedade contemporânea, a falta de contato com artefatos e experiências culturais de
vários tipos, a armazenagem deficiente de informações sobre o mundo;

c) a carência de um padrão no mundo vivencial, ou seja, as experiências dessa crianças


não incluíram um conjunto adequado de padrões, sequência ou associações entre os
eventos, de modo a permitir-lhe adquirir uma compreensão das relações entre os
elementos do mundo experiencial; faltar-lhe-ia, por exemplo, a oportunidade de
apreender relações de causa e efeito. Segundo os defensores desta explicação a privação
não é de estímulos, mas de organização da estimulação que lhe é apresentada pelos
adultos;

d) carência de contingências no ambiente: os ambientes carenciados, os adultos


organizam o ambiente de tal forma que os comportamentos desejados não são
adequadamente encorajados através de esquemas de reforçamento adequado;

e) carência como resultado de interação entre necessidades evolutivas e falta de


estimulação; a afirmação básica entre os defensores desta concepção é a de que
determinadas atividades cognitivas desempenham um papel estimulante na maturação de
estruturas neurais, importantes para a aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo
posteriores, tal como o comprovam experimentos de privação estimuladora levados a
efeito com animais.” (p. 115)

Foi necessário citar essa longa passagem, pois aqui Patto torna transparente vários
princípios norteadores da teoria da carência cultural, quer sejam conscientes ou não por parte
daqueles que desenvolvem esse campo de estudo.

A justificativa “nutricional” anteriormente citada é acompanhada de outra de cunho


“cultural”. Ou seja, a razão central para o fracasso escolar seria a disparidade cultural entre a
cultura das classes baixas e a das classes dominantes, nesta perspectiva tomadas como algo
absolutamente natural. A solução, segundo essa perspectiva (teoria da marginalização
cultural) é a aculturação das classes baixas por meio de programas de educação
compensatória que possibilitaria a igualdade de oportunidades às diferentes classes sociais da
sociedade. Novamente a existência das classes sociais não é sequer questionada nesta
perspectiva, sendo o psicólogo responsável por desenvolver de “desmarginalização”. (p. 116-
117)

2. Os programas de educação compensatória

A partir do “diagnóstico” que aponta a existência de uma imensa parcela da população


sem condições de um desenvolvimento digno seja por questões nutricionais, seja por
questões cultural, nos EUA foram desenvolvidos os programas de educação
compensatória.

Um dos mais proeminentes foi o Projeto Head Start. Este projeto necessitou o maior
orçamento não-bélico da história americana. (p. 1118) De acordo com Patto o projeto
pretendia “num espaço de oito semanas, preparar as crianças marginalizadas para que
iniciassem a escolarização primária com uma possibilidade maior de sucesso do que
acontecia até então.” (p. 118) Quanto aos conteúdos e abordagen pedagógicas
desenvolvidas por este projeto, a autora salienta os seguinte objetivos: “leva-las a adquirir
atitudes, valores, habilidades perceptivo-motoras, estruturas intelectuais, hábitos de
pensamento.” (p. 118)

A ideia camuflada por detrás dos idealizadores desse projeto, de acordo com Patto é
que “a única possibilidade que uma pessoa pobre tem de deixar de pertencer às camadas
pauperizadas da população é a substituição, devidamente monitorada por psicólogos e
educadores, de sua visão de mundo e de sua ação pela visão de mundo e pela ação típicas
da chamada classe média.” (p. 118) O problema não está na escola, ou na sistema político-
econômico vigente, mas na criança, não está no contexto, e sim no indivíduo.

No Brasil esse tipo de programa, comprovadamente fracassado nos EUA, tem sido
implementado em especial na educação pré-escolar. Contudo, em nosso país ele
apresenta pelo menos mais dois resultados em termos de difusão ideológica:

[1] aumentam a rentabilidade do sistema de ensino, enquanto qualificador de mão-de-


obra, na proporção exigida pelo atual modelo econômico de internacionalização do
mercado interno; [2] disseminam a crença de que todos os esforços estão sendo
empenhados no sentido de escolarizar os filhos da pobreza e de sanar suas deficiências,
ficando os fracassos que ainda houver – e certamente serão muitos, apesar (ou por
causa?) dos programas de educação compensatória – por conta da incapacidade da
criança e de seus pais.” (p. 119)

Isso é evidente nos comentários frequentes e, em sua maioria inconscientes, de


professores, pais e até mesmo estudantes que quando confrontados com o fracasso escolar
culpabilizar a família dos estudantes, seus pais, como que naturalizando seu problema e o
reduzindo à esfera individual.

Em suma, Patto aponta duas formas principais da utilização da psicologia a partir da


teoria da Carência Cultural: 1. Confirmando a incapacidade dos estudantes; 2. Desenvolvendo
métodos de eficiência de ensino, sem qualquer questionamento sobre a base do que é
ensinado.

3. A sociologia da “marginalização” social: do princípio da integração ao princípio da


contradição

A teoria da marginalização cultural conta com todo um suporte teórica da antropologia,


sociologia e psicologia que embasam direta ou indiretamente suas proposições. A linha geral
que unifica todos as linhas de pesquisa que atuam dentro dessa perspectiva é de que existe
um grupo marginalizado socialmente. Não se pergunta que sociedade é essa, a quem
“pertence”. Somente considera-se que o grupo é marginalizado em relação a essa entidade
ahistórica denominada sociedade, que tem uma cultura específica que precisa ser difundida às
camadas marginalizadas da população. Como bem coloca Patto “a questão da relação entre o
Estado e a estrutura de dominação, no momento histórico em que se constitui a
marginalidade, não é sequer levantada; o marginal é considerado um doente, isolado porque
em descompasso [...] com a racionalidade da ação na sociedade moderna.” (p. 121)

Outra perspectiva, diretamente oposta à teoria da marginalização cultural, entende que os


“marginalizados” não estão fora, mas dentro do sistema. São parte integrante do mesmo, o
que coloca outra perspectiva completamente distinta de enxergar a questão. Trata-se aqui da
teoria da dependência:

Desta perspectiva, propõem-se explicar a origem e a natureza do fenômeno da


marginalidade e a maneira pela qual o chamado “marginalizado”, longe de estar à margem,
integra-se à lógica histórica das formações capitalistas dependentes. (p. 122)

Além disso, Patto explica como é, dentro dessa perspectiva teórica (cita Cardoso e Faletto,
1970), a relação de dependência entre os países e como isso influi na produção da
marginalização:

[...] a situação de dependência dos países capitalistas periféricos em relação aos países
capitalistas centrais não se resume à mera repetição, pelo país satelitizado, das
condições de existência social e cultural vigentes no país dominante; ao contrário, a
situação da dependência gera um estado de coisas econômico, social e político
específico no interior de cada país dependente, estado esse que abrange o fenômeno
da marginalidade. (p. 122)

A caracterização dos países periféricos na teoria da dependência é envolve ser controlada


“por grandes grupos multinacionais, operar com uma tecnologia complexa e altos índices de
produtividade, explorar o trabalho já incorporado [...]”. Esses fatores culminam de acordo
Patto em um “exército de reserva” e em “excedente do exército de reserva” nos países
periféricos barateando ainda mais a mão de obra. O primeiro é algo necessário ao sistema
capitalista como um todo, para baixar o custo da força de trabalho, o segundo, contudo, é o
que gera as populações “marginais”, pois é desnecessário ao sistema. Assim, é importante
assinalar, esses são efeitos inerentes ao sistema, são partes dele, não estão excluídas, a
exclusão é parte inerente ao capitalismo. (p. 123)

Patto, de modo bastante preciso, após a análise até aqui desenvolvida, deixa
transparente os limites da teoria da marginalização cultural e de outras relacionadas ou dela
derivadas e da necessidade de superar essas estreitas perspectivas a partir de uma abordagem
que nos possibilite ir além das aparências:

Quando pensamos a situação “marginal” no marco dos processos históricos do capitalismo periférico,
a fragilidade das demais abordagens torna-se evidente; o referencial teórico materialista histórico
nos permite ir além das aparências e entender que a marginalidade, no sentido de exclusão do
sistema social que este termo assume em determinados contextos teóricos, não passa de um mito;
que identificar classe média com classe dominante constitui um grosseiro engano; que deter a análise
das causas do processo de marginalização de mão-de-obra a nível de questões étnicas ou raciais deixa
intacto o cerne econômico do problema; que as propostas de possibilitar a todos oportunidades
iguais de ascensão social, através do acesso a melhores empregos, viabilizado pela aquisição de um
maior nível de escolaridade, implica um profundo desconhecimento da dinâmica do sistema social.
(p. 124)

Por fim, Patto termina o texto dissertando sobre o termo que utilizará quanto às
chamadas “classes baixas”. Ela entende que esse termo ajuda a camuflar as relações sócio-
econômicas existentes de dominação. Assim, deixa claro que utilizará a partir de então os
termos “classes subalternas” ou “classes oprimidas” para deixar clara desde o início a relação
de dominação e exploração da sociedade de classes. (p. 124)

4. O mito da deficiência da linguagem

Patto aqui demonstra como as deficiências de linguagem das classes subalternas tem sido
estudadas a partir da perspectiva da teoria da carência cultural.

Alguns autores como Bereiter e Engelmann chegam a conclusões inquietantes. De acordo


com o levantamento de Patto, sejam elas pesquisas desenvolvidas em campo (escola) ou em
laboratórios o que apontam são deficiências de linguagem das populações marginalizadas.
Essas implicariam uma série de dificuldades aos jovens desse contingente cultural e sócio-
econômico como dificuldade de comunicação, raciocínio e de transição do período de
pensamento concreto ao abstrato, em termos piagetianos. Quanto às formas de se
apresentarem essas deficiências, Patto identifica nessa literatura a pobreza de vocabulário,
frases curtas e monossilábicas, com adição ou não de deficiências sintáticas e gramaticais,
também aqui com muitas variações na forma de ocorrerem (p. 126)

Alguns pesquisadores dessa linha, como Basil Bernstein, chegam a desenvolver


pesquisa que demonstra que a convivência dos jovens das classes oprimidas tem deficiências
de linguagem, comunicação e raciocínio lógico por conta da convivência com adultos que
advém de seu contexto cultural supostamente menos favorecido. (p. 131) A solução, assim,
seria, não gerar um ambiente que estimulasse mais o jovem, mas proporcionar a vivência com
adultos que possibilitassem os estímulos de linguagem necessários ao ulterior
desenvolvimento de pensamento e de raciocínio lógico-matemático necessários.

A título de ilustração, Patto cita dois programas brasileiros. que podem ser
enquadrados dentro dessa perspectiva: 1. Programa básico para creches da cidade de São
Paulo; 2. Trabalho de Witter sobre modificação do comportamento verbal. (p. 132). Em linhas
gerais, Patto afirma que esses exemplos apresenta boa parte do que foi até aqui exposto
quanto às concepções liberais da função da educação e das crianças oriunda de uma classe
subalterna como falante de um dialeto distinto (p. 134), sendo o papel da escola ensinar a
“segunda-língua”, o português formal as mesmas.

5. Mordaças Sonoras

Patto entende que a escola e a psicologia, enquanto instituição e campo do conhecimento,


respectivamente, trabalhando em função da ideologia dominante como formas de amordaçar
a cultura das classes oprimidas:

O que estamos tentando dizer é que as instituições de que estamos tratando neste trabalho – a escola
e a psicologia – têm participado cada vez mais ativamente do processo de cassação da palavra do
oprimido. Os programas educacionais, de um lado, e os serviços psicológicos, de outro, acabam, de
alguma forma, agindo no sentido de amordaçá-lo, de impingir-lhe uma forma de falar, de pensar e
de agir que dificulta a voz afinada com a vivência da degradação e da opressão e o torna porta-voz
de um discurso que não é o seu. (p. 135-36)

A autora entende que, para identificar de modo mais claro como esses processos de
amordaçamento ocorrem não basta uma análise superestrutural, dos AIE. Neste sentido, a
busca do entendimento de como a reprodução ideológico ocorre no contexto micro social, o
que a autora chama de “microfísica do poder no sistemade ensino”, por parte de autores
como Bourdieu & Passerón, Nidelcoff dentre outros tem apresentado uma importante linha de
pesquisa na atualidade. (p. 136) A busca pelo entendimento da “dimensão interpessoal ou
intersubjetiva” pode promover resposta muito importante com respeito às formas como a
reprodução ideológica ocorre.
Esses autores têm demonstrado em vários contextos, seja Bourdieu quanto à França, ou
Nicodelff sobre a Argentina, como essa reprodução ocorre. Em termos de currículo, p. ex., tem
ficado cada vez mais clara a função deste de encobrir a real relação das coisas na atual
sociedade e de desenvolver um ponto de vista naturalizante sobre o atual estado de coisas. (p.
137)

Em termos de “sucesso escolar”, a escola parece ser desenvolvida para fazer fracassar os
representantes das classes subalternas. A imposição de uma linguagem dominante sobre
todos os contingentes culturais que compõe a sociedade promove, inevitavelmente, a exclusão
social sistêmica da população oriunda das classes subalternas, como explica Patto:
Na medida em que o habitus que o trabalho pedagógico desenvolvido no âmbito escolar está mais
próximo do habitus inculcado pelas famílias burguesas, a maior possibilidade de o trabalho
pedagógico ser mais produtivo junto a esta classe é inquestionável. (p. 137)

Assim, neste contexto, só restam duas possibilidades para as crianças de acordo com a
autora: 1. Aceitar a aculturação e conquistar o sucesso escolar, o que significa aceitar a
mordaça sobre sua cultura; 2. Abandonar o sistema de ensino, por inadequação aos valores
dominantes expressa por repetidas reprovações, o que aparecerá como incompetência
individual. (p. 138-39)

Como forma de tentar superar essas contradição entre cultura dominante e cultura
dominada, pesquisadores tem tentado desenvolver metodologias de ensino que conseguiam
melhor dialogar com a cultura dominada. Porém, ainda com o objetivo de melhor integrá-la na
dominante. Na visão da autora isso se trata de deturpações da abordagem Freiriana. Do
caráter de partir da cultura do oprimido e construir o conhecimento e cidadão crítico, passa a
uma ferramenta mais aprimorada de aculturação, como bem expressam as propostas
pedagógicas do MOBRAL e a Cartilha Amazônica. (p. 140)

6. Autoridade Pedagógica e psicologia

Quem exerce a autoridade pedagógica, ou ao menos seu principal representante,


quem impõe o arbitrário cultural, ou “conjunto de significações culturais, de caráter
particular e arbitrário” é o Professor.

Patto identifica no trabalho de Nidelcoff a seguinte caracterização do trabalha do


professor em sala quanto à forma como exerce sua autoridade pedagógica:
Mantendo a disciplina repressivamente, valorizando positivamente a classe e o aluno que não
dão trabalho e que acatam ordens; dando mais importância ao fator intelectual, desvinculando
a ação de vivência, do significado do que foi aprendido e enfatizando, portanto, a memorização;
separando a linguagem escrita da expressão pessoal; limitando a expressão à verbalização;
supervalorizando o livro e a palavra impressa como fonte única de verdade e do saber;
estimulando a competição e o individualismo; desvalorizando o trabalho manual produtivo, na
medida em que aceita, sem crítica, textos que o desvalorizam; universalizando, enfim, a cultura
dominante (em termos da avaliação constante do que é civilizado e o que é primitivo, o que é
culto e o que é inculto, o que é certo e errado em matéria de hábitos, valores e atitudes). (p. 141)
Com respeito à relação currículo x sala de aula e seu produto, o fracasso escolar, Patto aponta
uma forte incongruência entre o espírito do currículo, pautado por “formação integral da
personalidade”, “desenvolvimento harmonioso da personalidade”, “desenvolvimento das
qualidades básicas de um bom cidadão”, com o que ocorre em sala de aula. De acordo com os
referenciais teórico utilizados pela autora a relação professor-aluno é de longe o principal fator
que culmina no fracasso escolar da rede estadual paulista de ensino. (p. 142) Alguns fatos
sociais são determinantes neste processo como a “profecia autorrealizadora”, em que o
preconceito do professor em relação a bons ou maus alunos, classes boas ou ruins, influi em
suas expectativas sobre e resultados dos mesmos. Contudo, a autora não promove uma
simplista culpabilização dos professores. O que a autora aponta aqui é a necessidade de
reflexão de como este desenvolve um papel de agente pedagógica, transmissor dos valores
dominante, tornando-se, por vezes, o que Nidelcoff chama de professor-policial.

Patto promove ainda uma reflexão sobre o papel do psicólogo neste contexto. Dentro
da escola, na atual sociedade de classes, ele poderia no geral, somente reproduzir a ideologia
dominante da área e contribuir não no processo de ajuda, mas no processo de ideologização e
mesmo repressão por vias não pedagógicas dentro da escola.

7. Características psicológicas do oprimido: algumas versões alternativas

7.1. Desmistificando a crença na deficiência da linguagem

Nesta seção Patto utiliza o trabalho de Susan Houston, que coloca em questão alguns
dos resultados da teoria da carência cultural. Houston, a partir do conceito de “registro”, em
que entende as formas de expressão de estudantes enquanto “escolar” e “não-escolar”,
promove critica arrasadora contra a teoria da carência cultural. Seu primeiro questionamento
]é de ordem epistemologica. Na perspectiva da autora, não é razoavel aceitar que as amostras
dos pesquisadores da teoria da carencia cultural se restrinjam a momentos nos quais a criança
só expressa o registro “escolar”, coletado quando a criaança se encontra perante algum tipo
de autoridade. De acordo com Houston, as criançaas, quando observadas em contexto
informal, possibilitam o registro não escolar, que se mostra muito mais fluente e vívido. (144-
45)

Outro ponto que Houston questiona é quanto ao pensamento abstrato e concreto das
crianças carenciadas. Como já demonstrado, os pesquisadores da teoria da carência cultural
trabalham na perspectiva de que os problemas linguísticos da criança influem em sua
capacidade de raciocínio e no desenvolvimento geral do pensamento abstrato. Houston
demonstra que, embora uma assertiva definitiva ou mesmo razoável sobre a questão ainda
esteja distante dos atuais avanços nesse campo, está suficientemente claro que não é possível
conectar aprendizado da língua formal, dita culta, com desenvolvimento do raciocinio logico-
matematico e do pensamento abstrato em geral. (146-47)

Outro ponto questionado não só por Houston, mas tambem por Eclea Bosi, é quanto à
suposta predominância do uso de linguagem não verbal nas classes subalternas. Para Bosi, o
que existe é outra forma de expressao, de comunicação. Ainda de acordo com essa autora,
tentar inculcar a linguagem erudita trata-se de amordaçar a forma de comunicação das classes
subalternas a partir da premissa de que as mesmas são menos desenvolvidas.

Tendo colocado esses questionamentos, Patto conclui que: 1. É bastante perigoso e


equivocado afirmar que as classes populares detém um dialeto distinto, a não ser que
passemos a considerar nuâncias linguistas como sotaques, dialetos; e 2. Não ha como afirmar
que a linguagem dos indivíduos oriundos das classes subalternas propiciam um ser humano
com menos capacidade de desenvolvimento do pensamento abstrato.

7.2. O perfil psicologico do oprimido: notas sobre duas tentativas de superar o empirismo

Uma das autoras que Patto apresenta como tentativa de superação do empirismo é
Arakcy. Essa pesquisadora desenvolve pesquisa com 20 operários paulistanos, analisando
tanto sua anterior vida rural como a posterior urbana. A autora apresenta resultados que Patto
entende levar às perspectivas da teoria da carência cultura, como a conclusão de que a cultura
rural proporciona estruturas cognitivas vazias, inócua, não complexas. Por estrutura cognitiva
a autora se refere às estruturação da capacidade cognitiva de modo a proporcionar uma maior
adaptabilidade do indivíduo, o que é adquirido a partir das vivências de cada um. Por outro
lado, há um grau maior de complexidade na estrutura cognitiva dos mesmos indivíduos
quando operários e em contexto urbano. Apesar disso, Arakcy conclui que, por conta das
condições débeis de vida dos operários, em ambiente brutalizador, sempre em dificuldades
financeiras e mais frágeis a quaisquer problemas acidentais da vida, o desenvolvimento das
estruturas cognitivas dos mesmos são ainda limitados. Ela é consciente das críticas que pode
receber, contudo, questiona se devemos ocultar os problemas do desenvolvimento cognitivo
gerados pela exploração do sistema capitalista, ressaltando somente os aspectos positivos da
cultura popular. Patto, apesar da ressalva da própria autora, discorda de sua caracterização da
cultura rural, de modo a entender que, apesar do importante esforço da autora, Arakcy deixa-
se cair dentro dos marcos da teoria da carência cultural.

Outro pesquisador abordado por Patto é Roberto Harari. Ele concorda com as
conclusões de Arakcy, quanto ao ambiente precarizado das classes subalternas promover sua
ddegenração cognitiva, porém, caminha mais pela linha da psicanálise, ou seja,nas relações de
cunho familial a partirdo contexto de pobreza. Patto também não está convencida com essa
perspectiva. Em primeiro lugar porque utilizar categorias euro-ocidentais para analisar o que
seria uma família bem estruturada apresenta em si problemas. Além disso, a observação de
caráter mais etnográfico, ou seja, do indivíduo estudado no contexto de sua atuação, não em
um laboratório, p. ex., tende a negar algumas hipóteses quanto à degeneração cognitiva das
classes subalternas.

7.3 A sociologia e a caracterização do marginalizado

Cerne da dominação de acordo com Patto a partir dos estudos de Paoli:

Encontramos ai o cerna da dominação: a afirmação da possibilidade, de um momento para


o outro, de o pobre vir a inserir-se estavelmente no sistema, o que equivale a afirmar que a
dominação tem como ponto de partida a impossibilidade objetiva da passagem a um estilo de
vida mais satisfatório, alimentando continuamente o projeto dessa possibilidade. A
impossibilidade objetiva transforma-se em possibilidade subjetiva. (p. 157)

Ainda de acordo com a leitura de Patto de Paoli, não é possível falar em uma cultura da
pobreza se partirmos do fato de que as classes subalternas reproduzem em grande parte a
ideologia da classe dominante (a constituição familiar p. ex.), porém em um contexto
concretamente mais hostil de exploração de sua força de trabalho em níveis alarmantes.
Assim, a questão não é buscar a “cultura do pobre”, pois isso leva a buscar resolver o
problema como se o mesmo fosse uma doença da sociedade, quando é sua consequência
necessária.

Apesar dos sociologos aqui apresentados por Patto desmistificarem a “marginalidade”,


demonstrando que não há uma cultura do pobre, mas exploração e sofrimento por parte das
classes subalternas, eles enfatizam, contudo, que essas condições de degradação social
promovem a dificuldade do proletário de organizar-se em organizações que luta por seus
interesses, prevalecendo a busca por instituições religiosas e de recreação, p. ex.. (p. 159)

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