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P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
O Inspetor será avaliado, aqui, como desdobramento da obra fílmica que Arthur
Omar vinha construindo desde o início dos anos 1970 e, ao mesmo tempo, como
uma forma de inserção do artista nas discussões estéticas e políticas do Brasil
em seu tempo de produção. Sabe-se que um filme, tal qual um livro ou uma
exposição, com suas invenções no âmbito da linguagem e deslocamentos de
sentido, pode nos ensinar a “notar melhor a vida” 1. Nesse sentido, o abalo das
percepções já assentadas parece ser um propósito consciente de Omar. Numa
1 WOOD, James. Como funciona a ficção. São Paulo: CosacNaify, 2012, p.63. O caráter de exemplaridade
das experiências estéticas diante da vida é assunto amplamente discutido pelo filósofo francês Jacques
Rancière, em obras como: A partilha do sensível; O inconsciente estético; e O Espectador Emancipado.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
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entrevista em 2001, ele disse que “cinema é provocar reações fortes. Provocar
reações, e não exatamente emoções. Reações deslocam o espectador do lugar.
Emoções afundam”2.
2 L.C.O. O provocador das palavras e das imagens. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 30.07.2001, p.4
3 Em 1971, Arthur Omar realizou seus primeiros curtas-metragens em 35 mm, Serafim Ponte Grande e
Sumidades Carnavalescas. Em 1972, realizou o curta O Congo, e em 1974 o longa Triste trópico, filmes
que se destacaram pelo experimentalismo de linguagem. Nos anos seguintes, produziu: O anno de 1798
(1975), Tesouro da Juventude (1977), Vocês (1979), Música Barroca Mineira (1981), O Som ou tratado da
harmonia (1984). Nesse ano se aproximou do vídeo e produziu nessa bitola: Tony Cragg in/no Rio (1984)
e O nervo de prata (1987). Em 1988 produziu os curtas O Inspetor e Ressurreição, ambos em 35mm. Depois
disso, dedicou-se ao vídeo, à videoinstalação, fotografia, instalações sonoras, entre outros tipos de obras
multimidiáticas. É artista e cineasta atuante até hoje, e também escreve ensaios estéticos e poéticos.
4 DA-RIN, Sílvio. Auto-reflexividade no documentário. Cinemais nº7, Rio de Janeiro: set/out. 1997, p. 73.
5 Ibidem, p.74
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6 BERNARDET, Jean-Claude. A voz do outro. In: AVELLAR, José Carlos; BERNARDET, Jean-Claude;
MONTEIRO, Ronald. Anos 70. Cinema. Rio de Janeiro, Europa, 1979, p.7.
7 Ibidem, p.10.
8 Jean-Claude Bernardet mencionou também outros autores que apontavam para a multiplicidade da
realidade ao longo dos anos 1970 por meio de seus filmes, ainda que com propostas bem distintas entre
si. Por exemplo: Antônio Manuel, Glauber Rocha, Juana dos Santos, Aluísio Raulino, João Batista de
Andrade e Vladimir de Carvalho. Além desse texto, há outros em que Bernardet fallou do caráter de
“pesquisa radical” nos documentários de Omar, como: BERNARDET, Jean-Claude. Cineastas e imagens
do povo. São Paulo: Brasiliense, 1985; e ainda “A pornochanchada contra a cultura ‘culta’”, publicado
originalmente em 1974 no jornal Opinião, sob pseudônimo, e atualmente disponível em: Cinema Brasileiro:
propostas para uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, p.210-215.
9 XAVIER, Ismail. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O desafio do cinema: a
política do Estado e a política dos autores. Rio de Janeiro: Zahar, 1985, p.34. Ao falar de um “metacinema”,
Xavier referiu-se ao trabalho experimental e consciente de alguns cineastas sobre as “experiências já
empilhadas”, tornando mais explícito o diálogo com o repertório cinematográfico, e “discutindo o cinema
dentro do cinema”. Mencionou filmes de Júlio Bressane, Glauber Rocha, Arthur Omar e Rogério Sganzerla,
entre outros.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
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10 VIEIRA, João Luiz. A reflexividade na tela. Cinemais, Rio de Janeiro, n.30, jul-ago 2001. “Este ensaio foi
originalmente publicado no catálogo da Quarta Mostra Curta Cinema, realizada no Rio de Janeiro, Centro
Cultural Banco do Brasil, e Niterói, Cine Arte-Uff, de 6 a 11 de dezembro de 1994. Escrito nesse ano,
propunha uma prática comum na crítica brasileira ao desenvolver um panorama e um balanço da produção
de curtas-metragens na década de 80, mapeando os diversos caminhos tomados pelo cinema reflexivo ‘de
citação’, marca incontestável de uma época e de uma geração de jovens realizadores”. Texto completo
disponível em: http://www.vivacine.org.br/site/textos/ver/?id=8
11 DA-RIN, Sílvio. Op.cit., p.75-76.
12 RAMOS, Guiomar. O espaço fílmico sonoro em Arthur Omar. Dissertação de Mestrado. SP: USP, 1995,
p.23-24. A autora identifica um primeiro momento de “negação do documentário padrão” (filmes de 1972
até 1975), em que a estrutura do documentário padrão está presente, mas de forma desconexa, nonsense
e constantemente ironizada; seguida de um segundo momento de composição fílmica mais abstrata, sem
referência a um tema, e nos quais não se observa mais o confronto com a estrutura do cinema documental
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L. C. (orgs.) Estudos de Cinema SOCINE VII. São Paulo: Annablume, Socine, 2006, p.265-271. A autora
discute “o momento em que o formato experimental se interliga ao formato documentário” e o exemplifica a
partir de quatro filmes feitos na década de 1970, entre os quais está O Congo.
14 OMAR, Arthur. O antidocumentário, provisoriamente. Cinemais, nº7, Rio de Janeiro: set/out. 1997, p. 202.
Obs: Este texto foi publicado pela primeira vez em 1978 na Revista Vozes nº 72, p.405 a 418.
15 PIMENTEL, M. Arthur Omar: corpo, tempo e experiência. Dissertação de Mestrado em História Social da
o cineasta vai articular a problemática do falso em seus filmes, problemática ontológica decerto, que vai
influir diretamente na forma como o tempo vai ser trabalhado em seus filmes. Se num primeiro momento o
falso será articulado a partir de um embate entre ficção e realidade, fazendo com que esses dois planos
apareçam sempre embaralhados e indiscerníveis, onde o mesmo é pensado em oposição à identidade
como não identidade - temporalidade crônica -, num segundo momento esta dicotomia se desfaz em favor
de uma terceira instância, a fabulação, de modo que o falso desponta como potência criadora - imagem-
tempo”. Ibidem, p.18.
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No entanto, apesar desta divisão em fases feita por Pimentel, considero que ao
produzir o filme O Inspetor a relação de Arthur Omar com o documentário
estabelecia-se ainda naquela dinâmica positiva observada por Guiomar, dentro
da qual o tema pôde ser desenvolvido, mesmo que observemos um confronto
entre os elementos fílmicos representativos do universo temático, dispostos em
múltiplas ramificações de significados possíveis através de uma narrativa
estranha e de uma montagem perturbadora. Ao mesmo tempo, pode-se dizer –
se aceitarmos as fases propostas por Pimentel – que este filme, juntamente com
o Ressurreição, marcou um momento de transição e de desdobramento na
trajetória autoral de Omar, indo do cinema para outros suportes, embora sem
abandonar sua postura questionadora quanto ao caráter paradoxal de
incompletude e de complexidade sígnica do audiovisual.
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P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
18 XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento. São Paulo: Cosac Naify, 2012, p.124-184.
19 AHMED, Flávio Villela. Dois curtas de Omar. Cine Imaginário nº 35, outubro de 1988, p.7.
20 PIMENTEL, Mariana. Op.cit., p.29.
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22 Vale a pena lembrar que, apesar da impressão de nome artístico, e até de um aparente trocadilho com
a repetição da palavra “war”, esse era o nome utilizado pelo policial já nos anos 1970, quando atuava na
polícia do Rio de Janeiro, como pode ser observado em reportagens referentes às investigações das quais
ele participou. Ver, por exemplo: “Uma história sem mistérios, 24 horas depois da descoberta do corpo”. O
Globo: Matutina. Rio de Janeiro, 4 set. 1977, p.20; e “Morte de Cláudia: polícia apressa inquérito”. O Globo:
Matutina. Rio de Janeiro, 6 set. 1977, p.15.
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Todos os elementos que foram descritos até aqui apontam para a temática do
filme: violência, tráfico, Brasil, universo da ação policial, e o próprio detetive Jamil
Warwar. Mas também para o universo do filme em si e da encenação: um
universo de “falseamento de identidade”, que condiz com o perfil do detetive,
conhecido por usar disfarces.
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encenações para poder penetrar no mundo do crime sem levantar suspeita” 23. E
um terceiro ponto referente a essa questão, é a forma de insinuar a condição
inapreensível da verdade, bem como a impossibilidade de imprimir uma única
face para o Inspetor. A ambiguidade na construção de sentidos, o caráter fugidio
das noções de verdade e autenticidade, as múltiplas tinturas entre o bem e o
mal, a opinião pública iludida, são ideias que pontuam o filme desde a primeira
frase até o final do curta-metragem.
Quando Warwar aparece em imagem pela primeira vez, está ao lado de uma
viatura policial com a sirene ligada, vestindo uma jaqueta. Ele despreza a
presença da câmera, enquanto o narrador afirma: “O inspetor tinha mil faces mas
nenhuma delas se imprimia no espelho”. Nova cena, e Warwar está fantasiado
de padre, numa praça, dando milho aos pombos. Agora é sua voz que ouvimos,
falando em primeira pessoa: “Desde garoto eu sempre tive o ideal de ser policial”.
Mas será de frente para a câmera que ele se apresentará objetivamente, na
sequência seguinte: “Meu nome é Jamil Warwar. Estou na polícia desde 1963”.
O ambiente é um suposto “salão de processos” extremamente precário, com
23 Sobre isso, sugiro a leitura do artigo: GUÉRON, Rodrigo. “O Inspetor” de Arthur Omar: fabulação e gestus.
Estudos da Língua(gem). Vitória da Conquista v. 12, n. 1 p. 157-173 junho de 2014. Guéron diz que “Jamil
se tornou um personagem midiático: um personagem criador de personagens que virou, exatamente por
isso, um personagem também” (p.158). Diz ainda: “De fato, um detetive de polícia é já um “papel” que se
assume: um personagem. Warwar, como sabemos, é um detetive criador de personagens – os disfarces –
, e que pelas suas performances como policial se torna ele mesmo um personagem midiático frequente nas
manchetes de jornais a ponto, inclusive, de ser convidado a participar como ator em fotonovelas onde ele
protagoniza um personagem de um policial: o “inspetor” propriamente dito. São as múltiplas fabulações de
Warwar que jogam o próprio Omar em suas múltiplas fabulações”. (p.167).
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24 Cláudia Lessin Rodrigues, 21 anos, foi morta em 24 de julho de 1977. Seu corpo foi encontrado dois dias
depois, nas pedras do Chapéu dos Pescadores, na Avenida Niemeyer. Ela estava nua e tinha um saco
cheio de pedras amarrado ao pescoço. Pela indicação de uma placa de carro, a polícia chegou aos nomes
de dois suspeitos que estavam com ela em uma festa na noite de seu desaparecimento: George Khour e
Michel Frank. Este fugiu para a Suíça e nunca foi julgado. O caso teve ampla repercussão na mídia, e o
inquérito se estendeu por vários anos. O afastamento “suspeito” de Jamil Warwar do caso é mencionado
no Programa do Globo Repórter que foi ao ar em 25 de julho de 1988, disponível em:
http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/claudia-lessin-morte/claudia-lessin-
morte-a-historia.htm
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livres25. Nesse mesmo ano Arthur Omar iniciou a produção do seu filme O
Inspetor, com o qual trouxe novamente à tona a participação de Warwar no
desvendamento do crime, inicialmente pela própria verbalização do investigador,
mas também através de outros elementos.
Uma das cenas que remete ao caso do assassinato de Cláudia é aquela em que
vemos Warwar andando de um lado para o outro diante de uma espécie de
fachada de uma loja, sobre a qual vê-se um enorme letreiro em vermelho com o
nome “Claudia”. Ele mostra-se pensativo, com a mão no queixo, como se
estivesse concentrado tentando resolver um enigma. Representa a si mesmo em
plena atividade mental. Tais imagens são alternadas com fotografias
documentais em preto e branco, que mostram um homem abrindo, com as
próprias mãos, a boca de uma mulher deitada, como se fosse segurar a sua
língua. Isso se relaciona com o depoimento de Michel Frank em 1977, quando
afirmou que Cláudia havia sofrido uma overdose e que ele próprio tentara salvá-
la puxando sua língua, pois “estava enrolada, a ponta voltada para dentro,
tapando-lhe a garganta”26. Logo em seguida, no filme, aparece uma legenda
mencionando a remoção de Warwar para o interior do estado por ordem do
governador do Rio de Janeiro, sugerindo uma articulação de interesses entre o
tráfico de cocaína e o poder político. A legenda vai aparecendo como se fosse
um telegrama sendo datilografado: “Inspetor soluciona caso Cláudia. Verdade
25 Após dez anos, acusados ainda não foram julgados. O Globo. Matutina. Rio de Janeiro, 12 de julho de
1987, p. 27. Ver também: Estão livres acusados da morte de Cláudia. O Globo. Matutina. Rio de Janeiro,
31 de julho de 1987, p. 26.
26 Depoimento publicado em: O mistério vai acabar? Revista Veja, São Paulo, 7.09.1977, p.31.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
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27 Um exemplo de fotonovela com a participação de Warwar é “Destino Fatal”, In: Sétimo Céu nº 264, Editora
bloch, 1978. De acordo com Raquel de Barros Pinto Miguel, a “grande maioria das fotonovelas publicadas
nas revistas brasileiras era italiana ou francesa. A produção de uma fotonovela era bastante onerosa, por
este motivo as editoras brasileiras preferiam importá-las a produzi-las. Apenas a editora Bloch produzia
com regularidade suas próprias fotonovelas. Para tornar tal empreendimento economicamente viável, a
revista contava com a participação de ídolos da televisão em suas histórias, assim como utilizava hotéis e
restaurantes como cenário, fazendo merchandising, mesmo que discreto, destes”. In: MIGUEL, Raquel de
B. P. Fotonovelas e leitoras: um romance. AlcarSul 2014: Anais do 5º Encontro Regional sul de História da
Mídia. Florianópolis, UFSC, 2014.
28 Essa aproximação entre o inspetor e o cineasta é sugerida por Marcelo Leitão, que diz: “Ele próprio,
Arthur Omar, assim como o inspetor, utiliza disfarces (melhor: fantasias) menos para frequentar locais
indevassáveis do que para apurar os crimes cometidos entre fotógrafos, cineastas, videastas...” LEITÃO,
Marcelo Magalhães. Modulações em fuga: movimentos acerca de Arthur Omar. Dissertação em Letras,
PUC-RIO, 2003, p.22.
29 GUÉRON, Rodrigo. Op.cit., p.159.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
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chegou a afirmar que “a história de Warwar é uma metáfora do artista como herói
popular”30.
Jamil Warwar como ator de fotonovelas. Imagens de O Inspetor (Arthur Omar, 1988)
30KLEIN, Cristian. Trópicos no MOMA. Jornal do Brasil, 17/9/1999. Nessa matéria, afirma-se que Warwar
desvendou mais de 2 mil homicídios ao longo de sua carreira.
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Após essa breve descrição do caráter geral do filme e de suas partes, pretendo
ainda situá-lo em relação ao seu contexto de produção, ou seja, os anos 1980
no Brasil. Para tanto, ao estabelecer um percurso de reflexão, nas próximas
páginas serão destacados dois aspectos referentes àquela década: 1) O cenário
cinematográfico nacional, em especial no que tange à produção de curtas-
metragens; 2) As questões referentes à ampliação da violência, um dos mais
candentes problemas urbanos do período, que se articulava ao momento de
crise e à projeção de uma imagem negativa do Brasil.
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31 Segundo Tonico Amâncio, “Durante os anos 1980 a Embrafilme enfrentou a crise econômica e a
reorganização e redemocratização da sociedade civil (com a Anistia e as Diretas-Já) reduzindo o número
de filmes produzidos”, além disso “O aumento galopante da inflação fez com que os orçamentos se
tornassem problemáticos, exigindo reajustes constantes.” AMÂNCIO, Tonico. Pacto cinema-Estado: os
anos Embrafilme. Alceu, v.8, nº15, jul./dez. 2007, p.180.
32 CESAR FILHO, Francisco e SAMPAIO, Rafael. Anos 80: cinema e vídeo. Catálogo. Centro Cultural Banco
exibidos diversos curtas em 35 mm que são contemporâneos ao O Inspetor, entre os quais: Queremos as
ondas do ar! (Tata Amaral e Francisco Cesar Filho, 1987, 11 min); História familiar (Tata Amaral, 1988, 11
min); Rock paulista (Anna Muylaert, 1988, 11 min); Caramujo-flor (Joel Pizzini, 1988, 21 min); A mulher do
atirador de facas (Nilson Villas Bôas, 1988, 11 min); Ilha das flores (Jorge Furtado, 1989, 12 min); e Pós-
modernidade (Mirella Martinelli, 15 min).
34 O Inspetor foi contemplado com os seguintes prêmios: Melhor montagem no Festival de Brasília em 1988;
Prêmio Leon Hirzman, da Fidalc, no FestRio, 1988; Prêmio Joaquim Pedro de Andrade do Governo do
Estado do Rio de Janeiro de Melhor Curta de 1988; Troféu Muiraquitã de Melhor Curta Metragem de 1988.
35 CARVALHOSA, Zita. Sem título. In: IV São Paulo Internacional Short Film Festival. Museu da Imagem e
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Em 1994, num texto escrito para o catálogo da Quarta Mostra Curta Cinema,
realizada no Rio de Janeiro e em Niterói, Vieira comentou essa visibilidade que
o curta-metragem experimental conquistara ao longo dos anos 1980, em meio à
crise do cinema brasileiro que, segundo ele, vinha se delineando “quando os
governos Figueiredo e Sarney iniciaram a retirada gradual do apoio do Estado à
cultura, radicalizada, no caso do cinema, a partir da omissão federal frente ao
vazio criado com a falência do modelo Embrafilme”37, apesar da criação de um
Ministério da Cultura em 1985 e da Lei Sarney em 1986 38.
Além disso, nos anos 1980 também foi constatado um afastamento do público
das salas de cinema (geralmente atribuído à concorrência da televisão e à crise
econômica). Uma matéria da revista Filme Cultura em 1986 comentava a
“redução de 67% do público nos últimos 10 anos”, provocando o fechamento de
1.848 salas de cinema no Brasil. “Entre 1975 e 1985 as salas de cinema
perderam 184 milhões de espectadores” 39. A mesma matéria anunciava a
iminente construção de salas de cinema menores, em shoppings centers, uma
36 “Levado pelo curador do Brasil no Congresso, o diretor da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do
Rio, João Luiz Vieira, a mostra com onze curtas, quatro vídeos e um longa-metragem do cineasta [Arthur
Omar] foi a única que, divulgada pela imprensa e pelo ‘boca a boca’ local, mereceu um bis da
selecionadíssima plateia, que incluía desde o cineasta Stan Drakhage ao crítico do The New York Times,
Noel Carol.” REGO, Alita Sá. Cinema rolando quente. Última Hora. Rio de Janeiro, 06.07.1989. Ver também:
VIEIRA, João Luiz. Toronto/Nova York. Letras & Artes, Rio de Janeiro, ano IV, no 10, setembro de 1990,
p. 9; e MOCARZEL, Evaldo. Omar, um artista de múltiplas artes. Folha da tarde, 21.12.1989. Dez anos
depois, em 1999, Arthur Omar realizaria uma retrospectiva completa de seus trabalhos em cinema e vídeo
no MoMA, “tendo sido o primeiro latino-americano a receber esse convite”. COCCHIARALE, Fernando.
Sobre filmes de artista. In: Filmes de artista. Brasil 1965-80. Rio de Janeiro: Contracapa / Metropolis, 2007.
Catálogo da exposição realizada no Oi Futuro, Rio de Janeiro, de 1º de maio a 17 de junho de 2007, com
a curadoria de Fernando Cocchiarale, p. 72.
37 VIEIRA, João Luiz. A reflexividade na tela. Op.cit. A Quarta Mostra Curta Cinema aconteceu no Rio de
Janeiro, no Centro Cultural Banco do Brasil, e em Niterói, no Cine Arte-Uff, de 6 a 11 de dezembro de 1994.
38 Contraditoriamente, na gestão do presidente José Sarney se disfarçou esse desinteresse do governo
através do estabelecimento de um Ministério da Cultura, criado por meio do Decreto nº 91.144 em 15/3/1985
com o argumento de que “os assuntos da cultura nunca haviam sido objeto de uma política consistente”.
Entre os órgãos que compunham o novo ministério, figuravam o Conselho Nacional de Cinema (Concine)
e a Empresa Brasileira de filmes S.A (Embrafilme). Já a Lei Sarney (Lei 7.505, de 2/7/1986) foi criada na
gestão do Ministro da Cultura Celso Furtado e concedia benefícios fiscais na área do imposto de renda para
operações de caráter artístico-cultural. Cf: CALEBRE, Lia. Políticas culturais no Brasil: dos anos 1930 ao
século XXI. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009, p.99-101.
39 1986: mais público para novos cinemas. Filme Cultura nº 47, agosto, 1986, p.128. A Filme Cultura era
uma revista publicada pela Embrafilme. Parou na edição nº 48, que seria publicada apenas em novembro
de 1988. Ou seja: a própria interrupção da revista já é parte da crise vivenciada pelo meio cinematográfico
brasileiro naquele momento.
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Num bordão parecido, Ivana Bentes afirma que “a experimentação mais radical
no cinema encontra no curta-metragem um espaço privilegiado”43, e Guiomar
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Ramos reitera a tendência reflexiva desse tipo de cinema quando esboça sua
definição para “documentário experimental”. Segundo Ramos, esses filmes
“propõem uma reflexão do mundo real a partir de uma visão subjetiva” 44.
O vídeo entrou com força na produção audiovisual brasileira dos anos 198046.
Muitos realizadores começam “a usar o vídeo como meio, orientados, no entanto,
por conceitos formulados mais no cinema experimental que na incipiente esfera
de produção de arte eletrônica no Brasil”47. Omar, no caso, começou a trabalhar
com vídeo em 1984, com o média-metragem Tony Cragg in/no Rio. Em 1987
realizou O nervo de prata, sobre o artista plástico Tunga, produção praticamente
simultânea ao O Inspetor. Em 1989, numa entrevista ao Jornal do Brasil referente
à sua participação no Festival de Cinema e Vídeo do Canadá (ocasião em que
expôs onze curtas, quatro vídeos e um longa-metragem), disse que o vídeo
“revolucionou o ato de ver”48. Noutra matéria, se declarou “um apaixonado pelo
vídeo, já que a mídia eletrônica tem uma linguagem mais quente e mais febril,
principalmente na hora da edição”, e também afirmou a importância de “um
cinema que fale sobre a realidade, o aqui-e-agora com impacto e
contemporaneidade, aguçando a sensibilidade do telespectador sempre pelo
excesso”49. Ao falar de “telespectador” na mesma frase em que remetia ao tipo
videocassete de uso doméstico e suas pequenas câmeras com gravadores-reprodutores chega em 1982.
Cf: FECHINE, Yara. O vídeo como um projeto utópico de televisão. In: MACHADO, Arlindo (org.). Made in
Brasil: três décadas de vídeo brasileiro. São Paulo: Iluminuras/Itaú Cultural, 2007, p.87-88.
47 Ibidem, p.95.
48 PÉROLAS na mediocridade. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro: 18.08.1989.
49 REGO, Alita Sá. Cinema rolando quente. Última Hora. Rio de Janeiro, 06.07.1989.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
50 MELLO, Christine. Arte nas extremidades. In: MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: três décadas de
vídeo brasileiro. São Paulo: Iluminuras/Itaú Cultural, 2007, p.155.
51 GUIMARÃES, José Claudio. As pernas cabeludas do polícia. Caderno de Crítica, n.6, maio de 1989. p.74-
75.
52 VIEIRA, João Luiz. Op.cit.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
Um universo de violências
Não é preciso grande esforço para perceber que esses dois curtas produzidos
por Omar entre 1987-88 apresentam uma conexão forte com seu entorno
imediato, em especial com a violência urbana. Diversos estudos acadêmicos
constatam que no Brasil dos anos 1980 aumentaram os indicadores associados
à violência na sociedade, como “a mortalidade por causas externas, crimes
violentos e homicídios”54. Basta um passeio pelas matérias de jornais e revistas
publicadas naquela década para estabelecer contato com os temas referentes à
violência por homicídios, corrupção no interior do aparato policial, chacinas e
tráfico de drogas. Eram assuntos constantes. O próprio interesse acadêmico
sobre o tema eclodiu naquele período, com estudos pioneiros que discutiam a
relação entre a pobreza e o aumento de criminalidade que vinha sendo
observada desde fins dos anos 1970. Esse interesse, segundo a antropóloga
Alba Zaluar55, pode ser associado à comoção pública e ao destaque na mídia
que o aumento da criminalidade provocou a partir da década de 1980. São
questões que perpassam O Inspetor.
O tema “violência” ganhava tal corpo que, aos poucos, passou a ser tratado
como assunto social de amplitude nacional não apenas no sentido jurídico, mas
como caso de saúde pública, mobilizando o interesse de intelectuais que
trabalhavam nas universidades e em organizações não-governamentais, além
53 Declaração de Arthur Omar para o jornal Última Hora. In: REGO, Alita Sá. Op.cit.
54 DELLASOPPA, Emilio; BERCOVICH, Alicia; ARRIAGA, Eduardo. Violência, direitos civis e democracia
no Brasil na década de 1980: o caso da Área Metropolitana do Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciências
Sociais, Vol. 14 nº 39, fevereiro/1999, p.156.
55 ZALUAR, Alba. Um debate disperso: violência e crime no Brasil da redemocratização. São Paulo em
Perspectiva, nº13 (3), 1999, p.9. Ver também a nota nº7, p. 14. A autora afirma que no contexto urbano “os
pobres figuraram simultaneamente como protagonistas principais dos crimes violentos cometidos e como
vítimas preferenciais deles”. Ver p.3.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
Num âmbito amplo, em termos políticos os anos 1980 constituíram, para o Brasil,
um período de importantes transformações. Experimentava-se um complexo e
lento processo de transição democrática, pontuado por muitas tensões, sendo
que entre 1985 e 1989, espaço de tempo considerado por Kinzo como “terceira
fase” do processo de transição59, a economia brasileira tropeçava num “caminho
de pedras e espinhos”. Segundo sua análise do processo de democratização, a
sucessão de fracassos nas medidas econômicas propostas pelo governo e
agravamento da crise comprometeram a capacidade do Estado de governar60.
Todavia, apesar da grave crise econômica e social, essa autora observa que se
intensificava a democratização que culminaria na elaboração da Constituição de
1988. Nesse ambiente, os debates sobre direitos humanos e civis que pautavam
as discussões sobre reforma constitucional foram associados ao combate à
violência e à insegurança pública. Ainda antes da formação de uma Assembleia
Constituinte que contaria com a participação de grupos sociais organizados, os
56 Ibidem, p.9. Ver também: SOUZA, Edinilsa Ramos. Homicídios no Brasil: O Grande Vilão da Saúde
Pública na Década de 80. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 10 (supl. 1): 45-60, 1994; e SOUZA, Edinilsa
Ramos. Mortalidade por homicídios na década de 80: Brasil e capitais de regiões metropolitanas. Rio de
Janeiro: Editora FIOCRUZ, 1998.
57 ZALUAR, Alba. Para não dizer que não falei de samba, os enigmas da violência no Brasil. In:
SCHWARCZ, Lilia. (Org.). História da Vida Privada no Brasil, vol. IV. São Paulo: Companhia das Letras,
1998, p.246.
58 De acordo com Minayo, “de 2% no total da mortalidade geral em 1930 (Prata, 1992), a violência subiu
para 10,5% em 1980; 12,3% em 1988 (Minayo & Souza, 1993); e 15,3% em 1989 (Souza & Minayo, 1994),
correspondendo, no final da década, à segunda causa de óbitos no país, abaixo apenas das doenças
cardiovasculares”. MINAYO, M. C. S. A violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad. Saúde
Públ. 10, Rio de Janeiro, 1994, p.10. [grifos meus].
59 Maria D’Alva Kinzo diz que o processo de transição da ditadura militar para a democratização brasileira
foi o mais longo da América Latina: 11 anos para que os civis retomassem o poder e mais 5 anos para que
o presidente da Repúbica fosse eleito por voto popular. A autora aponta três fases nesse processo: 1) o
período de 1974 a 1982, com as estratégias de transição totalmente conduzidas pelo governo militar; 2) o
período entre 1982 e 1985, marcado pelas eleições de 1982 e sucessão presidencial, os novos partidos e
a volta de políticos que haviam perdido seus direitos no início dos anos 1960; e 3) o período entre 1985 e
1989, quando uma “nova República” nascia sob circunstâncias frágeis”, com a morte de Tancredo e o início
do governo Sarney, vulnerável a todos os tipos de pressão. KINZO, Maria D’Alva G. A democratização
brasileira: um balanço do processo político desde a transição. São Paulo em Perspectiva, nº15, 2001, p.5-
9.
60 “Entre 1986 e 1994 o país mudou quatro vezes de moeda e teve seis experimentos em estabilização
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P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
sociedade brasileira como antônimo da cordialidade e cooperação: a inversão da teoria do homem cordial
brasileiro”. ZALUAR, Alba. Um debate disperso... Op. Cit., p.5.
63 “Com origem policial, o Esquadrão da Morte surgiu fundado em um discurso moralista de defesa da
sociedade contra os elementos indesejáveis e de manutenção da ordem pública. Mas, desde o seu início
[nos anos 1950], ele esteve ligado com corrupção, venda de proteção para traficantes de drogas,
associação com grupos de criminosos”. Para maiores detalhes, sugiro: COSTA, Marcia Regina. São Paulo
e Rio de Janeiro: A Constituição do Esquadrão da Morte. Anais do XXII Encontro anual da Anpocs.
Caxambu, Minas Gerais, 1998.
64 Disponível em: http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/834/entrevistados/paulo_brossard_1986.htm
65 DELLASOPPA, Emilio; BERCOVICH, Alicia; ARRIAGA, Eduardo. Op.cit., p.154.
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P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
Warwar lendo o seu próprio livro, e o “jurista” que declara-se favorável à pena de morte.
Cenas de O Inspetor (Arthur Omar, 1988).
Sentado numa sala obscura, com uma réstia de luz que entra por uma janela e
o ilumina parcialmente, Warwar lê dramaticamente enquanto a câmera se
aproxima dele. Durante toda a cena, ouve-se uma música melodramática que
evoca algum filme épico em momento de grande heroísmo, o que carrega a cena
de uma tonalidade kitsch, reforçada pelas frases lidas em rima:
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P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
A mise en scène dos policiais pegando as armas, um depois do outro, para sair numa
“operação”; a cena desta operação numa favela miserável, com a radicalização do
distanciamento na frase cômica e ácida de Omar narrador, “O Inspetor sentiu a certeza
de não estar em Paris”; a cena dos policiais alinhados de perfil e atirando contra um
terreno baldio numa clara performance para a câmera, e o policial que coloca a arma
“estilosamente” na cintura e dá uma olhada para a câmera revelando a sua
representação são exemplos claros da descoberta do gestus brechtiniano à maneira de
Omar66.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
Gotas distópicas
68 Quanto à espetacularização da violência na mídia, Zaluar comentava, em 1998, que “as notícias de
violência tornaram-se mercadoria”, e que “o próprio conceito de violência tem sido usado de maneira
abusiva para encobrir qualquer acontecimento ou problema visto como socialmente ruim ou
ideologicamente condenável”. ZALUAR, Alba. Para não dizer... Op.cit, p.247.
69 ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 62.
70 Sobre a violência simbólica no cinema de Glauber e suas relações com Franz Fanon, sugiro: XAVIER,
Ismail. Considerações sobre a estética da violência. In: Sertão mar. São Paulo: Cosac Naify, 2007, p.183-
184.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
71 No Brasil dos anos 1980 “as dúvidas quanto às possibilidades de construir uma sociedade efetivamente
moderna tendem a crescer e o pessimismo ganha, pouco a pouco, intensidade”. MELLO, J.M. e
NOVAIS, F. Capitalismo tardio e sociabilidade moderna. In: SCHWARCZ, Lilia. (Org.). História da Vida
Privada no Brasil, vol. IV. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 560. [grifos meus].
72 A ascensão da cocaína. Revista Veja. São Paulo, 7.09.1977, p.32-38.
73
COSTA, Marcia Regina. Op.cit., p.29-30.
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KAMINSKI, R. “As mil faces do inspetor”. In: KAMINSKI, R.; FREITAS, A.; GRUNER, C.; HONESKO, V.; REIS,
P. Imagem, narrativa e subversão. São Paulo: Intermeios, 2016, p. 241-270.
impressão dúbia poderia ser uma, ao menos, dentre as tantas faces possíveis
daquele Brasil ressentido e desarticulado em que viviam Jamil Warwar e Arthur
Omar em fins do anos 1980.
O Inspetor, no final das contas, não traz respostas, mas suscita muitas questões
que nos levam a pensar, ao mesmo tempo, o cinema e a história à qual pertence.
É isso que nos convida a voltar repetidamente ao filme sem, no entanto, esgotá-
lo.
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