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32º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS

GT 40:

Trabalho e sindicato na sociedade contemporânea

Título do Trabalho:

VERTENTES DE DISTINÇÃO NO SINDICALISMO BRASILEIRO:


TRABALHADORES ORGANIZADOS NO PARANÁ

Maria Aparecida Bridi (UFPR)


Silvia Maria de Araújo (UFPR)

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VERTENTES DE DISTINÇÃO NO SINDICALISMO BRASILEIRO:
TRABALHADORES ORGANIZADOS NO PARANÁ

Resumo
As transformações das últimas três décadas relativas ao capital e ao trabalho estão
na esteira de sucessivas crises e superações no processo de acumulação, com o
capitalismo se refazendo e ganhando dimensões internacionais. As realidades locais
respondem ao ritmo dessa contração/expansão da economia e a organização do trabalho
alterada afeta o modo dos trabalhadores se defenderem na era do neoliberalismo. Tanto
em relação à dinâmica do capital mundial quanto ao movimento sindical, o Brasil
apresenta um descompasso. Essa referência à efetiva inserção no jogo das forças
produtivas hegemônicas aplica-se, em certa medida, ao Paraná e à organização de seus
trabalhadores em relação ao país. Como reagem – trabalho e trabalhadores – é o foco
deste artigo sobre o sindicalismo dos metalúrgicos no Paraná dos últimos quinze anos.
Uma metodologia dialética e histórica analisa o novo que se imiscui com o velho também
na ação sindical, transmudada de oposição a negociações circunstanciais, hoje uma ação
induzida pelos trabalhadores organizados no interior das modernas plantas de
montadoras.

Palavras chaves:
Movimento sindical; Oposição metalúrgica; Trabalhadores das montadoras.

Introdução
Com a financeirização da economia e a fluidez do capital, que deixou de ser
prevalente em sua forma industrial desde a segunda metade do século XX, o processo de
mundialização possibilitou flexibilidade ao capital e destruiu por cima o equilíbrio entre
capital e trabalho conquistado em poucas décadas, para suas respectivas reproduções,
pondera Beynon (2003). O Estado se adequou às flutuações capitalistas. Se na vigência
do fordismo-taylorismo, a sua estrutura oferecia segurança ao desenvolvimento
econômico e conciliação aos conflitos de classe, o welfare state e seus simulacros nos
países capitalistas emergentes viram-se, na década de 1990, diante da fuga e migração
constante de capitais e do crescimento das taxas de desemprego estrutural. Os riscos são
grandes, pois a velocidade do capital especulativo migrar de um país a outro deixa o
capitalismo vulnerável e o trabalho inseguro.
A onda neoliberalizante que varreu a economia brasileira, nos anos 90 e início
dos anos 2000, não é um fenômeno isolado. Ao capital que se internacionalizou,
somaram-se condições de um desenvolvimento heterogêneo e dependente de recursos
externos. A política monetária regula a abertura de títulos públicos aos investimentos

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estrangeiros, facilita a fuga de capitais e a desvalorização da moeda nacional. Cada vez
mais dependente de capitais especulativos, comprometido com dívidas internas e
externas, o Estado depara-se com problemas para o financiamento do desenvolvimento
requerido para acompanhar as mudanças que, institucionalizadas ou não, passam a ser
cobradas pelos órgãos controladores da política neoliberal. A marca da economia
nacional passa a ser a abertura ao comércio exterior, a atração aos investimentos
estrangeiros e políticas de ajuste às exigências macroeconômicas da acumulação
mundial.
Neste cenário dos últimos quinze anos são identificadas as transformações num
pragmatismo da ação sindical, no Paraná, como se a avidez da mudança no padrão da
ação fizesse tabula rasa do sindicalismo anterior, forjado na crueza da política, interna ao
seu próprio movimento e comprometida com o terreno minado pelo neoliberalismo. Os
reflexos desse movimento rebatem no Sindicato dos Metalúrgicos de Curitiba e Região
Metropolitana (SMC). Como veremos neste artigo, este sindicato redireciona suas ações
diante das condições de trabalho nas plantas fabris reestruturadas, impulsionado pelos
trabalhadores sob pressão das metas de produtividade e extensão da jornada de trabalho
características da produção flexível e enxuta e, em alguns casos, pela organização interna
no interior das montadoras (BRIDI, 2008).
A recuperação da trajetória recente desse sindicalismo, de maneira analítica,
permite apreender a transição do capital e do trabalho e, ao mesmo tempo, sinalizar
perspectivas e desafios que se apresentam para o sindicalismo contemporâneo. Nesse
sentido, o caminho metodológico adotado – dialético e histórico – se deve ao
engajamento de uma sociologia atenta às transformações e permanências e ao novo
fenômeno que se imiscui no velho, além de permitir a crítica a generalizações de caráter
apocalíptico que pesam sobre o movimento associativo dos trabalhadores frente às
mudanças no âmbito do trabalho.
Diversas lacunas foram apresentadas por Guimarães (2007) no movimento
teórico/empírico sobre o sindicalismo no Brasil. Entre as insuficiências teóricas está a
carência de investigação dos diferentes tipos de sindicatos, entre os quais aqueles ligados
a outras orientações que não a cutista. Isso justifica a importância do presente estudo por
tratar-se de um sindicato não cutista que tem apresentado um caráter intensamente
mobilizador da categoria no Paraná.
Antes de avançar na análise desse sindicato é preciso dizer que esta lacuna se deve

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também, em parte, às dificuldades em ter acesso a esse sindicato. Enquanto os
sindicalistas cutistas abrem suas portas para as pesquisas com maior facilidade, o
sindicato ligado à Força Sindical se reserva, recebe os pesquisadores com desconfiança,
pois sabe que pesa sobre ele uma identidade de cunho negativo, construída de certo modo
de diferentes orientações à ação sindical no comparativo com outras centrais. Ser CUT se
firmou no meio trabalhador como marca de um sindicato combativo e ser Força, o seu
contrário. Uma das primeiras questões que se coloca ao investigador é a possibilidade de
acesso ao objeto investigado. E no caso desta pesquisa, fomos adentrando pelas bordas
do sindicato, ou seja, nas subsedes e junto a dirigentes e delegados sindicais mais
acessíveis. A pesquisa requereu cuidados teóricos e perspectivas metodológicas próprias
de um pensamento aberto, não classificatório e dicotômico e, portanto, mais preocupado
em indagar do que fazer afirmações categóricas pautadas muitas vezes, em modelos
idealizados de sindicalismo e num devir ser, ou seja, naquilo que possa ser projetado para
o sindicalismo e não no seu movimento real.
A presente reflexão sobre as possibilidades de distinção no sindicalismo
brasileiro, a partir da especificidade dos metalúrgicos no Paraná, Região Metropolitana
de Curitiba, no cenário da moderna indústria automobilística, comporta três partes
interligadas: uma primeira contempla a discussão de crise sindical; a segunda se debruça
sobre a trajetória do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba; e a terceira que
contextualiza as mais recentes transformações econômico-sociais propiciadas pelo
capitalismo que se mundializa nas duas últimas décadas. As realidades locais respondem
ao ritmo dessa contração/expansão da economia e a organização do trabalho alterada
afeta o modo dos trabalhadores se defenderem na era do neoliberalismo. A efetiva
inserção no jogo das forças produtivas hegemônicas aplica-se, em certa medida, ao
Paraná e à organização de seus trabalhadores. Como reagem – trabalho e trabalhadores
no sindicalismo dos metalúrgicos? Dessa forma, a utilização de uma metodologia
dialética e histórica analisa o novo que se imiscui com o velho também na ação sindical,
transmudada de oposição a negociações circunstanciais, hoje uma ação induzida pelos
trabalhadores organizados no interior das modernas plantas de montadoras, no Paraná.

A crise sindical: uma generalização difícil

Os efeitos negativos das estratégias do capital financeiro mundializado são

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perversos sobre as economias em processo de afirmação, ainda não modernizadas, muito
dependentes e com heterogêneas condições das opções de desenvolvimento dentro de um
mesmo país. O pulsar do capitalismo migrante em busca de novos investimentos passa a
ser o ritmo de alguns setores econômicos e de regiões que os atraem, colocando
realidades locais em articulação com outras mais abrangentes. Não é por acaso que em
termos de trabalho assiste-se ao fim da estabilidade e do emprego de carreira e vigoram
as apostas na flexibilização em todas as instâncias, inclusive a sindical, atingindo o
trabalhador. Os sindicatos presenciam o esfacelamento de suas bases e o descrédito que o
discurso recorrente de sua crise os coloca.
Das mudanças advindas, particularmente no mundo do trabalho, surgiram
antagônicas posições a respeito da instituição sindicato, sobre sua falência ou não, sua
fragilidade e dúvidas quanto ao seu papel social. A idéia de crise seja como “declínio” ou
“derrocada” (Rodrigues, 1999) alastrou-se e faz parte de um mainstream teórico, que de
certo modo pode ser associado ao teor apocalíptico para o trabalho que,
consequentemente, rebate sobre a classe trabalhadora e suas instituições de
representação. É, portanto, em meio também à crise teórica, que as leituras sobre o
sindicalismo prendem-se a um discurso de crise que perdura, apresentado quase como
auto-explicação generalizante e muitas vezes definitiva para o sindicalismo.
Apesar de não existir uma realidade sindical única nas diversas partes do mundo,
costuma-se tratar o sindicalismo e as suas crises como se fosse um todo homogêneo e
uniforme. Na Europa e nos Estados Unidos, existem realidades heterogêneas tal como na
América Latina e, embora seja possível fazer algumas classificações, identificando, por
exemplo, países com forte, média ou baixa ação sindical, como o fez Rodrigues (1999),
existe a dificuldade de realizar diagnósticos gerais a respeito da crise no sindicalismo nos
diversos países.
No novo contexto mundial das relações entre capital e trabalho, as posições dos
atores sociais são reconfiguradas e, com isso, o sindicalismo tem sido enquadrado em
distintas e até polêmicas interpretações, descritas como situações de crise, refluxo e
decadência. Decréscimo da ação coletiva, ausência de solidariedade de classe,
desintegração de classe, queda de filiação sindical, esfacelamento das bases, redução das
greves, desinteresse pelas questões sindicais estão entre os sintomas apresentados que
atestam a crise no sindicalismo.
Entre os estudos que buscam explicar o sindicalismo contemporâneo, Guimarães

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(2007) destaca duas perspectivas teóricas que norteiam tais análises: a) a abordagem
estrutural que parte das grandes transformações econômicas, políticas, jurídicas e
interferem na ação sindical; b) e outra denominada acionista, centrada na dinâmica de
estratégias dos agentes sociais, toma por pressuposto que “o ator social, (o indivíduo,
grupo ou instituição) teria capacidade de alterar o curso dos eventos" (Idem, p. 93), sem
relegar a importância dos fatores estruturais. Assim, uma parcela da literatura toma o
sindicalismo como em crise e outra o interpreta como em busca de novas estratégias:

A idéia de crise apresenta-se para os que percebem os sindicatos como um


movimento classista, atuando sob o principio da 'solidariedade mecânica', em
esfera própria do mundo fordista, na perspectiva do conflito. Esse sindicalismo está
realmente em crise. A idéia de 'novas estratégias' se afirma para os que percebem a
realidade em movimento e os agentes sociais reorientando-se, criando novos
campos de conflito e de negociação, a despeito dos constrangimentos
(GUIMARÃES, 2007, p. 103).

Uma alternativa não exclui a outra. Ao contrário, há crises, como demonstra a


investigação sobre o Sindicato dos Metalúrgicos de Curitiba e Região Metropolitana
(SMC), decorrentes de fatores externos, isto é, oriundas das transformações econômicas,
políticas e ideológicas e, no plano interno (oposição, pulverização de interesses,
fragmentação etc.). As alterações macro-estruturais são enfrentadas internamente de
modo diferenciado pelos sindicatos de diversas categorias. Porém, há elementos que
dizem respeito à própria conformação do sindicato que podem desencadear uma crise e
conduzir a uma mudança radical do sindicato. Sob esse ponto de vista, as razões das
crises devem ser buscadas tanto nas macro-situações, quanto nas micro-transformações.
Ao contrário do que aparenta, mesmo depois de tantas pesquisas e análises teóricas
sobre o sindicalismo, trata-se de uma problemática não resolvida na Sociologia, também
porque as visões do próprio conceito de crise são díspares. Não apenas explicar a
natureza da crise, mas, sobretudo, traçar uma teoria da crise ainda é um desafio
sociológico, pois uma forma de pensar as crises é necessária por várias razões. Primeiro,
em decorrência da emergência de vertentes não apenas antagônicas, mas que diante dos
fenômenos das dificuldades para explicar realidades em transição têm produzido teorias
de viés apocalíptico, seja da instituição sindical, seja do trabalho. Nesse aspecto, a
história de longa duração, proposta por Fernand Braudel da Escola de Annales, pode
iluminar a teoria da crise. Em segundo lugar, porque é necessário identificar o fenômeno
novo que se reproduz no velho, o que muda e o que contínua, o que permanece e não se

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apresenta com a forma anterior. Não perceber o fenômeno redimensionado conduz a um
pensamento que se fixa nos sintomas e nas aparências de crise. Uma terceira razão está
em considerarmos, assim como Anderson (2007) que, embora as idéias não criem a
realidade, elas tendem a tomar corpo no real e, no caso do movimento associativo dos
trabalhadores, podem contribuir para uma visão de pensamento único, de que não há
saídas, ou ainda de estarem esgotadas as possibilidades de explicação. Além disso, como
afirma Guimarães (2007), a perspectiva de análise do sindicalismo adotada condiciona,
sem dúvida, a explicação dos fenômenos investigados.
Nessa lógica, consideramos que a explicitação do conceito de crise pode nos
conduzir a outras interpretações que não aquelas finalistas como tem sido usual nesses
tempos de incerteza. Desse modo, compreendemos que as crises: a) encontram-se
inscritas num determinado tempo e numa espiralidade dialética; b) supõem situações de
conflitos, bloqueios, rupturas de um determinado equilíbrio; c) são momentos de
indeterminação e mudança, mas também de decisão, de inflexão de rumo dos
acontecimentos; d) são decorrências das transformações estruturais e, particularmente no
âmbito do trabalho, dos processos de desregulamentação do trabalho e das contradições
inerentes ao sistema capitalista; e) são transições que expressam os antagonismos,
contradições e conflitos da sociedade. Nem todas as mudanças são crísicas, mas aquelas
que colocam em risco a identidade de um sujeito social, de uma instituição (BRIDI, 2005).
Crise tem sido identificada também como uma resposta ao esforço de reconstrução
da sociedade, de restauração de seus princípios e de seu funcionamento. Nas palavras de
Touraine (1980, p. 337), com esse esforço, procura-se reencontrar "uma situação
‘normal’, recuperar as posições perdidas, a integração da coletividade, as regras do jogo
social, os princípios que animam a cultura”. O papel social de uma instituição sindical,
no caso o SMC, tem sido de responder de modo satisfatório às expectativas dos
trabalhadores que representa, conquistando ganhos salariais, por exemplo.
Se, por um lado, a transição desinstala, por outro esse desinstalar-se é acompanhado
de uma reorganização das forças sociais, de maneira distinta da organização anterior,
como demonstrou a situação crísica do sindicato estudado, quando este perdeu parte
significativa de sua base, em 1991, com a sua divisão na criação do sindicato do setor
eletro-eletrônico, bem como os abalos na ação sindical em épocas de grande desemprego.
As relações sociais que se tornam mais complexas apontam para a necessidade de
uma forma de pensamento capaz de perceber a sua dinâmica, atenta ao fluxo espiralado

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da história e à renovação do movimento dos trabalhadores, o qual não pode ser
interpretado a partir de uma visão linear sobre a própria organização e suas ações. A
complexidade do mundo do trabalho recusa versões definitivas sobre uma realidade em
curso e não se satisfaz com uma análise universalizante de crise. No entanto, no
complexo das situações que se cruzam delineia-se o simples, o mais leve e perceptível
movimento local com repercussão internacional e vice-versa, cumprindo o princípio de
“síntese de múltiplas determinações”, como anunciava Marx (1977, p. 218), para uma
realidade social aparentemente intangível e sempre nova à primeira vista.
O desafio para a Sociologia, portanto, é analisar uma realidade com dimensões
que mudam numa velocidade nunca vista e, ao mesmo tempo, olhar para aquilo que é
permanente, levando em conta que muitas das mudanças que se processaram por força do
capital, nas últimas décadas, objetivaram a recuperação e manutenção de elevadas taxas
de lucros para uma parcela da população mundial. Esta é uma questão recorrente e
intrínseca à natureza do capital. A crise contrasta esses objetivos e a ação coletiva
histórica em meio a mudanças que desarticulam e rearticulam velhos e novos interesses,
novas e velhas estratégias para o capital e o trabalho.
Como não se pode analisar a produção flexível, por exemplo, enquanto um padrão
único, mas diverso nos distintos países, também a realidade sindical tem se revelado
bastante heterogênea, tanto nos níveis de sindicalização quanto na força de mobilização
de diferentes categorias profissionais.
A crise no sindicalismo reflete também a crise teórica no coração da Sociologia do
trabalho. Nesse aspecto, é preciso recolocar qual o sentido de crise nas análises do
sindicalismo, pois o seu dimensionamento e a compreensão das razões da crise tendem a
contribuir para a não paralisação da ação. A noção de crise é inconcebível sem a
compreensão de sociedade como um sistema aberto capaz de sofrer crises, pois a própria
mudança contém um caráter crísico. Podemos, assim, tomar a crise no sindicalismo como
decorrência das transformações estruturais no mundo do trabalho e prenhe das
contradições inerentes ao capitalismo, ao mesmo tempo em que se apresenta como
resultado das ações dos atores. O desafio metodológico é justamente o de compreender a
crise na dupla dimensão estrutura e ação das condições objetivas e subjetivas imbricadas.
Em suma, de modo algum negamos as crises e as mudanças que as ocasionaram. O
diagnóstico de crise nos cenários internacional e nacional, no entanto, revela realidades
distintas que não permitem generalizações apriorísticas sobre a natureza da mudança no

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meio sindical, tampouco o tratamento deva ser algo completamente novo. Acreditamos
que o caráter novidadeiro dado a essa crise tem cunho ideológico na medida em que
explicações divorciadas da história do movimento associativo dos trabalhadores
produzem efeitos que servem aos propósitos de desqualificação das organizações dos
trabalhadores.
As taxas de sindicalização, o número de sindicatos e o de greves – tradicionais
indicadores do movimento sindical – na década de 1980, despencam no mundo e esta
queda é sentida no Brasil apenas nos anos 1990. Tanto em relação à dinâmica do capital
quanto ao movimento dos trabalhadores, o Brasil apresenta um descompasso, o que lhe
vale a expressão de desenvolvimento tardio ou mesmo de capitalismo desorganizado.
Essa referência ao modo e momento de efetiva inserção no jogo das forças produtivas
hegemônicas, ao seu tempo, aplica-se também ao Paraná e à organização de seus
trabalhadores.

A trajetória do SMC
Para compreender a conformação atual do sindicato paranaense dos metalúrgicos, é
importante destacar o caráter desse sindicato, sobretudo na época da ditadura militar no
Brasil (1964-1985)1. Tratava-se de um sindicato corporativo, oficial e definido como um
“um braço das empresas e da ditadura” (Depoimento de Passos, 19 ago. 06). Isso explica
a oposição mais sistemática, em fins dos anos 1970, disposta a encetar outro rumo de
atuação ao sindicato e que se intensifica na esteira do denominado Novo Sindicalismo,
nos anos 1980. A organização da oposição metalúrgica passa a disputar eleições e a
pressionar para mudanças, no cenário de efervescência política e de luta pela ampliação
de direitos de cidadania no país. A motivação inicial foram as lutas salariais e
posteriormente passaram a disputar a direção do sindicato dos Metalúrgicos da Grande
Curitiba.
Um marco dessa ação foi a histórica greve de 1979 dos metalúrgicos, em Curitiba,
resultado da conjuntura política e econômica nacional extremamente desfavorável para
1
O sindicato dos metalúrgicos do Paraná teve origem em 1920, numa reunião realizada pelos trabalhadores
da indústria Muller Irmãos com a finalidade de organização da categoria. Entre divisões e reunificações,
esse sindicato obtém o reconhecimento oficial em maio de 1942 – na era Vargas – quando recebe a Carta
Sindical, condição para representação e atuação junto à categoria. Em fins da década de quarenta, o
sindicato amplia a sua base territorial, passando a atuar no âmbito estadual e, em 1950, incorpora os
trabalhadores dos ramos da mecânica e de material elétrico, passando a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico.

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os trabalhadores: inflação na casa dos dois dígitos, arrocho salarial e crise econômica.
Como revela um participante da ação grevista de 1979, “a categoria dos metalúrgicos fez
uma greve, considerada na época como ‘espontânea’, não puxada pelo sindicato, reflexo
do que estava ocorrendo em São Paulo e no resto do país”. (NUPESPAR, 2007). Sobre a
greve dos metalúrgicos no Paraná, analisa um entrevistado:

Todo o processo foi conduzido por uma Comissão de Negociação. O sindicato na


época tinha uma atuação muito assistencialista. Assim, criou condições para
formar uma oposição, para concorrer às eleições sindicais em 1980. Participaram
principalmente aqueles que haviam feito greve, com os trabalhadores da Mueller
Irmãos, New Holland, Bosch, Volvo, Britânia, Siemens, entre outras. (Entrevista
com membro da oposição metalúrgica em 1980, 28 maio 2005).

Essa greve ocorreu fora do sindicato e apoiada por vários movimentos sociais
ligados à Igreja Católica, à esquerda e a trabalhadores que posteriormente se organizaram
enquanto oposição sindical2. A mobilização que culminou na ação grevista, no seu início,
ocorreu fora da instituição sindical, dado o quadro de atuação desse sindicato, desprovido
de tradição em ações reivindicativas – organizar pauta de reivindicação, mobilizar para a
luta, por exemplo, – em que se limitava à convenção coletiva convencional, isto é, àquela
cujos índices eram definidos pelo governo e o sindicato somente assinava.
Nessa greve, diversos membros da Chapa de oposição foram demitidos, pois
circulava entre os empresários uma lista negra contendo o nome dos participantes. Desse
modo, na eleição de 1983, não houve chapa de oposição ao sindicato, em parte porque os
trabalhadores que compuseram a chapa anterior e/ou fizeram oposição estavam
desempregados, “a oposição estava desarticulada, devido principalmente, à grande onda
de desemprego em 1982/83”, revelou um membro da oposição metalúrgica em 1980
(Entrevista 28 Maio 2005).
Nas eleições seguintes 1986, 1989 e 1992, houve chapas de oposição concorrendo
nas eleições sindicais, conforme a tabela 1:

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Em 19 de Agosto de 2006, sob a coordenação do CEPAT e contando com a participação do CEFÚRIA e
NUPESPAR foi realizada uma reunião com militantes, lideranças e antigos membros da oposição
metalúrgica e do movimento social na Casa do Trabalhador com objetivo de iniciar o resgate da memória
das oposições sindicais no Estado do Paraná.

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TABELA 1 – ELEIÇÕES NO SMC NO PERÍODO 1986 A 2003
Ano Chapa 1 Chapa 2 Chapa 3 Votos nulos ou brancos
(situação)
1986 2.550 1.087 649 -
1989 3.119 2.254 - -
1992 4.833 2.031 - -
1995* 5.648 - - 275
1999* 6.465 - - 415
2003* 8.442 - - 614
2007* 9.278 - - 750
FONTE: SMC – 85 anos (2005), pp. 25, 29, 46. Elaboração: Araújo e Bridi (2008).
* As eleições de 1995, 1999, 2003 e 2007 foram chapas únicas.

A ausência de oposição após 1992 não significa que este sindicato tenha alçado
unanimidade entre os trabalhadores. Justamente quando cessam as chapas de oposição é
que aparecem os votos em branco ou nulos nas eleições sindicais como se pode
acompanhar na Tabela 1. Isso sinaliza para algum movimento dos trabalhadores e não a
apatia completa, como se poderia supor. Diversos fatores explicam a não existência de
chapas de oposição, dentre elas, o fato dos trabalhadores identificarem a impossibilidade
de ganhar o sindicato estando fora dele. A Sociologia explica como uma organização
social define limites e cria sua própria defesa, impedindo a participação de outros grupos
em seu interior. O reconhecimento social é condição para a participação.
Enquanto no cenário internacional ganharam força as vertentes que interpretavam
o sindicalismo como em estado moribundo nos anos 1980, no Brasil assim como no
Paraná, o contexto era de efervescência da ação sindical. No plano local, este
revigoramento também ocorre em várias categorias e de diversas formas, seja no
aparecimento das oposições ao sindicalismo tradicional, de gaveta e assistencialista, seja
nas mobilizações, greves, tentativas de organização dos trabalhadores por local de
trabalho entre outras ações. O Sindicato dos Metalúrgicos no Paraná (SMC), ao se
deparar com as oposições nos anos 1980, inicia uma inflexão buscando modernizar-se e
tornar-se um sindicato mobilizador, entre os anos 1985 a 1995.
As mudanças de estratégias da direção desse sindicato objetivavam o seu
fortalecimento junto à categoria. Em 1986, o sindicato passou a ser assessorado pela
Oboré Editorial, empresa paulista de assessoria a sindicatos no país e, embora não se
possa afirmar de modo conclusivo, parece ter contribuído significativamente para as
mudanças de estratégias desse sindicato. Resultado dessa mudança foi a criação de uma

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assessoria de imprensa e comunicação que colocou a entidade mais próxima dos
trabalhadores e de outras realidades, assim como o estabelecimento de subsedes em
novas regiões visava a maior aproximação com a categoria3.
A pesquisa empírica do SMC aponta que este sofreu com a crise do desemprego,
ao reduzir sua base, em 1991, quando foi criado um sindicato articulado pelas empresas
do setor eletro-eletrônico na região, mas a crise nesse sindicato não se revelou terminal.
Entre as saídas estava a mudança de posicionamento junto aos trabalhadores. O sindicato
abandonou um caráter meramente assistencialista no sentido tradicional e adotou uma
posição mobilizadora dentro dos limites circunscritos pela Força Sindical.
As especificidades locais e de determinados setores incluem-se aqui os
metalúrgicos ligados à indústria automobilística no Paraná, ao serem precisadas, dão
cores diferentes para a crise. O SMC passou por crises conjunturais, porém, as alterações
econômicas que se processaram no Estado, a mobilização e as estratégias de ação
adotadas levaram ao crescimento e fortalecimento daquele sindicato, embora numa base
fragmentada.
As significações dos fatos, portanto, dependem da interpretação que é dada à
realidade pesquisada, assim o fenômeno de crise sindical pode ser compreendido de
múltiplas e divergentes formas. As causas e manifestações mais ou menos visíveis de
crise sindical nas últimas décadas do século XX e início do século XXI – de
fragmentação e pulverização de classe, de identidade, de representatividade, da relação
salarial – pedem a contextualização histórica do objeto, o redimensionamento e a
explicitação dos conceitos envolvidos e da realidade contraditória e paradoxal, na qual o
sindicato se encontra inserido.

O sindicato paranaense no contexto da globalização – década de 1990 e anos 2000

As alterações no parque automotivo no Paraná, na década de 1990, está


relacionada ao movimento do capital no plano internacional e, também, à ação do
governo na busca pela inserção do país na economia mundial. Tal inserção se deu através
de políticas de cunho neoliberal, da abertura dos mercados, das privatizações e da
desregulamentação do trabalho. Portanto, entender o que acontece no Paraná, quanto às

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Foram criadas subsedes em municípios da região metropolitana de Curitiba: São José dos Pinhais (1986);
Pinhais (1992); Campo Largo (1995). Em Curitiba, também foram criadas subsedes na Cidade Industrial
de Curitiba (CIC) em 1990 e no Sítio Cercado em 1995.

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alterações em seu parque industrial e às novas relações de trabalho, implica reportar às
mudanças econômicas, políticas e sociais no cenário nacional e internacional. Os atores
mundiais – empresas transnacionais – associam-se aos atores nacionais e locais –
governos nacionais, estaduais, municipais e suas políticas – para a maximização dos
lucros.
É nessa lógica que o Paraná se insere no capitalismo global. O governo, visando
atrair grandes indústrias cria diversos mecanismos de atração como incentivos fiscais,
facilidades financeiras, garantia de infra-estrutura. Estimular novos investimentos
industriais no estado, apoiar a modernização tecnológica e o desenvolvimento de novos
produtos, incentivar o investimento através da apropriação total dos créditos de ICMS
eram alguns dos propósitos do Programa Paraná Mais Empregos, implementado a partir
de 1995. Desse modo, a indústria automobilística foi atraída para a Região Metropolitana
de Curitiba, fato que irá incrementar seu parque industrial e a própria heterogeneização
da categoria metalúrgica: trabalhadores de empresas transnacionais e de pequenas firmas,
trabalhadores com trajetória metalúrgica de outros estados e trabalhadores da própria
região recém-ingressos no mercado de trabalho.

A indústria que se instala, no Paraná, vem formatada em moldes da produção


flexível e enxuta, enquanto as empresas que já existiam passam pelo processo de
reestruturação produtiva, como é o caso da Volvo. Com significativas alterações nas
formas de contratação, nas estratégias salariais e de inovação nas jornadas de trabalho,
possibilitadas pela legislação trabalhista flexibilizada do governo Fernando Henrique,
nos anos de 1990, as empresas visavam se adaptar aos novos padrões internacionais de
competitividade.
Temas novos emergem para o sindicato local, ainda sem tradição de negociação,
tais como contratação, remuneração e jornadas flexíveis, metas de produção, trabalho em
equipe etc. Além disso, a nova configuração da indústria tem implicações para as
organizações dos trabalhadores e seus sindicatos, pois ela fragmenta ainda mais a
categoria, pulverizando a classe trabalhadora, na medida em que de 10 mil operários que
podem participar na execução de um veículo, somente 2 mil são empregados diretos da
montadora (Gounet, 1999). Os demais trabalhadores são indiretos, ligados aos
fornecedores, às firmas terceiras e subcontratadas. Isso cria uma dificuldade suplementar
ao sindicato: a de conseguir representar todo o conjunto de trabalhadores das diferentes
empresas, os quais se encontram dispersos quanto aos interesses, ainda que não

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espacialmente. O sindicato está diante de trabalhadores da mesma categoria formais e
outros, terceirizados.
As novas formas de gestão do trabalho, ao eliminarem níveis hierárquicos ao
mesmo tempo em que, aparentemente, dão autonomia aos trabalhadores, repassam a
esses o ônus pela qualidade e produtividade. Tais formas, entretanto, não partilham os
bônus auferidos pelos aumentos crescentes de produtividade.
A organização do trabalho em equipes tem sido motivo de conflitos, segundo
dirigentes sindicais, pois a autonomia atribuída a esses grupos é relativa, restringe-se à
esfera da produção e, além disso, produz divisões entre os trabalhadores dos grupos. Um
exemplo dessa divisão é quando a função de supervisão de equipe é confundida com uma
posição de mando, como relatam os entrevistados. Os trabalhadores assumem funções de
vigilância e até de punição para os que não conseguem cumprir as metas estabelecidas
para o grupo. Ou seja, essa forma de organização do trabalho fragmenta o trabalhador no
chão de fábrica quando divide os interesses, pulveriza-os e cria falsas expectativas que
alimentam a cisão.
Enquanto na região do ABC paulista, que esteve organizada no padrão fordista
ainda na década de 1990, os trabalhadores se defrontam com a reconversão industrial
contando com um acúmulo de experiências de organização e história de luta para
enfrentar as alterações no trabalho, o SMC se depara diretamente com uma produção já
automatizada, informatizada, flexível e enxuta. Sindicato e trabalhadores, no Paraná,
somam a falta de tradição em negociação, sobretudo uma nova forma de negociar das
empresas.
O sindicato se coloca a necessidade de afirmar a sua representatividade e, para isso,
pautou suas estratégias no sentido da aproximação junto aos trabalhadores, como
demonstra o dirigente sindical:

a gente terminou pegando o veneno na empresa: você começou a trabalhar em


equipe e começou a se aproximar, porque antes o sindicato era blá, blá, blá [...].
Hoje em dia, você chega: “oh pessoal estamos aqui pra falar com você” e você vai
criando um grau de amizade, você vai criando uma identidade, criando uma equipe
também. Então, você tem um discurso mais pacificador, mais família, mais de
parceria (Entrevista com dirigente sindical do SMC, ago. 2004).

O incremento do parque automotivo no Paraná representou para o sindicato, a


ampliação da base. Conforme informações de dirigentes, o sindicato representa hoje

14
cerca de 50 mil trabalhadores na base, com 17 mil filiados, em 2004, chegando a 20 mil,
em 2005. O sindicato ampliou as subsedes da Cidade Industrial de Curitiba (CIC), em
São José dos Pinhais, em Pinhais e em Campo Largo, onde há um diretor responsável em
cada região. Possuem diretores e delegados de base em cada montadora, os quais
participam de cursos reunindo-se uma vez por mês. Já, a diretoria executiva reúne-se às
segundas-feiras. Trata-se de uma organização planejada visando garantir
representatividade, ganhar legitimidade e de proximidade com a categoria. Não se
verificam, portanto, no sindicato local, muitos dos sintomas anunciados pela literatura
sociológica que prenuncia a derrocada dos sindicatos, embora o crescimento tenha se
dado “sob uma organização sindical ainda sem tradição no confronto com empregadores
transnacionais”, como afirmou Araújo (2003).
Nesse contexto, portanto, em que o Estado do Paraná se insere no quadro de
internacionalização da economia, moderniza-se e diversifica seu parque industrial,
ocorrerem alterações no sindicato metalúrgico local, em vista de decisões atinentes ao
próprio sindicato, com vistas a garantir representatividade junto aos trabalhadores e,
também, devido a vinda das montadoras e seus fornecedores. Esse é o marco desta
conjuntura favorável à ampliação da base e que traz consigo uma nova realidade nas
relações de produção, das demandas de uma produção flexível e enxuta, com exigências
distintas se comparadas com a metalurgia anterior tanto para o trabalhador quanto para o
sindicato.

Quando essas montadoras vieram, lá por 97, mais ou menos, 98, que foi a Chrysler a
primeira que se instalou aqui, em 98, foi a primeira que chegou (e também foi a
primeira que foi embora). Nós aqui éramos contra, num primeiro momento, a gente
torceu para que todas essas empresas fechassem e fossem embora. [...] O resultado,
qual que foi? A mudança do perfil, o trabalhador ele teve um gozo no começo: “Pô,
vou trabalhar numa montadora”. Mas o pessoal, a grande maioria já voltou, já saiu da
montadora, já voltou para a sua empresa de origem, ou alguns ficaram porque
conseguiram no começo lá, ir para a Alemanha fazer alguns cursos pela Volkswagen,
pela Renault ir para a França, ou coisa e tal. Mas no começo, a desilusão do
trabalhador foi enorme, porque o salário é muito pouco, o salário é baixo. Vai
trabalhar numa montadora hoje, hoje o piso inicial, numa montadora, não chega a mil
reais, 950 reais. Então o trabalhador teve uma ilusão muito grande e, no começo
dessas montadoras, a exigência profissional foi muito grande: faz ele passar por
cursos no Senai, cursos com dinheiro do FAT, dinheiro nosso que as empresas
acabaram se apropriando para fazer qualificação profissional, um absurdo, um
absurdo o nosso governo estadual aceitar... Aliás, esse é um dos motivos para as
empresas virem, porque eles [o governo] prometeram um monte de coisas: prometeu
um sindicato, um sindicalismo fraco, um sindicalismo inoperante... Nós já perdemos

15
a conta de quantas greves fizemos principalmente na Volkswagen, porque a pior
empresa para tratar é a Volkswagen. (Entrevista com dirigente sindical, 28 abr. 05).

O incremento da atuação sindical com a vinda das montadoras se deve também ao


fato de se tratar de um setor que, historicamente, possui tradição sindical não apenas no
Brasil, quanto noutras partes do mundo. Destacamos que a "cultura" de negociação das
novas empresas instaladas no estado, além do peso histórico dos metalúrgicos do ramo
automobilístico em âmbito global/nacional/local, se constituiu em fator que desafiou o
sindicato a mudar as estratégias, a realizar novos aprendizados para uma atuação que
atendesse os interesses dos trabalhadores, de forma a não colocar em risco, a legitimidade
do grupo dirigente desse sindicato, hoje composto por antigos dirigentes sindicais, – o
próprio presidente está à frente do sindicato há 18 anos, – e novos dirigente oriundos,
inclusive, das montadoras.
Com as novas exigências colocadas pelo contexto da produção enxuta e flexível e
de (des)regulação do trabalho, o sindicato reconhece as dificuldades a enfrentar. Por
outro lado, ele se deparou com um novo interlocutor que o força a ir para a negociação.

Com as montadoras, daí é diferente, porque são empresas que têm informação, então
você tem condições de negociar o limite. No outro [setor tradicional da indústria
paranaense], aquela insegurança que ele tem, ele não sabe aonde vai dar aquilo ali
tudo, ele quer ficar onde está. Ele reproduz o que já está acordado. Nas montadoras
não. Aí, você tem toda essa possibilidade. Então o interlocutor do sindicato mudou.
Você tinha aí a mecânica, a indústria mecânica, a metalúrgica e as montadoras, só
que, nas montadoras, tem esse novo interlocutor, não que o interlocutor mudou,
metalúrgicas, mecânicas continuam tendo [...], mas têm um novo interlocutor, que
são as montadoras. E essas condições [interferiram no sindicato]. Então, por
exemplo, se a gente for pensar assim, ‘ah, o sindicato tinha uma forma de ação’, mas
aquela ação também correspondia a uma conjuntura dada, né! Então, quando você
tem uma nova situação, traz uma nova dinâmica, que incide sobre o sindicato dos
metalúrgicos (Entrevista com coordenador do DIEESE/PR, 12 jul. 04).

Da análise do eixo de formação desse novo dirigente submetido a novas


exigências, a impressão é de que se trata de uma pauta ditada pelo capital. Porém, isso é
histórico para as organizações operárias, que sempre tiveram de entender os mecanismos
do capital para se municiarem de argumentos que justificassem suas reivindicações.
Nesse sentido, os sindicalistas apontam o DIEESE como referência para a preparação das
pautas de reivindicações e auxílio na mesa de negociação com os novos atores, as
montadoras, bastante preparados para negociar.

16
Segundo assessor sindical, o novo contexto favoreceu o desenvolvimento do
sindicato, que aprendeu e amadureceu na forma de trabalhar e de se relacionar com essas
empresas e o “próprio dirigente foi descobrindo novas fronteiras de ação sindical”
(Entrevista com assessor sindical, jul.2004).
A realidade vem revelando que a pouca tradição sindical, característica do Paraná
e, certamente, um dos critérios adotados pelas montadoras para a instalação das novas
fábricas, não é permanente. Os trabalhadores têm demonstrado capacidade de
aprendizagem e de mobilização, pois as duras condições de trabalho e o ritmo intenso os
levam para a luta e a organização sindical. São “os trabalhadores que empurram o
sindicato para a ação” afirmou um sindicalista (Entrevista com dirigente sindical,
jul.2004).
Quando analisamos a crise no sindicalismo com base em dados de filiação
sindical é preciso atentar para as relocalizações do capital produtivo pelo mundo e dentro
dos próprios países. Enquanto outras regiões enfrentavam quedas de suas bases e redução
do número de filiados em conseqüência do desemprego, das alterações no mercado de
trabalho e nas formas de produção, o sindicato dos metalúrgicos ampliava sua base. E foi
no confronto e nas mesas de negociação que o sindicato foi agindo e reagindo no plano
local às novas condições no âmbito do trabalho.
A conjugação de condições local/global e de fatores macro e microeconômicos
tornou heterogênea a ação sindical tradicional. Sob a égide da flexibilização, as
articulações da institucionalidade jurídica e regras da economia mundial ficaram rápidas
e freqüentes e fizeram aflorar as fragilidades locais e estruturais do movimento sindical,
agora em contato mais intenso com outros movimentos e instituições (ARAÚJO, 2007, p.
144). Essa maior complexidade das operações está traduzida no discurso dos atores:

Você tem uma situação que traz uma nova dinâmica e incide sobre o sindicato
dos metalúrgicos, por exemplo. Ele é reconhecido dentro da própria CUT. Os
metalúrgicos de Curitiba são reconhecidos como uma categoria de bastante
mobilização. Então, essas situações acontecem na mesa de negociação. Quando
se está lá negociando, os trabalhadores vão pressionando. (...) o ente sindical vê
aquilo, ele está no dia-a-dia, ele vai para a mesa de negociação com quê
subsídios? Com os subsídios que a gente dá, mas também com o que a categoria
está reivindicando. Na montadora tem o dia-a-dia todo de exigências, de alta
produtividade e tal, e aí, se diz: “cadê o meu”? Então, vai motivando o
movimento sindical a ficar na mesa e a falar com muito mais fôlego, mais força.
Porque eles falam o seguinte: “se eu sair da mesa sem uma proposta que atenda a
reivindicação, o pessoal vai fazer greve”. Então, a conjuntura está dada na
mobilização. (Entrevista com assessor sindical, jul.2004).

17
Ao depararmo-nos com as teorias que sinalizam para a crise de mobilização dos
trabalhadores, destacamos a necessidade de compreender o caráter dessa crise. O
sindicato e os trabalhadores das montadoras especificamente, por exemplo, têm
demonstrado capacidade de aprendizagens rápidas, uma vez que as condições de
trabalho, as formas de gestão da produção adotadas, as baixas remunerações, ou seja, as
condições objetivas impostas sobre o sindicato e para os trabalhadores, os levam à ação,
à intensa mobilização e à ação grevista, como demonstrou Bridi (2008), na análise da
ação coletiva no interior das três montadoras no Paraná: Volvo, Volkswagen-Audi e
Renault, como se pode acompanhar no Quadro 1.

QUADRO 1 – PARALISAÇÕES E GREVES NAS MONTADORAS NO PARANÁ:


2003-2007

Ano Volvo Renault Volkswagen-Audi


2003 Campanha Emergencial: Campanha Emergencial: Campanha Emergencial:
Paralisações nos dias 22 Greve. Greve.
a 25 de abril pelo perí- *Reposição salarial e *Reposição integral do
odo de duas a oito horas. abono. INPC (Índice Nacional de
Reposição integral do *Redução da jornada. Preços o Consumidor).
INPC na data- base.
2004 Acordo / sem paralisa- Greve em 2004 na data- Greve 2004 de sete dias:
ção. base. *Redução da jornada.
*Aumento salarial.
*Fim do Banco de Horas.
2005 Acordo / sem paralisa- - Paralisação de duas horas.
ção. Empresa negocia acordo.
2006 Greve Paralisação de 2 h; pro- Paralisação de quatro horas
*Aumento salarial e da testo contra excesso de contra demissões; protestos
PLR. horas extras; decisão de de 24 horas contra demis-
não trabalhar no sábado. sões.

Greve Greve
*Aumento salarial e *Aumento salarial e PLR.
PLR.
2007 Paralisação de uma hora. Greve Greve
Negociação com a em- *Reivindicação de 8,5% *Reivindicação de 8,5%
presa de reajuste de mais R$ 2000 de abono. mais R$ 2000 de abono.
7,44%.
Fonte: SMC, diversos boletins; Jamil Davila, Diretor do Sindicato. Elaboração: Bridi, 2008.
(-) sem dado

18
Como demonstrado no quadro, houve greves em quase todos os anos dessa primeira
década do século XXI. Além das greves nas datas bases, diversas paralisações ocorrem
nas linhas de produção por razões que vão desde a convocação de horas-extras até
demissões, sobretudo nas montadoras Volkswagen-Audi e Renault (Bridi, 2008).
Contrariando as teses da desmobilização de analistas do movimento sindical, a trajetória
dos trabalhadores, exemplificadas pelo estudo das três montadoras instaladas no Paraná,
tem sido de mobilização, tanto em termos de greves como de ações pontuais no interior
das empresas. São vários os exemplos dessa mobilização. O fato é que existe movimento,
o que não aponta para crise como estagnação, mas crise de transição de uma forma de
mobilização para outra, mais dispersa e multiplicada, forçada pelas condições de trabalho
no interior das empresas e menos por aspectos de politização geral, como ressentem os
estudiosos do sindicalismo.
O patamar de mobilização tem sido elevado nos anos 2000. Não apenas por
ocasião das datas-base, também durante o ano ocorrem diversas paralisações, exigindo
uma ação coletiva, no caso das montadoras, mediadas primeiramente pelas comissões de
representação de trabalhadores, no momento em que os conflitos aparecem e, se
necessário, sustentadas no plano institucional pelo sindicato da categoria.
O movimento do SMC significa a reação, a história que vai se fazendo, difícil de
ser captada e analisada no calor do processo. Para um dos dirigentes sindicais
entrevistados, o sindicato tem que ser "preparado para discutir a política social, um
sindicato que tenha tolerância de colocar o trabalhador no caminho certo (...) muitas
vezes, o sindicato pode ser culpado por falir a empresa, como pode fazer a empresa ir
bem” (Entrevista com dirigente sindical, ago.2004). Isso indica que a tônica do sindicato
deve ser a moderação e não uma ameaça à existência da empresa, o que justifica uma
ação segmentada por parte do sindicato, impondo uma pressão maior onde se pode exigir
mais do grande capital. Para Ferraz (2005), isso pode significar dificuldades quanto à
bandeira da universalização dos direitos dos trabalhadores, na medida em que se aceita a
diferença. A dificuldade, aqui, se encontra nas condições subjetivas do ator sindical local
e uma base, além de pulverizada, desprovida de tradição de luta.
No contexto de produção flexível e enxuta, o SMC precisou estabelecer maior
articulação com os trabalhadores para ambos os lados – o sindicato e a empresa. O fator
negocial aumentou e se tornou diferenciado.

19
O representante do sindicato dentro da fábrica [tem que ter] conhecimento,
porque ele entra em discussões aqui, como a PLR, e o dirigente sindical da
fábrica tem muito mais condição de discutir do que o dirigente sindical de fora.
Por quê? Porque é uma questão de lá de dentro da fábrica, específica da fábrica.
Como é que o dirigente sindical vai acompanhar a questão da produtividade lá na
linha de produção, se ele está alheio a essa situação? Então, aí, o dirigente dentro
da fábrica tem que estar preparado para discutir essas questões (Entrevista com
dirigente sindical, jul. 2004).

Identifica-se, assim, uma nova dinâmica para o sindicato, agora mais exigente
desse ator, seja nas negociações, seja na ampliação dos espaços de atuação. Constata-se
que foi atribuído ao sindicato, o direito de representação junto ao poder público em
comissões e conselhos. Além disso, muitos desses dirigentes desenvolvem outras
atividades de natureza política que vão além das portas do sindicato e ou da empresa, seja
na política local partidária, seja em associações comunitárias, como lideranças.

O sindicato moderno hoje, tem que ser um sindicato que saiba avaliar a questão
produtiva, analisar uma questão conjuntural de economia, não somente mais da
região, a nível nacional e a nível até mundial. Porque se o sindicato não estiver
preparado pra isso, não tiver preparado com advogado, economista, com o
pessoal realmente conhecendo o sistema tecnológico mesmo, não precisa nem ser
o diretor, mas ele tem que ter um assessor bom, conhecendo um pouco de lei.
Como é que você vai discutir hoje a modernidade, a mudança do trabalho na
indústria se você não tiver inserido no contexto, quer dizer: acompanhando a
questão global da situação (Entrevista com dirigente sindical do SMC, ago. 05).

Essa dinâmica também implica que o sindicato teve que aprender a jogar com as
peças que a empresa vem jogando, tal como a possibilidade de relocalização da produção
de acordo com a conveniência do capital. Ainda que se trate de construção a se realizar, a
articulação política da classe trabalhadora e sua união na presente divisão capitalista do
trabalho, o sindicato encontra-se desafiado a uma ação também transnacional para
assegurar padrões mínimos para os trabalhadores, de forma que as empresas não fiquem
tentadas a encerrar suas atividades pela possibilidade de redução do custo da mão-de-
obra. Esta é uma realidade vivida pelos sindicatos do setor automotivo no Brasil e
naqueles países que lograram condições de trabalho e salariais superiores aos daqui.
Destacam-se situações em que o sindicato ou se firma, para manter os direitos
conquistados, jornadas reduzidas de trabalho etc., acarretando a perda de empregos, ou
negocia os direitos e aceita reduzi-los descumprindo seu papel primordial. Nesse caso, o
sindicato entra em crise, pois qualquer que seja a decisão tomada, pode lhe custar a
credibilidade dos trabalhadores ou a redução de sua base. Muitas vezes é uma situação

20
em que se vê sem saída, situação que é resultado de uma crise de regulação, pois o fato
da legislação de proteção do trabalho ser flexível e ser objeto de negociação a cada data-
base é que coloca o sindicato na encruzilhada.
Na visão de sindicalistas da categoria estudada, a crise no sindicalismo está
associada à crise econômica e ao desemprego em vista da redução da base, que redundou
em queda na arrecadação. Eles identificam, também, que muitos sindicatos no Brasil
entraram em crise porque não tiveram força para negociar quando, através da Medida
Provisória 1053/94, o governo eliminou a política de reajuste salarial através do Estado e
proibiu cláusulas de reajustes automáticos de salários. Segundo dirigentes do SMC, isso
não se aplica a esse sindicato que buscou construir uma identidade de negociador.
Os sindicalistas do SMC analisam que a crise já passou, embora alguns
identifiquem outras expressões de crise menos visíveis, tais como a dificuldade de
mobilizar o trabalhador para outras questões que não salariais e, por isso, os acordos
coletivos por empresa são vistos como importante elemento de mobilização. Também,
ocorre a dificuldade de se conseguir adesão para a ação coletiva dos trabalhadores com
contratos por tempo determinado, uma vez que esses se encontram em competição pelo
emprego.
Para os dirigentes sindicais entrevistados, o novo contexto trouxe a necessidade
para o SMC atender as demandas de trabalhadores com um novo perfil, buscar novas
formas de interação com os trabalhadores e que, portanto, o próprio sindicalista precisou
adotar um estilo, distinto daquele sindicalista estereotipado tradicional. Nesse sentido, o
SMC precisou se transformar num sindicato moderno que oferece atrativos aos
trabalhadores, atividades de lazer e outras vantagens. Dessa forma, a certeza da prestação
de um bom serviço pelo sindicato faz com que os dirigentes não receiem uma reforma
sindical, pois além de obterem conquistas, vêm se preparando para se garantir como uma
instituição representativa dos trabalhadores.
A análise do sindicalismo e das crises pelas quais passa, requer olhá-lo também
como uma instituição que se legitimou socialmente e como toda instituição tem
limitações e contradições próprias. Como analisa Araújo (2004, p.3), “as organizações,
enquanto conjuntos formalizados e hierarquizados que agregam os indivíduos para
atingir determinados fins, dão forma às instituições – um corpo de conhecimento,
fornecedor de regras de conduta aceitas como adequadas, que passou por um processo de
legitimação social”. Pensando nessa perspectiva, afirma Touraine (1980, p. 339), “todo

21
sistema institucional é limitado, toda reivindicação não é negociada, todos os interesses
sociais não são representados”, uma vez que “algumas condutas coletivas são respostas
ao bloqueio ou ao fechamento do sistema institucional”. A apatia ou o descrédito dos
trabalhadores de uma determinada organização sindical pode ser interpretado como uma
resposta a uma instituição que se distanciou de seus objetivos e/ou perdeu legitimidade
perante seus associados. No sindicato pesquisado verificamos que existe uma luta da
própria instituição sindical para se assegurar como representativa da categoria. É uma
condição que depende das estratégias utilizadas e da sua ação diária, mas, sobretudo, nas
negociações coletivas que acontecem a cada data-base.
O SMC, como se afirmou anteriormente, se caracteriza como uma instituição que
vem atuando no campo do capital e jogando com as mesmas peças. Desse modo, sua
ação tem duplo caráter: ao mesmo tempo em que assegura ganhos salariais aos
trabalhadores, também se garante enquanto instituição de representação dos mesmos.
Esse sindicato não se diferencia daquele sindicalismo numa estrutura fordista, pois ele
visa aprofundar e ampliar, por meio da mobilização, benefícios e aumentos salariais em
troca do cumprimento de metas, diminuição do absenteísmo e outras metas da empresa.
Isso pode ser verificado pela análise dos acordos, nos quais se atrelam parte da
remuneração ao desempenho individual, coletivo ou ambos. Assim, o sindicato mantém
uma posição de intermediário entre os trabalhadores e as empresas. Ou seja, guardadas as
devidas diferenças, mantém uma estrutura de funcionamento com base fordista.
À primeira vista, o SMC poderia ser compreendido como um sindicalismo que
visa somente garantir os padrões mais elevados de salários, melhores condições de
trabalho, redução de jornada de trabalho, elementos básicos de saúde, segurança no
trabalho, assinalados em seus acordos coletivos. No entanto, essa é uma visão parcial,
pois a atuação não é meramente econômica, ela é política. É no campo da política dos
trabalhadores que são estabelecidas as ações. Como mostrou Bridi (2008), as ações dos
trabalhadores organizados, seja no interior das fábricas, seja no sindicato, em muito
ultrapassam a mera reivindicação econômica. Em análise, Hyman (1996) indica não ser
possível um sindicalismo só de negócios, uma vez que os mecanismos de regulação
sustentam a possibilidade da ação e das condições de trabalho, por exemplo. Diversos são
os assuntos que envolvem o trabalho e o trabalhador e exigem uma atuação política do
sindicato junto ao Estado e a outras instituições sociais e, além disso, há um papel social
esperado do sindicato e que este busca cumprir ainda que o foco central sejam as

22
reivindicações salariais.
Não é possível, no entanto, analisar esse sindicato com base num devir ser. O
sindicato, apesar de sua função historicamente constituída de negociação de salários e de
condições de trabalho, foi tratado sob uma matriz desenhada por alguns leitores da teoria
marxista, como agente da revolução social cuja função seria a destruição do sistema
capitalista numa missão histórica emancipadora. Trata-se de uma idéia fundada num
devir. Algumas análises sobre a crise sindical pautaram-se mais na possibilidade de
futuro do que na própria condição histórico-concreta desse ator sindicato/sindicalismo.
Raciocínio como esses podem conduzir a distorções teóricas. É preciso considerar as
origens da organização sindical, pois os sindicatos nasceram vinculados ao capitalismo e,
portanto, com limitações em suas formas de resistir ao capital:

Os sindicatos trabalham bem como centro de resistência contra as usurpações do


capital. Falham em alguns casos, por usar pouco inteligentemente a sua força. Mas,
são deficientes, de modo geral, por se limitarem a uma luta de guerrilhas contra os
efeitos do sistema existente, em lugar de ao mesmo tempo se esforçarem para mudá-
lo, em lugar de empregarem suas forças organizadas como alavanca para a
emancipação final da classe operária, isto é, para a abolição definitiva do sistema de
trabalho assalariado (MARX, s.d., p. 378).

Nessa crítica, Marx revela a condição de um sindicalismo que nasceu dependente


do capital e cuja atuação serviu para minorar os efeitos da exploração, mas não para a
abolição do sistema capitalista. Apesar de perceber os limites do sindicalismo, reconhece
a importância do sindicato, inclusive do papel pedagógico que exerce junto aos
trabalhadores, o qual por meio de lutas e greves permite um aprendizado de classe social
e o confronto entre capital e trabalho.
O novo desempenho que o SMC adotou a partir dos anos 1990 revela, em certa
medida, continuidade histórica, pois mantém a mesma espinha dorsal dos anos anteriores
a 1980, conservando alguns dirigentes sindicais e introduzindo outros oriundos das
montadoras e de outras empresas, porém se modernizou e redimensionou suas ações para
um novo patamar de mobilização. Essa mudança deu-se mais por questões internas desse
sindicato, como por exemplo, a oposição sofrida por trabalhadores contrários ao grupo
que está à frente da entidade há quase duas décadas e, também, devido à crise mais geral
no capitalismo que envolve as mutações no mundo do trabalho; mais propriamente uma

23
transição de padrões de produção industrial e de adoção de políticas neoliberais em nível
macroeconômico.

Algumas considerações a mais


É certo que as circunstâncias são mais adversas para o sindicalismo e para a ação
coletiva, mas isso não significa a morte da ação. Ao contrário das teses sobre o fim do
sindicalismo, os trabalhadores encontram outros meios, outras brechas para se
reorganizarem como vêm demonstrando inúmeras experiências sindicais, inclusive na
realidade local estudada.

Como já afirmado, as mudanças que a vinda das montadoras ao Paraná trouxe ao


sindicato local dos metalúrgicos não provocaram apenas a ampliação da base, mas
também desafios ao sindicato. Dentre os desafios, precisou se adequar às novas
condições de trabalho na modalidade de produção enxuta e flexível e, sobretudo,
conhecê-la para conseguir representar, negociar e legitimar-se frente aos trabalhadores e
às empresas. O sindicato adapta-se à estrutura das empresas flexíveis, à
internacionalização da economia, ao ritmo do setor, à desregulamentação do trabalho no
Brasil e às novas formas de gestão da mão-de-obra. Nesse processo de adaptação, pode-
se identificar manifestações de crise pouco visíveis para o próprio sindicato, de maneira
que o movimento desse sindicato paranaense confirma algumas teses gerais sobre a crise
sindical e contradiz visões correntes de crise, pois apresenta sinais de ação coletiva e de
mobilização, ainda que não se trate de uma ação como aquela idealizada a partir da
prática no ABC paulista dos anos 1980.
As realidades empíricas e o movimento real do sindicalismo, portanto, sinalizam
que questões aparentemente semelhantes possuem significados muito diversos em
diferentes contextos históricos e culturais. Locke e Thelen (1998) analisam que a
complexidade das novas relações de trabalho em condições de produção flexível e enxuta
pressupõe mudanças comuns no cenário internacional. É necessário estudar, no entanto,
cada realidade de forma contextualizada e comparada, considerando as diferenças
sociais, culturais, econômicas e políticas que a envolvem como objeto de conhecimento,
tanto pelos diferentes graus de rigidez da economia de cada país, quanto pela
flexibilidade impressa à produção e administração da força de trabalho, que pode revelar

24
conteúdos e significados distintos. Os sindicatos diferem não só por seus arranjos como
também pela posição que ocupam e pelas relações políticas internas.
Ao acompanharmos a trajetória histórica dos metalúrgicos na região estudada,
revelam-se mudanças positivas, como o fato do sindicato ter adquirido maior visibilidade
no chão de fábrica, estar atento e mais próximo da categoria que representa. A cada data-
base tem representado um teste que os dirigentes sindicais querem responder
satisfatoriamente ao papel que lhe foi atribuído pelos trabalhadores: vigilância dos
direitos e da interlocução trabalhadores e empresa.

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SORJ, B. Sociologia e Trabalho: mutações, encontros e desencontros. Revista Brasileira


de Ciências Sociais, vol. 15, n.º 43, jun. 2000, p. 191-229.

TOURAINE, A. Os novos movimentos sociais. In: FORACCHI, M.; MARTINS, J. S.


(Orgs.). Sociologia e sociedade. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1980, p.
335-365.

Entrevistas realizadas
12 jul. 2004 - entrevista com Assessor Sindical, concedida a Maria Aparecida Bridi,
Royemersom Penkal, Marcos Alexandre dos Santos Ferraz e Silvia Maria de Araújo.

16 jul. 2004 - entrevista com Dirigente Sindical, concedida a Maria Aparecida Bridi,
Royemersom Penkal e Silvia Maria de Araújo.

19 jul. 2004 - entrevista com Dirigentes Sindicais e integrantes de Comissão da Fábrica


da Volvo, concedida a Maria Aparecida Bridi, Royemersom Penkal e Silvia Maria de
Araújo.

21 jul. 2004 - entrevista com Assessor Sindical, concedida a Maria Aparecida Bridi,
Royemersom Penkal e Silvia Maria de Araújo.

3 ago. 2004 - entrevista com Dirigente Sindical, concedida a Maria Aparecida Bridi e
Royemersom Penkal.

19 ago. 2004 - entrevista com Comissão de Fábrica, concedida a Maria Aparecida Bridi,
Royemersom Penkal e Silvia Maria de Araújo.

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28 maio 2005 - entrevista com ex-membro da oposição metalúrgica em Curitiba nas
eleições de 1979.

Maio 2005 - entrevista com Dirigente Sindical, concedida a Royemersom Penkal e Silvia
Maria de Araújo e Maria Aparecida Bridi.

19 ago.2006 - Depoimento de Passos para o CEPAT, CEFURIA e NUPESPAR.

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