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Caderno Prudentino de Geografia, Presidente Prudente, n.37, v.1, p.124-130, jan./jul. 2015.

RESENHA / REVIEW / RESEÑA

Lucas Labigalini Fuini


Universidade Estadual Paulista, Campus de Ourinhos, Curso de Geografia
Avenida Vitalina Marcusso, 1500, Parque das Palmeiras
CEP: 19910-206 - Ourinhos, SP – Brasil
lucasfuini@yahoo.com.br

Resenha da obra:
MORAES, A. C. R. Território e história no Brasil. SP: Hucitec, 2002.

O território como História da Geografia, ou Geografia da História?

No livro “O Brasil: território e sociedade no início do século XXI”, Milton


Santos e Maria Laura Silveira1 se colocam na árdua tarefa de elaborar um compêndio
a partir do seguinte desafio: “fazer falar a nação através do território”. Creio que tem
sido essa a missão do já renomado geógrafo Antônio Carlos Robert Moraes, do
Departamento de Geografia da USP. Sua obra de 2002, “Território e história no Brasil”,
faz parte de um quadro maior de contribuições do autor2 que busca caracterizar uma
historiografia do território brasileiro de forma dialética, colocando os fatos em evidência
buscando suas contradições, em uma linha althusseriana3 que segue a análise das
macroestruturas sociais, as formações econômico-sociais marxistas, ao lado da
compreensão do Estado e seus aparelhos ideológicos.
A obra tem como eixo condutor a formação territorial brasileira e se
articula, analiticamente, com outros conceitos, como: valorização do espaço, território,
Estado-territorial, Estados periféricos, ideologias geográficas, fundos territoriais. Além,
é claro, de noções mais gerais para se discutir o ethos do território, como povo, nação,
fronteira e soberania, centralidades territoriais. A perspectiva territorial-geográfico,
evocada desde Ratzel e sua Geografia moderna, aparece em outra obra de Moraes
(1990) assim explicitada:

1 SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. RJ/SP: Record,
2001.
2 Dentre essas obras, destacam-se: “Ratzel”, coletânea de 1990; “Ideologias geográficas”, de 1988,

“Bases da formação territorial do Brasil: o território colonial brasileiro no "longo" século XVI”, de 1999, e o
mais recente, “Geografia histórica do Brasil: capitalismo, território e periferia”, de 2011.
3 Filósofo francês de origem argelina responsável pela elaboração de uma teoria sobre o Estado de base

marxista. É um dos principais nomes do estruturalismo francês (1918-1990). Dentre uma de suas obras
mais conhecidas, destaca-se: Aparelhos Ideológicos de Estado.
Resenha: O território como história da geografia, ou geografia da história? Lucas L. Fuini.

O território seria, em sua definição (para Ratzel), uma determinada


porção da superfície terrestre apropriada por um grupo humano. (...)
Dessa forma, o território é posto como um espaço que alguém possui,
é a posse que lhe atribui identidade (...). O espaço vital manifestaria a
necessidade territorial de uma sociedade (...). A defesa do território é
vista como um imperativo da história, que passa a ser delineada por
uma luta pelo espaço (MORAES, 1990, p. 23)4.

Mas o autor vai além. Este estudo, compilação de diversos textos, busca
compreender o processo histórico de apropriação do espaço produzido, que funda o
território como formação, correlacionando sua materialidade, as formas e objetos
(configuração territorial) com os aspectos imateriais dos discursos geográficos. O autor
destaca que, no caso brasileiro, nossa ideia de território é diferente, pois como colônia
que fomos, fruto da conquista territorial das metrópoles coloniais ibéricas e
posteriormente das potências econômicas anglo-saxãs, nunca pudemos pensar em
uma nação e um território para si. A condição de periferia nos legou a dependência,
em diversos níveis, e um território apenas como projeto ideológico nacional, um
discurso legitimador da dominação.
Desse modo, a “construção dos Estado periféricos se faz a partir de
heranças coloniais existentes, seja no que importa aos sistemas de produção, à
estrutura político-administrativa, ou mesmo à identidade vigente entre os operadores
do processo” (MORAES, 2002, p. 102). Território que se configura, como unidade
físico-ideológica, através de um projeto nacional voltado para o futuro, o que o autor
chama de “pacto que amarrava as elites coloniais em um compromisso político comum
com fundamento na reprodução do poder de mando dessas elites sobre seus espaços
de dominação” (MORAES, 2002, p. 2002).
Desse pacto conservador advém as características de um país novo, com
um Estado frágil se comportando como Estado patrimonial, e no plano externo, da
divisão internacional do trabalho, a condição periférica na limitação quanto à
emancipação política e na subalternidade na economia-mundo capitalista. Nesse
aspecto, o autor dialoga com Darcy Ribeiro, que em “O povo brasileiro” reconhece que
em face de uma aparente unidade cultural nacional, que forma o nosso povo brasileiro,
não se pode se “cegar para disparidades, contradições e antagonismos que
subsistem” (p. 20), pois “a unidade nacional, viabilizada pela integração econômica de

4 MORAES, A. C. R. Ratzel. Coleção ‘Grandes cientistas sociais’. SP: Ática, 1990.

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sucessivos implantes coloniais, foi alcançada através de lutas violentas e da sabedoria


política das velhas classes dirigentes brasileiras (RIBEIRO, 1995)5.
O livro, de um total de 198 páginas, se subdivide em 9 capítulos. O
primeiro, a explorar uma história da Geografia através dos discursos geográficos,
discursos que expressas as mentalidades vigentes e suas formas de pensar
historicamente, um olhar geográfico que se exercita sob certas condições históricas e
que busca antever a modernidade atendendo à normas e padrões hegemônicos (como
nos diz Gottmann, o interesse dos Estados se expressa em suas geografias). Mas
que, em nossa condição periférica, denota a “busca da legitimação pela adoção de
modelos gerados noutros contextos, com o descolamento entre o mundo das ideias
(discursos oficiais) e a vida prática brasileira” (MORAES, 2002, p. 41). Com a
emancipação em 1822 e consolidação do Estado brasileiro, se congraça a união do
discurso político com a geografia ao se adotar o território como símbolo da unidade
nacional, não o povo.
No capítulo 2 cabe ao autor explicitar conceitos importantes de uma
abordagem territorial pelo viés da Geografia humana, articulando seu método de
análise. Inicia-se pelo tratamento da totalidade socioespacial em diálogo que a busca
das particularidades e mediações, passando pela referenciação à valorização do
espaço como apropriação dos espaços naturais na construção dos espaços sociais ao
longo da história, adicionando-se o trabalho que incorpora e cria valor (uso e troca)
nessa relação. Esse raciocínio prossegue com o processo histórico de apropriação
dos meios naturais, transformação desses mesmos meios e reapropriação dos meios
transformados, conjunto objetivado no processo de produção do espaço. Assim, se
chega à concepção de território e formação territorial, pela “valorização do espaço que
pode ser apreendida como processo histórico”, pelas “construções e destruições
realizadas e que fazem parte desse espaço”, “pela ação de um grupo social que ocupa
e explora aquele espaço”, pelas “representações, discursos, consciências e
articulações práticas”, pelos “processos econômicos e determinações políticos
culturais”, e por fim, pelos “interesses e projetos sociais dos atores que emergem na
cena histórica” (MORAES, 2002, p. 56-59).
Os capítulos do 3 ao 6 lidam, como uma unidade epistêmica, com a
formação do Estado territorial e sua faceta colonial e periférica brasileira, sustentada
em projetos nacionais dotados de ideologias geográficas. O Estado-nação, o Estado

5 RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. SP: Cia das Letras, 1996.

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moderno, base da formação de territórios estatais-nacionais do século XIX, se


reconhecem como formações históricas – como formatos de articulação dos processos
sociais vinculados a intervenções humanas nos lugares, buscando seu ordenamento-,
e espaços de dominação política que consagram princípios e conceitos, como, o da
soberania (a indivisibilidade do poder no espaço), a soberania popular (governo deve
expressar a vontade geral), a população (conjunto de habitantes de um território), o
povo (população dotada de direitos de cidadania), a nação (expressão política do
povo) e a pátria (expressão geográfico de um povo) . Assim, se consagra a definição
de território como sendo, ao mesmo tempo, uma referência objetiva e física da
construção da identidade, aglutinador de interesses em pleitos territoriais e ameaças
de soberania, e como construção simbólica vinculada a um imaginário territorial. O
território é, assim, uma construção e projeto militar, político, econômico, jurídico e
ideológico.
Ao analisar as formações coloniais, o autor pontua a importância de se
caracterizar que, nesse processo, há um centro difusor original (zonas de difusão) da
expansão territorial e uma periferia a ser conquistada (região colonial), assimilada e/ou
destruída, na lógica de subordinação à metrópole colonial. No entremeio desses dois
polos há fronteiras de ocupação em movimento e áreas de trânsito sem ocupação
perene, sem ocupação consolidada. Os territórios coloniais como empreendimentos
econômicos (pois que muitas vezes a colonização foi levada a cabo por companhias
privadas), interessados em fundos territoriais a serem mobilizados na lógica de retorno
lucrativo do empreendimento, configuram-se como que voltados para fora, articulando
os lugares de produção à drenagem do comércio internacional via portos. Surge nessa
urdidura a figura dos Estados de formação colonial como fatos históricos, que
assimilam como heranças as estruturas econômicas, políticas e culturais do período
colonial, e mesmo depois das emancipações políticas, chamadas de “negação com
assimilação”, nos deixa como rastro, no contexto periférico pós-colonial,

(...) a sobrevivência de relações muito assimétricas, herdadas da


organização colonial, torna difícil falar em vontade geral nestas
sociedades, onde vigoram formas de trabalho compulsório e
impedimentos sociais extraeconômicos. Em tais sociedades, o povo
não abarca a totalidade da população do país, pois ali vigoram regras
de exclusão na distribuição dos direitos de cidadania. Enfim, a
legitimação do Estado emerge como problemática nestes contextos
(MORAES, 2002, p. 93).

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O autor retoma o mito do bandeirante “aventureiro, corajoso e


desbravador”, para dizer que a história do Brasil tem sido concebida como um espaço
cuja apropriação, seu projeto nacional, legitima a ação do Estado desde o início, com
a tarefa de defesa da soberania sobre fundos territoriais, tendo como meta a
ocupação. A conquista territorial reforça a dialética da dependência e subordinação
que se expressa na máxima: a construção de um Estado para defender seu território e
não seu povo. E, após o momento histórico colonial, o Estado ainda se vê com as
dificuldades de ser periférico, a questão territorial, pois que se submete ao controle
dos países centrais na adaptação constante de seu território (modernizações) aos
requerimentos técnicos postos pelos padrões de acumulação internacional.
As ideologias geográficas, como embasamentos discursivos dos projetos
nacionais no contexto brasileiro, desde José Bonifácio e sua proposta de construção
de uma nacionalidade não-escravista, repousam na ideia de se construir um país, e o
próprio Estado, para dar coesão às elites e seus pleitos. E nesse propósito, caminhar
para implantar uma organização espacial que refletisse duas aspirações e projetos: de
se criar uma civilização e se postular a modernização. Assim perpassam gestões
coloniais, a monarquia, a república, o Estado novo, o Plano de metas e o governo
militar autoritário, cada qual com uma perspectiva sobre a ocupação e a
(re)organização do território (instalação e disposição/remodelagem de objetos
técnicos), e o que se fazer com seus recursos naturais (fundos territoriais) e seu povo
(abandono, violência, tutela ou integração).
O discurso geográfico moderno associado ao Estado e os esforços de
centralização político também se manifestam no Brasil, tendo como marco a fundação
do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro), em 1838, quando a monarquia
postulava criar um centro da “Ilustração nos trópicos”, e indo além, se reflete em
diversos outros escritos literários, políticos, militares e histórico-geográficos. A ampla
base de referenciais bibliográficos do autor subsidia esse diálogo com o abstrato-
factual. Desse modo, o auto lembra da eficácia do aparelho escolar para divulgar uma
visão da geográfica com base nos princípios de soberania e indivisibilidade do poder
do Estado e dos indivíduos como membros de uma comunidade imaginada de
interesses. A Geografia escolar utilizada para justificar e legitimar uma certa
“naturalização” do território em encontro ao discurso de ordem social. No diálogo das
principais correntes geográficas com o contexto histórico brasileiro, busca-se o sentido
político e social do conhecimento geográfico, que não deve se apegar apenas às

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materialidades e concretudes, face o projeto de busca de construir por aqui uma


ordem capitalista de base nacional, onde se tem como herança a ordem política de
estilo oligárquico.
Nos capítulos finais, manifesta-se uma abordagem mais contemporânea,
ainda que contemplada pelo substrato da formação territorial, e se explora crítica de
dois temas muito caros ao debate atual: a questão ambiental (e sua interface das
políticas públicas) e a globalização. Nesse esforço de geograficizar os processos
históricos, o autor nos lega duas conclusões: 1) “Num país construído na apropriação
de espaços, a ideia de natureza como valor em si tem dificuldade de se enraizar nas
práticas sociais”. Expõe a dialética entre padrão colonial de ocupação (exploração) x
momento atual (valoração), em relação aos fundos territoriais (patrimônio natural); 2)
“O novo momento do capitalismo (modernidade globalizadora), ancorado num imenso
desenvolvimento tecnológico, não anulou a existência do centro e da periferia” e nem
a persistência de estruturas estatal-nacionais para manter a ordem política vigente e a
presença de classes sociais antagônicas. Ainda que se necessite de reajustes nas
formas de tratamento teórico, dentre as quais a própria dialética, a condição periférica
permanece como mediação básica para compreender “nosso lugar no mundo”
(MORAES, 2002, p. 194, 195-198).
A grande questão que a obra nos lega é a de pensar o Brasil como uma
construção, e os aportes conceituais e teóricos de matiz histórico-geográfica nos faz
ver essa processualidade de maneira mais evidente, mesmo âmbito de preocupação
de grandes leitores da história econômica espraiada em território brasileiro: Caio
Prado Jr. e Celso Furtado. O primeiro, nos lembra da visão que acompanhava a
marcha de ocupação do espaço, depois transformado em território colonial e território
estatal-político brasileiro:

(...)territórios que só esperavam a iniciativa e o esforço do homem. É


isto que estimulará a ocupação dos trópicos americanos. Mas
trazendo este agudo interesse, o colono europeu não traria com ele a
disposição de pôr-lhe a serviço, neste meio tão difícil e estranho, a
energia do seu trabalho físico. Viria como dirigente da produção de
gêneros de grande valor comercial, como empresário de um negócio
rendoso; mas só a contragosto, como trabalhador. Outros
trabalhariam para ele (PRADO JR, 1986, p. 56)

6 PRADO JR., C. História econômica do Brasil. 26ª. Ed. SP: Brasiliense, 1986.

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O segundo, na cunha da economia política (ainda que ambos embasados


em leituras historiográficas da implantação do modo de produção capitalista no Brasil,
como formação territorial), nos lembra da oportunidade econômica que a ocupação
das imensas terras do Brasil dava à coroa portuguesa, com esperanças de também
encontrar recursos metálicos de monta, e que fez da ocupação um projeto estatal de
construção de um território como unidade política, que viabilizasse a empresa colonial,
e não unidade cultural, que viabilizasse a formação de uma nação (FURTADO, 20057).
Posteriores processos e projetos ainda se fizeram acompanhados das heranças desse
período, não só materiais, como também imateriais (dos interesses, das elites, do
patrimonialismo estatal-territorial).
Esta obra “Território e história no Brasil” nos faz lembrar, sempre, da
importância do recorte histórico-temporal nas análises geográficas, e sobretudo
naquelas que se alicerçam no território para a abordagem de processos e fatos
sociais. Ainda que não se aprofunde sobre as territorialidades dos diversos grupos
sociais que fizeram do Brasil um mosaico multicor, e se detenha em uma visão de
cultura como discurso da/e sobre a materialidade do território (nega ou evita o valor
das individualidades e subjetividades), eis uma obra cujo valor se reconhece pela
profundidade analítica e não pelo número de páginas, e que nos faz lembrar, assim
como citou Saquet (2013)8, que o território não é um asno (MAGNAGHI, 20009, p. 50),
pois é consubstanciado pelos sujeitos, grupos e classes sociais vivendo,
historicamente, em interações, conflitos e disputas. Assim se fez o território brasileiro,
enquanto formação histórica e econômico-social, e assim continuará a se fazer, nos
lembra A.C.R Moraes, dadas as suas potencialidades (fundos territoriais, da
diversidade de seu povo) e limitações como formação colonial-periférica. Mas isso não
é destino, como em um determinismo histórico-social que nos legará ad eternun à
pobreza e ao atraso, mas um desafio que infelizmente ainda não superamos, o das
desigualdades como retrato no/do território.

Recebido em: 06/02/2015


Aprovado para publicação em: 31/07/2015

7 FURTADO, C. Formação econômica do Brasil. 32ª. Ed. SP: Cia. Editora Nacional, 2005.
8 SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial: continuando a reflexão. In: SAQUET, M. A. Estudos
territoriais na ciência geográfica. SP: Outras expressões, 2013.
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MAGNAGHI, A. Il projeto locale. Torino: Bollati Boringhieri, 2000.
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