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KLEBER HENRIQUE FACCHIN

A FUNÇÃO SOCIAL DO TABELIONATO DE


PROTESTO NO DOMÍNIO DA ECONOMIA
CONTEMPORÂNEA

RIO DE JANEIRO
2015
KLEBER HENRIQUE FACCHIN

A FUNÇÃO SOCIAL DO TABELIONATO DE


PROTESTO NO DOMÍNIO DA ECONOMIA
CONTEMPORÂNEA

Monografia apresentada ao Grupo Educacional


Cianni / UCAM, como requisito para a obtenção do
título de Especialista em Direito Notarial e Registral.
Orientadora: Prof. Flávia Viana.

RIO DE JANEIRO
2015
Apresentação da monografia em __/__/____ ao curso de Especialização em Direito
Notarial e Registral.

______________________________________________________________________________
Coordenador: Prof. Dr.

______________________________________________________________________________
Orientador: Prof. Dr.
DEDICATÓRIA

Dedico a minha futura esposa, FLÁVIA SUMAIO DOS REIS, minha amada Flavinha, cujo amor me

faz sonhar e viver, me preenche de sentido e me dá forças para seguir adiante, e por cujo amor eu me ponho de

pé a cada novo sol.

Aos meus pais VANDERLEI CARLOS FACCHIN e CACILDA BARUFFALDI FACCHIN, sem cuja

dedicação eu jamais teria chegado onde cheguei.


AGRADECIMENTOS

À minha FLAVINHA, que sempre esteve ao meu lado na minha caminhada acadêmica e

profissional, pelo constante e devotado companheirismo, pelo imenso carinho e pelo apoio incondicional que

dedicou aos meus projetos desde o vestibular para o curso de Direito até os sonhos mais altos, todos os dias das

nossas vidas.

Às nossas companheiras felinas, PHOEBE e CHANDLER, por iluminarem o lar em que vivemos com

a franca alegria que emana de seus gestos mais singelos e a mais profunda pureza que raríssimas criaturas são

capazes de conservar.

Aos meus pais VANDERLEI CARLOS FACCHIN e CACILDA BARUFFALDI FACCHIN, que se dedicaram

a mim desde a minha concepção e me proporcionaram todas as condições para que eu pudesse alçar o atual

patamar em que me encontro hoje, nutrindo em mim os valores da retidão e do trabalho e sempre me oferecendo

a melhor educação que pudessem oferecer. À minha avó LEONEIDE CÓRDOBA BARUFFALDI, que igualmente

zelou por mim desde os meus primeiros passos, suportando a minha ausência com serena compreensão.

A todos que estiveram ao meu lado e, cada um à sua maneira, contribuíram para possibilitar a

realização deste projeto.


RESUMO

Contemporaneamente, o crédito assumiu um papel de destacado relevo na matriz da economia capitalista. Com o
condão de adiantar a realização dos anseios de consumo, propulsionou a ampliação da demanda e tornou-se força
motriz do modo de produção. Ocorre que a concessão irrefreada de créditos, tomados sem o devido
planejamento, desaguou num mar de inadimplência, cujas consequências se estendem desde a insegurança do
mercado até as bases da produção. A generalização da inadimplência fragiliza a economia e traz ônus para todos
que dela participam. Diante disso, patente a necessidade de instituir formas de controle do crédito e contenção da
inadimplência, a Lei 9.492/97 deu novo horizonte à função dos tabelionatos de protesto, ampliando o alcance de
sua publicidade e conferindo-lhe distinta eficácia como instrumento hábil para intentar a recuperação de créditos.
Com esta configuração, o protesto ganhou novos contornos, recuperando substancialmente a segurança das
relações jurídicas estabelecidas no mercado, a confiabilidade do ambiente negocial e a probabilidade de
cumprimento das obrigações pecuniárias firmadas em títulos de crédito e outros documentos de dívida. Com
isso, o protesto contribuiu para a redução objetiva das perdas dos credores, inclusive as pequenas empresas que
dependem do recebimento de seus créditos para saldarem as próprias dívidas e fazerem os reinvestimentos
necessários para enfrentar a crescente concorrência. Reflexamente, diminuem os riscos da atividade mercantil,
desonerando em cadeia os valores que tais riscos agregavam aos preços das mercadorias, além de levar à queda
nas taxas de juros, tornando o crédito mais a acessível às empresas que dependem dele para fazer os
investimentos necessários para parear a concorrência e permanecer no mercado. Tendo em vista a relevante
repercussão social promovida pelos efeitos do protesto na economia, emerge a concepção de uma função social
dos tabelionatos de protesto no domínio da economia contemporânea, identificando o protesto de títulos e
documentos como vetor fundamental para o desenvolvimento de uma economia mais sólida e sustentável, dentro
dos moldes do que prevê a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no título dedicado à Ordem
Econômica e Financeira.

Palavras-chave: Tabelionato de protesto. Economia. Função social.


ABSTRACT

Contemporaneously, the credit system seized a paper of highlighted importance on the matrix of capitalist
economy. With the power to advance the realization of consumption aspirations, it propelled the growth of
consumer demand and became the driving force of production. Besides, the unbridled lending of credit, taken
without proper planning, flowed in a sea of defaulting, whose consequences extend from the insecurity that
spreads in the market until the bases of production. The widespread of defaulting weakens the economy and
burdens all its parts. Thus, due to the highlighted need to establish forms of credit control and containment of
defaulting, the Law 9.492/97 gave new horizon to the function of notarial protest, extending the reach of its
publicity and enabling it as an effective instrument for seeking the recovery of credits. With this configuration,
the protest gained new contours, sponsoring a substantial recovering from the security of legal relations
established in the market, the reliability of the business environment and the likelihood of fulfillment of financial
obligations signed into credit titles and other debt documents. Thus, the protest contributed to the objective
reduction of the losses of creditors, including small businesses that rely on receiving their credits to pay their
own debts and make the necessary reinvestments to face increasing competition. Reflexively, it decreases the
risks of commercial activity, relieving progressively the values aggregated by such risks to goods’ prices. It still
leads to lower interest rates, making credit more accessible to companies who depend on it to make the necessary
investments to pair competition and stay in business. Before the significant social impact promoted by the effects
of protest in the economy, emerges the concept of a social function of notarial protest in the field of
contemporary economy, identifying the protest of credit titles and documents as a fundamental vector for the
development of a stronger and sustainable economy, within the outlines given by the Constitution of the
Federative Republic of Brazil, from 1988, in the title dedicated to the Economic and Financial Order.

Keywords: Notary of protest. Economy. Social function.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 8

2. PROPOSIÇÃO .................................................................................................................. 12

3. REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................ 14

4. DISCUSSÃO ...................................................................................................................... 19

4.1 O protesto de títulos e documentos de dívida e seu papel em relação ao crédito ...... 21

4.1.1 Finalidades e efeitos do protesto ................................................................................. 24

4.1.1.1 Finalidade objetiva .................................................................................................... 24

4.1.1.2 Finalidade subjetiva .................................................................................................. 26

4.1.1.3 Efeitos legais subjacentes do protesto ..................................................................... 29

4.1.1.3.1 Efeito moratório ....................................................................................................... 30

4.1.1.3.2 Efeito de interrupção da prescrição .......................................................................... 31

4.1.1.3.3 Efeito de fixação do termo legal da falência ............................................................ 32

4.1.1.3.4 Efeito da publicidade ............................................................................................... 32

4.1.1.4 Efeitos sociológicos do protesto ................................................................................ 33

4.2 Reflexos relevantes do protesto e sua função social na economia de mercado .......... 37

4.2.1 Prevenção da inadimplência no mercado .................................................................. 37

4.2.2 Restrições ao crédito para evitar a elevação dos preços ao consumidor ................. 38

4.2.3 Preservação das pequenas empresas .......................................................................... 40

4.2.4 Diferença entre os tabeliães de protesto e as entidades de proteção ao crédito ..... 46

5. CONCLUSÃO ................................................................................................................... 49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 55


8

1. INTRODUÇÃO

Nunca antes na história o crédito teve um papel tão marcante como o que ocupa

hoje, na fase atual do capitalismo. Com efeito, se outrora os títulos cambiais representavam

um meio para facilitar o trânsito de valores monetários, atualmente a finalidade precípua de

sua emissão é o adiantamento de valores ainda não logrados pelos beneficiários do crédito, os

quais se tornam devedores daqueles que concedem o adiantamento.

A sociedade contemporânea se distingue claramente pelo imediatismo com que

exige a realização de seus propósitos e, neste contexto, o crédito assume o condão de

viabilizar este anseio. Nos dizeres de Zygmunt Bauman (2010, p. 12):

Nos velhos tempos [...] era preciso adiar a satisfação [...]: apertar o cinto,
privar-se de certas alegrias, gastar com prudência e frugalidade, colocar o
dinheiro economizado na caderneta de poupança e ter esperança, com
cuidado e paciência, de conseguir juntar o suficiente para transformar os
sonhos em realidade. [...] Com um cartão de crédito, é possível inverter a
ordem dos fatores: desfrute agora e pague depois! Com o cartão de crédito
você está livre para administrar sua satisfação, para obter as coisas quando
desejar, não quando ganhar o suficiente para obtê-las.

É claro que, embora Bauman destaque “o cartão de crédito” como meio de

adiantar a satisfação instantânea de desejos consumistas, o mercado conta com inúmeras

formas por meio das quais se promove o adiantamento de valores, constituindo créditos.

Dentre elas, há duas espécies que interessam particularmente à presente pesquisa: os títulos de

crédito e os documentos de dívida.

Diante disso, não há dúvida de que muitos títulos de crédito são postos em

circulação e muitos documentos de dívida são firmados todos os dias, com o compromisso de

se efetuar o pagamento, a certo termo, de uma determinada quantia.


9

O problema é que a concessão facilitada de créditos implica na contração de

compromissos creditícios sem a devida prudência e o devido planejamento, de sorte que,

muitas das vezes, a capacidade financeira para adimplir as obrigações depende de fatores

aleatórios. Com isso, inevitavelmente, várias dívidas terminam inadimplidas.

Bem como infere Bauman (2010, p. 19), “hoje, ingressar nessa condição [de

endividamento que se autoperpetua pelos seus encargos] é mais fácil do que nunca antes na

história da humanidade, assim como escapar dessa condição jamais foi tão difícil”.

Conforme ilustra a “pesquisa nacional de endividamento e inadimplência do

consumidor”, realizada pela Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio de

Bens, Serviços e Turismo (Dez. 2014), no mês de dezembro de 2014, 59,3% das famílias

entrevistadas tinham dívidas a pagar, sendo que 18,5% estavam com suas dívidas atrasadas e

5,8% afirmaram que não teriam condições de pagar.

Considerando que mais da metade dos entrevistados se utiliza de crédito,

ajustando o pagamento de suas contas para o futuro, que aproximadamente uma em cada

cinco famílias tem dívidas em atraso e que a cada vinte famílias, existe pelo menos uma que

não pagará as contas que fez, os números são preocupantes.

Acrescenta-se a isso o fato de que a economia contemporânea vem

experimentando uma crise de proporções globais, agravando as dificuldades econômicas de

todos os sujeitos que interagem no mercado, cujas finanças dependem da vitalidade das

condições de reprodução do capital.

Evidentemente, a inadimplência provoca intensa instabilidade no ambiente

mercantil, drenando a vitalidade das relações cambiais. Afinal, os credores que não recebem

suas dívidas terão mais dificuldade para adimplir seus próprios compromissos creditórios, o

que implica um ciclo vicioso de difícil superação.


10

A título de exemplo da instabilidade econômica que este modelo inflige ao

capitalismo, a reiteração da inadimplência a longo prazo implica no fechamento de diversas

empresas, especialmente as menores, como as microempresas, empresas de pequeno porte e

as cooperativas, causando impacto inflacionário na demanda efetiva por emprego, afunilando

as portas da livre iniciativa, solapando a concorrência perfeita e atentando contra o programa

constitucional de incentivo às pequenas empresas.

Outro fator relevante é a restrição do crédito disponível para a capitalização de

novas iniciativas, impossibilitando os investimentos necessários para a inclusão de pequenos

empreendimentos no plano concorrencial do mercado.

Além disso, quanto mais generalizada a inadimplência, menor o nível de

segurança das relações estabelecidas no mercado, vale dizer, maiores os riscos dos

empreendimentos, pois toda transação estaria sujeita ao inadimplemento das obrigações

assumidas. Em decorrência disso, as margens de sobrevalor embutidas no preço final são

inflacionadas, onerando o consumidor.

Diante disso, é imprescindível que hajam meios suficientemente eficazes para

inibir a inadimplência, aos quais os credores lesados possam recorrer para exigir seus créditos

vencidos. Mais que isso, aliás, o crescente dinamismo nas relações mercantis demanda uma

via célere para intentar a recuperação dos créditos e combater a prática da inadimplência,

resguardando o mercado contra a reincidência dos mesmos devedores inadimplentes e

aumentando a segurança jurídica.

Com efeito, sem qualquer dúvida, o protesto satisfaz muito bem tais condições,

pois se trata de um procedimento célere, seguro e eficaz, cujo procedimento possibilita a

recuperação dos créditos e cuja natureza garante a publicidade das obrigações inadimplidas.

Bem como ensina Sérgio Luiz José Bueno (2013, p. 61):


11

[...] a quem está na iminência de conceder crédito a outrem deve ser


assegurado o direito de conhecer a precedente conduta daquele que está para
ser beneficiado. [...] Assim, é fato que o protesto tem o legítimo efeito de
gerar o abalo no crédito do devedor, e é esse um dos principais fatores que
levam a altos índices de satisfação da obrigação [...].

Neste sentido, fazendo um exame atido do alcance que os efeitos do protesto têm

sobre a sociedade e sobre a economia, este trabalho buscará demonstrar a existência de uma

função social dos tabelionatos de protesto no domínio da economia contemporânea.


12

2. PROPOSIÇÃO

A história demonstra que para manter a dinâmica capitalista é necessário

promover mudanças estratégicas no esquema de produção e no mercado, reinventando os

modos de reprodução de capital.

A expansão do crédito – não só quantitativa mas também qualitativa – representou

uma estratégia fundamental para a manutenção do sistema econômico em um contexto de

estagnação dos campos de exploração capitalista. E, por sua vez, esta mudança paradigmática

na maneira de pensar o capital financeiro transformou substancialmente as bases do modo de

produção.

Logo, diante da atual crise no programa de crédito, a manutenção da economia

requer o desenvolvimento de mecanismos aptos a restituir a confiabilidade nas relações

mercantis.

Em virtude dos atributos que o caracterizam, o protesto notarial – isto é, aquele

efetivado pelo tabelião –, desponta como excelente ferramenta para enfrentar os problemas

inerentes à circulação de crédito no mercado. Afinal, o protesto é uma via segura e legítima de

compelir o devedor a satisfazer sua obrigação com o credor, assim como é a via jurisdicional.

Mas, enquanto a via jurisdicional padece de problemas estruturais que levam à morosidade

dos processos de execução, o protesto se erige sobre o princípio da celeridade, possibilitando

uma solução rápida ao credor.

Outrossim, o protesto faz parte do sistema brasileiro de registros públicos. Logo,

os títulos e documentos de dívida que estejam protestados estão sujeitos ao princípio da

publicidade, podendo qualquer interessado requerer certidão ao tabelionato, da qual constarão

todos os títulos protestados, no período mínimo que compreende os últimos cinco anos

anteriores à data do pedido de certidão. Além do mais, a própria Lei 9.492 de 1997 estabelece
13

que “os cartórios fornecerão às entidades representativas da indústria e do comércio ou

àquelas vinculadas à proteção do crédito, quando solicitada, certidão diária, em forma de

relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos” (Art. 29, Lei 9.492/97).

Com isso, por meio da publicidade que dimana do protesto notarial, o tabelionato

de protesto contribui para a proteção do sistema de créditos, permitindo restringir a concessão

àqueles que tiveram protestado título ou documento de dívida no qual figuravam como

devedores, conferindo maior segurança a todo o mercado creditício.

Ao longo deste trabalho, pretende-se corroborar a existência de uma função social

dos Tabelionatos de Protesto de Títulos e Documentos, demonstrando a sua importância como

ferramenta para possibilitar o recebimento de obrigações inadimplidas, aumentar a

confiabilidade nas relações mercantis, reduzir os riscos dos negócios jurídicos e ajudar a

construir uma economia mais sólida e sustentável.


14

3. REVISÃO DE LITERATURA

Historicamente, a função ortodoxa do protesto é comprovar a o inadimplemento

do devedor principal de um título vencido. Eis que, conforme se extrai das lições de Fábio

Ulhoa Coelho (2015, p. 301), na seara do direito cambiário, o protesto é visto como mera

condição de exigibilidade do crédito contra os coobrigados (i.e., o sacador e endossantes).

Quer dizer, se o credor intenta exigir dos coobrigados o crédito do qual é titular, deverá

providenciar o protesto dentro do prazo legal.

Ocorre que atualmente o protesto transcende esta função, meramente

comprobatória, para a qual fora criado a priori. Em primeiro lugar, por funcionar como meio

eficaz de recuperar os créditos. Visto que o procedimento se inicia com a intimação do

devedor, isto lhe possibilita quitar sua dívida e obstar o protesto.

Contudo, é certo que se os devedores ignorassem a consequência de terem

protestados os títulos em que assumiram as obrigações ora exigidas, mantendo-se

inadimplentes, o protesto se revelaria uma medida vã com relação ao intuito de recuperar

créditos vencidos.

Neste sentido, a fim de verificar a eficácia do protesto enquanto meio de recuperar

créditos materializados em títulos e documentos de dívida, especificamente no estado de

Minas Gerais, Helton de Abreu e Simone Eberle (apud GARCIA, 2013, p. 77) fizeram um

levantamento dos títulos levados a protesto entre 2007 e 2011, por amostragem de 39 dos 297

tabelionatos de protesto do estado mineiro.

Conforme ficou constatado ao final da pesquisa, de todos os títulos levados a

protesto, cerca de 80% tiveram sua situação resolvida, satisfazendo a intenção do credor de

receber o que lhe era devido, com um índice que varia entre 65% a 90%, isto sem nunca

atingir percentuais menores que 50%, ainda que considerados somente os títulos pagos ou
15

retirados dentro do período de três dias, antes do protesto ser lavrado (ABREU; EBERLE

apud GARCIA, 2013, pp. 77-78).

No mesmo sentido, Reinaldo Velloso dos Santos, 3º Tabelião de Protesto de Letras

e Títulos de Campinas, estado de São Paulo, em sua tese de mestrado, relata o elevado índice

de eficácia na recuperação de créditos, com relação aos títulos e documentos de dívida

apresentados no tabelionato de cuja delegação é titular, apontando que, entre os anos de 2005

e 2011,

[...] houve resultado positivo, no tríduo, em 58,10% dos casos. E, dentre os


protestos lavrados, 30,73% foram cancelados no prazo de cinco anos, sendo
que expressivo percentual de cancelamentos refere-se ao período de até dois
anos após a lavratura do protesto. Ou seja, 70,89% dos títulos sem
irregularidade formal apresentaram resultado positivo no tríduo ou no prazo
de cinco anos. (SANTOS, R.V., 2012, p. 182)

Assim, conforme salienta Garcia (2013, p. 79), “o instituto do protesto já se

consolidou como uma alternativa extrajudicial de recuperação de crédito, função que foi

sendo, progressivamente, legitimada pelo uso que a sociedade fez do instituto”.

Diante do exposto, é inegável que o protesto tem plenas condições de oferecer

proteção adequada, consideravelmente ampla e notadamente eficiente, ao crédito constituído

em títulos de crédito e documentos de dívida.

Não foi à toa que, atento às potencialidades do protesto cambiário, o legislador, ao

editar a Lei 9.492, em 1997, ampliou a abrangência dos documentos passíveis de protesto,

incluindo a possibilidade de levar a protesto não somente títulos de crédito, mas também

outros documentos de dívida. Nas palavras do tabelião de protesto Sérgio Luiz José Bueno 1

(2013, p. 31), “nascido como figura integrada exclusivamente ao universo cambiário, hoje o

1 1º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos de São José de Rio Preto, estado de São Paulo.
16

protesto, no atendimento das necessidades sociais e econômicas, [...] passou a ser admitido

em relação a outros documentos de dívida”.

Outra circunstância que leva o protesto para além da função para a qual foi

tradicionalmente instituído é a ampliada envergadura da sua publicidade. Atualmente, o

tabelionato de protesto trabalha em colaboração “às entidades representativas da indústria e

do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito”. Em consonância com o artigo 29

da Lei 9.492/97, os cartórios deverão lhes fornecer “quando solicitada, certidão diária, em

forma de relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos”.

Em decorrência desta parceria, o protesto passou a ter “o legítimo efeito de gerar o

abalo no crédito do devedor, e é esse um dos principais fatores que levam a altos índices de

satisfação da obrigação” (BUENO, 2013, p. 61).

Significa dizer que, devido às restrições que a publicidade do protesto impõe ao

devedor na consecução de créditos no mercado, os devedores cujos títulos são apresentados

para protesto tendem a satisfazer as obrigações até então inadimplidas.

Vale lembrar que inúmeras vezes os credores são pequenas empresas que

dependem do recebimento de seus créditos para conservar sua capacidade financeira e

conseguir sobreviver ao mercado. Tal como observa Bueno (2013, p. 61), “muitas vezes quem

concede o crédito é o pequeno comerciante, que para sobrevida de seu negócio depende que a

dívida seja honrada”.

Destarte, o protesto também tem sua relevância pautada pelo aporte que

proporciona às empresas, especialmente as mais modestas, colaborando para que permaneçam

em atividade, e, por consequência, constituindo fator relevante para a realização de sua função

social na economia.

Entrementes, importa ressaltar que os efeitos da publicidade não se encerram na

impulsão do devedor à satisfação das suas obrigações, alcançando a preservação de uma


17

economia de mercado saudável, aliviando os riscos oriundos da inadimplência desenfreada.

Afinal:

[...] com a remessa das certidões em forma de relação às entidades de


proteção ao crédito e com a multiplicação de bancos de consulta gratuita
disponibilizados pelos próprios Tabeliães de Protesto, por meio das entidades
que os agrupam [...], a existência de protesto não cancelado em nome de
determinada pessoa, muito provavelmente, acarretará a ela restrições
creditícias, [assegurando] a quem está na iminência de conceder crédito [...]
o direito de conhecer a precedente conduta daquele que está para ser
beneficiado. (BUENO, 2013, p. 61)

Ora, ao possibilitar aos concedentes de crédito consultar a conduta pregressa dos

potenciais beneficiários da concessão creditícia, o protesto viabiliza um controle sobre a

circulação do crédito no mercado. Assim, estabelece maior segurança nas relações mercantis.

Consoante entende Fabio Fioruci (apud SANTOS, R.V., 2012, p. 176), a publicidade do

protesto faz parte de um sistema de informações que protege o direito subjetivo dos terceiros,

atendendo a interesse público da sociedade.

Reinaldo Velloso dos Santos (2012, p. 177) conclui assinalando que, no contexto

mercantil, “a publicidade do protesto gera importantes efeitos macroeconômicos, reduzindo a

assimetria de informação e, com isso, facilita a realização de negócios, pela mitigação do

risco do credor”.

E, evidentemente, uma vez que “a falta de meios adequados para a exigência das

obrigações [...] também onera o crédito, com a imposição de taxas de juros maiores”

(SANTOS, R.V., 2012, p. 177). A contrario sensu, ao reduzir os riscos dos credores – sejam

eles os responsáveis por conceder o crédito –, com instrumentos eficazes de recuperação de

créditos, como demonstram ser os tabelionatos de protesto, contribui-se para desonerar as


18

taxas de juros e, considerado o funcionamento sistêmico do mercado, desoneram-se os preços

finais que são pagos pelo consumidor.


19

4. DISCUSSÃO

Antes de qualquer coisa, para que as conclusões ulteriores sejam inteligíveis, é

necessário investigar se, de fato, o crédito possui efetiva relevância na economia

contemporânea.

Pois bem. Conforme leciona Zygmunt Bauman (2010, pp. 9-10), “a força do

capitalismo está na extraordinária engenhosidade com que busca e descobre novas” fontes de

exploração, perpetuando a reprodução do capital.

Neste diapasão, é evidente que a inserção crédito no protagonismo da matriz

econômica causaria mudanças estruturais no mercado, o que de fato ocorreu. Com a expansão

do crédito, tornou-se possível o consumo de mercadorias antes inacessíveis às faixas mais

pobres da população.

Segundo Celso Furtado (apud FERREIRA; LIMA, 2014, p. 63), configura-se no

Brasil um padrão de “consumo mimético em função de as classes mais pobres tentarem imitar

os padrões das classes mais abastadas, haja vista o acesso a inúmeras alternativas de crédito”.

Mais afundo, observa-se que a sociedade conserva distinções entre as pessoas

segundo a capacidade de consumo que ostentam pela exibição de suas posses, marginalizando

os indivíduos que não se enquadrem nas condições impostas pela mídia e pelo senso comum.

Diante desta realidade, a expectativa de inclusão social funda no espírito dos membros da

sociedade um insaciável anseio consumista.

De acordo com a filosofia de Zygmunt Bauman (1989, p. 73), “o capitalismo [...]

abre à liberdade uma esfera de vida social enorme, se não decisiva: a produção e distribuição

de bens destinados à satisfação das necessidades humanas”. E, continua explicando ele:

[...] o capitalismo trouxe um tipo de sociedade onde o modelo de vida da


livre escolha e da auto-afirmação pode ser praticado numa escala nunca
20

antes conhecida. Este, porém, é um desenvolvimento intimamente ligado à


substituição da competição pela riqueza e poder pela concorrência simbólica;
[...] A propagação da energia libertada por indivíduos livres
empenhados na concorrência simbólica, aumenta a procura de produtos
da indústria até níveis sempre crescentes, e emancipa eficazmente o
consumos de todos os limites “naturais” definidos pela capacidade de
“necessidades materiais” – aquelas capacidades que requerem bens apenas
como “valores utilitários”. (BAUMAN, 1989, p. 99, grifo nosso)

Dentro deste contexto, por ora ignorando-se o problema decorrente da assunção

de dívidas sem condições apropriadas para solvê-las, o fato é que este fenômeno impulsionou

a produção a um nível astronômico. Afinal, com a expansão do crédito, sob o domínio do

desejo consumista, o mercado consumidor tende a se valer de todos os meios disponíveis para

participar do mercado de consumo.

Com esta breve análise do mercado consumidor, fica claro que o crédito exerce

função essencial na dinâmica do capitalismo, na sua fase atual. Indo adiante, importa

examinar a relevância do crédito na senda da atividade produtiva.

Pois bem. A marcante substitutividade que passou a caracterizar os bens de

consumo é, nitidamente, um dos principais fatores responsáveis pelo aumento da demanda e,

consequentemente, da produção de mercadorias. Assim, para funcionar em sua plena

capacidade produtiva, a indústria precisa renovar sua oferta segundo a demanda.

Do outro lado, influenciado pelas artimanhas publicitárias e pelas tendências da

moda, o consumidor demanda constantes renovações com as quais seja possível reforçar os

caracteres distintivos da sua personalidade montada, ostentada pelas mercadorias consumidas,

além de incrementar sua posição na concorrência simbólica.

Eis que, devido à grande volatilidade do mercado, as empresas precisam renovar

constantemente seu portfólio de produtos, modernizar os desenhos industriais, atualizar as

tecnologias de produção e informação empregadas no processo produtivo, dentre tantas


21

estratégias administrativas indispensáveis para manter a empresa no mercado, com condições

de paridade concorrencial. Obviamente, tudo isso requer novos investimentos e, muitas das

vezes, sobretudo quando se trata de pequenas empresas, o capital necessário advém de

concessões de crédito.

Por todo o exposto, resta patente que o crédito desempenha um papel fundamental

para o funcionamento deste complexo mecanismo produtivo que move a economia

contemporânea.

4.1 O protesto de títulos e documentos de dívida e seu papel em relação ao

crédito

Ao identificar no crédito um novo campo encontrado pelos economistas para

renovar as potencialidades de investimento e lucratividade, Bauman (2010, p. 12) observa

que:

A introdução dos cartões de crédito foi um sinal do que viria a seguir. Foram
lançados "no mercado" cerca de 30 anos atrás, com o slogan exaustivo e
extremamente sedutor de "Não adie a realização do seu desejo". [...] Com
um cartão de crédito, é possível inverter a ordem dos fatores: desfrute agora
e pague depois! Com o cartão de crédito você está livre para administrar sua
satisfação, para obter as coisas quando desejar, não quando ganhar o
suficiente para obtê-las.

Certamente, os cartões de crédito operaram uma revolução no sistema de

concessão de créditos, especialmente devido à sua grande praticidade, viabilizada pela

inovação tecnológica. Contudo, a utilização de crédito nas transações comerciais não se limita

aos cartões de crédito nem aos moderníssimos meios eletrônicos de e-commerce. Até os dias
22

de hoje, os títulos de crédito representam um elevado contingente das transações creditícias

realizadas no mercado.

Em suma, os títulos de crédito são documentos que formalizam um acordo entre

partes, sendo que uma das partes assume voluntariamente a obrigação de pagar determinado

valor a certo tempo. Na definição de Fábio Ulhoa Coelho (2015, p. 272), os títulos de crédito

podem ser distinguidos pela “sua essencialidade de instrumento representativo da obrigação”.

Embora em regra os títulos de crédito tenham origem mercantil, eles podem ter

origens diversas, tais como, por exemplo, um contrato de aluguel em que o locatário,

comprometido a ficar no imóvel locado pelo período mínimo de doze meses, firma uma nota

promissória no valor da anualidade, com natureza de caução, a fim de garantir o cumprimento

do que foi estabelecido no contrato.

Coelho (2015, p. 271) cita o exemplo de uma obrigação oriunda de um acidente

automobilístico em que o causador do dano reconheça sua responsabilidade e concorde com a

parte lesada sobre o valor a ser pago, a título de indenização pelos danos causados. Assim

sendo, “se devedor e credor estiverem de acordo quanto à existência da obrigação e também

quanto à sua extensão (o valor da indenização devida), esta pode ser representada por um

título de crédito – cheque, nota promissória ou letra de câmbio, no caso” (COELHO, 2015, p.

271).

Insta salientar, entretanto, que os títulos de crédito, oriundos de uma relação

jurídica, não se confundem com a própria relação jurídica. Nas palavras de Fábio Ulhoa

Coelho (2015, p. 271), “os títulos de crédito são documentos representativos de obrigações

pecuniárias. Não se confundem com a própria obrigação, mas se distinguem dela na exata

medida em que a representam”. Ou seja, os títulos de crédito são documentos que constituem

uma obrigação pecuniária autônoma, na literalidade dos termos nele escritos.


23

O descumprimento de quaisquer obrigações – pagar, aceitar ou devolver,

conforme estejam previstas em lei para cada título de crédito – contidas em um título de

crédito justifica o protesto do título. Nos termos da Lei de Protesto, “o protesto será tirado por

falta de pagamento, de aceite ou de devolução” (Art. 21, Lei 9.492/97).

Objetivamente, o protesto serve para comprovar, formal e solenemente, “a

inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de

dívida” (Art. 1º, Lei 9.492/97). Assim, o protesto tem um vínculo umbilical com os títulos de

crédito, pois sua existência se funda na necessidade de fazer prova do descumprimento de

obrigações inadimplidas dos títulos de crédito.

Demais disso, o legislador da Lei 9.492 de 1997 optou por ampliar a competência

do protesto, abrindo campo para a protestabilidade de “outros documentos de dívida”,

expressão esta que, segundo a doutrina majoritária, abrange os demais títulos executivos,

arrolados pelo Código de Processo Civil de 1973 em seu artigo 585.

O tabelião de protesto de títulos e doutrinador Sérgio Luiz José Bueno (2013, p.

82) assevera que na normatização paulista, estabelecida pela Corregedoria Geral da Justiça do

estado de São Paulo para os tabeliães deste estado-membro, “são considerados documentos de

dívida os títulos executivos, desde que líquidos, certos e exigíveis”.

Extensivamente, Bueno (2013, p. 85) defende que, mediante a avaliação de cada

caso singular pela Corregedoria Geral da Justiça, seria possível o protesto de documentos não

tachados de títulos executivos, mas que satisfaçam as condições para executividade do artigo

580 do Código de Processo Civil de 1973: liquidez, certeza e exigibilidade.

Levando em conta este entendimento, Bueno (2013, p. 86) conclui sua reflexão

postulando que, para fins de interpretação da Lei de Protesto, “documento de dívida é todo

título executivo (judicial ou extrajudicial) ou outro documento cujo protesto seja permitido

por lei ou por norma regulamentar”.


24

Portanto, todo sujeito que houver concedido créditos consubstanciados por títulos

de crédito ou documentos de dívida, com relação aos quais haja recusa no aceite ou falta de

devolução dos títulos – nos casos da letra de câmbio e da duplicata2 – ou, enfim, a falta de

pagamento conforme acordado no título ou documento, este credor poderá recorrer ao

protesto, nos termos do artigo 21 da Lei 9.492/97.

4.1.1 Finalidades e efeitos do protesto

A ampliação legislativa a priori quantitativa do protesto de títulos, estendendo sua

aplicação a outros documentos de dívida, demonstra a intenção do legislador de promover

uma extensão qualitativa deste instituto. Para Bueno (2013, p. 31), ao incluir o protesto dos

documentos de dívida, o legislador conferiu ao protesto desígnios mais abrangentes, como a

satisfação de obrigações e a prevenção de litígios.

Indubitavelmente, a Lei 9.492/97 e a evolução do entendimento sobre o protesto

abriram espaço para o desenvolvimento de sua utilidade para melhor atender a finalidades que

a princípio eram tidas por secundárias, tais como a publicização da inadimplência e a busca

pelo recebimento das dívidas.

Assim, importando decisivamente para a perquirição sobre a função social dos

tabelionatos de protesto, merece maior atenção o estudo das finalidades do protesto, bem

como dos efeitos que dele sejam decorrentes.

4.1.1.1 Finalidade objetiva

2 Para mais informações a este respeito, ver Sérgio Luiz José Bueno. Tabelionato de protesto. Coord.
Christiano Cassettari (col. Cartórios). São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 117-119.
25

Não é necessário muito esforço científico para conhecer a finalidade objetiva do

protesto. Para tanto, basta fazer um exame da Lei 9.492/97, buscando encontrar o escopo para

o qual o legislador dedicou este instituto.

Já no primeiro artigo da Lei 9.492/97, depreende-se que o objetivo do protesto –

logo, a sua finalidade objetiva – é a comprovação formal e solene do inadimplemento de uma

obrigação pecuniária originada em título de crédito ou outro documento de dívida.

Conforme delineia Sérgio Luiz José Bueno (2013, p. 28):

O termo de protesto trasladado para o respectivo instrumento prova o


descumprimento da obrigação cambiária, ou daquela materializada em
documento de dívida, sendo apto a demonstrar também a falta de aceite. [...]
O protesto especial para fins falimentares também tem a função de provar a
falta de pagamento no prazo (impontualidade) [...].

Destarte, consoante sua definição legal, pode-se dizer que o protesto tem por

finalidade precípua a realização de sua função probatória ou testificante, sendo esta a

finalidade objetiva primária do protesto.

Mais, acrescentando a este conceito a reserva de que o protesto “é tirado apenas

contra o devedor principal ou originário” (SANTOS, E.T.V., 2012, p. 119-20), tem-se que a

finalidade principal do protesto consiste em comprovar, formal e solenemente, que o devedor

principal não adimpliu obrigação expressa em título de crédito ou outro documento de dívida.

Uma vez constituída esta prova, legitima-se a exigibilidade do crédito contra os

demais coobrigados, abre-se a possibilidade para a decretação da falência pela

impontualidade, dentre outros atos jurídicos que pedem esta prova solene como precondição

para seu exercício.


26

Nesta esteira, Bueno (2013, p. 28) identifica que “a função do protesto é [...]

eminentemente probatória ou testificante, ainda que em alguns casos o ato se destine a

conservar direitos, como na hipótese do protesto necessário”.

Nos casos de protesto necessário, definido por Bueno (2013, p. 56) como aquele

em que o protesto é “ato indispensável para que o portador conserve determinados direitos”, a

lavratura do protesto constitui uma condição necessária para demandar a tutela jurisdicional

de certos direitos pertinentes ao título executivo.

Assim sendo, para além da comprovação do inadimplemento (função probatória),

a finalidade objetiva do protesto necessário é assegurar o direito de ação em relação a

determinados direitos derivados do título executivo. Por isso, a doutrina classifica que, ao

cumprir esta designação especial, o protesto desempenha uma função conservatória.

Além dela, também é possível identificar uma finalidade teleológica do protesto

no artigo 2º da Lei 9.492/97, qual seja o de garantir a “autenticidade, publicidade, segurança e

eficácia dos atos jurídicos”.

Conclui-se que o protesto visa, objetivamente, provar o inadimplemento de uma

obrigação materializada em título de crédito ou documento de dívida, conferindo

autenticidade, publicidade, segurança e eficácia aos atos que tangem a relação jurídica

estabelecida entre os sujeitos que figuram no título ou documento de dívida levado a protesto.

4.1.1.2 Finalidade subjetiva

Para além do seu escopo institucional, quando o apresentante leva a protesto um

título ou documento de dívida a protesto, ele o faz com um desiderato pessoal. Portanto, há

que se reconhecer, paralelamente à finalidade objetiva definida pelo legislador, a existência de


27

uma finalidade subjetiva, consistente na pretensão do apresentante que leva um título ou

documento de dívida a protesto.

Há três situações que devem ser consideradas para reconhecer a finalidade

subjetiva do apresentante, ou seja, sua expectativa com relação ao protesto. A primeira delas é

o protesto especial para fins falimentares. Neste caso, o protesto é requerido com a finalidade

especial de provar a impontualidade, visando ao preenchimento do requisito objetivo do artigo

94, inciso I, da Lei 11.101/2005 para, então, pedir a decretação da falência do devedor.

A segunda situação relevante para a investigação da finalidade subjetiva do

protesto é a hipótese de protesto necessário. Existem várias ocasiões em que o protesto é

imprescindível para que o portador possa exercitar algum direito relativo ao título. Uma delas,

enfatizada por Bueno (2013, p. 57) é a hipótese em que o protesto visa “possibilitar ao

portador do título o direito de regresso contra devedores indiretos”, salientando que caso um

dos devedores indiretos efetue o pagamento do título, torna-se de pronto seu portador e,

enquanto portador que é, deverá se sujeitar “às mesmas normas que impõem ao primeiro

(credor originário) o protesto necessário, caso pretenda exercitar seu direito de regresso”. Eis

que cita o seguinte exemplo:

João emite uma duplicata, tendo Antônio como sacado. Em seguida, a


endossa a Paulo, que lança novo endosso para José, e este, em última
transmissão, endossa a Rosa. São translativos os endossos. Pensemos nas
seguintes situações: Rosa pretende receber seu crédito. Se quiser voltar-se
contra João (sacador), Paulo ou José (coobrigados), o protesto é necessário.
Note-se que havendo ou não o aceite, o protesto se impõe. Imaginemos que,
instado, Paulo efetuou o pagamento a Rosa. Esse pagamento exonera José e,
para exercitar seu direito cambiário contra João, será preciso que ele (Paulo)
promova o protesto (necessário), haja ou não aceite. Mas se Rosa objetiva
ação contra Antônio (sacado) – e aqui já não se trata de direito de regresso,
duas hipóteses podem surgir: a) se há aceite, o protesto é facultativo; b) se
28

não há aceite expresso, o protesto é necessário (art. 15, II, a, da Lei n.


5.474/68). (BUENO, 2013, pp. 58-59)

Este exemplo serve para ilustrar quais são as pretensões dos titulares de direitos

cambiários quando procuram o serviço de protesto. Invariavelmente, o objetivo derradeiro de

qualquer credor é sempre receber o montante que lhe é devido. Todavia, nos casos de protesto

necessário, existe uma intenção imediata que é a de abrir caminho para a possibilidade de

ingressar com ação judicial contra determinados sujeitos da relação cambiária.

Assim, pode-se dizer que no protesto necessário, a finalidade subjetiva

inicialmente coincide com a finalidade objetiva do protesto necessário, isto é, a conservação

de direitos do portador. Nesta perspectiva, o protesto é apenas um meio extrínseco para que o

portador possa acessar o Judiciário e exigir judicialmente a recuperação de seus créditos.

Entretanto, o protesto, per si, pode funcionar como meio direto de recuperação

dos créditos. Aliás, de acordo com Reinaldo Velloso dos Santos (2012, p. 200), o protesto

“tem se revelado como um meio célere e eficaz para a recuperação de crédito”. De fato,

conforme já comentado alhures3, muitos casos terminam com o recebimento dos créditos

vencidos, dispensando a necessidade de buscar tutela jurisdicional.

O tabelião de protesto José Caros Alves (2014, p. 201) expressa seu entendimento

no sentido de que “o abalo no crédito sofrido por um devedor que tem um título ou

documento de dívida protestado é, inegavelmente, a consequência hodiernamente mais

desejada pelo credor”. Com efeito, nota-se que o abalo no crédito é o meio mais eficaz de

compelir o devedor a satisfazer sua obrigação. Logo, o desiderato maior do credor é que, a

fim de preservar a integridade de seu crédito no mercado, o devedor efetue o pagamento.

3 Vide pp. 15-16. Para mais informações, ver Reinaldo Velloso dos Santos. Apontamentos sobre o protesto
notarial. Dissertação de mestrado. Orientador: Mauro Rodrigues Penteado. São Paulo: USP, 2012, p. 182; bem
como Helton de Abreu e Simone Eberle apud Raquel Duarte Garcia. Protesto de títulos de créditos e
documentos de dívida como solução extrajudicial para recuperação e execução de créditos. Dissertação de
Mestrado. Orientador: Jean Carlos Fernandes. Nova Lima, MG: Faculdade de Direito Milton Campos, 2013, pp.
77-78.
29

Neste sentido Sérgio Luiz José Bueno (2013, p. 30) ressalta que, normalmente, o

que o apresentante tenciona quando procura o serviço de protesto de títulos e documentos é a

satisfação do crédito do qual é titular. Ademais, vale acrescentar, é facilmente inteligível que a

vontade última do apresentante que busca o protesto é sempre a recuperação de seus créditos,

mesmo que se valha do protesto para conservar direitos.

Certamente, também o tabelião de protesto espera que o crédito seja satisfeito,

pois esta seria a maneira mais segura de eliminar o litígio que repousava sobre a relação

jurídica subsistente por trás do título ou documento levado a protesto e, assim, conferir

eficácia e segurança jurídica aos atos jurídicos que permearam a assunção da obrigação ora

inadimplida.

Posto isso, não devem restar controvérsias de que a recuperação dos créditos seja

a pretensão mais comum relacionada ao protesto e, por isso, também se revela a finalidade

subjetiva de maior proeminência.

4.1.1.3 Efeitos legais subjacentes do protesto

Além do efeito probatório para o qual o protesto fora instituído, consoante artigo

1º da Lei de Protesto, outras leis, extravagantes ao protesto em si, se valem do protesto como

parâmetro para a tomada de providências ou para o desfecho de consequências legais.

Um dos casos em que o protesto aparece como condição legal é a recém citada

hipótese de requerimento da decretação de falência pela impontualidade do devedor, nos

termos do artigo 94, inciso I, da Lei 11.101/2005.

Feita a juntada dos instrumentos de protesto de “título ou títulos executivos

protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do

pedido de falência” (Art. 94, I, Lei 11.101/2005) ao respectivo processo, comprova-se a


30

impontualidade (função testificante: efeito natural do protesto) e fica autorizada a decretação

da falência, sendo este um efeito extrâneo ao protesto, mas decorrente de sua lavratura.

Quando o protesto é necessário para a conservação de direitos, pode-se apontar

também a ocorrência de um efeito legal subjacente, não previsto no conjunto das normas

relativas ao protesto, mas nas leis que tratam de cada título de crédito em espécie ou em

outros diplomas que estatuam exigência do protesto para autorizar um determinado ato

jurídico.

Elisabete Teixeira Vido dos Santos (2012, p. 119) adverte que

O protesto é obrigatório como requisito para o credor mover a ação judicial


pertinente: a) para suprir o aceite nos títulos cujo aceite era necessário (letra
de câmbio e duplicata); b) no pedido de falência por impontualidade (art. 94
da Lei 11.101/2005) e c) na execução contra os codevedores (endossante e
avalista).

Vale lembrar, conforme já dito anteriormente, que o rol das situações em que se

faz necessário o protesto não é um rol taxativo. Afinal, tais situações não estão

necessariamente previstas na legislação que trata do próprio protesto, mas incidentalmente em

leis esparsas.

Além dos resultados obtidos com o protesto quando ele perfaz condição

necessária para o desenrolar de atos e efeitos jurídicos, o protesto de um título de crédito ou

documento de dívida sempre induz certos efeitos, independentemente de sua classificação

como necessário ou facultativo.

Dentre outros que podem vir a ser identificados no ordenamento jurídico

brasileiro, mediante análise das diversas normas jurídicas vigentes, importa destacar o efeito

moratório, o efeito de interromper a prescrição, o efeito de fixar o termo legal da falência e o

efeito da publicidade.
31

4.1.1.3.1 Efeito moratório

O efeito moratório está previsto na própria Lei 9.492/97, artigo 40, segundo o qual

“não havendo prazo assinado, a data do registro do protesto é o termo inicial da incidência de

juros, taxas e atualizações monetárias sobre o valor da obrigação contida no título ou

documento de dívida”. Diante disso, entende-se que o registro do protesto tem efeito

constitutivo de mora do devedor, servindo como marco para o início da contagem de juros,

taxas e correção monetária.

Por outro lado, segundo explica Luiz Emygdio Franco da Rosa Junior (apud

BUENO, 2013, p. 59):

[...] não se aplica aos títulos cambiários o disposto no art. 40 da Lei


9.492/97, pelo qual, não havendo prazo assinado, a data do registro do
protesto é o termo inicial da incidência de juros de mora e de atualizações
monetárias [...] porque a matéria é regrada por legislação específica. A
correção monetária incide a partir do vencimento do título e não do protesto
ou do ajuizamento da ação.

Portanto, apesar do texto da lei mencionar que o curso da atualização monetária

inicia-se a partir da data do registro do protesto, esta disposição legal somente se aplicaria aos

títulos cambiários com relação à contagem de juros, enquanto a atualização monetária seria

devida desde a data do vencimento.

4.1.1.3.2 Efeito de interrupção da prescrição


32

Segundo disposto no Código Civil, em seu artigo 202, inciso III, “a interrupção da

prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: [...] por protesto cambial”. Ou seja,

o protesto do título induz a interrupção da prescrição da pretensão executória.

Não obstante haver uma súmula editada a respeito deste efeito – a Súmula n. 153

do Supremo Tribunal de Justiça –, enunciando que “simples protesto cambiário não

interrompe a prescrição”, sua aprovação data de 1963, de modo que é pacificado o

entendimento quanto a sua revogação tácita pelo Código Civil de 2002.

Importa destacar, outrossim, consoante explica Bueno (2013, p. 60), que este

efeito incide apenas com relação aos títulos de crédito, excluindo-se os demais documentos de

dívida passíveis de protesto, uma vez que estes últimos estão fora da esfera do direito

cambiário e o Código Civil refere-se taxativamente ao “protesto cambial”, restringindo assim

a aplicação do dispositivo.

4.1.1.3.3 Efeito de fixação do termo legal da falência

No texto do artigo 99 da Lei 11.101/2005, o protesto – mais especificamente o

primeiro protesto por falta de pagamento, não se levando em conta os cancelados – aparece

como um dos possíveis paradigmas para a fixação do termo legal da falência e, conforme

ressalta Bueno (2013, pp. 59-60), “este marco traz importantes consequências previstas na

referida lei”.

Pelo que se infere do artigo 129 do mesmo diploma legal, tais consequências se

destinam à proteção dos credores, induzindo à ineficácia de atos como a concessão de bens

em garantia real (mesmo que em favor de algum dos credores, pois isto violaria a isonomia

entre eles), o pagamento antecipado de dívidas vincendas ou, ainda, o pagamento de dívidas
33

vencidas e exigíveis, mas feito de maneira diversa da estipulada em contrato (por exemplo,

uma dação em pagamento).

4.1.1.3.4 Efeito da publicidade

Consoante o artigo 31 da Lei 9.492/97, “poderão ser fornecidas certidões de

protestos, não cancelados, a quaisquer interessados, desde que requeridas por escrito”. Assim,

é correto afirmar que hodiernamente o protesto faz parte do sistema de registros públicos. Ou

seja, os títulos e documentos de dívida que estejam protestados estão sujeitos ao princípio da

publicidade, podendo qualquer interessado requerer certidão ao tabelionato, da qual constarão

todos os títulos protestados4.

A história do protesto demonstra a superação de sua serventia eminentemente

privada. Segundo Bueno (2013, pp. 28-29), “uma dessas importantes transformações decorreu

da extensão do protesto, antes destinado a comprovar a falta de aceite, também aos casos de

falta de pagamento”.

Nesta mesma linha, a publicidade inerente ao protesto vem demonstrar que a

função do protesto vai além de provar o inadimplemento do título pelo devedor principal,

alçando uma função mais ampla, de interesse público 5, promovendo a efetiva proteção do

crédito.

4.1.1.4 Efeitos sociológicos do protesto

Além dos efeitos juridicamente estatuídos, cumpre analisar de que maneira os

efeitos do protesto repercutem sobre a sociedade e, dialeticamente, seu comportamento.

4 Isto é, aqueles cujo protesto tenha sido lavrado e em cujo registro não conste averbação de cancelamento.
5 Neste sentido, ver Fabio Fioruci apud Reinaldo Velloso dos Santos. Apontamentos sobre o protesto notarial.
Dissertação de mestrado. Orientador: Mauro Rodrigues Penteado. São Paulo: USP, 2012, p. 176.
34

Sem dúvida, paralelamente à finalidade e às consequências definidas pelo Poder

Legislativo, pelas normas administrativas e pela jurisprudência, uma observação atenta

revelará que o protesto tem relevantes efeitos decorrentes das decisões que os indivíduos

tomam perante sua potencialidade e seus efeitos. Desta forma, o protesto mostra-se capaz de

modular uma delimitada seara do comportamento social.

Primeiramente, é interessante notar que os tabeliães de protesto, assim como os

notários em geral, contribuem para aliviar a carga de serviço do Poder Judiciário. Conforme

assinala Brasil Chaves e Rezende (2013, p. 76), ao comentar sobre o princípio notarial da

prevenção de litígios:

Devido ao crescimento exacerbado de provocações aos órgãos julgadores,


acumulam-se cada vez mais as demandas, não obstante todo o esforço
desempenhado pelo Judiciário brasileiro no sentido de fornecer respostas
eficientes e em prazo adequado [...] Tal princípio, ligado de forma umbilical
à noção de Justiça Notarial, acarreta a necessidade de um esforço, cada vez
maior, por parte do notário, para exercer seu ofício de forma segura e
cautelosa, procurando prevenir, sempre que possível, por meio do bom
desempenho dos atos de sua competência, o futuro litígio.

Neste sentido, Bueno (2013, p. 30) registra que, diante das proporções atingidas

pela assoberbada demanda ao Poder Judiciário, “qualquer forma extrajudicial de satisfação de

obrigações deve ser bem vista. O pagamento realizado no tabelionato pode evitar o

ajuizamento de mais uma ação”. Na mesma esteira, Reinaldo Velloso dos Santos (2012, p. 3)

considera que “o protesto se caracteriza [...] como um relevante instrumento para recuperação

de créditos, contribuindo para a redução da inadimplência e a diminuição de litígios

judiciais”.
35

Realmente, segundo mostram as estatísticas apresentadas neste trabalho 6, o bom

desempenho de suas atividades pelo tabelião de protesto contribui para prevenção de litígios,

atendendo ao crescente clamor pela desjudicialização, devido ao considerável índice de

pagamentos obtido no procedimento de protesto. Ainda, como bem anota o tabelião José

Carlos Alves7 (2014, p. 198), “a função do protesto notarial que mais se acentua nos dias

atuais é a função de compelir o devedor a cumprir sua obrigação”.

Constata-se, pois, que o protesto tem se mostrado capaz de compelir vários

devedores a efetuar o pagamento de suas dívidas, de forma legítima, segura e eficaz,

resultando na composição do litígio e na satisfação da pretensão executória do credor,

atenuando a sobrecarga do Judiciário.

Insta registrar, ainda, que o elevado grau de sucesso do protesto se deve, em

grande parte, às consequências da publicidade. Como bem ensina Bueno (2013, p. 61),

“decorrência direta da publicidade [...] o protesto tem o legítimo efeito de gerar o abalo no

crédito do devedor, e é esse um dos principais fatores que levam a atos índices de satisfação

da obrigação”.

Nota-se, portanto, que a publicidade do protesto tem importância nuclear para a

produção de efeitos sociais. Afinal, é por meio dela que a informação do protesto chega à

sociedade e, a partir disso, dado o conhecimento público da inadimplência comprovada pelo

protesto, derivam diversas reações.

Por exemplo, a apresentação de uma certidão pode constituir indício de

confiabilidade, dando sustentação à tese de que o indivíduo é um bom pagador, ou demonstrar

6 Vide pp. 15-16. Ver Reinaldo Velloso dos Santos. Apontamentos sobre o protesto notarial. Dissertação de
mestrado. Orientador: Mauro Rodrigues Penteado. São Paulo: USP, 2012, p. 182; bem como Helton de Abreu e
Simone Eberle apud Raquel Duarte Garcia. Protesto de títulos de créditos e documentos de dívida como solução
extrajudicial para recuperação e execução de créditos. Dissertação de Mestrado. Orientador: Jean Carlos
Fernandes. Nova Lima, MG: Faculdade de Direito Milton Campos, 2013, pp. 77-78.
7 1º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Comarca da Capital, estado de São Paulo. Presidente do Instituto
de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil – Seção São Paulo.
36

que o sujeito não adimpliu a obrigação assumida, denunciando seu descomprometimento com

os negócios jurídicos que firmou no passado.

Notavelmente, dentre as consequências sociais derivadas da publicidade, o mais

saliente é o abalo no crédito do devedor. Este efeito do protesto não se dá somente pela

emissão de certidões requeridas por pessoa interessada ao tabelionato de protesto. A Lei

9.492/97 estabelece o envio de informações, em forma de certidão, a entidades de proteção ao

crédito, nos seguintes termos:

Art. 29. Os cartórios fornecerão às entidades representativas da indústria e


do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito, quando solicitada,
certidão diária, em forma de relação, dos protestos tirados e dos
cancelamentos efetuados, com a nota de se cuidar de informação reservada,
da qual não se poderá dar publicidade pela imprensa, nem mesmo
parcialmente.

Tais informações destinam-se à consulta de comerciantes ou de outros possíveis

interessados que contratem o serviço de consulta junto às entidades solicitantes das certidões

de protesto, servindo como parâmetro aos concedentes de crédito, para que possam se

guarnecer contra a possibilidade de prestarem créditos que não receberão no tempo devido.

Deste modo, os efeitos da publicidade do protesto ganham relevo, pois o seu

alcance “se amplia com a remessa das certidões em forma de relação às entidades de proteção

ao crédito e com a multiplicação de bancos de consulta gratuita disponibilizados pelos

próprios Tabeliães de Protesto, por meio das entidades que os agrupam” (BUENO, 2013, p.

61).

A repercussão social destas informações é articulada pelas restrições que o

mercado impõe aos devedores inadimplentes, ou “maus pagadores”. Em termos práticos,


37

àqueles que têm créditos pendentes de adimplemento – fato este que é solenemente

comprovado pelo protesto –, fecham-se as portas para operações mercantis a crédito.

No que se refere à proteção do crédito no mercado, os tabelionatos de protesto

ainda “contribuem [...] com a redução da assimetria de informação existente no mercado de

crédito, conferindo maiores subsídios para a análise de idoneidade e a eventual concessão de

crédito ao tomador” (SANTOS, R.V., 2012, p. 175).

E, além disso, “com o crescimento de sua publicidade, o percentual de títulos e

documentos apresentados a protesto e pagos no tabelionato começou a crescer; de tal forma

que hoje há mais pagamentos que protestos” (BUENO, 2013, p. 29). Quer dizer, além de

funcionar para reduzir o potencial de inadimplemento dos títulos emitidos no mercado, ainda

há considerável probabilidade de pagamento no tabelionato de protesto, com relação àqueles

que deixam de pagar após passarem pelas barreiras de proteção do crédito.

No final das contas, somando-se os créditos que foram poupados de potencial

inadimplência graças à consulta aos órgãos de proteção ao crédito, mais aqueles que deixam

de inadimplir por recear as consequências jurídicas e mercadológicas e, ainda, aqueles que

efetuam o pagamento quando instados pelo tabelionato de protesto, com tudo isso,

inequivocamente, o protesto promove uma redução objetiva das perdas dos credores que,

como se verá adiante, tem uma repercussão positiva para todo o mercado.

4.2 Reflexos relevantes do protesto e sua função social na economia de

mercado

Diante de todos os efeitos descritos, nota-se que o registro do protesto dá

publicidade aos casos de inadimplemento apresentados a protesto, e nisto repousa um

importante vetor de seus reflexos sociais, pois faz com que muitos títulos sejam pagos,
38

evitando o protesto, e possibilita ao público interessado consultar os registros de títulos

protestados, servindo de parâmetro para avaliar a idoneidade de potenciais tomadores de

crédito, facilitando a decisão de conceder ou negar crédito a alguém. E, como ficará

demonstrado ao longo das próximas páginas, este mecanismo tem importantes reflexos na

sociedade e na economia.

4.2.1 Prevenção da inadimplência no mercado

Tendo compreendido que a publicização dos casos de inadimplência solenemente

comprovados pelo protesto tem o condão de prevenir o mercado contra a inadimplência, e

sendo este um dos efeitos do protesto que mais alto ecoam na economia contemporânea,

cumpre examinar a extensão desta prevenção.

Nota-se que, por um lado, o protesto previne a inadimplência sob um aspecto

especial, isto é, afastando especificamente os tomadores de crédito que não cumpriram as

prestações assumidas com os credores e, consequentemente, tiveram protestados títulos em

que figuravam como devedores.

Por outro lado, promove uma espécie de prevenção geral do mercado contra a

inadimplência, persuadindo os devedores potencialmente inadimplentes a satisfazer suas

obrigações. Aqueles que não honrariam suas prestações pela mera representação moral do

compromisso, mas que temem as consequências jurídicas e práticas desta escolha, são

dissuadidos pelo receio de sofrerem eventual afastamento do mercado de crédito e, assim,

acabam por saldar suas dívidas. Assim, “a iminência de um protesto [...] serve de importante

estímulo ao cumprimento da obrigação, influenciando o comportamento do devedor”

(SANTOS, R.V., 2012, p. 182).


39

Este esquema de publicidade e limitação na concessão de créditos mercantis

assegura o guarnecimento das transações creditícias realizadas no mercado, promovendo um

considerável incremento da segurança quanto ao recebimento das prestações assumidas nos

negócios jurídicos e aumentando a credibilidade nas relações mercantis.

4.2.2 Restrições ao crédito para evitar a elevação dos preços ao consumidor

Conforme ensina Fábio Nusdeo (2013, p. 315):

Para os monetaristas a inflação é explicada [...] pela elevação do volume de


meios de pagamento à disposição do público. Tal elevação desaguaria numa
exacerbação de procura por bens e serviços [...] insuscetível de ser atendida
pelo aparato produtor [...].

Como é de conhecimento geral, a inflação consiste numa elevação

desproporcional dos preços em determinados segmentos do mercado, devido à expansão

desenfreada da procura8 sem a respectiva resposta do setor produtivo.

Segundo a explicação de Fábio Nusdeo (2013, pp. 313-14) sobre a teoria

monetária, os preços crescem na proporção em que crescem os meios de pagamento

disponíveis, potencializados em função da velocidade com eles circulam no mercado, sendo

inversamente proporcionais à “quantidade dos bens e serviços disponibilizados à comunidade,

que é a titular daqueles meios de pagamento”.

Isto é, a disponibilização exacerbada de crédito aos consumidores, sem a

respectiva promoção de um aumento proporcional na oferta de produtos e serviços,

certamente implicará numa exacerbação nos preços dos produtos e serviços mais procurados

8 “A procura é a quantidade de um bem que os adquirentes estão dispostos a comprar a um dado preço num
determinado período”, conforme explana Fábio Nusdeo. Curso de economia: introdução ao direito econômico.
7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 250.
40

pelo mercado consumidor diante da abertura de um novo horizonte para receber

imediatamente os bens e serviços desejados para pagar depois.

Portanto, é indispensável conter a concessão de créditos, afunilando a circulação

de novos meios de pagamento e limitando a demanda por bens e serviços, a fim de evitar a

elevação demasiada dos preços e, por conseguinte, controlar a inflação.

Nesta estrutura, sem dúvida nenhuma, o protesto tem relevante papel. Devido à

sua natureza de registro público, à sua vinculação a mecanismos de proteção ao crédito e o

consequente alcance estendido de sua publicidade, bem como aos elevados índices de

recebimento de pagamentos, o protesto serve ao controle da inadimplência no mercado,

diminui eficazmente a probabilidade de perdas nas transações envolvendo títulos de crédito

ou documentos de dívida e, automaticamente, reduz os riscos da atividade comercial.

Obviamente, todo comerciante calcula o preço das mercadorias levando em conta

os riscos de inadimplência a que está sujeito. Quanto maior for seu risco, maior a margem de

valor que incluirá sobre os preços finais para compensar essa variável.

Desta forma, reduzindo-se os riscos da atividade comercial, abre-se espaço para a

consequente redução dos ônus que incidem desses riscos sobre os produtos, ou seja,

abaixando os preços e desonerando-se o consumidor final.

4.2.3 Preservação das pequenas empresas

Como se viu, outro proeminente reflexo do protesto na economia de mercado é a

redução dos riscos compreendidos pela atividade mercantil, especialmente por considerar que

as transações a crédito representam uma parcela bastante significativa do fluxo monetário

atualmente.
41

Tendo em vista a redução das perdas dos credores, resultante da inibição da

inadimplência, é inquestionável a ocorrência de queda nas margens do risco inerente à

concessão de crédito, pois, à medida que decrescem as possibilidades de perda, cresce o grau

de certeza sobre a viabilidade do negócio e bons proventos do investimento.

Ora, quanto menores os índices de inadimplência nas operações de crédito,

menores também serão as taxas de juros para concessão de créditos. Este aspecto também é

relevante para mensurar a repercussão do protesto no universo econômico porque muitas

empresas dependem de crédito para fazer investimentos e manter sua capacidade de

concorrência, especialmente as empresas de menor capital.

Note-se que, dentre as várias circunstâncias que levam à concentração econômica,

o primeiro fator citado por Fábio Nusdeo (2013, p. 282) é “o progresso tecnológico,

implicando uma proporção cada vez maior de custos fixos, o que, por sua vez, torna muito

pesados os investimentos para os potenciais competidores”.

Ainda, de acordo com o economista Thomas Piketty (2014, p. 46), no processo de

produção capitalista,

A participação do capital pode alcançar níveis elevados: geralmente entre um


quarto e a metade de todo o valor produzido. [...] às vezes ela chega a
superar essa parcela nos setores que o utilizam de maneira mais intensiva,
como a mineração. Quando há monopólios locais, a participação pode ser
ainda maior.

Assim, apesar da natureza usurária do fenômeno que garantiu ao crédito seu

espaço no mercado e às possíveis implicações negativas da construção de patrimônios

sedimentados sobre valores vindouros – i.e., que ainda não foram economizados para então

serem investidos –, é necessário considerar que no modo de produção capitalista e atual

contexto econômico, a disponibilização de capital a título de crédito aos que não possuem
42

autonomia financeira para investir amplia o horizonte da mobilidade social, permitindo aos

pequenos empreendedores lograr uma qualidade de vida mais digna do que propiciada pela

venda de sua força de trabalho.

Vale lembrar, também, que o mercado atual se funda na rápida obsolescência das

mercadorias postas em circulação. Isto é, a chave para a produção vertiginosa e ininterrupta é

a fungibilidade de tudo o que circula no mercado. Devido a esta característica fundamental da

economia contemporânea, observa-se uma grande volatilidade nas relações mercantis e

empresas envolvidas na cadeia produtiva.

Abreviadamente, noutras palavras, significa dizer que o mercado exige constantes

inovações e quem não for capaz de se adaptar às novíssimas exigências será considerado

obsoleto e, logo, sumariamente descartado, excluído do mercado. Diante desta necessidade, se

faz imprescindível investir continuamente em pesquisa e em publicidade, reinventar-se

periodicamente e convencer o público sobre os motivos pelos quais o novo produto merece

ser adquirido.

É claro que, neste cenário de luta pela sobrevivência no mercado, as pequenas

empresas são as “que mais sofrem com a [...] retração do crédito [...], uma vez que enfrentam

forte concorrência das empresas de maior porte no mercado de crédito. Sem acesso ao crédito,

[...] perdem a capacidade de investimento e, consequentemente, de crescimento”.

(ARNOLDI; MADUREIRA, 2009, p. 56)

Enfim, a importância de se garantir acessibilidade do crédito aos pequenos

empresários é incontestável, pois assegura sua inclusão e sua permanência no mercado, além

de abrir nova perspectiva à parcela do proletariado que disponha de ânimo empreendedor e

ímpeto para assumir o risco inerente à atividade empresarial.

Evidente que, quanto mais segurança houver no mercado de crédito, mais

acessível este crédito deverá ser para os pequenos empresários. Pois, quanto maior for o
43

índice de inadimplência, mais onerosa serão as tarifas incidentes sobre o crédito. Ainda que as

MEs e EPPs tenham acesso a linhas especiais de microcrédito, com condições mais fáceis de

pagamento, tarifas e juros mais baixos, cedo o tarde o encarecimento do crédito das linhas

tradicionais impactará no microcrédito. Trata-se de uma consequência natural: “a falta de

meios adequados para a exigência das obrigações [...] também onera o crédito, com a

imposição de taxas de juros maiores” (SANTOS, R.V., 2012, p. 177).

Diante disso, o controle sobre a inadimplência é essencial para preservar o crédito

a valores acessíveis para que os pequenos empreendedores tenham condições de iniciar um

negócio próprio e buscar melhor desenvolvimento socioeconômico para si, sua família e

outros membros de seu entorno social que venham a beneficiar-se, direta ou indiretamente, da

atividade empresarial mantida pelo pequeno empresário.

Neste sentido, pode-se inclusive dizer que, zelando para a edificação de um

mercado de crédito mais sólido e seguro, os tabelionatos de protesto contribuem –

indiretamente e reservadas as proporções àquilo que lhes compete – para a realização do

programa constitucional de incentivo e facilitação de condições para as microempresas,

empresas de pequeno porte e cooperativas.

É verdade que, em atendimento às diretrizes constitucionais, o legislador editou a

Lei Complementar n. 123/2006, a fim de simplificar a manutenção e diminuir os ônus das

microempresas e empresas de pequeno porte, dispensando-as de certas responsabilidades, do

pagamento de certos tributos, além de prever seu favorecimento no “acesso a crédito e ao

mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes

Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão” (Art. 1º, LC n. 123/2006).

Assim, na forma do artigo 58 da LC n. 123/2006, o Estado estimula a

capitalização das pequenas empresas, mantendo linhas de crédito especiais nos bancos

comerciais públicos, bancos múltiplos públicos com carteira comercial e na Caixa Econômica
44

Federal, visando à concessão de crédito para as microempresas e empresas de pequeno porte

com taxas de juros mais acessíveis.

Todavia, mesmo com todo o aporte dado às pequenas empresas pela força

normativa da LC n. 123/2006, elas ainda estão sujeitas a sofrer o inadimplemento dos créditos

concedidos nas negociações mercantis que concluíram. Esta circunstância apenas já causa

impacto suficiente para desestabilizar as contas da pequena empresa, pois, em regra, as

empresas de menor aporte financeiro não dispõem de capital de giro suficiente para

compensar o passivo não realizado, isto é, os créditos não recebidos.

Então, como adverte Sérgio Luiz José Bueno (2013, p. 61), é preciso levar em

conta que “muitas vezes quem concede o crédito é o pequeno comerciante, que para sobrevida

de seu negócio depende de que a dívida seja honrada”. Aliás, neste mesmo bojo se enquadra a

pequena indústria que depende do recebimento dos créditos que lhe são devidos para poder

saldar suas próprias dívidas e reinvestir no aparato tecnológico necessário para emparelhar-se

à concorrência e lutar pela sua permanência no mercado.

Desta perspectiva, se as pequenas empresas não tiverem meios eficazes para

exigir os créditos que lhes são devidos, não terão fôlego para manter suas contas e permanecer

no mercado. Neste contexto, o protesto desponta como um meio célere, seguro e eficaz de

intentar a recuperação de passivos constituídos em títulos de crédito e documentos de dívida

inadimplidos. E, além disso, alguns estados contam com previsão legislativa instituindo a

gratuidade do protesto para o apresentante, facilitando o acesso às pequenas empresas.

A título de exemplo, é este o caso do estado de São Paulo, cuja legislação – por

meio da Lei 10.710/2000 – veda ao tabelião exigir depósito prévio. Se o devedor quiser

resolver a sua situação perante o tabelionato de protesto, deverá arcar com os emolumentos

devidos. Independentemente disso, nenhum custo será suportado pelo apresentante.


45

Outrossim, importa salientar que, além dos interesses individuais dos empresários

e sócios, essas pequenas empresas atendem a interesses coletivos, gerando empregos e

atendendo a interesses locais. Por isso, é importante assegurar-lhes meios de superar as

dificuldades provenientes no mercado, como é o caso da inadimplência.

Acertadamente, Arnoldi e Madureira observam que (2009, p. 52):

[...] as MEs e EPPs passaram de algum tempo pra cá, representando as


menores células dessa estrutura denominada mercado, a interferir
substancialmente não só na economia, mas na seara político-social dos
países. Tais unidades produtivas transformaram-se em importante
instrumento de inclusão econômica e social em função da sua expressiva
capacidade de geração de ocupação e renda.

Dentro desta conjectura, o protesto emerge como excelente instrumento para que

esses credores desamparados possam buscar a recuperação de seus créditos, haja vista a

oficialidade do tabelião e todos os predicados que sucedem do poder a ele outorgado:

legalidade, solenidade, autenticidade, segurança e eficácia, além da celeridade que, intrínseca

ao procedimento de protesto, adere convenientemente à dinâmica própria das relações

mercantis contemporâneas.

De fato, “o apresentante busca o serviço de protesto, salvo raras exceções, para

obter a satisfação de seu crédito, o que pode obter em pouco tempo, com segurança e

legalidade” (BUENO, 2013, p. 30). Assim, o protesto contribui amplamente para resguardar a

capacidade financeira dos apresentantes, pois apresenta significativa eficácia como meio

autônomo de recuperação de créditos.

Afinal, se a transação foi precedida de consulta às entidades de proteção ao

crédito e a consulta realizada, a partir do nome e documento do beneficiário do crédito,

atestou a inexistência de protestos registrados, isso indica que este sujeito tem interesse em
46

manter íntegra sua imagem como tomador de crédito confiável, ou seja, bom pagador. Então,

ainda que este devedor não pague o título no vencimento, considera-se haver uma relação

favorável entre o custo para efetuar o pagamento e o benefício de se evitar futuras restrições

no mercado de crédito. Diante disso, há expressivas chances de fazê-lo quando for intimado

pelo tabelionato de protesto.

Finalmente, oportuno ressaltar que

[...] a atividade cotidiana dos tabelionatos de protesto no Brasil envolve, em


regra, título emitidos em decorrência de relações interempresariais [...] Nesse
contexto, a possibilidade de recurso a um meio simples e ágil, como o
protesto, para a recuperação de crédito, contribui com a instituição de um
ambiente negocial propício ao desenvolvimento da atividade econômica, no
qual os compromissos são firmados e honrados. (SANTOS, R.V., 2012, p.
184)

Com efeito, uma vez satisfeita a pretensão do credor de reaver seus créditos, ele

incorpora recursos para manter seu poder financeiro. Por conseguinte, o protesto assegura o

equilíbrio do ambiente comercial, conferindo uma via legal, segura e eficaz de recuperação de

passivos.

Então, além de prevenir o mercado contra a inadimplência, atribuindo às relações

negociais maior credibilidade e reduzindo os riscos da atividade empresarial – o que tributa

para o controle dos preços finais, desonerando o consumidor –, os tabelionatos de protesto

ainda conferem uma possibilidade a mais às empresas para que revertam condições de

cumprir as suas próprias prestações e fazer os investimentos necessários para enfrentar a dura

concorrência imposta pelos grandes aglomerados empresariais, contribuindo, assim, para

preservar uma concorrência saudável, indispensável para o bom funcionamento da economia

de mercado.
47

4.2.4 Diferença entre os tabeliães de protesto e as entidades de proteção ao crédito

Muitos argumentam que os serviços do tabelião de protesto seriam caros, defendendo que

as entidades de proteção ao crédito teriam maior benefício em função do custo, prestando um serviço

supostamente equivalente por um valor supostamente mais baixo. Neste ínterim, importa investigar se

os valores cobrados pelas entidades particulares é realmente mais módico do que são os emolumentos

percebidos pelo tabelião e, mais que isso, elucidar quais são as diferenças dos serviços prestados.

Notadamente, o grande diferencial dos tabeliães reside na oficialidade de sua função.

Investidos nesta função pública por delegação do Estado, os tabeliães são imparciais no desempenho

de suas atribuições, ao contrário das entidades de proteção ao crédito que, sendo pagas pelos credores,

inclinam-se nitidamente para assegurar os interesses de seus clientes. Em razão disso, não são raras as

ocorrências de pessoas inscritas irregularmente em bancos de dados de inadimplentes.

Recentemente, foi aprovada no estado de São Paulo uma lei que regulamenta o processo

de negativação. Trata-se da Lei n. 15.659/2015, a partir da qual, “antes de sujar o nome do cidadão, os

birôs de crédito são obrigados a notificar o consumidor por meio de aviso de recebimento e apresentar

a prova da dívida, seja por nota fiscal ou por nota promissória, comprovando a sua legalidade”

(ALVES, 2016, p. 1).

Antes dessa lei, a contratação dos serviços das entidades privadas de proteção ao crédito

(ou, os birôs de crédito, tal como os descreve José Carlos Alves) não respeitavam critérios de

legalidade nem se preocupavam em notificar o devedor para que este tivesse a oportunidade de

adimplir sua dívida. Inobstante as melhorias que a nova lei deve trazer à sociedade, os birôs de crédito

inegavelmente continuarão eivados pela parcialidade, pois seu objetivo essencial é receber os lucros,

atendendo aos interesses dos credores.

Com o advento da nova lei, os preços dos birôs de crédito certamente irão subir,

prejudicando o argumento que normalmente era utilizado em face dos tabeliães. Argumento que, aliás,

já não correspondia com a verdade. Por exemplo, no caso do estado de São Paulo9:

9 A Lei Federal 10.169/2000, que estabelece normas gerais para a cobrança dos emolumentos, deixou ao
legislador estadual a competência para fixar os custos de selos e emolumentos conforme as peculiaridades locais
de cada estado. Assim, é necessário adotar um estado como paradigma. No caso, optou-se por São Paulo.
48

[...] a cobrança e as informações de protesto são gratuitas e barateiam o custo


do crédito. Já os birôs de crédito, que prestam mais de 6 milhões de
informações creditícias por dia, cobram de R$ 5,80 a R$ 22,80 (tabela do
Serasa) por consulta realizada. [...]fica claro que todos os consumidores
tomadores de crédito, tanto os adimplentes quanto os inadimplentes, pagam
pelas consultas dos birôs, visto que o valor é repassado ao consumidor pelo
comércio e serviço. Portanto, é falso o argumento do aumento do custo
creditício e da burocracia em razão da lei e da opção do pagamento em
cartório. (ALVES, 2016, p. 1)

Vale acrescentar que o apresentante nada paga para apresentar o título a protesto,

enquanto os devedores têm a garantia de que não serão negativados indevidamente pelo tabelião,

como recorrentemente são pelos birôs de crédito.

Outro ponto de marcada relevância é o fato de que os tabeliães são profissionais do

direito, devidamente capacitados para qualificar a legalidade e a regularidade dos títulos de crédito e

documentos de dívida que recebem a protesto. Vale lembrar também que os tabeliães não estão

protegidos pelo manto da personalidade jurídica, como estão os administradores das entidades de

proteção ao crédito. Sua responsabilidade é pessoal e ilimitada. Logo, é certo que o tabelião adotará

todas as cautelas, valendo-se do seu preparo jurídico para evitar problemas para ambas as partes e,

inclusive, para si mesmo.

Por tudo isso, evidente que a função de manter a harmonia das relações de crédito

realizadas no mercado, especialmente relevante para a atual economia de matriz consumista,

deve ser desempenhada pelos tabeliães de protesto, não pode ser deixada ao livre ofício de

empresários despreparados e parciais, cujo objetivo último é a lucratividade do negócio.

.
49

5. CONCLUSÃO

É inerente ao modo de produção capitalista a renovação dos modos de reprodução

do capital, passando por crises cíclicas a cada lapso temporal – note-se que

contemporaneamente a economia vem enfrentando um colapso de grandes proporções – eis

que, na segunda metade do século XX, os economistas apontaram o crédito como uma

possível alternativa para movimentar a economia. A ideia era injetar volume monetário no

mercado para que a demanda crescente por bens e serviços fosse capaz de alavancar a

produção, além de criar uma nova demanda no mercado financeiro.

Contudo, a concessão irrefreada de crédito demonstrou ser um caminho

pernicioso para a recuperação da economia. Influenciados pelo ímpeto imediatista de haver

seus desejos realizados em curto espaço de tempo, os indivíduos da sociedade contemporânea

apelam para o crédito sem a devida provisão de recursos para arcar com o pagamento de suas

dívidas.

Com isso, a política de propulsão da economia por meio do crédito abriu vasto

campo para a inadimplência, haja vista que muitos tomadores de crédito deixavam de pagar

seus débitos, tendo sido responsável por crises colossais, como foi a crise do crédito subprime

no mercado hipotecário dos Estados Unidos, em 2008.

Desta dinâmica, despontaram inúmeras consequências nocivas à sociedade,

criando um ciclo vicioso em que o inadimplemento de créditos furta a capacidade financeira

dos credores – especialmente os menos abastados – para pagarem as suas próprias dívidas,

além de criar um ambiente de insegurança nas relações negociais, levando à elevação dos

preços praticados, bem como o encarecimento do próprio crédito que, em alguns casos, é

necessário para a manutenção da capacidade competitiva de pequenas empresas. Em virtude


50

disto, agravam-se as dificuldades econômicas de todos os sujeitos que interagem no mercado,

cujas finanças dependem da vitalidade da economia.

Diante da necessidade de criar mecanismos de contenção do crédito e redução da

inadimplência, a fim de proteger o mercado de crédito e os sujeitos que dele participam, o

protesto notarial se revela como meio seguro de instituir controle sobre a inadimplência,

dando publicidade aos casos de descumprimento de obrigações consubstanciadas em títulos

de crédito ou documentos de dívida, além de abrir grande margem para o recebimento das

prestações vencidas.

A eficácia do protesto para esta finalidade se deve à sua natureza pública e,

notadamente, ao alcance que o legislador conferiu à sua publicidade. Atualmente, os

tabelionatos de protesto enviam certidões diariamente a órgãos de proteção ao crédito que

oferecem suporte aos membros do comércio e da indústria que mantenham relações mercantis

com concessão de crédito a seus clientes, além de disponibilizarem bancos de consulta

gratuita que são mantidos pelas entidades de classe às quais pertencem os tabeliães de

protesto.

Com isso, institui-se um efeito ao qual a doutrina se refere como “abalo no crédito

do devedor”. Isto é, ao deixar de satisfazer uma obrigação materializada em um título de

crédito ou documento de dívida levado a protesto, mesmo instado pelo tabelionato a fazê-lo,

efetua-se o registro – público – do protesto e, a partir de então, a situação de inadimplência

daquele devedor poderá ser consultada, imputando-lhe restrições no mercado de crédito.

Dentre os efeitos deflagrados pela publicidade dos registros de protesto, os mais

diretos são o considerável aumento na segurança das relações mercantis, resguardando o

mercado daqueles sujeitos que tenham inadimplência solenemente comprovada pelo protesto,

bem como a inibição geral da inadimplência e, por fim, o aumento das chances de receber os

créditos prestados.
51

Afinal, tendo em vista o benefício de manter a própria credibilidade e permanecer

com o crédito aprovado no mercado, o pagamento de algumas prestações assumidas constitui

um custo consideravelmente baixo para os devedores que foram aprovados no exame de

idoneidade realizado por meio das consultas aos bancos de dados de proteção do crédito, pois

isto significa que eles não têm parcelas pendentes e, então, o montante a saldar para não

incorrer em inadimplência é muito menor do que para aqueles que deixaram as dívidas se

acumularem.

Com isso, conclui-se que o protesto tem um papel socialmente relevante para

combater a prática da inadimplência, tributando para conservar a confiabilidade nos negócios

firmados e a segurança jurídica das relações jurídicas estabelecidas no mercado. Disto sucede,

automaticamente, a redução das perdas dos credores e a redução dos riscos inerentes à

atividade mercantil.

Com riscos menores, desonera-se toda a cadeia mercantil, desde o setor produtivo

até os bolsos do consumidor final. Aliás, a elevação dos preços também é contida pelo sistema

de controle do crédito disponibilizado aos consumidores. Afinal, havendo necessidade de

comprovar idoneidade para obter crédito, opera-se uma redução na demanda potencial por

bens e serviços ou, melhor, impede-se o aumento exacerbado desta demanda, impedindo

reflexamente a alta dos preços nos produtos e serviços cuja demanda tivesse sofrido maior

inflação.

Além disso, a mitigação da inadimplência também deriva na redução dos juros

cobrados pelo uso do crédito. Neste sentido, apesar da fragilidade econômica que o crédito

pode induzir, a função social que o protesto cumpre, neste caso, é tornar o crédito mais

acessível às pessoas que dele efetivamente necessitam. É o caso das pequenas empresas, que

precisam de crédito para capitalizar-se, fazer investimentos e intentar paridade com as

empresas de maior capital.


52

Logicamente, o aumento das taxas de juros encarece as linhas de crédito, leva à

restrição do crédito disponível para os pequenos empresários, obstando a capitalização de

novas iniciativas e impossibilitando os investimentos necessários tanto para a inclusão quanto

para a renovação de pequenos empreendimentos no plano concorrencial do mercado.

Nesta perspectiva, evidencia-se a função social dos tabelionatos de protesto em

relação à contribuição que presta para possibilitar a disponibilização de capital a título de

crédito aos que não possuem autonomia financeira para investir. Assim, amplia-se o horizonte

da mobilidade social, dando condições aos pequenos empreendedores para buscarem uma

qualidade de vida mais digna do que poderiam lograr com a venda de sua força de trabalho.

Além do mais, muitos dos credores que procuram os tabelionatos de protesto, com

a normal pretensão de recuperarem os seus créditos, dependem da realização de seus passivos

– isto é, o recebimento dos créditos que lhes são devidos – para preservarem sua capacidade

financeira e as condições mínimas para permanecerem no mercado.

Com efeito, a reiteração continuada da inadimplência provoca sérias dificuldades

para a sustentação das empresas que não disponham de capital de giro suficiente para suportar

momentos de crise mais acentuada, podendo levar ao encerramento de suas atividades, em

longo prazo.

Os tabelionatos de protesto se inserem neste cenário como canais seguros, legais e

rápidos – abonados pelos predicados que derivam da oficialidade do tabelião, seus serviços

exalam segurança jurídica, pois são guiados pela estrita legalidade, pela solenidade e pela

celeridade que são próprias do procedimento do protesto – aos quais os credores lesados

podem recorrer para buscar a recuperação de seus créditos, desde que consubstanciados em

títulos ou documentos de dívida.

Além de todas essas qualidades que podem ser atribuídas aos serviços prestados

pelos tabeliães de protesto, a legislação de alguns estados-membros traz previsão de


53

gratuidade dos emolumentos, dispensando o apresentante de quaisquer despesas para

protocolizar um título ou documento de dívida. Um exemplo desta medida, que se justifica

pelo fito de estimular os credores a buscar o protesto – devendo o devedor pagar as despesas

quando quiser resolver a sua situação junto ao tabelionato de protesto – pode ser encontrada

na Lei estadual n. 10.710 de 2000, do estado de São Paulo.

Neste sentido, os tabelionatos de protesto ajudam na preservação das pequenas

empresas, na direção traçada pelo o constituinte de 1988 com as diretrizes de incentivo às

microempresas, empresas de pequeno porte e cooperativas, e em harmonia com o atual

entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a função social da empresa.

Importa ressaltar, ademais, que o interesse alcançado pelos reflexos do protesto,

no atendimento de sua função social, vai além dos interesses particulares dos sujeitos que

figuram nos títulos e documentos de dívida levados a protesto e transcende, até, os interesses

dos concedentes de crédito que se protegeram pelo sistema de publicidade dos registros de

protesto.

A repercussão deste mecanismo de proteção ao mercado de créditos abrange o

interesse público de todo o mercado e, uma vez que a essência do capitalismo está na

circulação de bens e serviços, alcança a economia em sua totalidade, favorecendo a toda a

coletividade.

Ora, enquanto combate a inadimplência, o protesto refreia a concessão

descomedida de créditos, obstando-o para aqueles que já têm títulos protestados.

Automaticamente, contém a inflação da demanda e a elevação dos preços. Além disso,

controlando a inadimplência, o protesto institui um ambiente negocial seguro, atribuindo

confiabilidade às relações jurídicas estabelecidas no mercado.

Objetivamente, o protesto reduz as perdas dos credores e aumenta a probabilidade

de recebimento dos créditos concedidos, reduzindo os riscos da atividade mercantil. Com isso,
54

ocorre uma diminuição em cadeia dos valores que os riscos agregam aos preços finais, além

da consequente queda nas taxas de juros.

Diante disso, o crédito se torna mais acessível às empresas que dele dependem

para pagar suas dívidas, fazer investimentos necessários para se parear à concorrência e,

enfim, reunir condições para permanecerem ativas no mercado. Neste sentido, os tabelionatos

de protesto contribuem para a preservação de empresas que atendem a uma determinada

demanda e garantem empregabilidade para a população local.

Por todo o exposto, resta evidente a relevância marcante do protesto para a

edificação de um mercado responsável, e consequentemente mais confiável, pois

comprometido com o adimplemento das obrigações que estejam contidas em títulos de crédito

e documentos de dívida.

Assim, o protesto de títulos e documentos de dívida representa um vetor

fundamental para o desenvolvimento de uma economia mais sólida e sustentável, dentro dos

moldes do que prevê a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no título

dedicado à Ordem Econômica e Financeira.


55

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