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ANTROPOS - Capacitação Antropológica

Tradução da Bíblia para línguas indígenas do Brasil


Enviado por Cácio Silva
19-Mai-2006
Atualizado em 25-Mai-2006

Realizações, Desafios e Possibilidades.

Seguindo por uma trilha, logo avistei, no sopé de uma pequena montanha, na outra margem do riacho, uma palhoça
bem rudimentar. Formato retangular, cobertura e paredes de capim, sendo a metade bem fechada, sem janelas, e a
outra metade totalmente aberta. De longe parecia não ter ninguém. Atravessei o riacho, de águas cristalinas e pouco
profundas. Subi o barranco e então avistei a figura de um ancião indígena à minha espera. Na parte aberta da palhoça um
fogo aceso. Uma criança engatinhando brincava nas proximidades. A imagem era singela. A simplicidade material e a
riqueza cultural ali se misturavam. Aproximei-me e rompi o silêncio com uma das poucas expressões que conhecia
naquela língua: “may xeka!” – “olá!” (literalmente “muito bom!”). Ao que
o ancião prontamente me respondeu.

Logo descobri que se tratava de Totó Maxakali, um dos anciões mais antigos daquele povo. Comecei a conversar e me
apresentei, enquanto vasculhava o local com um olhar discreto. De repente ele me perguntou, com um português muito
limitado, se eu conhecia “Aroldo”. Entrou na palhoça e saiu com um livro cuidadosamente embrulhado num
saco plástico. Desembrulhou com cuidado, mostrou-me orgulhosamente e disse: “amigo Aroldo”. Na
capa estava escrito “Topa Yõg Tappet” – “O Livro de Deus”. Era um exemplar do
Novo Testamento Maxakali, cuja tradução havia sido concluída vinte anos atrás. “Aroldo” é a forma
aportuguesada que usam para referirem-se a Harold, o tradutor.

Harold e Frances Popovich são americanos, missionários da SIL – Sociedade Internacional de Lingüística, que
vieram para o Brasil em março de 1958. Depois de alguns meses estudando o português, seguiram para o nordeste de
Minas Gerais, para trabalhar com os Maxakali, chegando ali em fevereiro de 1959. Sendo o povo falante quase que
exclusivamente da língua materna, o primeiro passo foi aprender a língua Maxakali. Foram os primeiros a fazer um
estudo sistemático dessa língua. Desenvolveram um alfabeto para a mesma, criaram cartilhas de alfabetização e
traduziram o Novo Testamento, concluindo o mesmo em 1981, após 22 anos de árduo trabalho. Esse processo muito
contribuiu para a valorização da língua e revitalização da cultura. Dos oito grupos indígenas de Minas Gerais, os Maxakali é
o único que preservou de forma efetiva a língua e suas instituições culturais. Mas o trabalho dos Popovich contribuiu
também para a preservação étnica do povo, dando assistência na área de saúde e coibindo invasões das terras por
parte de fazendeiros da região. Quando ali chegaram, os Maxakali estavam em acelerado processo de extinção,
reduzidos a 197 pessoas! Hoje somam mais de mil indígenas.
Esse é apenas um exemplo das dezenas de projetos de tradução bíblica que já foram e estão sendo desenvolvidos entre
grupos indígenas em solo brasileiro.

O QUE JÁ FOI FEITO E QUEM FEZ

Temos atualmente no Brasil 2 Bíblias completas e 32 Novos Testamentos traduzidos para línguas indígenas. Resultado
do esforço de dezenas de igrejas enviadoras, 7 agências missionárias, 66 tradutores e mais de 150 falantes nativos
diretamente envolvidos no processo de tradução. Vejamos o que os números indicam sobre todo esse trabalho.

Tradutores

Os 66 tradutores são oriundos de 6 diferentes países: 40 americanos (sendo 2 desses com nacionalidade brasileira, por
serem filhos de missionários), 12 ingleses, 7 canadenses, 3 brasileiros, 3 alemães (sendo 1 com nacionalidade
brasileira) e 1 colombiano. Deste quadro, 24 são solteiros, dos quais 23 são mulheres e um único homem (padre). Dos
42 tradutores casados, 34 trabalharam como casais e 8 homens se dedicaram sozinhos ao trabalho direto de tradução,
via de regra estando a esposa envolvida em algum outro ministério igualmente importante como educação e saúde. No
total, foram 41 mulheres e 25 homens.

Transformando estes números em percentuais, pode-se perceber que, quanto à nacionalidade 95,4% são estrangeiros,
dos quais 63,5% são oriundos dos Estados Unidos da América. Quanto ao estado civil 51,5% são casados e quanto ao
sexo 60,7% são mulheres. Isto nos mostra que os projetos de tradução até então concluídos foram feitos quase que
exclusivamente por força missionária estrangeira, com uma participação relativamente equilibrada de missionárias
solteiras e casais missionários.

Organizações

Das 7 organizações missionárias envolvidas, 1 é internacional (SIL) e as demais nacionais ou nacionalizadas: MNTB
– Missão Novas Tribos do Brasil, MEVA – Missão Evangélica da Amazônia, MICEB – Missão Cristã
Evangélica do Brasil, ALEM – Associação Lingüística Evangélica Missionária, JAMI – Junta Administrativa
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de Missões da Convenção Batista Nacional e a missão católica Salesiana. Entretanto, 26 das 34 traduções foram
gerenciadas pela SIL, seguidas de 3 traduções da MNTB, 2 da MEVA, 1 da parceria MICEB e SIL, 1 da parceria ALEM e
JAMI e 1 dos Salesianos. Portanto, 76,5% vem de força estrangeira. Entre as agências nacionais há uma saudável
tendência a parcerias.

Tempo investido nas traduções

Das 34 traduções de Novos Testamentos, 2 foram feitas entre 8 e 9 anos, 8 entre 11 e 20 anos, 10 entre 21 e 29 anos, 11
entre 31 e 38 anos e 3 entre 41 e 46 anos. Contando da chegada do primeiro missionário tradutor ao campo até o
momento da publicação, a média geral é de 26,5 anos de trabalho. Estão incluídos aqui os intervalos no processo de
tradução, por motivos como férias, licença por problemas de saúde e ausências do campo por proibições políticas. O Novo
Testamento mais rapidamente traduzido foi o Nheengatu (8 anos) e o que gastou mais tempo foi o Xavante (46 anos).
Isto não reflete a habilidade ou falta de habilidade dos tradutores, mas sim, outros elementos como a complexidade da
língua, a disponibilidade de falantes nativos com facilidade em tradução e a quantidade de intervalos no processo. Desses
Novos Testamentos, 2 são adaptações: do Kaxinawa do Peru (25 anos) e do Tukano da Colômbia (9 anos).

As 2 Bíblias completas representam esforços continuados às traduções dos respectivos Novos Testamentos. Com a tradução
do Antigo Testamento Wai-Wai, concluído em 2002, essa língua tornou-se a primeira entre as indígenas do Brasil a ter
uma Bíblia completa. Foram 28 anos para traduzir o Antigo Testamento somando um total de 53 anos de trabalho para
traduzir toda a Bíblia. Já o Antigo Testamento Guarani-Mbyá foi concluído em 17 anos, que somados aos 12 anos
investidos na tradução do Novo Testamento totalizam 29 anos de trabalho.
Todos esses números nos mostram que o trabalho de tradução bíblica para línguas indígenas tem sido árduo, exigindo
muita perseverança, paciência e dedicação. Inclusive as adaptações, que no pensar de muitos é trabalho fácil, mostram-
se não tão fáceis assim.

Começos e conclusões

O primeiro trabalho de tradução para língua indígena teve início em 1949 (Wai-Wai). Na década de 1950 outros 13 projetos
foram iniciados, seguidos por mais 15 na década de 1960 e 4 nos anos setenta. Das traduções aqui em análise apenas
uma teve início na década de 1990, sendo esta de iniciativa brasileira (Tukano). A primeira tradução concluída foi em 1965
(Baniwa), seguida por outras 4 na década de 1970, 13 na década de 1980, 11 nos anos noventa e 5 nos primeiros
anos do século 21.

Portanto, as décadas de 1950, 60 e 70 foram marcadas pelo maior fluxo de missionários vindo para o Brasil com
projeto de tradução. No início dos anos oitenta, houve uma grande pressão por parte do governo coibindo o ingresso de
novos missionários em solo brasileiro para trabalho entre indígenas. Isto pode explicar esta pausa a partir da década
de 1980. O esforço de tradução bíblica para línguas indígenas brasileiras tem, portanto, 56 anos de história.

Troncos e Famílias Lingüísticas

De acordo com o lingüista Aryon Rodrigues , as línguas indígenas brasileiras estão agrupadas em dois grandes troncos
lingüísticos e em algumas famílias não agrupadas em troncos. Tronco e família lingüística são termos técnicos para indicar
agrupamentos de línguas que possuem uma origem comum. É como o caso do português que pertence à mesma família
lingüística do espanhol, francês e italiano, família esta chamada românica, tendo o latim como língua mãe. Digamos que são
línguas irmãs. Mas a família românica é irmã da família germânica, que abarca o alemão, inglês, holandês e sueco, e da
família eslava, formada pelo russo, polonês, checo e outras. Desta forma, o português seria língua prima do inglês e
do russo, por exemplo. Essas três famílias lingüísticas juntas formam o tronco lingüístico indo-europeu. O mesmo acontece
com as línguas indígenas. Temos no Brasil os troncos Tupi e Macro-Jê, cada um com várias famílias lingüísticas. Temos
as famílias Aruak, Karib, Tukano, Maku e outras que não se agrupam em troncos, e ainda algumas línguas isoladas que
não se agrupam em nenhuma família ou tronco.

Das nossas 34 traduções, 10 são de línguas do tronco Tupi, sendo 8 da grande família Tupi-Guarani, uma da família
Munduruku e uma língua não classificada em família (Sateré-Mawé). Outras 9 são do tronco Macro-Jê, sendo 5 da
grande família Jê e as demais respectivamente das famílias Maxakali, Karajá, Bororo e uma língua não classificada em
família (Rikbaktsa). As demais 14 línguas são de famílias não agrupadas em troncos, sendo 5 da família Aruak, 4 Karib e
as demais respectivamente das famílias Nambikuara, Pano, Arawá, Guaikuru e Tukano. Por fim, temos 1 tradução em
língua isolada (Tikuna).

Portanto, todos os principais troncos e famílias lingüísticas indígenas já possuem traduções bíblicas. Se considerarmos que,
em muitos casos, uma tradução em língua irmã serve como bom ponto de partida para uma nova tradução, temos então um
bom caminho andado.

População indígena

Das 34 traduções, 7 representam povos com mais de 10 mil pessoas. 3 representam povos com 5 a 10 mil pessoas. 17
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são de línguas cujas populações somam entre mil e 5 mil pessoas. E as outras 7 traduções são de povos com menos de mil
pessoas. Isto aponta a tendência natural de investir esforços em direção a línguas com populações maiores. Mas torna-se
também desafiador, se considerarmos que cerca de dois terços dos povos indígenas do Brasil possuem menos de mil
pessoas.

Regiões

Na região norte estão 18 das 34 traduções. No centro-oeste 11, no nordeste 2, outras 2 no sul e 1 no sudeste. É natural que
seja assim, visto que, a grande maioria dos grupos indígenas está exatamente nas regiões norte e centro-oeste do país.
E também pelo fato de grande parte dos povos do nordeste e sudeste já ter perdido suas línguas maternas, falando
apenas o português.
Mas pelo menos 14 dessas traduções são usadas além das fronteiras brasileiras, em países vizinhos como Colômbia,
Venezuela, Guiana, Guiana Francesa, Suriname, Peru, Paraguai, Uruguai e Argentina. Temos também o caso de um
Novo Testamento traduzido na Colômbia sendo usado em território brasileiro (Kuripako). Isto se dá pelo fato de vários
povos indígenas viverem sobre as fronteiras geopolíticas do Brasil.

A Palavra em Mais de uma Língua

Desta forma, no vasto solo brasileiro, a Bíblia Sagrada é conhecida também como “Deusu JesusweTaeshu Yuba
Bena Yuiniki, Hawe Unanuma” – “O Livro de Deus que, através de Jesus, nos deu novas notícias
anos atrás” (Kaxinawa), “Deus Athi Kapapirani Hida” – “O Papel da Fala de
Deus” (Paumari) e “Pahpãm Jarkwa” – “O Livro da Palavra Bem Respeitada do Pai de
Todos Nós” (Ramkokamekrá-Canela). Deus é também conhecido como “Itukó’oviti” –
“Criador” (Terena), “Nhanderuete” – “Nosso Pai Verdadeiro” (Guarani-
Mbyá) e “Waptokwa Zawre” – “Nosso Grande Criador” (Xerente).

O QUE ESTÁ SENDO FEITO E QUEM ESTÁ FAZENDO

De acordo com Paulo Bottrel, do Banco de Dados do Departamento de Assuntos Indígenas da AMTB – Associação
de Missões Transculturais Brasileiras, existe atualmente 52 projetos de tradução bíblica em andamento para línguas
indígenas brasileiras. Alguns em fase final de editoração e outros em fase inicial de análise lingüística. Em alguns casos o
texto bíblico já está na gráfica (como o Novo Testamento Xerente, com publicação prevista para 2006) e em outros o
missionário tradutor chegou no campo há poucos meses e está aprendendo as primeiras palavras na língua.
O número atual de tradutores não é preciso, mas certamente soma mais de 80 missionários. Boa parte é de
estrangeiros, mas a maioria já é de brasileiros. Pelo menos 8 agências missionárias estão atuando com tradução. Um
percentual expressivo de projetos está sendo desenvolvido pela SIL, mas grande parte já é iniciativa de agências
nacionais, como a MNTB, ALEM, MEVA e outras. As parcerias são muitas, tanto entre as agências brasileiras como
entre brasileiras e a SIL. Um fato facilmente observável é que várias agências não diretamente envolvidas com
tradução fazem parcerias com aquelas especializadas na área.

Os dados apontam um crescente envolvimento da igreja brasileira na tarefa de traduzir a Palavra para línguas indígenas.
Devemos ser gratos aos missionários estrangeiros que aqui atuaram, pois não apenas traduziram a Bíblia para várias
línguas do nosso país, mas também contribuíram em muito para o despertamento de obreiros e igrejas nacionais.

Das 52 línguas alvos de tradução, 4 pertencem à grande família lingüística Jê, do tronco Macro-Jê. Outras 14 são de três
famílias do tronco Tupi: Tupi-Gurani (10), Mondé (3) e Ramarama. A maioria (32) pertence a dez famílias lingüísticas não
agrupadas em tronco: Arawá (10), Karib (5), Pano (4), Yanomami (4), Maku (4), Tukano, Katukina, Mura, Nambikuara e
Txapakura. E ainda, 2 línguas isoladas são alvos de tradução (Aikanã e Jabuti). Isto aponta um processo já esperado. As
línguas mais conhecidas e analisadas (Tupi e Macro-Jê) foram naturalmente as primeiras a serem alvejadas por
projetos de tradução. Agora, o esforço de tradução se expande cada vez mais para línguas menos conhecidas.

Um fato digno de nota é que dos 52 projetos de tradução hoje em andamento, 28 são direcionados a povos com menos
de 500 pessoas e outros 11 para povos com uma população entre 500 e mil pessoas. Ou seja, 39 projetos visam línguas
indígenas com menos de mil falantes. Outras 11 são línguas com mil a 5 mil pessoas, 1 com população entre 5 a 10 mil e
apenas 1 com população acima de 10 mil. Novamente pode-se perceber a tendência natural de alcançar primeiro os
povos maiores e avançar em um segundo momento para os menores.

Destes projetos, 39 estão na região norte do país, 11 no centro-oeste e 2 no nordeste, o que também segue a realidade
populacional. Como já dito, a grande maioria dos povos indígenas do Brasil, ainda falantes da língua nativa, está
exatamente no norte e centro-oeste.
Além dos 52 projetos de tradução do Novo Testamento, temos ainda 7 Antigos Testamentos sendo traduzidos para
línguas que já têm o Novo Testamento completo. Pelo menos 3 desses projetos estão com a conclusão prevista para
2006. Geralmente, enquanto se traduz o Antigo Testamento é feita uma revisão do Novo.

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O QUE RESTA A SER FEITO E QUEM FARÁ

O que podemos concluir a partir dos dados acima é que muito já foi feito em termos de tradução bíblica no Brasil. É mais
de meio século de história e os grupos que já têm a Palavra e aqueles que estão sendo alvos de tradução somam 86
línguas. Grande parte é resultado do esforço de igrejas, agências e missionários estrangeiros, mas a igreja brasileira
também tem respondido de forma positiva nas últimas décadas ao desafio de tradução.

A tradução tem contribuído para o surgimento de igrejas indígenas fortes e com liderança autóctone. Tem possibilitado que
muitos indígenas conheçam a revelação divina em suas próprias línguas. Tem valorizado línguas maternas e contribuído para
a preservação das mesmas. Tem sido um instrumento de revitalização cultural de muitos povos. Tem analisado e
documentado línguas ainda desconhecidas. Ou seja, além do seu eterno e incalculável valor espiritual, a tradução bíblica
possui também um inestimável valor cultural e científico. Como reconhece Ruth Monserrat , a grande maioria das
análises lingüísticas entre indígenas do Brasil foi feita por missionários, em especial da SIL. Isto fica igualmente evidente
na obra clássica sobre línguas indígenas do Brasil, “As Línguas Brasileiras”, do professor Aryon Rodrigues,
considerado pai da lingüística brasileira. Nas 57 notas de rodapé do seu livro, ele cita a SIL 68 vezes. Das 314 fontes
pesquisadas, 109 são da SIL, sem contar as dezenas de artigos, dissertações e teses de missionários da SIL publicados
em revistas de lingüística e antropologia em várias universidades do Brasil e exterior.

Mas apesar do muito que já foi feito, temos ainda um grande desafio pela frente. De acordo com a pesquisadora
Bárbara Grimes , são faladas no Brasil cerca de 185 línguas indígenas. Como já exposto, 34 já possuem a Palavra
traduzida e outras 52 têm um projeto de tradução em andamento. Os Kuripako usam o Novo Testamento traduzido para
a sua língua na Colômbia e outros 7 povos usam Novos Testamentos traduzidos para línguas parentes e mutuamente
inteligíveis. É o caso dos Katuena, Mawayana e Xereu que fazem uso da Bíblia Wai-Wai por compreenderem aquela língua.
Portanto, restam pelo menos 91 línguas sem tradução da Palavra de Deus. Destas, 15 já foram investigadas e a
conclusão é que carecem de tradução. As demais precisam ainda ser investigadas, mas certamente grande parte das
mesmas é igualmente carente de tradução bíblica.

Estima-se que tenha no Brasil algo em terno de 30 milhões de evangélicos, distribuídos em cerca de 188 mil igrejas
locais . Bastaria então que cada 600 mil evangélicos ou que cada 3.760 igrejas locais se responsabilizassem por uma
língua. Poderíamos até concluir que no caso da tradução bíblica para línguas indígenas do Brasil a seara é pequena para
tantos trabalhadores! Mas sabemos que isto é simplismo e a situação não é bem assim. Mesmo sendo um número
mensurável, o desafio continua sendo grande se considerado o despertamento ainda insuficiente da igreja brasileira
para esta área e os desafios que envolvem uma tradução.

Treinamento Missionário

Antes de iniciar uma tradução é preciso analisar a língua de forma profunda. Segundo o lingüista-tradutor Norval da Silva ,
deve-se começar pela análise fonética para perceber quais são os sons, seguindo com a análise fonológica para
compreender como os sons se articulam, passando pela análise morfológica para compreender a estrutura interna das
palavras, alcançando a análise gramatical para compreender como as palavras são articuladas na formação de orações,
até chegar no nível do discurso para compreender as diferentes formas discursivas da língua.
Portanto, além do caráter cristão bem moldado e um chamado consciente, um tradutor precisa de uma boa formação
lingüística com ênfase em tradução. Temos hoje no Brasil basicamente três centros de formação missionária que
oferecem treinamento lingüístico: MNTB, ALEM e JOCUM. Mas o apenas treinamento lingüístico não é suficiente também. É
preciso ainda um bom treinamento na área teológica com ênfase em exegese e missiológica com ênfase em
antropologia. Isto demanda tempo e investimento.

Tradução e Evangelização

Dos 258 povos indígenas brasileiros, 133 possuem presença missionária evangélica e 20 possuem igrejas com liderança
autóctone. Destas 20 igrejas autóctones, 14 possuem o Novo Testamento traduzido para suas línguas e as outras 6 têm
acesso ao texto bíblico em alguma língua compreendida pelo povo.

Em contrapartida, dos 34 povos com tradução bíblica em suas línguas, apenas esses 14 acima mencionados possuem
igrejas com liderança autóctone. Outros 8 povos já foram alcançados mas ainda não possuem liderança autóctone. E pelo
menos 12 permanecem sendo um desafio missionário em termos de evangelização. Alguns por terem sido alcançados de
forma insuficiente e outros por permanecerem ainda sem nenhuma comunidade cristã local. Isso deixa claro que é
possível traduzir a Bíblia sem plantar igrejas, mas é quase impossível plantar uma igreja forte e com liderança própria sem
viabilizar o uso da Bíblia na respectiva língua do povo.
Grande parte dos tradutores não consegue conciliar tradução e evangelização, devido a intensidade do trabalho. Na
maioria dos casos, quando tem Bíblia mas não tem igreja, o interesse pela mesma é muito pequeno, por não ser vista
como algo da cultura.

Tradução e Educação

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O lingüista-tradutor Ronaldo Lidório chama-nos a atenção para outro desafio, relacionado à educação. A tradução desvinculada
da alfabetização na língua materna tem resultado em alguns Novos Testamentos para não leitores no Brasil. Isto não
aponta falta de cuidado ou estratégia dos tradutores, mas sim a impossibilidade de às vezes conciliar tanto trabalho.
Tem surgido bons cursos de educação bilíngüe nos centros de treinamento missionário, mas faz-se necessário maior
investimento e conscientização desta necessidade. Tanto o desafio da evangelização como o da educação, evoca a
necessidade de enviar equipes, onde cada missionário se dedique a áreas específicas. Mas esta visão deve passar
pelas agências missionárias e alcançar as igrejas, para que haja um avanço efetivo nesta direção.

Possibilidades

Tem-se visto nos últimos anos um crescente interesse por tradução bíblica no Brasil. A cada ano novos vocacionados se
inscrevem em cursos de lingüística e tradução. Porém, a ida efetiva para o campo não tem se concretizado na maioria dos
casos. Isto aponta para uma conscientização ainda insuficiente da igreja brasileira, incluindo seus seminários e
agências missionárias. Enquanto isto, a força missionária estrangeira continua ativa, porém, diminuindo. E ainda não
temos notícias de um envolvimento efetivo de tradutores indígenas.

O lingüista-tradutor Isaac de Souza classifica a caminhada missionária em direção aos indígenas do Brasil em três
“ondas”: estrangeira, nacional e indígena. A onda estrangeira já fez e tem feito a sua parte. Devemos
sempre louvar a Deus pelos muitos missionários estrangeiros que recebemos em nosso país. A onda nacional pode e
deve assumir de forma mais consciente o desafio da tradução bíblica em terra brasileira. Mas há lugar também para a
onda indígena. Como sugere o líder indígena Henrique Terena , os próprios indígenas podem ser um braço forte nesta ação
missionária em direção aos povos minoritários do nosso país. O CONPLEI – Conselho de Pastores e Líderes
Evangélicos Indígenas, já conta hoje com 1.200 associados . Portanto é hora de investir no treinamento de indígenas
para traduzir a Palavra de Deus para outros indígenas. Isto também não é tão simples, demandando tempo e
treinamento, mas é possível.

No desafio da tradução para os grupos indígenas do Brasil, há lugar para as três ondas. Analisando o trabalho
missionário estrangeiro no Brasil, o missiólogo Carlos Caldas conclui que uma das principais áreas para estrangeiros
ainda hoje é exatamente a tradução. Concordando com ele, podemos concluir que a tradução da Bíblia para as línguas
ainda à espera da Palavra no nosso Brasil, poderá ser levada a cabo numa ação conjugada de tradutores estrangeiros,
nacionais e indígenas.

O sentimento de Totó Maxakali é o mesmo de muitos indígenas que têm a Palavra de Deus em suas línguas. O indígena
Francisco Luiz, do povo Kuripako, testemunhou dizendo: “Antes de conhecermos a Palavra de Deus, vivíamos
com medo dos espíritos da mata. Não tínhamos paz nenhuma e sempre existiam conflitos entre nós e os vizinhos. E, por
quase nada, espancávamos as nossas mulheres e nossos filhos. Os pajés nos enganavam; nossa vida era só temor;
tínhamos medo de tudo e de todos! Mas a Palavra de Deus nos trouxe paz e iluminou as nossas vidas” . Orello
Francisco, do povo Kadiwéu, também testemunhou: “A Bíblia que eu tenho é em português. É uma língua que eu
acho difícil de falar e entender. Agora que eu estou ajudando na tradução da Bíblia para a minha língua é que eu entendo
bem melhor quem é Deus, aquilo que Ele quer me falar e tudo aquilo que eu devo fazer” . E Zelito, do povo
Tenharim, apelou: “Queremos as Escrituras na nossa língua. Temos que conservar a nossa cultura. Todos os
povos precisam ter as Escrituras traduzidas nas suas próprias línguas” . Como Igreja do Senhor, precisamos
atender a este apelo!

Cácio Silva
Outubro de 2005

FONTES
BOTTREL, Paulo (org.). Banco de Dados. Brasília: AMTB, Departamento de Assuntos Indígenas, 2005.
CALDAS, Carlos. O Último Missionário – Os Missionários Estrangeiros estão Deixando o Brasil. Qual a
Perspectiva para a Nova Liderança Evangélica? São Paulo: Mundo Cristão, 2001.
GRIMES, Barbara F. (ed.). Ethonologue. Vl. 1. Languages of the World. Dalas: SIL, 2000.
Mais que Uma só Língua. São Paulo: SBB e Chapada dos Guimarães: CONPLEI, 2004.
LIDÓRIO, Ronaldo. Novas Fronteiras. São Paulo: APMT, 2001.
LIMPIC, Ted (org.). CD-ROM Despertando a Visão. São Paulo: SEPAL, 2005.
RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. Línguas Brasileiras – Para o Conhecimento das Línguas Indígenas. São
Paulo: Loyola, 1994.
TERENA, Henrique. A Cultura Indígena e a Necessidade do Evangelho. IN: LIDÓRIO, Ronaldo (org.). Indígenas do Brasil
– Avaliando a Missão da Igreja. Viçosa: Ultimato, 2005.
SILVA, Norval Oliveira da. Traduzindo a Bíblia para Povos Indígenas. IN: LIDÓRIO, Ronaldo (org.). Indígenas do Brasil
– Avaliando a Missão da Igreja. Viçosa: Ultimato, 2005.
SOUZA, Isaac Costa de. De Todas as Tribos – A Missão da Igreja e a Questão Indígena. Viçosa: Ultimato, 1996.

NOTAS

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Os dados deste tópico foram obtidos em pesquisa junto ao Banco de Dados do Departamento de Assuntos Indígenas da
AMTB – Associação de Missões Transculturais Brasileiras, agências envolvidas em projetos de tradução e
diretamente com alguns tradutores.
Muitos nomes de povos indígenas são grafados de diferentes formas. Esse texto obedece a convenção de 1953 da ABA
– Associação Brasileira de Antropologia, a qual é largamente adotada no meio antropológico e lingüístico brasileiro.
Línguas Brasileiras. 1994.
Os dados deste tópico foram obtidos basicamente no Banco de Dados da AMTB.
Aryon Rodrigues. Línguas Brasileiras. 1994. p.6.
Ethonologue. 2000. pp.267-280.
Ted Limpic. Despertando a Visão. 2005.
Traduzindo a Bíblia para Povos Indígenas. 2005. p.207.
Novas Fronteiras. 2001. p.19.
De Todas as Tribos. 1996. p.37.
A Cultura Indígena e a Necessidade do Evangelho. 2005. p.38.
De acordo com Henrique Terena, em palestra no IV CBM, Águas de Lindóia, outubro de 2005.
O Último Missionário. 2001. p.87.
Mais que Uma só Língua. 2004. p.25.
Idem. p.17.
Idem. p.38.
Cácio Silva é pastor presbiteriano e missionário da Missão AMEM. Juntamente com sua esposa Elisângela, está
seguindo para a Amazônia, para trabalho entre indígenas. Tem mestrado em missiologia pelo CEM, onde também leciona
fenomenologia da religião, e habilitação em lingüística pela ALEM. www.caciosilva.com.br.

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