Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
IDÉIAS E CULTURA:
uma resposta a Don Mitchell
DENIS COSGROVE
Don Mitchell (1995) está preocupado porque quando, ou especialmente porque, nin-
a chamada “nova geografia cultural” caiu na mesma guém foi capaz de especificar o que é
armadilha que seus organizadores, ao criticarem ‘cultura’... isto continua a ser verdade,
trabalhos anteriores sob esse nome, procuraram evi- não importa quanto os geógrafos cul-
tar: isto é, tratar a cultura como uma categoria on- turais gostariam de reivindicar que
tológica que é “socialmente causativa”. Apesar de suas conceitualizações mais recentes
simpático a grande parte da produção acadêmica e mais sutis de cultura, ou sua atenção
dos “novos” geógrafos culturais, ele está preocu- a uma lista ampliada de característi-
pado em enfatizar que cultura é uma idéia com his- cas que presumem verdadeiramente
tória específica e laços explícitos ao exercício e constituir a cultura, permite maior
representação do poder social. Em suas palavras, é espaço para as ‘subculturas’ serem ana-
“uma idéia por intermédio da qual as várias maqui- lisadas (ibid).
nações da ‘economia política’ são representadas
Que eu saiba, em parte alguma qualquer um dos
como cultura”(ibid). No espaço limitado de uma
“novos” geógrafos culturais citados por Mitchell
resposta a um trabalho sério e fortemente argu-
afirmou – explicitamente em textos teóricos ou
mentado, apresentarei apenas três pontos.
implicitamente, em seus trabalhos substantivos –
Primeiro, há algo tenuemente quixotesco so-
que uma lista ampliada de características constitui
bre o conjunto do projeto de Mitchell. Ao trazer
uma definição mais verdadeira de uma ‘cultura’ rei-
à tona exclusivamente afirmações programáticas e
ficada do que a que existia anteriormente. Afirmar
críticas teóricas, ele ignora o trabalho monográfi-
isto é entender erroneamente suas intenções. Ape-
co substantivo daqueles a quem critica (a não ser
sar de poder estar faltando uma visão explicita-
em breves e corteses notas de rodapé). Ao longo
mente geográfica da idéia de cultura e apesar das
de seu trabalho, ele passa de uma crítica razoavel-
considerações de David Livingstone em The geo-
mente cautelosa, intimamente ligada a reivindica-
graphical Tradition (1992) sobre o que ele chamou
ções teóricas publicadas, até atribuições de con-
de “o procedimento geográfico” oferecer algumas
vicção não substanciadas e impetuosas.
orientações sugestivas, os “novos” geógrafos cul-
A ‘cultura’ é certamente reificada como turais historicamente sensíveis trabalharam preci-
explanação, como força causal mesmo samente ao longo das linhas que Mitchell parece
lavras, “cultura” é aquilo que nâo é “natureza”. Os COSGROVE D. The Palladian landscape. Geographical change
and its cultural representations in sixteenth-century Italy.
dois conceitos, natureza e cultura, só podem exis- Leicester: Leicester University Press, 1993.
DUNCAN J. The city as text: the politics of landscape
tir em relação dialética uma à outra e acredito que
interpretation in the Kandyan kingdom. Cambridge: Cam-
este aspecto da idéia de cultura é consistente como bridge University Press, 1990.
JACKSON P. Race and racism. London: Allen and Unwin,
uma dimensão de seu significado através das várias 1987.
mudanças no uso lingüístico da palavra “cultura”. JACKSON P. Maps of meaning: an introduction to cultural
geography. London: Unwin Hyman, 1989.
Assim, concordo com Mitchell que a idéia de —. Mapping meanings: a cultural critique of locality studies.
Environment and Planning A, v. 23, p. 215-28, 1991.
“cultura” gera distinções e diferencia o mundo. Es-
—. Towards a cultural politics of consumption. In: BIRD J.,
tou menos convencido que ele que as diferencia- CURTIS B., PUTNAM T., ROBERTSON G. and TICKNER
L. eds. Mapping the future: local cultures, global change.
ções formuladas e expressas por meio da idéia de London: Routledge, 1993.
LIVINGSTONE D. N. The geographical tradition: episodes in the
cultura sejam redutíveis apenas a contestações de history of a contested enterprise. Oxford: Blackwell, 1993.
poder. Tal posição só é defensável quando a ima- WILLIAMS R. The sociology of culture. New York : Schocken, 1982.