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DITADURA DO PROLETARIDO OU ABOLIÇÃO DO ESTADO?

O CONFLITO CONCEITUAL ENTRE ANARQUISTAS E MARXISTAS

Rafael Saddi Teixeira


saddirafael@yahoo.com.br

Segundo a opinião padrão, a Neste sentido, pretendemos aqui,


distinção central entre os anarquistas e os primeiramente, analisar a trajetória do
marxistas está no fato de que os primeiros conceito de “ditadura do proletariado” em
“(...) insistem na destruição imediata do Marx, depois, analisar as diferenças do
Estado em geral”, enquando os marxistas conceito “Estado” em Marx e Bakunin, e, por
“entendem que, apenas depois da vitória do último, sugerir uma possibilidade de
proletariado e do período da Ditadura superarmos as diferenças conceituais entre
Revolucionária do Proletariado, poderá o anarquistas e marxistas autogestionários
Estado perecer” (VERGER, 2009).2 para nos entendermos em relação à crítica
O presente artigo tem como da realidade e à forma de superação da
objetivo questionar esta explicação um tanto sociedade capitalista.
simplista das diferenças entre os anarquistas e
os marxistas. Queremos mostrar que por trás O Conceito de Ditadura do Proletariado
do conflito entre Bakunin e Marx ocorreu em Karl Marx
uma série de confusões terminológicas e
conceituais. O que era ditadura do A primeira utilização do termo
proletariado para Marx? Era de fato um “ditadura do proletariado” foi realizada pelo
Estado, tal como Bakunin criticara? O que era francês Auguste Blanqui, que entendia a
a “abolição do Estado” para Bakunin? Era ditadura do proletariado como um governo
uma destruição de qualquer instância de transição entre a antiga sociedade e a
organizativa e coercitiva? nova sociedade.
Este conflito entre anarquistas e Em um dos documentos de
marxistas, presente desde o século XIX, ingresso de militante na Sociedade das
embora não se resuma a um mero conflito Primaveras, sociedade secreta criada por
de termos, constantemente apresenta-se sob Blanqui, está explícita esta preocupação
a forma conceitual, isto é, sob uma luta com um governo centralizado que preparará
contra e por conceitos e definições que as condições para a nova sociedade.
foram elaborados de formas diferentes por
cada uma destas duas correntes. Can the people govern themselves
immediately after the revolution? (…)
the people will need, for a certain
period of time, a revolutionary power.
2
Existem muitas outras referências aos conflitos entre – In summary, what are your
marxistas e anarquistas que não colocam a questão principles?
central na transição política do capitalismo à nova Royalty and all aristocracies must be
sociedade, tais como a diferença em relação ao exterminated; to substitute in their
método de análise, às táticas de ação place the republic, which is to say the
(espontaneidade-disciplina), à concepção de government of equality; but, to pass to
liberdade (coletiva-individual), etc. A maior parte this government, to employ a
destas referências apresentam várias confusões tanto revolutionary power, which sets the
do entendimento do pensamento de Marx quanto do people to exercise its rights.
pensamento dos anarquistas. Entretanto, neste artigo (BLANQUI, 1830).3
nos centraremos na questão do Estado, que nos
3
parece ser a mais comentada e mais socializada das Tradução do autor: “Pode o povo imediatamente
opiniões. governar a si mesmo imediatamente depois da
instrumentos de produção nas mãos do
Vejamos que para os blanquistas, Estado” e definia este Estado como “o
o povo não poderá governar-se a si mesmo proletariado organizado em classe
imediatamente após a revolução, dominante”. Vejamos o que fala no
necessitando, por um certo período de Manifesto Comunista, de 1848:
tempo, de um poder revolucionário que
prepare as condições para o estabelecimento (...) o proletariado utilizará sua
da plena igualdade. supremacia para arrancar, pouco a
pouco, todo capital à burguesia,
Marx utilizou poucas vezes o centralizando os instrumentos de
termo “ditadura do proletariado”. Parece-me produção nas mãos do Estado, ou seja,
que a sua primeira utilização foi em 1850, do proletariado organizado em classe
no texto “A Luta de Classes em França de dominante, e para aumentar o mais
1848 a 1850”, onde afirma: rápido possível o total das forças
produtivas. (MARX, 1848).
Este socialismo é a declaração da
permanência da revolução, a ditadura Podemos dizer aqui que a
de classe do proletariado como ponto ditadura do proletariado era entendida, por
de trânsito necessário para a abolição Marx, como este Estado (o proletariado
das diferenças de classes em geral, organizado em classe dominante), que era
para a abolição de todas as relações de
produção em que aquelas se apoiam, caracterizado pela centralização dos
para a abolição de todas as relações instrumentos de produção. Vemos também
sociais que correspondem a essas uma certa noção de “transição”. Ao tomar o
relações de produção, para a revolução poder, o proletariado deve arrancar “pouco a
de todas as ideias que decorrem destas pouco” todo capital à burguesia e “aumentar
relações sociais. (MARX, 1850).
o mais rápido possível o total das forças
produtivas”.
Ele não diz muita coisa nesta
A noção de ditadura do
citação sobre o que é de fato esta ditadura
proletariado em Marx apresenta-se distinta
de classe do proletariado. Apenas afirma
da noção em Blanqui. Para o último, a
que é um ponto de trânsito necessário para a
ditadura do proletariado é uma ditadura do
abolição das diferenças de classe e para a
grupo revolucionário no poder de Estado.
abolição de todas as relações de produção
Para o primeiro, a ditadura do proletariado é
capitalistas. Se esta ditadura é um Estado ou
uma ditadura da classe proletária, isto é, do
uma outra forma de organização, Marx não
proletariado organizado em classe
fala.
dominante.
Embora sua explicação do termo
Mas, o que era este
seja vaga, uma análise do contexto do seu
proletariado organizado em classe
pensamento neste período nos dá pistas para
dominante? Podemos dizer que, até então,
compreender o que ele entendia por
Marx entendia que o proletariado, ao fazer a
“ditadura do proletariado”.
revolução, deveria se apropriar da máquina
Marx acreditava que a revolução
estatal já montada, centralizar os
proletária deveria “centralizar os
instrumentos de produção nas mãos de
Estado e criar a partir daí as condições para
revolução? (...) o povo precisará, por um certo
período de tempo, de um poder revolucionário. Em
a nova sociedade.
suma, quais são seus princípios? Realeza e todos os A partir da experiência da
aristocratas devem ser exterminados, para colocar em Comuna de Paris, entretanto, há um
seu lugar a república, que é o governo da igualdade; rompimento com a idéia de tomada do poder
mas, para passar para este governo, é necessário de Estado pelo proletariado. Marx e Engels
empregar um poder revolucionário, o qual prepare o
povo para exercer seus direitos”.
a explicitam em um prefácio à edição alemã
do Manifesto Comunista:
proletariado deveria se organizar. É no texto
Face ao imenso desenvolvimento da “A Guerra Civil na França” que Marx
grande indústria nos últimos vinte e apresenta claramente a sua posição:
cinco anos e, com ele, ao progresso da
organização do partido da classe
operária, face às experiências práticas, (...) uma vez estabelecido em Paris e
primeiro da revolução de Fevereiro, e nos centros secundários o regime
muito mais ainda da Comuna de Paris comunal, o antigo governo centralizado
— na qual pela primeira vez o teria que ceder lugar também nas
proletariado deteve o poder político províncias ao autogoverno dos
durante dois meses —, este programa produtores (...); não se tratava de
está hoje, num passo ou noutro, destruir a unidade da nação, mas, ao
antiquado. A Comuna, contrário, de organizá-la mediante um
nomeadamente, forneceu a prova de regime comunal, convertendo-a numa
que "a classe operária não pode realidade ao destruir o poder estatal,
simplesmente tomar posse da que pretendia ser a encarnação daquela
máquina de Estado [que encontra] unidade, independente e acima da
montada e pô-la em movimento para própria nação, em cujo corpo não era
os seus objectivos próprios. (MARX & mais que uma excrescência parasitária.
ENGELS, 1872). (MARX, 1986, p. 73-74).

Esta era, portanto, a primeira Vejamos que Marx


definição marxista de “ditadura do claramente opõe “poder estatal” (como uma
proletariado”. Foi a partir desta concepção, “excrescência parasitária”, “independente e
ainda bem próxima da concepção acima da nação”) ao “regime comunal” e
blanquista, que Marx utilizou o termo. opõe também “governo centralizado” ao
A partir da experiência da “autogoverno dos produtores”.
Comuna de Paris, entretanto, há um Aqui nos encontramos com o
rompimento com a idéia de tomada do poder ponto cerne de nossa questão. Bakunin já
de Estado pelo proletariado. Em 12 de abril havia percebido que a revolução proletária
de 1871, em uma carta a Kugelmann, Marx deveria abolir o Estado e constituir o
escrevia: autogoverno dos produtores. Marx, a partir
da experiência da Comuna de Paris, também
Se você reeexaminar o último capítulo compreende isto. Os dois chegam assim a
do meu “18 Brumário”, vai constatar uma mesma percepção do que o proletariado
que declaro como próximo intento da deverá fazer ao se levantar em revolução
Revolução na França – não mais social. Ele deverá abolir o antigo Estado e
como antes –, o ato de transferir a
maquinaria burocrático-militar de
organizar o seu autogoverno, a Comuna.
uma mão para outra, mas sim É significativo o fato de que
despedaçá-la (EvM.: no original Marx não utiliza em nenhum momento neste
alemão ”zerbrechen”, i.e. despedaçar, texto, “A Guerra Civil na França”, o termo
quebrar, fraturar, destruir etc.). “ditadura do proletariado”. E poderíamos
(MARX, 1871).
pensar que este termo havia morrido junto
com a idéia de tomada do Estado Burguês.
Ocorre, assim, uma superação da Entretanto, em diferentes
antiga concepção de ditadura do
cartas, e também nas “Críticas ao Programa
proletariado por uma outra concepção de Gotha” de 1875, o termo “ditadura do
política. O proletariado não deve mais
proletariado” continua a ser utilizado.
simplesmente tomar o Estado, ele deve Vejamos o que diz:
aboli-lo, reconstruindo uma nova forma
política, uma forma proletária de Entre a sociedade capitalista e a
organização política. A Comuna de Paris sociedade comunista medeia o período
teria fornecido a forma política como o da transformação revolucionária da
primeira na segunda. A este período dominação de classe através da repressão,
corresponde também um período da intervenção na produção, da produção de
político de transição, cujo Estado não
pode ser outro senão a ditadura
ideologias etc.
revolucionária do proletariado. Entretanto, a definição do
(MARX, 1875). termo Estado tal como utiliza Marx,
necessita apenas da repressão para garantir
Ditadura do proletariado está sua utilidade. É por isto que Marx pode falar
definida aqui como um período político de de Estado operário quando quer dizer
transição entre o capitalismo e o coerção-repressão proletária sobre a
comunismo. Mas, o que caracteriza este burguesia 4.
período e que forma política apresenta? Se o Estado é, portanto, uma
Engels irá afirmar, em uma carta a Bebel, forma de repressão de uma classe sobre
em 1875, que era necessário substituir em outra, ao destruir o Estado Burguês, o
todos os programas o termo Estado proletariado constrói o seu Estado, ou seja, a
(operário) pelo termo Gemeinweisen, “uma sua forma específica de repressão classista,
boa palavra alemã antiga que pode a ditadura do proletariado. Assim, ainda
corresponder muito bem à «Comuna » quando falamos de “autogoverno dos
[Kommune] francesa” (ENGELS, 1875). produtores”, ou “Comuna”, na terminologia
Em 1891, em um prefácio ao livro “A de Marx, estamos ainda falando de Estado,
guerra civil na França”, Engels dirá que a pois pressupõe que a Comuna é um
“ditadura do proletariado” é a própria instrumento criado pelo proletariado para
“Comuna de Paris”. (ENGELS, 1891). reprimir a oposição burguesa. Como
Desta forma, é bem possível respondeu Marx, em notas críticas ao livro
que Marx, ao utilizar o termo “ditadura do de Bakunin:
proletariado” e “Estado operário” esteja, a
partir de 1871, se referindo ao autogoverno (Ditadura do Proletariado) Significa
dos produtores, e não mais a um Estado (no que o proletariado – em vez de lutar,
fragmentadamente, contra as classes
sentido que os anarquistas dão ao termo). economicamente privilegiadas –
Então porque Marx mantém a utilização do adquiriu forças e organização
termo “Estado” e do termo “ditadura do suficientes para aplicar contra elas
proletariado”? Porque não fazer como meios gerais de coerção. Porém, o
Engels havia proposto na Carta a Bebel e proletariado pode apenas aplicar meios
econômicos que suprimem seu próprio
substituir o termo “Estado” por “Comuna” caráter de salariat (EvM:
(coisa que nem Engels mesmo fez)? assalariamento) e, portanto, de
Deve haver vários motivos classe.
para isto. Mas, para além deles, quero Portanto, com sua
insistir aqui na limitação da definição de completa vitória,
terminará também sua
Estado em Marx e dizer que esta limitação dominação, pois que
possibilitava a utilização do termo “ditadura desaparecerá seu caráter
do proletariado”, (mesmo quando se entende de classe. (MARX,
por isto o autogoverno dos produtores ou a 1874).
Comuna) como uma forma de Estado.

A Concepção de Estado em Karl Marx e 4


em Mikhail Bakunin Para Marx, o que é essencial no conceito de Estado
é o fato de que todo Estado é um meio de repressão
de uma classe sobre outra. (VIANA, 2003). Ao falar
Para Marx, o Estado é um de Estado operário, Marx está falando do “estado que
instrumento de reprodução das relações de a classe operária utilizaria para reprimir a burguesia.”
produção. Neste sentido, ele reproduz a (VIANA, 2003).
Assim, para Marx, o Estado Assembléias constituintes, nem os
operário é a concentração das forças governos provisórios, nem as ditaduras
supostamente revolucionárias, porque
proletárias para aplicar “meios de coerção” estamos convencidos de que a
contra a burguesia. revolução só é sincera, honesta e real
Em Bakunin, o termo Estado dentro das massas e que, quando se
assume uma outra definição. Para ele, o concentra nas mãos de alguns
Estado é, também, um instrumento de governantes, transforma-se inevitável e
imediatamente em reação.
repressão de uma classe sobre outra. (BAKUNIN, 1999, p. 148).
Entretanto, a utilização do termo implica
mais que isto. Todo Estado é, em sua Neste sentido, Bakunin
essência, hierarquizado, burocrático, combate os termos “Estado operário” e
dominador. Logo, todo Estado só pode atuar “ditadura do proletariado” e não aceita que a
a partir de uma divisão entre dirigentes e Comuna de Paris seja tomada como uma
dirigidos. Por isto, ele afirma: “Estado quer forma de Estado, posto que ela foi uma
dizer dominação, e toda dominação supõe forma anti-estatal por excelência, uma
submissão das massas e, consequentemente, organização descentralizada, federativa,
sua espoliação em proveito de uma maioria firmada de baixo para cima, sem a divisão
governamental qualquer.” (BAKUNIN, de poder entre dirigentes e dirigidos.
1999, p. 147). Para nós, este conflito
A crítica de Bakunin à terminológico apresenta algo mais do que
“ditadura do proletariado” se faz dentro uma simples questão de termos. Podemos
desta sua concepção de Estado. Ele critica a citar ao menos dois exemplos para
idéia de que seja possível falar em Estado demonstrar isto. Primeiro, é por esta
como “o proletariado organizado em classe percepção do Estado enquanto dominador
dominante”, pois nenhum Estado pode atuar por essência que Bakunin colocava a
com toda a classe dentro dele, mas somente necessidade de destruição da máquina
através desta divisão entre governantes e estatal burguesa e a constituição do
governados. “autogoverno dos produtores” antes mesmo
da experiência da Comuna de Paris. O
O que significa: “o proletariado
organizado em classe dominante”? pensamento de Marx precisou da realização
Quer dizer que este estará inteiramente da primeira grande experiência
na direção dos negócios públicos? Há, revolucionária do proletariado para perceber
aproximadamente, quarenta milhões de a importância desta premissa. Segundo, é
alemães. Poderão esses quarenta também por esta concepção de Estado que
milhões de alemães fazer parte do
governo e, o povo inteiro governando, Bakunin rompeu com qualquer tipo de
não haverá governados? Então não participação política (entenda-se política
haverá Estado, mas, se houver, haverá como Estado), defendendo o abstencionismo
governados, haverá escravos. completo, enquanto Marx, mesmo depois da
(BAKUNIN, 1999, p. 155). Comuna de Paris, ainda achava que em
alguns países seria possível a transição do
Bakunin não aceita a idéia de um capitalismo para o comunismo de forma
Estado operário, afirmando que ainda que pacífica, como afirma em um discurso
ele fosse formado por membros da classe durante o Congresso de Haya (mesmo
proletária, os dirigentes se tornariam novos congresso que expulsou os anarquistas da
opressores e reconstruiriam também a Associação Internacional dos
exploração econômica. Trabalhadores):
Não admitimos, nem mesmo como Sabemos que há que ter na devida
transição revolucionária, nem as conta as instituições, os costumes e as
Convenções nacionais, nem as
tradições dos diferentes países; e não da luta de classes posteriores a ele; que
negamos que existem países como a acredito que termos como “ditadura do
América, a Inglaterra, e se conhecesse
melhor as vossas instituições,
proletariado” ou “Estado operário” devam
acrescentaria a Holanda, onde os ser superados pela noção de “abolição do
trabalhadores podem atingir o seu Estado” e “autogoverno dos produtores”.
objectivo por meios pacíficos. Se isto é Entretanto, devemos entender
verdade, também devemos reconhecer que é preciso ir além dos termos e conceitos
que na maior parte dos países do
continente a força é que deve ser a
utilizados por anarquistas e marxistas e nos
alavanca das nossas revoluções; é à aproximarmos através da crítica real à
força que se terá de fazer apelo por sociedade e da sua forma de superação.
algum tempo a fim de estabelecer o
reino do trabalho. (MARX, 1872). Superando os conflitos de conceitos
Embora esta questão em Quando Bakunin critica a
relação à defesa da participação eleitoral por “ditadura do proletariado” ou a noção de
Marx seja polêmica, alguns documentos da “Estado Popular”, ele não está na realidade
AIT – Associação Internacional dos criticando a concepção que Marx
Trabalhadores, demonstram isto. Além da apresentava, mas aquilo que Bakunin
citação acima, podemos nos recordar de acreditava que Marx apresentava. Como
uma fala de Marx na Conferência de assim? Vejamos o que Bakunin fala:
Londres em 1871, a respeito da participação
eleitoral dos trabalhadores franceses: (...) conforme a teoria do Sr. Marx, o
povo não apenas deve destruir o
The governments are hostile to us, one Estado, como, ao contrário, deve
must respond to them with all the consolidá-lo, torná-lo ainda mais forte
means at out disposal. To get workers e, sob esta forma, colocá-lo à
into Parlament is synonimous with disposição de seus benfeitores, de seus
victory over the governments, but one tutores e de seus educadores, os chefes
must choose the right men, not Tolains. do partido comunista, em suma, à
(MARX, 1871a)5. disposição do Sr. Marx e de seus
amigos, que começarão em seguida a
Neste sentido, assim como a libertá-lo à sua moda. (BAKUNIN,
1999, p. 159).
Comuna de Paris foi importante para Marx
pensar a destruição da máquina estatal
A citação acima serve, em algum
burguesa; a experiência dos diferentes
sentido, para o pensamento de Marx antes
“partidos operários” durante o final do
da Comuna de Paris, mas não depois dela.
século XIX e início do século XX foi
Embora Marx e Blanqui não possuam a
necessária para que os marxistas autênticos
mesma concepção de “ditadura do
percebessem a necessidade de se romper
proletariado” (um vê o proletariado
com a idéia de que a participação política
organizado como classe dominante e o outro
poderia trazer algum ganho para a luta da
vê um grupo de conspiradores tomando o
classe proletária.
Estado), ambos pensaram em um tomada do
É por isto, por achar que o
Estado. Posto que a máquina do Estado até
conceito de Estado em Bakunin resistiu ao
então montada era o Estado burguês (uma
tempo e foi demonstrado nas experiências
máquina burocrática) me parece válida neste
5
sentido a crítica de Bakunin para este
Tradução do autor: “Os governos são hostis a nós,
nós devemos respondê-los com todos os meios
período do pensamento de Marx, embora
disponíveis. Colocar os trabalhadores no Parlamento não sirva para o período após a Comuna de
é sinônimo de vitória sobre os governos, mas Paris, quando este demonstra que não se
devemos escolher os homens certos, não Tolains”. deve simplesmente tomar a máquina até
(MARX, 1871).
então montada, mas constituir a Comuna, ou no interior de formas políticas que
seja, uma forma não burocrática da ainda pertencem mais ou menos a ela,
não atingiu ainda, ao longo desse
organização política. mesmo período de luta, sua complexão
Se é verdade que para Marx a definitiva e emprega meios de
“ditadura do proletariado” passou a ser libertação que deixarão de existir,
entendida como a “Comuna”, o depois da libertação. Por isso, o Sr.
“autogoverno dos produtores”, então não é Bakunin conclui que é mais
aconselhável não se fazer
verdade que Marx queria aumentar a força absolutamente nada ... e esperar o Dia
do Estado, mas suprimir as funções da Liquidação Geral – o Dia do Juízo
burguesas do Estado (para usar a Final. (MARX, 1874).
terminologia marxista) e “abolir o Estado”
(na terminologia anarquista). Marx parece compreender
Depois de 1872, a crítica de que Bakunin pretende simplesmente a
Bakunin a Marx se centra bastante naquilo abolição do Estado de uma hora para outra,
que ele chama de “a noção de Estado sem entender a importância do proletariado
Popular do Sr. Marx”. Entretanto, Marx exercer uma dominação de classe sobre a
nunca usou e, na verdade, combateu esta burguesia, ou seja, a importância da classe
idéia de “Estado Popular” cunhada por proletária criar meios de coerção contra a
Wilhelm Liebknecht. Neste sentido, mais oposição burguesa.
uma vez, a crítica de Bakunin, embora Em um outro texto, datado de
correta em sua essência, não é uma crítica 1873, Marx e Engels afirmam, ironizando os
ao pensamento mais avançado de Marx. anarquistas:
Assim, se, para Bakunin, o
problema de se manter ou se criar um Se a luta política da classe operária
Estado operário era que este Estado não adquire formas revolucionárias, se os
operários, em lugar da ditadura da
conduziria à emancipação dos trabalhadores, burguesia, estabelecem a sua ditadura
mas à sua exploração e dominação; então revolucionária, cometem um espantoso
sua crítica não servia mais para a concepção crime de lesa-princípios, pois que, para
de Marx/pós Comuna de Paris. Posto que, satisfazerem as necessidades do
chame de “Estado operário” ou momento, necessidades lamentáveis e
profanas, para quebrarem a resistência
“autogoverno dos produtores”, tanto Marx
da burguesia, dão ao Estado uma forma
quanto Bakunin concordavam que a revolucionária e passageira, em vez de
Comuna deveria ser a forma política do deporem as armas e suprimirem o
proletariado. Estado. (MARX apud: Lênin, 1918).
Marx também, por sua vez, e
Engels (este mais ainda) confundiram Aqui opõem a atitude marxista
bastante, em suas críticas, a concepção de dar ao Estado uma forma revolucionária
bakuninista de revolução social. Nas notas e passageira (a ditadura do proletariado, o
críticas ao livro “Estado e Anarquia” de Estado Operário, a Comuna, o autogoverno
Bakunin, Marx afirma: dos produtores) à atitude anarquista de
À parte o fato de que o Sr. Bakunin depor as armas e suprimir o Estado. Mais
fica cavalgando em torno da concepção uma vez, Marx e Engels acusam os
de Estado do Povo, criada por Wilhelm
anarquistas de não pensarem a questão da
Liebknecht, sua parvoíce é dirigida
contra o “Manifesto do Partido importância do proletariado garantir, no
Comunista” etc. e significa apenas o momento revolucionário, uma forma
seguinte: Durante o período da luta organizada de repressão-coerção à oposição
para a derrubada da velha sociedade, burguesa.
como o proletariado ainda atua sobre a
Seria ridículo pensar que
base dessa velha sociedade,
movimentando-se, por isso, também Bakunin não pensava na necessidade de uma
repressão sobre a oposição burguesa a partir mais claramente como este processo ocorre
do fato revolucionário. Ainda que não e deve ocorrer.
tivesse citado isto claramente em seus
textos, a sua total concordância com a forma No processo revolucionário, o antigo
como se procedeu a Comuna de Paris poder estatal será destruído e os órgãos
que virão tomar o seu lugar, os
serviria para provar que tal idéia é absurda. conselhos operários, terão certamente
Mas, mesmo em alguns de seus textos, é durante algum tempo ainda poderes
possível ver referências como: políticos importantes a fim de
combater os vestígios do sistema
Para a organização da Comuna: a capitalista. Contudo, a sua função
federação das barricadas permanentes e política reduzir-se-á gradualmente a
a função de um conselho uma simples função econômica: a
revolucionário da Comuna pela organização do processo de produção
delegação de um ou dois deputados por colectiva dos bens necessários à
cada barricada, um por rua ou por sociedade. (PANNEKOEK, 1936).
bairro, deputados investidos de
mandatos imperativos, sempre Neste sentido, para
responsáveis e sempre revogáveis. Pannekoek, “A organização conselhista
(BAKUNIN, 1999, p. 138).
encarna a ditadura do proletariado”. O
processo de luta de classes, segundo ele,
O que significa “federação
“engendra naturalmente órgãos dessa
das barricadas permanentes” senão a
ditadura: os sovietes.” (idem).
federação do povo em armas? Assim, sem
Para Nildo Viana, Marx
dúvida alguma, tanto Marx não mais
entende a “ditadura do proletariado” como o
proclamava um Estado Centralizado, como
processo revolucionário que vai da
pensava Bakunin, quanto este último não
derrocada do poder burguês até a extinção
ignorava a necessidade de mecanismos
completa da oposição à nova sociedade.
organizados de coerção-repressão da
Neste sentido:
burguesia pelo proletariado.
Essa confusão entre Marx e A Comuna de Paris seria a forma
Bakunin contribuiu para impossibilitar um histórica na qual isto teria se
acordo comum que estava implícito na tese manifestado pela primeira vez. Na
de ambos em relação ao caráter do poder esfera da produção, há a "autogestão
revolucionário. Hoje, devemos superar as dos produtores" e isto se generaliza
para todas as relações sociais, mas
confusões terminológicas, buscando como ainda existe, neste momento,
compreender a crítica real, para além dos oposição (seja internacional ou
conceitos que cada um utilizou. internamente na nação), haverá uma
repressão aos elementos reacionários,
Comunistas de Conselhos e Anarquistas representantes do antigo estado de
coisas, realizada pelo "povo em
Revolucionários: um encontro possível armas", ou seja, pela população auto-
organizada, sendo uma extensão da
Para os comunistas de conselhos, autogestão na produção. Com a derrota
é com a experiência da luta de classes que o da contra-revolução, cessa de existir a
conceito de “ditadura do proletariado” necessidade de uma coletividade
armada para auto-proteção. Aí se entra
assume a sua forma concreta. Pannekoek, na segunda fase da sociedade
por exemplo, afirma que na época em que comunista.”. (VIANA, 2003).
este conceito foi criado “não era ainda
possível encarar claramente como a classe Embora alguns comunistas de
tomaria o poder.” (PANNEKOEK, 1936). conselhos não utilizem mais o termo
Entretanto, a experiência de toda a luta “ditadura do proletariado”, este termo, para
proletária dos tempos posteriores forneceu eles, não significa a constituição de um
Estado de transição (um Estado socialista) social conduz à “ditadura do proletariado”
como dizia Lênin. Ela significa o que é, por sinal, a autogestão política, sob a
autogoverno dos produtores, mantendo forma dos conselhos operários. Neste
ainda a força de repressão, sem a sentido, para um anarquista atento, o que os
constituição de um exército, mas a partir do conselhistas chamam de “ditadura do
“povo em armas” na luta contra a oposição à proletariado” é, sobretudo, a “abolição do
sociedade autogestionária. Estado” proposta pelos anarquistas, isto é, a
Não há, aqui, nenhuma abolição de um sistema de autoridade
diferença essencial entre esta concepção firmado na divisão entre dirigentes e
política marxista e a concepção anarquista. dirigidos. É o autogoverno dos
Há sim uma diferença de termos utilizados. trabalhadores. Para um marxista atento, a
Para os anarquistas, a revolução social é a crítica anarquista à ditadura do proletariado
abolição imediata do Estado e a constituição e ao Estado operário é uma crítica à
do autogoverno dos trabalhadores. Para os burocracia e, portanto, a qualquer idéia de
marxistas não burocráticos, a revolução estatização dos meios de produção.

Referências

BAKUNIN, Michael. Textos Anarquistas.Porto Alegre: L&PM. 1999.


BLANQUI, Auguste. Reception Procedure of the Society of the Seasons. 1830.

In: http://www.marxists.org/reference/archive/blanqui/1830/seasons.htm. Acesso em: novembro de 2009.


ENGELS, Frederich. Carta a August Bebel. 1875. http://www.marx.org/portugues/marx/1875/03/28.htm. Acesso
em: dezembro de 2009. ______. Introdução de Friedrich Engels à Edição de 1891. In:
http://marxists.architexturez.net/portugues/marx/1891/03/18.htm. Acesso em: dezembro de 2009.
LENIN, Vladimir. O Estado e a Revolução. 1818. In:
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