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ENSAIO

ECOLOGIA Novo enfoque para o estudo de grupos taxonômicos em extensas áreas do globo

Macroecologia: visão
panorâmica de sistemas
ecológicos complexos
José Alexandre F. Diniz-Filho
Departamento de Biologia Geral, Universidade Federal de Goiás
e Departamento de Biologia, Universidade Católica de Goiás

Luis Mauricio Bini


Departamento de Biologia Geral, Universidade Federal de Goiás

Carlos Eduardo R. de Sant’Ana


Núcleo de Ecologia e Biologia Evolutiva, Centro Federal de Educação Tecnológica de Goiás

Thiago F. L. V. B. Rangel
Programa de Pós-graduação em Ecologia e Evolução, Universidade Federal de Goiás

O objetivo da pesquisa acadêmica em ecologia


é explicar a distribuição e a abundância da
vida na Terra. Como em outros campos da ciência,
canadense Robert H. MacArthur (1930-1972) e do
biólogo norte-americano Edward O. Wilson (1929-).
O programa de pesquisa em macroecologia integra
a abordagem reducionista (que envolve experi- teorias e métodos da ecologia, sistemática, fisiologia
mentos em pequena escala de tempo e espaço com comparada, paleobiologia, biogeografia e biologia
poucas espécies, selecionadas segundo a facilidade evolutiva.
de manipulação) foi e continua sendo importante Ao buscar padrões em grandes escalas geográficas
para o avanço dessa área de conhecimento. Mas, e evolutivas, a macroecologia pode ser vista como
quando se pensa em grandes escalas espaciais e em abordagem complementar aos estudos experimen-
escalas evolutivas de tempo, essa abordagem ‘tra- tais de processos ecológicos em escala local, que do-
dicional’ raramente oferece resposta a questões im- minaram a ecologia de comunidades nos anos 80 e
portantes. Na tentativa de solucionar alguns des- 90. Apesar das dificuldades epistemológicas de apli-
ses problemas, em 1989 os ecólogos norte-america- car um pensamento hipotético-dedutivo na determi-
nos James H. Brown e Brian A. Maurer criaram um nação dos processos que explicam a origem e a ma-
programa de pesquisa denominado macroecologia, nutenção de padrões, a macroecologia parece aten-
com a finalidade de estudar as características de der melhor às demandas relacionadas com crise
grandes grupos taxonômicos distribuídos em ex- ambiental e perda de biodiversidade. Isso porque tais
tensas áreas geográficas ao longo do tempo evoluti- questões dificilmente podem ser reduzidas a escalas
vo (por exemplo, mamíferos da região neotropical). que permitam experimentação, e os efeitos da ação
O primeiro livro-texto sobre macroecologia foi humana se propagam por escalas regionais, envol-
publicado em 1995 e, desde então, a literatura cien- vendo tanto processos locais de interação entre popu-
tífica sobre o tema tem crescido significativamente. lações quanto processos regionais e evolutivos.
O tema integra diversos programas de pesquisa e Mas se os requisitos da experimentação tradicio-
teorias ‘clássicas’ em ecologia – desenvolvidas ini- nal são relaxados, é possível pensar em estudos
cialmente no âmbito da chamada fase ‘não-experi- macroecológicos que utilizam ‘experimentos natu-
mental’ da ecologia de comunidades, das décadas rais’ (por exemplo, mudança na biota causada por
de 1950 e 1960 –, das quais a mais famosa é a teoria eventos naturais, como erupções vulcânicas e tsu-
do equilíbrio em biogeografia de ilhas, do ecólogo namis) e ‘experimentos na natureza’ (mudança na

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biota de uma grande região ocasionada por inter- A B E
venções humanas, intencionais ou acidentais, a
exemplo das alterações da composição atmosféri-
ca). A comparação entre abordagens de experimen-
tação tradicional e experimentos naturais revela
vantagens e desvantagens das duas abordagens. Os
experimentos tradicionais cumprem os requisitos
necessários para a posterior aplicação das análises
ensinadas nos cursos básicos de estatística. As ques- C D F
tões de escala são os principais problemas associa-
dos à experimentação tradicional. Em geral é difícil
transpor os resultados obtidos em pequena escala
espacial para a escala real de interesse (como os
biomas). Por outro lado, os experimentos naturais e
os experimentos na natureza, como apresentados em
1986 pelo ecólogo norte-americano Jared Diamond,
têm a vantagem de ser realizados na própria escala Figura 1. Estudos de ecologia de comunidades podem apresentar resultados
espacial (ou temporal) de interesse. Mas a ausência detalhados, mas apenas em alguns poucos locais (A). Já a abordagem
de um controle verdadeiro restringe as possibilida- macroecológica torna possível visualizar a área estudada como um todo,
mas de um modo nebuloso (B). Outro exemplo hipotético indica que é possível
des de estabelecer relações seguras de causa e efei-
definir com maior precisão os valores de algum atributo de interesse
to. Em resumo, as duas abordagens se comple- (como número de espécies) apenas em escalas localizadas (C). Em grandes
mentam. Os experimentos tradicionais podem, no escalas espaciais, a análise da variação desse atributo na área estudada
entanto, ser usados para resolver questões macroe- só pode ser feita através de interpolações (D). No futuro, talvez seja possível
cológicas em sistemas nos quais as manipulações combinar as duas abordagens (E e F) e assim compreender os sistemas
ecológicos detalhadamente e em grandes escalas espaciais
são de grande escala para os organismos, mas não
para o experimentador.
É possível entender melhor as visões tradicional As espécies são as ‘partículas’ usadas nos estudos
e macroecológica por meio de uma analogia. Se macroecológicos. A dinâmica dessas partículas no
visualizarmos uma comunidade ‘tradicional’, focada tempo e no espaço determina padrões gerais de va-
em escalas locais, na maioria das vezes vamos com- riação de características espécies-específicas, como
preender detalhadamente os processos ecológicos tamanho do corpo, abundância e distribuição geo-
que estruturam essa comunidade apenas em poucos gráfica. Da correlação entre essas variáveis ecológi-
locais, sem uma visão global. Equivaleria a enxer- cas complexas (VECs) – no sentido de serem a ex-
gar uma parte do todo sem distorções. Por outro lado, pressão final de múltiplos processos ecológicos,
por meio de um enfoque macroecológico, seria pos- evolutivos e fisiológicos ocorridos com os indiví-
sível ter uma visão global dos padrões e processos, duos de uma espécie –, surgem também padrões de
mas os detalhes ficariam obscuros, sem nitidez. A correlação que ocorrem em escala regional, conti-
falta de detalhes é, pois, o preço que se paga pela nental e global. As VECs podem ser sumarizadas ao
visão panorâmica (figura 1). longo do espaço geográfico e, desse modo, diferentes
áreas ou regiões também podem ser tratadas como
O programa de pesquisa partículas submetidas a efeitos históricos e
em macroecologia ambientais (gradientes latitudinais de diversidade,
Operacionalmente, a macroecologia pode ser pen- do tamanho do corpo ou do tamanho da prole). As-
sada como a análise estatística de um grande nú- sim, com base na variação interespecífica dessas
mero de ‘partículas’ ecológicas. A preocupação não VECs e nas interações entre elas, é possível definir
é determinar as características de cada partícula, as principais linhas de ação do programa de pesqui-
mas as propriedades da dinâmica dessas partícu- sa em macroecologia.
las no tempo ou no espaço geográfico. Essa dinâmi- As distribuições de freqüência das VECs são ge-
ca seria responsável pela criação de padrões ge- ralmente assimétricas à direita, sugerindo que são
rais, como a relação entre riqueza e área ou rique- determinadas por interações não aditivas de múlti-
za e gradientes latitudinais de diversidade. Espe- plos fatores ecológicos. Assim, a maior parte das es-
ra-se que a dinâmica seja a resultante de processos pécies é de pequeno porte e tem distribuição geo-
ecológicos e evolutivos, como adaptação a diferen- gráfica restrita (figura 2). Dados de vários grupos
tes componentes ambientais, competição, predação taxonômicos também indicam que a maior parte
etc., atuando em diferentes escalas e interagindo das espécies é rara, e a procura de modelos para
de forma complexa. descrever essa distribuição foi e continua sendo uma 

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tude, e tamanho do corpo x latitude – também ten-
dem a gerar padrões poligonais que divergem de
relações funcionais ou de relações que seriam espe-
radas ao acaso.
A partir da sobreposição das distribuições geo-
gráficas das espécies, é possível avaliar padrões es-
paciais de riqueza (figura 4). Mais uma vez, o progra-
ma de pesquisa em macroecologia recorreu à aná-
lise de um dos padrões mais conhecidos em ecolo-
gia: os chamados gradientes latitudinais de diversi-
dade. Os trabalhos de naturalistas como Johann
Reinhold Foster (1729-1798) e Alexander von Hum-
boldt (1769-1859), nos séculos 18 e 19 respectiva-
mente, deram início à discussão sobre por que as
Figura 2. Distribuição de freqüências do tamanho do corpo regiões tropicais são mais ricas que as temperadas.
(kg) em escala logarítmica para 486 espécies de aves Essa questão aparentemente simples tem sido
brasileiras, a partir de dados compilados da literatura. debatida desde então, e mais de 100 teorias ou mo-
Observe que a maior parte das espécies é de pequeno
porte e que só algumas delas conseguem atingir
delos já foram propostos para explicá-la. No âmbito
grandes tamanhos corpóreos do novo programa de pesquisa, os trabalhos voltados
para o entendimento do problema têm sido estimu-
lados pela possibilidade de obtenção de dados cli-
das principais linhas de investigação da ecologia de máticos e ambientais em grande escala (com auxí-
comunidades desde a década de 1940. lio da tecnologia de sensoriamento remoto) e de
As relações entre as VECs também revelam pa- processamento e análise dessas informações. Isso
drões interessantes que em geral não são descritos gerou avanços significativos nos últimos 10 anos,
por funções lineares ou não-lineares. As espécies permitindo eleger os mecanismos mais prováveis
(partículas macroecológicas) ocupam certas partes para explicá-lo e com maior efeito em grandes esca-
do espaço definido pelas VECs, separadas de outras las. Busca-se hoje uma avaliação integrada de fato-
regiões ‘vazias’. Isso forma figuras poligonais deno- res ecológicos atuais e históricos para explicar esses
minadas envelopes de restrição, e a interpretação padrões, bem como sua relação com as VECs do con-
de muitos processos ecológicos estaria nas bordas junto de espécies analisadas.
desses envelopes. A relação entre a área de distri- As partículas ecológicas (espécies) utilizadas nos
buição geográfica e o tamanho do corpo, por exem- estudos macroecológicos não trazem, na maioria das
plo, pode ser descrita por uma região poligonal na vezes, informações independentes. Por exemplo,
qual as espécies de pequeno porte podem ocupar
áreas de distribuição geográfica grandes ou peque-
nas; já as de grande porte devem, quase obrigatoria-
mente, ocupar áreas grandes (figura 3). Assim, apa-
rece uma relação triangular, caracterizada princi-
palmente por uma relação positiva entre área míni-
ma de distribuição e tamanho do corpo. Na realida-
de, essa linha é probabilística (no sentido de que as
espécies devem se distribuir aleatoriamente ao seu
redor) e deve resultar de processos de extinção de
espécies associados à viabilidade das populações.
Do ponto de vista prático, a distância das espécies a
essa linha pode estar relacionada com sua probabi-
lidade de extinção. E, de fato, há uma correlação
entre a posição relativa de cada espécie no espaço
de restrição e o nível de ameaça definido pela União Figura 3. Relação entre área de distribuição geográfica
Internacional para a Conservação da Natureza para e tamanho do corpo, em escala logarítmica,
os mamíferos carnívoros da América. para 70 espécies de mamíferos carnívoros da América.
Outras relações que envolvem espécies como par- As linhas tracejadas indicam o envelope de restrições
macroecológicas. Note que as espécies em risco
tículas (pontos nos gráficos que relacionam duas
de extinção estão mais próximas do limite inferior direito,
VECs) – área de distribuição geográfica (ADG) x abun- usualmente interpretado por um modelo
dância, abundância x tamanho do corpo, ADG x lati- de populações mínimas viáveis

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Figura 4. Padrão espacial da riqueza de 3 mil espécies
de aves na América do Sul, calculada a partir
da sobreposição de áreas de ocorrência. Os dados
de extensão de ocorrência das espécies estão disponíveis
em formato digital em http://www.natureserve.org/
getData/birdMaps.jsp

A macroecologia e o homem
Os padrões observados em grandes escalas podem
ser úteis à elaboração de estratégias eficientes de
conservação da biodiversidade. Por exemplo, a for-
ma do envelope de restrição que descreve a relação
entre tamanho do corpo e distribuição geográfica
pode permitir uma avaliação inicial do risco de
extinção de espécies. A modelagem de padrões es-
paciais de abundância pode auxiliar no delineamen-
to de unidades de conservação mesmo na ausência
de dados detalhados em escala local.
A compreensão da origem e manutenção dos gra-
dientes de diversidade com base em modelos climá-
ticos e históricos permite identificar regiões ricas
em espécies e com elevado endemismo, em geral
nas áreas tropicais do planeta. Relacionar tais pa-
drões de diversidade com ocupação humana per-
mitiu o estabelecimento dos chamados hotspots
mundiais de biodiversidade – uma filosofia de ação
emergencial para a conservação da diversidade bio-
pares de espécies podem apresentar valores simila- lógica que utiliza procedimentos claramente ma-
res para uma VEC qualquer (tamanho do corpo) sim- croecológicos.
plesmente porque descendem de um ancestral co- A visão da espécie humana como partícula ecoló-
mum e não por influência causal de outras VECs. Do gica pode ajudar a compreender seu impacto sobre
mesmo modo, locais próximos uns dos outros ten- a biodiversidade da Terra (figura 5). O homem é um
dem a se assemelhar mais que o esperado ao acaso. dos maiores mamíferos do planeta, e o envelope de
Como resultado, os pressupostos das análises esta- restrição apontado explica sua ampla distribuição
tísticas clássicas não são atendidos devido à depen- geográfica e a viabilidade de sua persistência a lon-
dência entre as observações. Assim, os estudos go prazo. Isso é coerente com as mudanças ecoló-
macroecológicos geralmente usam métodos esta- gicas que vêm ocorrendo com as espécies de ho-
tísticos especiais para controlar esses efeitos. minídeos desde o início do Pleistoceno e que resul-
taram em um processo de expansão populacional a
partir de cerca de 2 milhões de anos atrás.
Mas, considerando-se o tamanho de seu corpo, o
FONTE: MODIFICADO DE J.E. COHEN. JOURNAL OF APPLIED ECOLOGY, V. 34, PP. 1325-1333, 1997.

homem deveria viver em baixas densidades popula-


cionais, a fim de respeitar o envelope de restrição en-
tre abundância e tamanho, cujo limite superior pode-
ria ser definido por um modelo conhecido como re-
gra de equivalência energética. Segundo essa regra,
espécies de diferentes tamanhos corporais utiliza-
riam uma proporção semelhante da energia disponí-
vel no ambiente, uma vez que a variação das deman-
das metabólicas individuais seria equilibrada pelas
variações na abundância. Atualmente o homem vive
nas áreas urbanas em uma densidade muito maior
que a esperada para um mamífero do seu porte. Como
conseqüência, estimativas recentes apontam que a
Figura 5. Relação entre densidade populacional
e tamanho do corpo para mamíferos. Destaca-se espécie humana consome de 30% a 50% da produ-
a posição atípica do homem (peso de aproximadamente ção primária do planeta. O restante é ‘dividido’ entre
70 kg e média de 44 indivíduos por km2) os pouco mais de 2 milhões de espécies descritas. ■

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